Acórdão nº 4849/05.0TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução31 de Março de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA – INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DE CRÉDITO, S.A, com sede na Rua .................., nº..., em Lisboa, intentou acção declarativa, ordinária, contra BB, residente na Quinta .............., ..... .....º, S. João de Ver, pedindo se declare a resolução do contrato de crédito que juntou e, em consequência, se condene a Ré a restituir-lhe o auto-ligeiro, da marca Opel-Corsa, matrícula 00-00-00, com o cancelamento do registo deste averbado em nome da Ré.

Alegou, em síntese, que no âmbito da sua actividade celebrou com a Ré, em 09/12/2003, um contrato de crédito que teve por objecto o financiamento de € 9.000,00, destinado à aquisição, pela Ré, daquela viatura automóvel matrícula 00-00-00, tendo constituído a seu favor reserva de propriedade sobre tal veículo; como a Ré não pagou parte da 9ª prestação, nem as 10ª a 14ª prestações, enviou-lhe, em 26/02/2005, carta registada com a/r, concedendo-lhe um prazo suplementar de 8 dias para proceder à sua liquidação sob pena de, não o fazendo, a mora se converter em incumprimento definitivo, não tendo a Ré, apesar disso, pago nem lhe feito a entrega do veículo; intentou uma providência cautelar de apreensão dessa viatura, que foi decretada em 09/09/2005.

Contestando, a Ré alegou a excepção de incompetência relativa em razão do território, defendendo que a competência cabe ao Tribunal da Comarca do Porto, impugnou a factualidade da petição inicial e concluiu pela procedência daquela excepção, e, sempre, pela improcedência da acção.

Proferido o despacho saneador, em que se julgou improcedente a referida excepção de incompetência relativa, e elaborados os elencos da matéria de facto assente e da base instrutória, a acção prosseguiu a sua normal tramitação, vindo a realizar-se a audiência de julgamento, com resposta à base instrutória a fls.321-322, e a proferir-se sentença, que, julgando a acção parcialmente procedente, declarou “ resolvido o contrato de crédito celebrado em 9 de Dezembro de 2003, entre aquela ( autora) e a ré”, tendo absolvido a mesma ré “da restante parte do peticionado, ou seja, do pedido de condenação na restituição do veículo de marca “Opel”, modelo “Corsa”, com a matrícula 00-00-00 e do pedido de cancelamento do registo averbado, sobre a mesma viatura, a favor da mesma ré”.

No seguimento dos recursos de apelação que tanto a Autora como a Ré interpuseram, o Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão de 06-05-2010, julgando improcedente a apelação da Ré, e procedente a apelação da Autora, condenou aquela a restituir o veículo de marca Opel, modelo Corsa, com a matrícula 00-00-00 à Autora “AA” e ordenou o cancelamento do registo averbado em nome da Ré.

Irresignada, a Ré interpôs recurso de Revista, formulando as seguintes: CONCLUSÕES A - No contrato de mútuo celebrado e em análise nestes autos, não foi fornecida à ré consumidora cópia do contrato, nem aquando da sua assinatura. nem posteriormente.

B - No caso de não ser entregue um exemplar/cópia devidamente preenchido do contrato ao consumidor no momento da assinatura, o contrato de crédito é nulo, pois é obrigatório e essencial para a validade do negócio.

C - Violou a recorrida o dever de comunicação e informação, D -- Gerou a recorrida a nulidade do contrato.

E- Impediu uma informação atempada e completa de todas as condições do contrato.

F - Nulidade é invocável a todo o tempo e é insanável.

G - A recorrida provocou a nulidade do contrato com o seu comportamento e coarctou direitos fundamentais ao consumidor pelo que não pode ver premiado esse seu comportamento lesivo desses direitos, validando - se - lhe o negócio.

H - É patente a desigualdade de meios entre o fornecedor do bem e o consumidor, e ao actuar como actuou, a recorrida. prevalecendo-se de superioridade negocial em relação a quem recorreu ao credito, infringiu em termos censuráveis, os deveres de cooperação, de lealdade e informação, em suma, os princípios da boa fé.

I - Confirmar negócio nulo, ou impedir a invocação de nulidade do mesmo pelo consumidor o que objectivamente tem o mesmo resultado, vem legitimar futuros procedimentos irregulares e ilegais deixando o consumidor desprotegido e à mercê do arbítrio do fornecedor/vendedor.

J - Poderá o outorgante incumpridor confiar que uma nulidade invocável a todo o tempo, a final não o é.

L - Violou o douto acórdão em crise o disposto nos artigos 6 do D.L.. 359/91 de 21.9, 286º, 288º a contrario sensu e 294º todos do C. Civil M - A recorrida é a mutuante no contrato de crédito.

N - Não era à data do negócio proprietária do veículo, nem resulta do contrato de credito em causa que tenha sido subrogada nos direitos desse proprietário ( o vendedor da compra e venda) ante o pagamento do preço que fez a este ultimo.

O - O artigo 409º do C. Civil não consente que se incluam na sua previsão os contratos de mutuo mesmo quando conexionados com um contrato de compra e venda do bem financiado.

P -É invalida, por legalmente inadmissível, a clausula de reserva de propriedade estabelecida a favor do financiador da aquisição de veiculo automóvel quando não comunga da qualidade de vendedor ( Ac do STJ de l0.07.2008).

Q - Violou o douto acórdão em crise o disposto no artigo 409 do C.Civil.

Foram apresentadas contra-alegações, pugnando a parte contrária pela manutenção do decidido.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, pois nada obsta ao conhecimento do objecto do presente recurso, sendo que este é delimitado pelas conclusões da alegação do Recorrente, nos termos, essencialmente, do artº 684º, nº 3 do CPC, como, de resto, constitui doutrina e jurisprudência firme deste Tribunal.

FUNDAMENTOS Das instâncias, vem dada, como provada, a seguinte factualidade: 1 - A autora é uma sociedade comercial sob a forma anónima, cujo objecto é a actividade de locação financeira e a actividade de financiamento de aquisições a credito, nomeadamente de veículos automóveis ( alínea A).

2 - No âmbito da sua actividade celebrou com a ré, no dia 9/12/2003, o contrato n° ......, cuja cópia consta de fls. 124 e 125 dos autos (resposta ao art. 1da B I).

3 - A ré apôs a sua assinatura no documento cuja cópia consta de fls. 124-125 dos autos (alínea B).

4 O referido contrato teve como objecto um financiamento de € 9.000,00 (resposta ao artº. 2 B I ).

5 - Do valor de € 9.000,00, € 8.696,00 respeitam ao preço de venda do veículo automóvel marca "Opel" , modelo "Corsa", com a matricula 00-00-00, declarado pelo Stand fornecedor e pela ré à autora e que foi transferido para a conta titulada pelo primeiro; € 254,00 respeitam a encargos administrativos e fiscais e € 50.00 respeitam a despesas de legalização (resposta ao quesito 3 da BI).

6 - O preço ajustado entre a ré e o Stand fornecedor para a viatura foi de € 7.780,01 (resposta ao art. 10 BI).

7 - Como condição de celebração do referido contrato e como garantia do seu bom cumprimento, foi exigido pela autora à ré a constituição de reserva de propriedade a seu favor sobre o mencionado veículo (resposta ao art. 4 BI). .

8 - Na Conservatória do Registo Automóvel encontra-se registado, relativamente ao veículo de matrícula 00-00-00, que a propriedade está registada a favor da ré, existindo encargo de reserva, de que é...

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