Acórdão nº 88/2002.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelORLANDO AFONSO
Data da Resolução23 de Março de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça:

  1. Relatório: Pela 5ª vara cível do Tribunal Judicial da comarca de Lisboa corre processo comum, na forma ordinária, em que é A. AA, identificado nos autos, e R. Estado Português, pedindo aquele a condenação deste no pagamento da quantia de 1.209.495,11 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação, bem como quantia a liquidar posteriormente, como indemnização de danos futuros, por anormal funcionamento do processo, erro judiciário, e ultrapassagem do prazo razoável em processo de regulação do poder paternal.

    O R. contestou pedindo que a acção fosse julgada improcedente, por não provada e, consequentemente fosse absolvido do pedido e o A. condenado como litigante de má fé.

    Replicou o A invocando a litigância de má fé do R.

    Treplicou o R. concluindo como na contestação.

    O A. apresentou dois articulados supervenientes tendo o primeiro sido admitido e o segundo sido admitido em parte.

    Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais, conforme da acta consta, tendo a acção sido julgada improcedente, por não provada e o R sido absolvido do pedido.

    Inconformado com esta decisão dela recorreu o A para o Tribunal da Relação de Lisboa tendo, em conferência, sido negado provimento ao agravo interposto e concedido provimento parcial à apelação condenando-se o R a pagar ao A., a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de 5.000,00 €, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação e até efectivo pagamento. No mais confirmou-se a sentença proferida em 1ª instância.

    Deste acórdão recorre, agora, o A alegando, em conclusão, o seguinte: 1ª Verifica-se nulidade do aresto recorrido, nos termos do art668°n° 1 d) do Código do Processo Civil (CPC), por não ter julgado da extemporaneidade ou não da contestação conforme ac. do Sr. Presidente do TRL de 28/04/2003.

    1. O prazo razoável violado não foi apenas o que mediou entre o momento de incumprimento do regime de visitas por parte da mãe do menor, até o tribunal providenciar pelo restabelecimento dessas visitas, mas também o tempo que mediou entre o início do processo e o seu término ou, pelo menos, até o último facto alegado no segundo articulado superveniente.

    2. Daí que o prazo violado não começa em 01/06/2000, mas logo com o incumprimento da mãe que dá origem ao Apenso F e termina não em 02/08/2001 mas ainda continua.

    3. Por isso, o "quantum" indemnizatório tem necessariamente de reportar-se não só a todo o tempo em que o prazo razoável foi incumprido, como também, e sobretudo, às consequências da violação do prazo razoável e que constam a págs. 36 "in fine" e 37 do aresto recorrido ou seja, tal violação conferiu à mãe do menor o tempo necessário para efectuar uma eficaz "alienação parental" com a consequência do menor vir a recusar as visitas provisoriamente fixadas pelo tribunal.

    4. Houve violação dos arts.264°; 268° e 506° do CPC, pois foi mal interpretado o pedido da acção e suas consequências, bem como não se valoraram os articulados supervenientes.

    5. Verificou-se também erro na interpretação/ aplicação dos arts.494º/496º; 562°; 563° e 564° do Código Civil (CC).

    6. Quanto ao art.494º do CC, porque foi aplicado por remissão do art.496°n° 3 do CC, apenas se pode atentar aos seus critérios e não permitindo-se uma fixação da indemnização em montante inferior à dos danos causados, e tendo acontecido no caso "sub Júdice" que tais critérios não foram sequer ajuizados e valorados.

    7. A aplicação do art.496º do CC pressupõe (obriga) a que se avalizem os danos morais conforme o A. (ou o R. em reconvenção), os alegou e provou, conforme págs. 22 do aresto recorrido, o que não aconteceu.

    8. A gravidade a que se refere o art.496º do CC deve ser apreciada objectivamente, o que implica também que se avaliem todos os danos um a um em concreto.

    9. Não se verificou uma concatenação e conjugação dos arts.562º /563º do CC, que implica após avaliarem-se quais os danos (o que já fora feito anteriormente na 1ª instância), se lhes atribua um valor monetário.

    10. Valor este a fixar nos termos do art.564° do CC, o que não aconteceu.

    11. Bem como não se consideraram os danos futuros, oportunamente requeridos na p. i., pelo que se verifica nulidade nos termos do art.668°n° 1 d) do CPC.

    12. O "quantum" indemnizatório fixado é, assim, irrisório face aos danos causados pela violação do prazo razoável e anormal funcionamento da justiça.

    Contra-alegou a Digna Magistrada do Ministério Público, em representação do R., pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.

    O Tribunal da relação proferiu acórdão infirmando os vícios invocados pelo recorrente.

    Tudo visto, Cumpre decidir: B) Os Factos: São os seguintes os factos dados como provados pelas instâncias: 1- No processo n.º 9233 – B/1994, do 1º Juízo 1º Secção do Tribunal de Família de Lisboa, em 19/10/94, foi homologado o acordo de regulação de poder paternal, celebrado entre o autor e BB, relativa ao menor CC, pelo qual, em síntese: 1º - O menor fica confiado à guarda e cuidados da mãe que sobre ele exercerá o poder paternal; 5º - Nos três primeiros meses após homologação deste acordo o pai terá consigo o menor, uma vez por semana, das 18:00 horas às 20.00h, em todas as quartas feiras, sem prejuízo de ser fixado outro dia por acordo, … 6º - A partir do 4º mês, o menor ficará ao cuidado do pai uma vez por semana, no período das 12:00 horas de sábado até às 12:00 horas…, o pai poderá optar por fins de semana alternados, entre as 14:00 horas de sexta e as 14:00 horas de domingo devendo dar conhecimento antecipado à mãe… 7º- O menor passará a época de Natal com a mãe até aos 8 anos e a partir dessa idade, passará essa época alternadamente com a mãe e com o pai.

    8º- O menor passará a época da Páscoa – desde Sexta-feira Santa ao final do Domingo de Páscoa – alternadamente, com a mãe e com o pai, desde o início do acordo… 9º- O menor passará com cada um dos progenitores o período de férias laborais destes, no máximo anual de 30 dias… seguidos ou interpolados. Se houver coincidência de férias o período será dividido ao meio… 10º- O menor passará com cada um dos pais o dia de aniversário deste, e no dia do seu aniversário, almoçará com um e jantará com outro” (fls. 813 a 816). - (alínea A) dos Factos Assentes doravante FA) 2 - No apenso c) do processo referido (9233-C/94) em 18.12.95, foi alterado por acordo, o Regime de Regulação do Exercício do Poder Paternal, em termos da cláusula 6 do regime referido em A) supra, passou a ter a seguinte redacção: 6ª O pai terá consigo o menor dois fins-de-semana por mês, um deles entre as 16:30h de sexta-feira e as 16:30 horas de segunda-feira e, outro, entre as 16.30 de sexta-feira e as 16:30h de terça-feira”.

    Acordo homologado por sentença. (fls. 849 e 850) - (al. A1 dos FA) 3 - Por a mãe do menor não o ter entregue ao autor, no período de férias que se iniciou a 15.07.99, este requereu ao tribunal, 19.07.99, a “entrega judicial” do menor dando origem ao apenso E do processo 9233/94, que seguiu como incidente de incumprimento.

    Em consequência, por despacho de 20/07/99, ordenou o tribunal a notificação imediata da mãe para, no prazo de 24 horas, fazer a entrega do filho ao pai para gozo do período de férias. (fls.18) - (al. B) dos FA) 4 - Em 03/08/99, a mãe do menor, BB, deduziu alteração do regime de regulação do exercício do poder paternal fixada, alegando que o menor se havia recusado a ir passar férias com o pai e que o menor contou que o pai o obrigava a fazer brincadeiras com ele, de que não gostava, estando ambos nus, o pai obrigava-o a fazer de cavaleiro e ele de cavalo e fazia-o passar por debaixo das pernas, deitava-se em cima dele, imobilizando-o no chão, dormia com o pai, ambos nus e o pai manuseava o pénis apontando-o na sua direcção; que o menor demonstrava alteração de comportamento, mostrava sofrimento, desde que regressara das férias da Páscoa de 99, invocou risco para o menor e requereu se ordenasse a suspensão dos contactos do pai com o menor até se esclarecer os factos ocorridos. (fls. 20 a 30, 265 a 275). - (al. C) dos FA) 5 - Por despacho de 4.08.99, foi ordenada a realização de inquérito ao IRS sobre os factos alegados e a notificação do requerido, ora Autor, para alegar nos termos do art.º 182º, n.º 3, OTM (fls. 283). - (al. C1) dos FA) 6 - O ora Autor alegou, em 12/08/99, impugnando, no essencial os factos e invocou o carácter ignóbil e manipulador da requerente e a sua falta de escrúpulos e a sua anomalia psíquica e concluiu pelo indeferimento da pretensão da suspensão do regime de visitas e requereu a realização de exames periciais sobre o estado mental, social e moral das partes. (fls. 285 e seg.). - (al. C2 dos FA) 7 - Paralelamente, no apenso E do processo 9233/99 – referido em B supra – a mãe do menor respondeu, em 23.08.1999, remetendo no essencial para o requerimento referido em C), concluindo pela suspensão do regime de visitas ao pai. (fls. 114 a 118). - (al. D) dos FA).

    8 - Em 21/09/99, foi proferido despacho no apenso E), no qual, invocando que a situação de incumprimento do regime de regulação do poder paternal ai alegado estava directamente ligado com os fundamentos do pedido de alteração do regime do poder paternal deduzido no apenso F e, por isso, decidiu que os autos apensos E) – incumprimento invocado pelo pai em 19/07/99 – aguardassem a prolação de decisão naquele apenso F (da alteração do regime de R.P.P.) – fls. 121. - (al. E) dos FA) 9 - Em consequência, em 27/9/99, no apenso E), o ora Autor requereu que se mantivesse o regime de visitas estabelecido, invocando o tempo que irá demorar a decisão do apenso F, que inviabiliza que o menor e o ora Autor convivam, com as consequências e sequelas dai advenientes para ambos (fls. 122 e verso) - (al. F) dos FA) 10 - A este requerimento, foi proferido despacho no qual se decidiu “nada altera ao despacho de fls. 49 e v (referido em E) supra) aliás transitado em julgado”; despacho esse datado de...

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