Acórdão nº 01046/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do STA: B…, S.A. intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, contra o INSTITUTO para a CONSERVAÇÃO E EXPLORAÇÃO DA REDE RODOVIÁRIA acção declarativa pedindo a condenação deste no pagamento de 13.896,51 euros, acrescida de juros de mora vencidos (no montante de 3.443,29 euros) e vincendos até integral pagamento, a título de indemnização pelos danos sofridos pelo seu segurado C… em resultado do acidente ocorrido, no dia 18/10/99 no IP5, quando ele conduzindo o seu veículo no sentido Guarda - Viseu foi surpreendido pela gravilha que cobria a sua faixa de rodagem e pelo desnível desta sem que esses perigos estivessem sinalizados.

O Réu contestou para, por um lado, arguir a sua ilegitimidade visto o acidente ter ocorrido em local onde estava a ser executada uma empreitada a cargo de D…, S.A. e, nos termos do clausulado no respectivo contrato, era esta a responsável pelos danos causados a terceiros em consequência dessas obras e, por outro, para impugnar a factualidade articulada pela Autora contrapondo que a ocorrência do acidente se ficou a dever ao excesso de velocidade a que seguia o veículo segurado.

Requereu, por isso, a intervenção da identificada sociedade.

A arguição de ilegitimidade da Autora foi julgada improcedente mas a requerida intervenção foi admitida e, tendo a chamada sido citada, esta apresentou-se a contestar os factos alegados pela Autora e a sustentar que o acidente não resultou de culpa sua.

Realizado o julgamento a acção foi julgada procedente e o Réu condenado no pedido.

Inconformados, tanto o Réu como a D… recorreram para este Tribunal.

EP-Estradas de Portugal, E.P.E.

Que sucedeu ao IEP que, por sua vez, já havia sucedido ao ICERR.

rematou as suas alegações do seguinte modo: A. Ao abrigo da al.ª a) do art. 19.° do D.L. 522/85, de 31/12, a seguradora, ora Autora, teria direito à indemnização apenas e só na circunstância de o causador do acidente - alegadamente a ora Agravante - o tivesse provocado dolosamente.

B. Ora, a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, por acto ilícito, no domínio dos actos de gestão pública, rege-se pelo D.L. n.° 48 051, de 21 de Novembro de 1967, nomeadamente o número 1 do seu artigo 2°.

C. Ora, não pode deixar de entender-se que da norma ínsita no n.° 1 do artigo 493° do CC, resulta uma presunção de culpa, na sua forma menos grave de mera negligência - Ac. n.° 06A2847, do STJ, de 07 de Novembro de 2006.

D. Cabendo o ónus da prova do dolo a quem desse requisito carece, para ver reconhecido determinado direito, o que não ficou provado.

E. Logo, por não ter agido com dolo, como se verifica pelo exposto na matéria provada, deve a ora Agravante ser absolvida na presente acção, por não se encontrar preenchido o requisito constante do direito de indemnização da Agravada, presente na alínea a) do n.° 1 do art. 19 do D.L. 522/85, de 31/12.

F. Lê-se, na sentença da qual se recorre, que “nem o R., nem a Interveniente sinalizaram de modo conveniente e suficiente os factores de aumento de perigosidade na circulação rodoviária - obras, “gravilha” e desnível”.

G. Sucede que ficou provado, no ponto 24 dos Factos Provados, que, no momento do alegado acidente, “ocorriam obras de beneficiação do lanço entre Mangualde (km 103,000) e Celorico da Beira (km 147,000), cuja empreitada foi adjudicada à D…, S.A., sendo que o condutor se despistou ao km 136,100 (ponto 6 e seguintes dos Factos Provados).

H. Ficou ainda provado, no ponto 27, que estas obras “encontravam-se, habitualmente, sinalizadas com sinalização vertical, com os sinais de “obras na estrada”, “circule com precaução” e “mantenha-se atento”.

I. Considere-se, de momento, o disposto no número 1 do artigo 24° do Código da Estrada, que rege que “o condutor deve regular a sua velocidade de modo que, atendendo às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente” e ainda que “a condução de veículos é unta actividade perigosa pela sua própria natureza, os condutores estão obrigados a uni dever geral de prudência e de cuidado” (cfr. Ac. do STJ n.° 03A4191, de 03 de Fevereiro de 2004).

J. Ora, de acordo com a factualidade provada nos pontos 6 e seguintes, 24 e 27, conclui-se que o acidente ocorreu cerca de 11km antes do fim da zona de obras, zona essa cujo início se encontrava sinalizado! K. Não tendo a Agravante omitido o dever de sinalização, não agiu ilicitamente nem tão pouco violou o disposto no artigo 6° do D.L. 48 051.

L. Nunca poderia o Tribunal a quo condenar a Agravante na totalidade do pedido, porquanto o condutor faltou ao dever de cuidado que lhe advém do artigo 24° do Código da Estrada, no sentido de adequar a velocidade às características e estado da via, o que não foi feito pois (1) o inicio das obras estava efectivamente sinalizado, devendo o condutor moderar a velocidade e (2) é dever do condutor prestar atenção à estrada e suas condições, adoptando uma condição defensiva para evitar imprevistos.

M. Era, portanto, dever do condutor, reduzir a velocidade naquele troço, como podia e devia ter feito, de modo a evitar o acidente dos autos, na medida em que não ficou provado ter o mesmo sido surpreendido pela estrada coberta de gravilha.

N. Assim e, sempre existiria concorrência de culpa e concasualidade para produção dos danos, nos termos e para os efeitos do n.° 1, do artigo 570.° do Código Civil.

O. Pelo que não se compreende a total procedência do pedido, devendo a indemnização ser excluída ou, pelo menos, reduzida.

P. Ademais, leia-se o disposto no número 2 do artigo 570.°, no sentido de, “Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar”.

Q. Logo, verificada a concorrência da culpa do lesado na presente contenda e baseando-se a responsabilidade numa presunção de culpa, deve a ora Agravante ser absolvida do pedido.

R. Escreve-se, na sentença de que ora se recorre, que a Agravante “não cumpriu o seu dever de fiscalização e vigilância, sendo que não resta qualquer dúvida que agiu de modo censurável, porquanto os seus funcionários não usaram dos cuidados exigíveis em face das circunstâncias concretas”.

S. Face a esta alegada inobservância do dever de fiscalização e conservação que incumbe à R., sempre se haveria de atender à posição adoptada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, no seu Ac. n.° 01782, de 01 de Outubro de 2002, nos termos da qual “A Brisa (leia-se E.P., ora Agravante) deve assegurar a boa circulação nas auto-estradas, fazendo as reparações devidas, mantendo a vigilância permanente (em termos realistas) e, através de sinalização adequada, alertar os automobilistas de qualquer obstáculo que não possa ser prontamente removido ou eliminado. Porém, não é exigível à Brisa que a todas as horas e em todos os momentos proceda a uma integral inspecção - esquadrinhamento - da via.” (sublinhado nosso) T. Ora, é impossível às equipas de fiscalização da Agravante estar em todo o lado a todas as horas, dada a extensa rede rodoviária nacional sob a sua responsabilidade.

U. Ademais, o acidente ocorreu a uma 2.ª feira, ás 6.20h da manhã! V. Assim, a ora Agravante, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, não faltou ao seu dever de fiscalização, não sendo, consequentemente, devida qualquer quantia a título indemnizatório.

W. Ao encontro da factualidade, nomeadamente da descrita no ponto 24 dos Factos Provados, foi celebrado contrato de empreitada com a Interveniente Principal tendo ficado contratado que todos os prejuízos resultantes ao dono da obra e a terceiros da empreitada corriam por sua responsabilidade.

X. Ora, sendo a empreiteira parte principal nos autos, podia a mesma ter sido condenada no pedido formulado pela A., na medida em que “(...) em relação ao objecto da causa, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu, nos termos dos artigos 27° e 28°” - vide al.ª a) do art.º 320 do CPC, pois, ao abrigo do disposto no n.° 1 do art.º 328.° daquele diploma legal, “Se o chamado intervier no processo, a sentença apreciará o seu direito e constituirá caso julgado em relação a ele”.

Y. Ora, tendo em conta que a Interveniente Principal é plenamente responsável por todos os prejuízos que a obra causar a terceiros, não se percebe a razão pela qual não foi apreciada, na sentença recorrida, a culpa da Interveniente Principal nos termos do artigo 320º e 328° do Código de Processo Civil.

Por seu turno, a D…, S.A formulou as seguintes conclusões: I) A Agravante actuou de acordo com o que legalmente se impunha em termos de sinalização e de execução dos trabalhos, na qualidade de empreiteiro e obedecendo as ordens da fiscalização do Dono de Obra, Estradas de Portugal, E.P; II) Ficou provado no presente processo que esta obra se encontrava, sinalizada com sinalização vertical com os sinais de “obras na estrada”, “circule com precaução” e “mantenha-se atento”; III) No início da obra existiam dois painéis com distância aproximada de 50 m a indicar a habitualmente, em...

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