Acórdão nº 07122/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa que julgou improcedente o pedido de decretamento de providência cautelar de suspensão de eficácia do “acto administrativo emitido pelo Secretário de Estado do Ambiente em 29 de Agosto de 2008, no âmbito do qual reconhece a validade da Declaração de Impacte Ambiental (DIA) do projecto de Aproveitamento Hidroeléctrico do Baixo Sabor (AHBS) emitida a 15 de Junho de 2004 e determina a prorrogação da sua validade até à data de 15 de Junho de 2009”.

Em alegações são formuladas as seguintes conclusões:

  1. Da análise da sentença resulta que a fundamentação da sentença recorrida não é mais do que uma mera transcrição expressis verbis da fundamentação constante da sentença proferida no âmbito do processo n.° 1266/08.3BELSB.

  2. Tal facto é inadmissível, desde logo, porque a prova produzida em juízo e em que ambas as sentenças se basearam é distinta.

  3. Desde logo, no caso da sentença proferida no âmbito do processo n. 1266/08.3BELSB, a convicção do juiz baseou-se em prova produzida em sede de audiência de julgamento. O que não ocorreu no presente caso.

  4. Por outro lado, o aditamento ao RECAPE e a adenda ao aditamento ao RECAPE, nos quais a sentença proferida no âmbito do processo n.° 1266/08.3BELSB se baseou, não foram juntos aos presentes autos.

  5. Refira-se ainda que a sentença referente ao processo n.° 1266/08.3BELSB foi proferida a 23.01.2009, i.e. há praticamente dois anos, numa fase em que as obras relativas ao AHBS ainda estavam numa fase inicial.

  6. Por sua vez, a sentença proferida no âmbito do processo n.° …../08.3BELSB foi já objecto de recurso para o STA, o que significa que a questão de mérito - a verificação do periculum in mora - está ainda a ser objecto de discussão em juízo.

  7. Uma vez que estamos em face de uma fundamentação, mais do que lacónica, indiscutivelmente ilegal, porque, por um lado, não satisfaz os limites mínimos e de suficiência legalmente exigidos e, por outro lado, baseia-se em prova não produzida em juízo, em consonância com o disposto na alínea b), do n.° 1 do artigo 668.° do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.° do CPTA, deve a sentença recorrida ser considerada nula.

  8. À cautela, refira-se ainda que a decisão recorrida padece de omissão de pronúncia pelo facto de não ter apreciado, tal como a lei impõe, a segunda vertente do requisito do periculum in mora, i.e. a produção de prejuízos de difícil reparação, razão pela qual, nos termos do disposto na alínea d), do n.° 1 do artigo 668.° do Código de Processo Civil, ex w artigo 1.° do CPTA, deve a sentença recorrida ser considerada nula, por se tratar de uma questão essencial para dirimir o litígio que a ora Recorrente submeteu à sua apreciação.

    l) Por sua vez, o Tribunal a quo não podia ter dispensado a audição das testemunhas arroladas pela ora Recorrente, pois só se tivesse havido lugar à audição de testemunhas ficaria o Tribunal totalmente habilitado a proferir decisão relativamente à extensão e dimensão dos prejuízos de difícil reparação e a existência da situação de facto consumado.

  9. Efectivamente, ao impedir a Recorrente de fazer prova dos factos por si invocados, o Tribunal a quo não só violou o direito processual que a estas assiste, de proceder a essa mesma prova, como violou o próprio princípio do inquisitório.

  10. Estamos, assim, perante uma sentença infundamentada, por não ter levado a cabo os meios de prova requeridos pela Recorrente, tendo-se, ao invés, limitado a dispensá-los, sem qualquer fundamento válido, e sem que com isso estivesse a contribuir para a descoberta da verdade material da causa.

  11. A douta sentença ao decidir pela dispensa da produção de prova testemunhal arrolada pela Recorrente em sede de Requerimento Inicial viola o disposto no artigo 118.°, n.° 3, do CPTA. M) Da análise da prova produzida em juízo não é possível concluir que as medidas que constam da Adenda ao Aditamento ao RECAPE são as medidas adequadas e necessárias à protecção das espécies e habitats existentes no Baixo Sabor.

  12. O RECAPE apresentado em Outubro de 2006 foi chumbado pela Comissão de Avaliação de Impacte Ambiental (cfr. facto assente GG) previsto na douta sentença na página 16).

  13. Por sua vez, o Aditamento ao RECAPE em apresentado em Agosto de 2007, foi também considerado lacunoso, daí a necessidade de se apresentar uma Adenda ao Aditamento ao RECAPE, (cfr. facto assente II) previsto na douta sentença na página 17).

  14. Quanto à Adenda ao Aditamento ao RECAPE apresentada em Outubro de 2007, para além de a mesma continuar a ser considerada pela APA como lacunosa (pelo menos quanto a certas medidas de minimização), a verdade é que o mesmo não contempla as medidas adequadas de protecção das espécies e habitats protegidas pela Directivas Comunitárias (Habitats e Aves), sendo que muitas delas não têm qualquer aplicação na prática.

  15. Por conseguinte, tendo em conta que o aditamento e a adenda ao aditamento não prevêem as medidas necessárias à protecção dos interesses susceptíveis de ser grave e irreversivelmente afectados pela construção do AHBS, nomeadamente na sequência das exigências impostas pela Comissão Europeia e pelas entidades que fazem parte da CAIA, o periculum in mora é aqui manifesto.

  16. Por um lado, estamos perante uma situação clara de facto consumado, no sentido de que caso as obras avancem e se concluam, sem que haja (como não há) um pacote de medidas de compensação adequado, os interesses ambientais em jogo estarão já irremediavelmente prejudicados.

  17. Por outro lado, se é certo que parte dos impactes negativos podem vir a ser minimizados e compensados, certo é também que em relação a muitos deles os seus efeitos são permanentes e irreversíveis e insusceptíveis de serem replicados. São, pois, estes os prejuízos de difícil reparação.

  18. Quando está em causa matéria de natureza ambiental, para efeitos do cumprimento do princípio da precaução - princípio geral aplicável ao caso em apreço -, o Réu/Recorrido deve demonstrar que as medidas adoptadas de minimização, de compensação, e os planos de monitorização são os mais adequados a evitar a ocorrência de danos irreparáveis.

  19. Assim sendo, cabia à ora recorrida (e à EDP Produção) demonstrar, através de produção de prova, que as medidas que foram adoptadas de minimização e de compensação são adequadas a evitar a ocorrência de danos irreparáveis.

  20. Todavia, in casu, a Recorrida não produziu a prova necessária para demonstrar o cumprimento deste princípio.

  21. E a verdade é que o processo célere e sumário de produção de prova, próprio dos procedimentos cautelares, nada impede que as partes ou o Tribunal (ao abrigo do principio do inquisitório) lancem mão deste mecanismo se o mesmo for a única via possível de acautelar que situações de graves danos e factos consumados em matéria ambiental se verifiquem.

  22. Remeter a aferição da adequabilidade das medidas de compensação e minimização para a decisão a tomar no âmbito da acção principal compromete o seu efeito útil, uma vez que ainda que a mesma seja no sentido do reconhecimento da invalidade da DIA, as obras do AHBS estarão já num estado avançado e as lesões aos habitais e espécies protegidos terão já sido consumadas, sendo que muitas delas são irreversíveis e irreplicáveis.

  23. Assim sendo, o Tribunal a quo andou mal ao ignorar o princípio da precaução: na dúvida sobre a existência de uma situação de facto consumado e de prejuízos de difícil reparação, a sentença recorrida preferiu, pura e simplesmente, não decretar a providência requerida, esperando, depois, que em sede de acção principal (i.e. já numa altura em que tudo vai estar já destruído), fosse decidida a questão da existência ou inexistência de medidas adequadas à protecção da biodiversidade existente no Baixo Sabor.

  24. Face ao acima exposto, forçoso é concluir que a douta sentença, ao decidir pela não verificação do requisito periculum in mora, viola o disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 120.° do CPTA, incorrendo, nessa medida, num erro de julgamento, razão pela qual deverá ser a mesma anulada e o presente recurso ser julgado totalmente procedente.

    A Contra-Interessada EDP em contra-alegações com ampliação do âmbito do recurso a título subsidiário, formula as seguintes conclusões:

  25. A transcrição feita pela douta sentença recorrida dos fundamentos de direito da sentença proferida no processo n.° 1 266/08. 3BELSB, é perfeitamente admissível, tendo passado a ser fundamentação própria da sentença recorrida, dela fazendo parte integrante, ainda que por via da reprodução dos fundamentos adoptados numa outra sentença.

  26. Para além de admissível, tal remissão é desejável, a fim de se evitar contradição entre decisões que têm subjacente a mesma questão fundamental e a mesma matéria de facto.

  27. Pouco releva que a prova concretamente produzida em ambos os processos seja distinta — muito ligeiramente, atente-se —, porquanto a prova produzida no presente processo permite sufragar plenamente a fundamentação que, por transcrição, adoptou, bem como a decisão a que chegou. .

  28. Sendo verdade que o RECAPE, o Aditamento e a Adenda ao Aditamento não foram juntos ao presente processo, isso não interfere com a validade da sentença recorrida, na medida em que o que foi determinante para o Tribunal a quo considerar não verificado o requisito do periculum in mora foi, não propriamente o teor do RECAPE, do Aditamento e da Adenda ao Aditamento, mas antes a apreciação que deles fizeram as autoridades competentes para o efeito — a saber, o ICNB e a APA -, apreciação essa plasmada nos pareceres favoráveis juntos à oposição da ora Recorrida como docs. n.°s 9 e 10.

  29. A decisão recorrida não padece de falta de fundamentação, nos termos do artigo 668.°, n.° 1, alínea b), do CPC, não só por ser admissível - e mesmo desejável in casu - a transcrição dos fundamentos de uma outra decisão, como porque se baseou em prova documental produzida em juízo, improcedendo, assim, as conclusões A) a G)...

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