Acórdão nº 01438/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelADÉRITO SANTOS
Data da Resolução20 de Janeiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

O Município da Batalha recorre para este Tribunal Pleno do acórdão da 1ª Secção, 10.9.09, que, concedendo provimento ao recurso contencioso interposto por A… e Outros, todos melhor identificados nos autos, anulou o despacho do Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, de 11.4.03, que indeferiu o pedido de reversão da parcela de terreno identificada com o nº 14 da declaração de Utilidade Pública, de 18.3.80, do Ministro da Habitação e Obras Públicas.

Apresentou alegação, a fls. 805/828, dos autos, com as seguintes conclusões: 1ª Da análise dos factos dados como assentes e da motivação de facto, ou mais propriamente da sua falta, presente na resposta às questões suscitadas pelo Município na sua contestação, não podemos deixar de concluir que o tribunal a quo fez tábua rasa dos documentos juntos pelo contra-interessado em requerimento apresentado em 11 de Junho de 2008, não invocando quaisquer razões para os não levar em consideração.

  1. Analisando a fundamentação das respostas as questões jurídicas colocadas pelo município na sua Contestação verificamos que o Tribunal a quo se limita a aventar, sem qualquer justificação, que o Município "não conseguiu provar", isto é, sem fazer referenda ao "porque" de considerar que a prova documental junta pelo Contra-interessado não serve para fundamentar as pretensões do Beneficiário da Expropriação ou mesmo porque é que a prova documental que considerou assente serve para fundamentar as respostas negativas as questões levantadas pelo Município.

  2. No que concerne a questão da caducidade do direito de reversão, o tribunal a quo nem sequer se pronunciou sobre a data a partir do qual se deveria considerar que os Recorrentes tiveram conhecimento do desvio ao fim expropriativo estabelecido na Declaração de Utilidade Pública, denominando-a de "irrelevante" e consequentemente não considerou provado, com base no documento junto com o n.º 12 e que se transcreve supra, que tal conhecimento se fixa nos idos de Novembro de 1989.

  3. Ora, como melhor se explanará infra, o conhecimento de tal questão e um tomar de posição sobre o aludido documento é tudo menos irrelevante.

  4. É sabido que, o âmbito dos poderes de Cognição do Pleno, quando decide em segundo grau de jurisdição, cinge-se a matéria de direito (art. 21º n.º 3, do ETAF), salvo os casos excepcionais previstos no art. 722° do CPC, aplicável ex vi art. 1° da LPTA.

  5. Se é verdade que no recurso contencioso de anulação, nos termos do disposto no art. 12° da LPTA, salvo as situações excepcionais aí referidas, só é admissível a prova documental, também o não é menos que o tribunal a quo não procedeu a uma análise crítica das provas documentais apresentadas, limitando-se a enunciar os factos que considerou provados e a especificar alguns factos que não considerou provados, sem, no entanto, enunciar quais os fundamentos decisivos para formar a sua convicção de considerar uns como não provados e outros como provados, isto é, sem fundamentar porque e que determinados documentos foram valorados e outros não mereceram qualquer valoração. 7ª Neste conspecto, deverá o acórdão que ora se recorre ser considerado nulo por não especificar os fundamentos de facto que fundamentam a decisão e por não ser ter pronunciado sobre questões que devesse apreciar, nos termos do disposto no art. 772° n.º 1 al. c) e 668° n. ° 1 al. b) e d) do CPTA aplicável ex vi art. 1º da LPTA.

  6. O prazo de dois anos para exercer o direito de reversão previsto no n.º 6 do artigo 5º do Código das Expropriações de 1991, nas situações em que o bem tenha sido utilizado, em momento anterior à entrada em vigor daquele Código, para um fim diferente do que justificou a expropriação, conta-se a partir de 7 de Fevereiro de 1992 e não de 7 de Fevereiro de 1994.

  7. Nestes casos, precisamente porque já houve uma actuação com desvio ao fim do beneficiário da expropriação, não tem de se esperar pelo decurso dos dois anos a que se refere o n.º 1 do artigo 5.º, o qual vale exclusivamente para as situações de inércia.

  8. Contando-se o prazo de dois anos referido no n.º 6 do artigo 5.º do facto que originou a reversão, o qual é, nesta situação, a data da entrada em vigor do Código de 1991 que passou a prever este direito, os expropriados apenas podiam exercer esse direito ate 7 de Fevereiro de 1994; 11ª Motivo pelo qual esse direito já tinha caducado em 14 de Fevereiro de 1994, data em que vieram exercer aquele direito apresentando o respectivo pedido.

  9. O prazo de dois anos constante do n.º 1 do artigo 5.º não é um prazo dado ao beneficiário da expropriação para poder utilizar o bem para o fim que justificou a expropriação, ainda que o tenha utilizado o bem para um fim diferente.

  10. Uma tese como esta daria ao beneficiário da expropriação a possibilidade de, dentro do referido prazo de dois anos, utilizar livremente o bem expropriado, não se colocando qualquer entrave a esta possibilidade desde que, até ao limite do referido prazo, o bem viesse a ser afecto ao fim constante da declaração de utilidade pública.

  11. Uma tese como esta colocaria em causa a garantia constitucional da propriedade privada a qual apenas pode legitimamente ser afectada em nome do fim de utilidade pública que justifica a expropriação; por isso, o bem expropriado apenas pode ser utilizado para esse fim e não para qualquer outro, ainda que durante um lapso temporal limitado.

  12. Ao assim não considerar o tribunal a quo operou em erro de julgamento ao ter erroneamente interpretado e aplicado ao caso sub judice o disposto no art. 5º do Código das Expropriações de 91.

  13. Analisando o documento n.º 2 junto com a p.i., verifica-se que o fim previsto na DUP foi a implantação da célula B.

  14. Esta operação urbanística, promovida pela CMB, envolvia, desde a primeira hora, a aquisição de terrenos aos seus proprietários, par via negocial ou expropriativa, o seu loteamento, a sua urbanização e alienação parcial.

  15. A implantação da Célula B, para usar a expressão prevista na DUP exigia a CMB fazer todas as infra-estruturas da zona (rede de saneamento, rede de águas, rede de electricidade, arruamentos, estacionamentos, zonas verdes e espaços públicos, incluindo pragas e passeios), reservando para si alguns lotes – mormente os afectos a "Centro Cívico" e alienando os demais.

  16. Não houve, pois, qualquer desvio de fim por parte da CMB ao alienar lotes: nos termos da DUP os terrenos a expropriar eram para a implantação da Célula B e foram-no efectivamente. A Célula B continua implantado no local – vide neste sentido acórdão da 2° Subsecção do CA deste STA, de 23-11-99, Processo n.º 037869, em que foi Relator o Sr. Juiz Conselheiro Adelino Lopes.

  17. Nos termos do disposto no art. 2° n.º 1 da Lei dos Solos, sempre que for julgado necessário pela Administração podem por esta ser apropriados solos destinados a criação de aglomerados urbanos.

  18. Nos termos do disposto no art. 62° n.º 1 da Lei dos Solos, “para efeitos deste diploma, entende-se por aglomerado urbano o núcleo de edificações autorizadas e respectiva área envolvente, possuindo vias públicas pavimentadas e que seja servido por rede de abastecimento domiciliário de água e de drenagem de esgoto, sendo o seu perímetro definido pelos pontos distanciados 50m das vias públicas onde terminam aquelas infra-estruturas”.

  19. Destarte, atendendo a que o local onde foi implantada a Célula B era constituído por terrenos agrícolas que distavam bem mais de 50 m de vias públicas infra-estruturadas, ao executar a DUP sub iudicio, a CMB apropriou-se de solos destinados a criação de um aglomerado urbano.

  20. Aplica-se igualmente no caso presente o disposto no art. 30 n.º 1 do Decreto-Lei n.º 794/76, segundo o qual as realizações previstas no artigo anterior são planeadas, decididas e concretizadas pela Administração, através dos órgãos centrais e locais.

  21. Bem como o plasmado no n.º 2 alíneas b) e c) daquele normativo legal, que estabelece que “A Administração pode, porém, recorrer a colaboração de outras entidades, nomeadamente de particulares: cedendo-lhes terrenos ou direitos sobre eles para a execução de empreendimentos compreendidos em planos por ela aprovados; confiando-lhes a realização, sem encargos para a Administração ou com a sua participação, de obras de urbanização projectadas para terrenos já adquiridos e a construção, para venda ou arrendamento, dos edifícios a erigir na área.

  22. Também o art. 4° n.º 1 do Lei dos Solos estabelece que, a Administração procederá a aquisição das áreas necessários, para os fins previstos no artigo 2°, pelos meios que se tomem mais adequados, designadamente, por expropriação ou pelo exercício do direito de preferência.

  23. Podendo ser autorizada a cedência de terrenos a cedência dos terrenos em propriedade plena, a entidades de direito privado, desde que aqueles se integrem em áreas abrangidas por pianos de urbanização legalmente aprovados (cf. art. 5° n.º 2 do Decreto-Lei n.º 794/76).

  24. Neste conspecto, a expropriação foi feita com fundamento em utilidade pública (para colmatar as enormes carências da vila da Batalha no que concerne a terrenos destinados a construção, infra-estruturas e equipamentos públicos, comerciais e de serviços e para prosseguir uma requalificação digna e com qualidade na zona envolvente ao Mosteiro de Santa Maria da Vitória, entretanto declarado pela Unesco Património da Humanidade) e a venda dos lotes para construção que resultaram de tal procedimento expropriativo está compreendida nas atribuições quer da entidade expropriante, quer da beneficiária da expropriação, pelo que não se verificam os pressupostos de que depende a reversão invocada.

  25. Sabiam os Recorrentes que os lotes que excedessem o Centro Cívico se destinavam à venda, sabendo outrossim conforme supra exposto que havia entre esses lotes, alguns destinados a habitação colectiva com inclusão de comércio e serviços.

  26. Pelo que, vir exigir o direito de reversão...

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