Acórdão nº 04057/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelEUGÉNIO SEQUEIRA
Data da Resolução11 de Janeiro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.

  1. A Exma Representante da Fazenda Pública (RFP), dizendo-se inconformada com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou procedente a oposição à execução fiscal deduzida por A..., veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: a) A douta sentença ora recorrida enferma dos omissão de pronúncia sobre algumas questões suscitadas nos autos, designadamente quanto à gerência de facto da recorrida e violação do princípio da oficialidade e do inquisitório, plasmado no mo 13° do CPPT, tendo sido igualmente desrespeitado o princípio da descoberta da verdade material, por incorrecta apreciação da prova produzida nos autos e incorrecta apreciação da causa de pedir.

    1. As dívidas ora revertidas dizem respeito a IVA e IRC, dos anos atrás identificados, pelo que, em bom rigor, o regime aplicável ao IVA de 1998 é o constante do mo 13° do CPT, que continha ínsita uma presunção de culpa do gerente.

    2. Por outro lado, e após notificação para o exercício do direito de audição, nos termos do mo 60° da LGT, a oponente não invocou a sua ilegitimidade, quer pelo não exercício da gerência de facto, quer pela renúncia à gerência da sociedade, que teria efectuado por carta manuscrita, datada de 31.12.1997 (com registo comercial efectuado em 19.12.2008,já com a presente oposição a correr termos em tribunal).

    3. Da prova documental junta aos autos crê a Fazenda Pública ter feito prova cabal da gerência de facto, infirmando a douta sentença recorrida, uma vez que: - Desde a data - 18.04.1989- em que foi feito o registo do contrato de sociedade é indicada como sendo uma das sócias gerentes a ora oponente; - Encontra-se junto aos autos um aviso de recepção assinado pela ora oponente, concernente à notificação de uma liquidação de IVA, referente ao ano de 1999 (um dos exercícios cujas dívidas ora se revertem), indicando que a correspondência era por esta recebida, responsabilizando e vinculando a sociedade ao respectivo conteúdo.

      - As declarações de rendimentos modelo 22 - IRC eram também por estas assinadas na qualidade de legal representante, mais uma vez, vinculando a sociedade aos elementos declarados, que se presumem verdadeiros e de boa fé, nos termos do artº 75° da LGT, inclusivamente, a assunção da qualidade de legal representante, por quem assina a declaração.

    4. A ora oponente estava presente e tinha uma intervenção directa nos destinos da sociedade, adoptando um comportamento omissivo conducente ao nascimento de dívidas de natureza tributária.

    5. A prova testemunhal, arrolada pela oponente, não foi produzida, uma vez que o mandatário da oponente prescindiu de um dos depoimentos e não logrou fornecer identificação cabal à notificação da outra testemunha. Esta testemunha, foi indicada, em 23.04.2009, por alteração ao Rol de Testemunhas, admitido por despacho, de 30.04.2009, da Mmª Juíz "a quo". Considerando que a aludida testemunha aparece indicada como "Dr. B..., a notificar na C...Lda, Sabugal" foi ouvida no âmbito de outros processos de oposição (nomeadamente, nos processos 88/07.3 e 89/07.1, no dia 05.05.2009), deduzidos pelo filho da ora oponente, F... D...D..., pelo que, cabia à oponente a sua apresentação, em audiência contraditória - não observância do princípio do contraditório.

    6. A sentença padece, ainda, de uma incorrecta apreciação da causa de pedir e de um eventual excesso de pronúncia, nos termos do artº 668°, n° 1 d) do CPC, considerando que: - A oponente nunca arguiu a renúncia formal à gerência da sociedade Construções D...& D...Lda, a não ser já no decurso do processo. Isto é: - A oposição é deduzida em 15.01.2007; - A carta de renúncia à gerência está datada de 31.12.1997; - Esta só é apresentada, em juízo, em 26.01.2009; - Nunca a oponente refere este facto na douta petição inicial, maxime nos seus nºs 23 a 25.

    7. A renúncia à gerência, por carta dirigida à sociedade em 31.12.1997, da sua autoria, era, necessariamente, do seu conhecimento pessoal e directo, pelo que não é facto superveniente, devendo e podendo tal circunstância ser invocada na petição inicial da presente oposição.

    8. A ora recorrida/oponente nunca se furtou à prática de actos que vinculassem a sociedade, perante terceiros (assinatura da correspondência remetida por entidades oficiais, v.g. DGCI e assumindo-se na qualidade de representante legal, nas declarações de rendimentos apresentadas à Administração Fiscal) indícios da efectiva gerência societária.

    9. Por outro lado, a renúncia formal ao cargo de gerente aD...s tem reflexos na titularidade de direito, nada relevando para o exercício de facto dessas mesmas funções.

    10. Verifica-se, pois, que o facto jurídico da renúncia à gerência não constituiu a causa de pedir da presente oposição. O que a oponente, alega, outrossim, é aD...s o não exercício da gerência de facto e a ausência de culpa na dissipação do património - violação do princípio do dispositivo.

    11. A douta sentença ora recorrida não apreciou as questões da validade do documento, suscitadas pela RFP, na resposta, de 04.02.2009, ao requerimento junto pela oponente e nas suas alegações escritas, designadamente no que toca à questão de tal renúncia à gerência não ser oponível ao órgão da execução fiscal (comunicação dirigida à sociedade, recebida pelo sócio Agostinho, marido da oponente e inexistência de uma acta da sociedade a aprovar a renúncia) - omissão de pronúncia e violação do inquisitório e da oficialidade.

    12. A douta sentença também não apreciou a questão da culpa, designadamente, na vertente apresentada pela Fazenda Pública, isto é, em todas estas situações existe um montante que é afecto ou que deve ser afecto ao pagamento de uma determinada dívida tributária, já que existem valores que efectivamente entraram na sociedade ou que deixaram de sair dessa sociedade, desse modo possibilitando a liquidação dos respectivos tributos. Nestes casos, muito embora a actuação típica de qualquer gestor seja a de utilizar aqueles fundos para fazer face a outras despesas até à data de liquidação ou entrega, parece-nos que esta utilização, que coincidirá com uma necessária diminuição do património será censurável. Desta forma, se esses tributos não forem posteriormente pagos por insuficiência do património social para lhes fazer face, não nos parecem restar dúvidas da existência de culpa por parte do gestor que, anteriormente à data da liquidação ou entrega, dissipou aqueles fundos. Nos casos de afectação das quantias ao pagamento de certos tributos, os deveres de cuidado exigíveis ao gestor relativamente à manutenção das mesmas são muito mais rigorosos.

      Pelo que, com o mais que Vossas Excelências se dignarão suprir, não deve ser dado provimento ao recurso (SIC) e, em consequência, deve ser mantida a decisão recorrida, devendo, ainda, a execução fiscal prosseguir contra a ora recorrida, só assim se fazendo inteira JUSTIÇA Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito suspensivo.

      A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por a sentença recorrida não ter conhecido de questões de que não devesse conhecer e a renúncia à gerência dever ser tomada em conta, como na mesma se fundamentou.

      Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.

      B. A fundamentação.

  2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a conhecer: Se a sentença recorrida padece do vício formal de excesso de pronúncia conducente à declaração da sua nulidade; E padecendo, e declarada nula a mesma sentença, e conhecendo este Tribunal em substituição, se os imputados vícios relativos à nulidade do processo de execução fiscal, a falta de título executivo e os vícios da citação que invoca, constituem fundamentos válidos da oposição à execução fiscal; Se o despacho de reversão padece do vício formal de falta de fundamentação; Se não foi por culpa da opoente que o património da sociedade se tornou insuficiente para solver tais dívidas; Se ocorreu a falta de notificação da liquidação das dívidas em causa; E se a oponente nunca exerceu as correspondentes funções de gerente na sociedade executada.

  3. A matéria de facto.

    Em sede de probatório a M. Juiz fixou a seguinte factualidade, a qual se passa a subordinar às seguintes alíneas:

    1. Em 18/04/1989 foi constituída a sociedade "Construções D...e D..., Lda” a qual tinha como objecto a prestação de serviços de construção civil e obras públicas com sede na Aldeia de Santo António, no concelho de Sabugal.

    2. A mencionada sociedade comercial foi constituída por E..., A...e F... D...D..., respectivamente marido, mulher e filho, tendo o primeiro uma quota representativa de 50% e os dois restantes 25% cada um.

    3. A gerência da Sociedade ficou, aquando da sua constituição, a cargo de todos os sócios.

    4. Em 28/02/2002 foi instaurado o processo de execução fiscal n° 1260021000110...

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