Acórdão nº 736/08.8TBCTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelEMÍDIO COSTA
Data da Resolução30 de Novembro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTS.522-B, 685 Nº7, 712 Nº1 CPC, 1207, 1208, 1211 CC Sumário: 1 - Pode ocorrer a gravação das audiências finais, para além dos casos especialmente previstos na lei, por iniciativa de alguma das partes ou do próprio tribunal.

2 - Tendo-se procedido à gravação da audiência, sem que nenhuma das partes tivesse requerido essa gravação e sem que o tribunal a tivesse ordenado de forma expressa, as partes podem impugnar a decisão da matéria de facto, socorrendo-se da efectuada gravação.

3 - A efectuada gravação não é nula, já que se traduz num acto que a lei admite, mesmo por iniciativa do tribunal, e cuja prática não prejudica nenhuma das partes.

4 - Entre nós vigora o princípio da livre apreciação da prova e o juiz responde aos quesitos segundo a convicção que formar acerca de cada facto quesitado.

5 - A Relação só deve fazer uso dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto quando exista flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos da matéria de facto impugnada.

6 - No âmbito do contrato de empreitada, de entre os deveres que cabem ao dono da obra, situa-se aquele que constitui a sua principal obrigação – o de prestar o preço acordado, constituindo este dever um dos elementos integrantes da noção legal de empreitada – art.º 1211º, nº2, do C. Civil).

7 - Sobre o dono da obra recai a obrigação de pagar o preço referente a trabalhos realizados a mais pelo empreiteiro, a pedido e no interesse daquele.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: RELATÓRIO J (…), S.A., intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Castelo Branco, a presente acção com processo ordinário contra: - S (…), L.da, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 47.663,76, acrescida de juros de mora vencidos, que, à data da propositura da acção, se contabilizaram em € 1.473,09 e, ainda, nos vincendos, desde a data da propositura da acção e até integral pagamento.

Alegou, para tanto, em resumo, que, no exercício da sua actividade de construção civil, celebrou com a Ré um contrato de empreitada denominado X..., sendo que, por via da execução dos respectivos trabalhos, a Ré ainda deve à Autora a quantia de € 48.590,18; de acordo com o contrato de empreitada, deve ser retido o valor correspondente a 5% da factura, a título de garantia de boa execução, pelo que, por ora, apenas é exigível da Ré o pagamento da importância de € 46.160,67, quantia que deveria ter sido paga nos 30 dias seguintes à data emissão da factura, no escritório e sede da Autora.

Contestou a Ré, alegando, também em resumo, que é verdade ter celebrado um contrato de empreitada com a Autora, mas que foi surpreendida pelo envio da factura que esta diz não ter sido paga; que teve lugar uma reunião de obra onde ficou acordado que o auto de medição seria o último auto da empreitada, sendo que a factura antes referida não se refere aos trabalhos a que se reporta tal auto de medição n° 13.

Na réplica, a Autora defendeu que o auto de medição n° 13 se referia apenas a trabalhos inicialmente contratados e não aos trabalhos extra, efectuados a pedido da Ré, no seu interesse; certo é que ficou acordado que o auto de medição n° 13 seria o último mas o último reportando-se a trabalhos inicialmente contratados, sendo que a factura que ora se pretende cobrar se refere a trabalhos efectuados a pedido da Ré e não constantes do contrato de empreitada.

Proferiu-se o despacho saneador, consignaram-se os factos tidos como assentes e organizou-se a base instrutória, de que reclamou, ao invés do que se afirma na sentença, a Ré (fls. 94 e 95), mas sem êxito.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, finda a qual se respondeu à matéria da base instrutória, sem reclamações.

Finalmente, verteu-se nos autos sentença que, julgando a acção totalmente procedente, condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 46.160,67, acrescida de juros de mora, à taxa legal.

Inconformada com o assim decidido, interpôs a Ré recurso para este Tribunal, o qual foi admitido como de apelação e efeito meramente devolutivo.

Alegou, oportunamente, a apelante, a qual finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1ª – “O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida nos autos, em 22.04.2010, que julgou ... a acção procedente e provada ..., decidindo por isso, a) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 46.160,67 €, acrescida de juros de mora ...; 2ª - Decisão, com a qual a Recorrente não pode conformar-se, uma vez que, a discussão da matéria dos autos ficou circunscrita à emissão de uma factura em 17.12.2007, no valor de 48.590,18 € e ao facto de a mesma não ter sido paga, não tendo o Tribunal, apesar do alegado pela Recorrente, averiguado, como lhe competia, todos os aspectos da causa; 3ª - De facto, impunha-se que o Tribunal se debruçasse e se pronunciasse sobre todas as questões e sobre toda a prova produzida em audiência de julgamento, pois, certamente, ter-se-ia a uma decisão bem diferente; 4ª - Por essa razão, o presente recurso versa também sobre a impugnação da matéria de facto; 5ª - Com efeito, da prova produzida e gravada resulta suficientemente demonstrado que os presentes autos não se cingem à simples emissão de uma factura e ao seu não pagamento no prazo de vencimento; 6ª - Na perspectiva vista na decisão em recurso, teria sido desnecessário proceder a julgamento na medida em que, a Recorrente admitiu em sede de contestação que efectivamente não liquidou a factura dos autos; 7ª - Ora, são as testemunhas da Autora / Recorrida, (…) - respectivamente, engenheiro responsável pela obra e encarregado da obra, - quem admite perante o Tribunal que todas as facturas tinham subjacente um auto de medição previamente aprovado pelo Dono de Obra e que só após aprovação tinha lugar a emissão da factura; 8ª - Sendo os autos de medição a causa da emissão das facturas, tal como melhor consta da cláusula nona do contrato de empreitada junto aos autos; 9ª - Donde, as facturas referentes a esta empreitada, não sendo a factura emitida em 17 de Dezembro de 2007 excepção, tinham sempre subjacente um auto de medição previamente aprovado pelo Dono de Obra, sendo por isso relevante para a decisão, averiguar se o auto subjacente à referida factura, tinha ou não sido previamente aprovado pelo Dono de Obra, a aqui Recorrente (…); 10ª - Tal resulta ainda do depoimento das testemunhas da Recorrida, supra transcrito e para o qual se remete; 11ª - Resultando ainda desse mesmo depoimento que o referido auto n.º 14 não foi aprovado pelo Dono de Obra e, nessas condições, face ao contratado, não poderia ser emitida qualquer factura; 12ª - Ora, competia à Recorrida o ónus de provar que a emissão da factura cujo pagamento reclamou tinha subjacente um auto de medição aprovado pelo dono de obra, o que, salvo outra opinião, não cumpriu; 13ª - Aliás, as testemunhas da Recorrida, nomeadamente o Eng. (…), cujo depoimento se encontra gravado em suporte áudio, com início às 15h20 e termo às 15h39 que, como resulta da transcrição acima, para a qual se remete assumiu claramente que este auto é discutido, o que apenas pode significar, não foi aprovado; 14ª - Aliás, no mesmo sentido, veja-se o depoimento da testemunha (…)com depoimento gravado em suporte áudio com início às 14h38 e termo às 14h50, como resulta da transcrição acima, para a qual se remete, quando questionado sobre a aprovação do auto se limitou a declarar que não sabia; 15ª - Pugna assim a Recorrente pela alteração da resposta ao artigo 2.º, da Base Instrutória que, ao invés de 2.º: Provado que tal quantia devia ter sido paga pela ré nos 30 dias seguintes à data de emissão da factura, atenta a factualidade apurada, deveria ser, Provado que tal quantia devia ser paga pela ré nos 30 dias seguintes à data da emissão da factura, desde que o auto subjacente à mesma tivesse sido aprovado pelo dono de obra, o que, neste caso não aconteceu; 16ª - Entende assim a Recorrente, verificam-se no caso presente razões e fundamentos suficientes para, face à prova gravada, ao abrigo do art. 712.º, do CPC, haver lugar à reapreciação da prova e consequentemente à alteração da resposta dada ao artigo 2.º da Base...

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