Acórdão nº 2732/07.3TBFLG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Dezembro de 2010

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução16 de Dezembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. Cabe ao destinatário da cláusula que se quer ver excluída do contrato celebrado o ónus de invocar a falta ou a deficiência da respectiva comunicação.

  1. A negligência grosseira ou a culpa grave corresponde a uma conduta altamente reprovável à luz do mais elementar senso comum.

  2. O atravessamento de uma auto-estrada, por um peão, integra, em princípio, o conceito de negligência grave ou de acto temerário.

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA, BB, casada com CC, DD, casado com EE e FF, casada com GG, na qualidade de herdeiros de HH, vieram intentar acção, com processo ordinário, contra II, COMPANHIA DE SEGUROS, S. A., pedindo a condenação desta a pagar-lhes a quantia global de € 54 136,36, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação até integral liquidação.

Alegando, para tanto, e em suma: HH, marido e pai dos autores, celebrou com a ré, em 11/10/2002, um contrato de seguro de acidentes pessoais, de que os autores são os beneficiários em caso de morte.

O referido HH faleceu em 10/11/2004, vítima de acidente de viação, por atropelamento negligente, causado por veículo pesado.

A ré escusa-se a pagar a respectiva indemnização, invocando que o acidente em causa se enquadra na previsão de exclusão constante no art. 5.º, 1.2 das Condições Gerais, o que os autores não aceitam.

Mais alegam o pagamento de despesas com o repatriamento da vítima e com o seu funeral, também cobertas pelo aludido seguro.

Citada a ré, veio a mesma contestar, alegando, também em síntese: O acidente de viação em questão ficou a dever-se a conduta temerária da vítima, estando, assim, excluído da cobertura da apólice em causa (art. 5.º, nº 1.2 das Condições Gerais).

Impugna, ainda, as invocadas despesas.

Foi elaborado o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 232 a 233 consta.

Foi proferida a sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a ré do pedido.

Inconformados, vieram os autores interpor, sem êxito, recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães.

De novo irresignada, veio a autora AA pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - O Acórdão recorrido violou a lei substantiva aplicável ao caso sub judice, existindo fundamento de recurso de revista nos termos do art. 722.º, n.º 1 alínea a) do Código de Processo Civil.

  1. - A decisão de absolvição da Ré do pedido teve como fundamento a existência de uma cláusula de exclusão no contrato de seguro em vigor na data em que ocorreu o sinistro.

  2. - Estando nós perante um contrato em que se recorreu ao uso de cláusulas contratuais gerais e ao qual se aplica o regime jurídico instituído pelo DL 446/85 de 25 de Outubro e sucessivamente alterado pelos DL 220/95 e DL 249/99.

  3. - A Ré ao invocar a cláusula de exclusão para limitar a sua responsabilidade tinha de alegar e provar o seu conhecimento completo e efectivo por parte do tomador do seguro.

  4. - No caso sub judice a Ré não alegou, apesar de ter invocado a cláusula de exclusão para se eximir ao pagamento das garantias da apólice aos herdeiros do malogrado HH, nem provou que tenha comunicado e explicado o teor da cláusula invocada ao tomador de seguro, pelo que a mesma é nula nos termos do art. 8° aI. a) do DL 446/85 de 25 de Outubro.

  5. - A nulidade, nos termos do art. 286.º do Código Civil, pode ser invocada a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal.

  6. - O Acórdão do Tribunal a quo fez o entendimento de que a Relação não podia conhecer a questão da nulidade da cláusula de exclusão inserida nas condições gerais da apólice pelo facto de a questão não ter sido suscitada pelos autores na primeira instância.

  7. - A questão pode efectivamente ser apreciada em sede de recurso, apesar de ser questão nova, porque não foi alegada nem apreciada na primeira instância, todavia ser de conhecimento oficioso.

  8. - O ónus da alegação bem como a respectiva prova da comunicação e dever de informação da cláusula de exclusão ao tomador do seguro, cabia à Ré seguradora que fez uso das cláusulas contratuais gerais, e nesse sentido fazer prevalecer-se do comando vertido na respectiva cláusula de exclusão. Ora, a Ré não alegou em momento algum que tenha comunicado ao falecido HH a cláusula de exclusão para se eximir ao pagamento das garantias da apólice. Não tendo alegado, outrossim, não fez prova como que lhe competia, do dever de comunicação a que estava obrigada, 10ª- O Acórdão do Tribunal a quo fez errada apreciação quanto à questão da alegação do dever de comunicação das cláusulas contratuais gerais, mormente, da cláusula de exclusão art. 5°, 1. 2. inserida nas condições gerais da apólice. Transferiu o ónus da alegação e respectiva prova para os Autores, quando resulta do art. 5° nº 3 do DL 220/95 de 31 de Agosto que tal tarefa cabia à Ré enquanto contratante que submeteu a outrem, in casu, ao tomador do seguro HH, as cláusulas contratuais gerais.

  9. - A escusa no pagamento das garantias da apólice, por parte da Ré, por recurso a uma cláusula de exclusão deveria ter sido acompanhada da respectiva alegação e prova da comunicação da mesma ao tomador do seguro. Ora, nada disso tendo resultado dos autos, a respectiva cominação será a exclusão da norma em apreço do contrato singular nos termos do art. 80º al b) do supra referido DL 220/95.

    12° Teria pois a Ré, no que ao presente caso diz respeito, ter alegado e provado que deu efectiva comunicação e informação da cláusula inserta no art. 5°, 1. 2., das Condições Gerais da Apólice e só nessa medida lograr prevalecer-se da cláusula de exclusão.

  10. - Ora, a nulidade de cláusulas contratuais é do conhecimento oficioso, nos termos do art. 286° do Cód. Civil. O Acórdão do Tribunal a quo deveria ter decidido pela exclusão da cláusula em questão do contrato singular atenta a inobservância da alegação e prova de que a mesma foi comunicada ao falecido HH por parte da Ré seguradora. Assim sendo deverá a referida cláusula de exclusão ser declarada nula, excluída do contrato singular.

  11. - Entendeu o Acórdão do Tribunal a quo que tendo a Ré invocado a exclusão prevista no art° 5°, 1. 2. das Condições Gerais da Apólice, logrou provar matéria que integra a sua previsão, uma vez que a morte do HH se ficou a dever exclusivamente à conduta temerária, que actuou com negligência grave.

  12. - Não podem os recorrentes conformar-se com o entendimento vertido no Acórdão recorrido pois não resultaram no processo elementos probatórios que permitam...

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