Acórdão nº 2135/04.1TBPVZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução30 de Novembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Sumário : I - A lei remete os fundamentos da impugnação da partilha extrajudicial, a que se reporta o art. 2121.º do CC, para a teoria geral dos contratos, nomeadamente, para as regras sobre a nulidade e a anulabilidade do negócio jurídico em geral, e não para as regras estabelecidas para qualquer contrato em especial, designadamente, o contrato de compra e venda de pais a filhos.

II - Não sendo a autora herdeira legitimária da esposa de seu pai, cuja herança, então, ainda não tinha sido aberta, mas cujos bens foram partilhados entre os seus herdeiros, incluindo o pai, não é a mesma pessoa, directamente, interessada na partilha, não podendo participar na partilha extrajudicial ou requerer inventário por óbito da esposa de seu pai.

III - Não se tendo provado que a preterição da autora na partilha tenha sido, intencionalmente, dolosa ou determinada por má fé dos demais outorgantes, designadamente, dos réus, inexiste fundamento legal para, por esta via, impugnar a partilha extrajudicial realizada.

IV - Não se tendo demonstrado a alegada aparência de partilha, que se traduziria na divisão entre os réus e seu pai dos bens que faziam parte do património deste, no qual se continha o seu quinhão hereditário e a sua meação no casal, por óbito da esposa e mãe daqueles, recebendo o mesmo tornas em dinheiro, com as quais preencheu, inteiramente, o seu direito, a situação não se converteu num contrato de compra e venda, nem aquela partilha carecia de ser autorizada pela autora, filha não matrimonial do pai e irmã consanguínea dos réus, mas que não era herdeira da esposa de seu pai.

V - Não se havendo demonstrado os requisitos constitutivos da impugnação da partilha, ou seja, a preterição da autora na partilha, de forma, intencionalmente, dolosa ou determinada por má fé, esta goza da faculdade de, na qualidade de herdeira legitimária de seu pai, requerer inventário judicial para partilha dos seus bens, não se sujeitando ao que os restantes herdeiros, seus irmãos consanguíneos, possam, eventualmente, ter outorgado em seu prejuízo.

VI - Não se tratando, manifestamente, de uma situação de dolo instrumental, nem sequer de dolo material indirecto, inexiste fundamento legal para condenar a parte vencedora como litigante de má-fé.

Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA : AA, residente na Rua ..., Póvoa de Varzim, propôs a presente acção declarativa comum ordinária, contra BB, residente na Praça ..., Póvoa de Varzim, pedindo que, na sua procedência, seja decretada a anulação da escritura pública celebrada, na Secretaria Notarial da Póvoa de Varzim, no 1o Cartório Notarial, em 8 de Junho de 2000, na parte em que se faz a partilha dos bens de CC, ordenando-se que tais bens sejam divididos entre os seus três filhos, sendo 7/18 avos para DD, 7/18 para o réu e 4/18 avos para a autora [a], seja ordenada a anulação do registo, na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim, e efectuado outro, nos termos e proporções acima mencionados [b] sejam remetidos aos Serviços de Finanças da Póvoa de Varzim, para tomarem conhecimento desta inicial e da aludida escritura, as respectivas cópias destas [c] e sejam notificados o 1o Cartório da Secretaria Notarial e a Conservatória do Registo Predial, ambos da Póvoa de Varzim [d], invocando, para o efeito, como causa de pedir, que DD e o réu BB são filhos de CC e de sua mulher, EE, os quais eram casados um com o outro, segundo o regime da comunhão geral de bens.

Por outro lado, a autora AA é filha de CC e de FF EE faleceu, em 24 de Maio de 1999, e CC, em 7 de Agosto de 2003.

A autora soube, em 27 de Outubro de 2003, que foi lavrada a escritura pública corporizada no documento junto aos autos, sem que, intencionalmente, tenha sido informado o Notário de que existia uma irmã, ou seja, a aqui autora, procedendo-se à partilha dos bens comuns do casal e não apenas dos bens da herança.

Com efeito, na mencionada escritura e, após a habilitação de herdeiros, CC e o réu BB, seu filho, este intervindo por si e na qualidade de procurador de seu irmão, DD, e mulher deste, GG, declararam ir proceder à partilha dos bens do casal e da herança de EE, passando a fazê-lo, mediante a adjudicação ao réu de uma sepultura com o n°41, na secção F, 1o talhão, do cemitério municipal da Póvoa de Varzim, com o valor atribuído de 10 000$00, e de uma sepultura com o n°40, na 1a secção, no cemitério paroquial de Aver-O-Mar, de metade indivisa do prédio urbano, sito no lugar de Fontes Novas, freguesia de Aver-O-Mar, descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim, sob o n°11.107, do Livro B29, com o valor atribuído de 5000$00, e ainda de metade indivisa do prédio urbano, sito no lugar de Fontes Novas, freguesia de Aver-O-Mar, descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim, sob o n°11.107, do Livro B29, com o valor atribuído de 25 252$00, sendo a restante metade indivisa deste prédio urbano adjudicada a DD, e ao viúvo, CC, da torna de 26 834$66, que o mesmo declarou ter já recebido dos filhos BB e DD, mas sem que na referida escritura tivesse sido feita qualquer referência à autora.

Na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim, o prédio urbano outrora sob o n°11.107, do Livro B29, da freguesia de Aver-O-Mar, encontra-se descrito sob o n°01868/011031, aí constando que o mesmo corresponde ao artigo matricial 336º e que, por força de averbamento efectuado em 24 de Maio de 2005, o respectivo valor patrimonial é de €1. 448,76.

A aquisição do imóvel em causa encontra-se inscrita, na Conservatória do Registo Predial, a favor do réu BB e de DD e mulher, GG, constando como sua causa aquisitiva a sucessão deferida em partilha, por morte de EE, que foi casada com CC, segundo o regime da comunhão geral, representando a partilha uma venda do património imobiliário de seu pai, CC, aos filhos, BB e DD.

Na contestação, o réu defende-se, na parte que ainda interessa considerar, por impugnação, contradizendo, no essencial, toda a factualidade invocada pela autora.

Na réplica, a autora conclui como na petição inicial e o réu, na tréplica, como na contestação.

DD, por si e em representação de sua mulher, GG, depois de ter revogado o mandato conferido à Exª Advogada constituída pela autora, desistiu do pedido que, conjuntamente com esta, inicialmente, formulara contra o réu, bem assim como de todos os articulados subsequentes e do pedido de cancelamento do registo da acção.

Foram admitidos, a requerimento da autora, como intervenientes principais provocados, associados do réu, os aludidos DD e sua mulher, GG.

Posteriormente, “A... – Gestão Imobiliária, SA”, na qualidade de cessionária da posição dos intervenientes DD e mulher, GG, foi jugada habilitada para os ulteriores termos da acção principal e, em substituição dos mesmos, prosseguir na sua tramitação processual.

A sentença julgou a acção, parcialmente, provada e procedente e, em consequência, declarou a anulabilidade da escritura pública em causa, na parte em que se faz a partilha da meação e do quinhão hereditário dos bens pertencentes a CC, ordenando-se que os mesmos bens sejam divididos, igualitariamente, pelos três filhos, DD, BB e a autora, e ainda o cancelamento do registo feito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim, e, em conformidade, absolveu o réu e interveniente DD do demais pedido.

Desta sentença, o réu BB e a habilitada “A...-Gestão Imobiliária, SA” interpuseram recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado improcedente a respectiva apelação, declarando a nulidade do negócio.

Do acórdão da Relação do Porto, o réu BB e a habilitada “A...-Gestão Imobiliária, SA” interpuseram agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, proferindo-se decisão que, declarando, totalmente, válida a escritura, decrete a improcedência da presente acção, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem: O RÉU: 1ª – O douto acórdão recorrido deve ser revogado, visto que a partilha em causa nos presentes autos observou toda a legislação que lhe é aplicável, nenhuma censura lhe podendo validamente ser feita. Na verdade, 2ª - Através da referida escritura procedeu-se à partilha dos bens que constituíam o acervo patrimonial da herança da falecida EE, tendo-se previamente procedido à habilitação dos herdeiros da falecida, e, de seguida, observando a legislação aplicável, os herdeiros desta, e só estes, pois só estes tinham legitimidade para intervir na escritura, procederam à partilha dos bens, da herança daquela falecida, fazendo as respectivas adjudicações. Deste modo, 3ª - E contrariamente ao defendido no douto acórdão recorrido, nenhuma violação ocorreu de qualquer norma legal, não podendo, portanto, a escritura em causa, ser objecto de qualquer censura, nomeadamente da nulidade decidida no acórdão recorrido. Com efeito, 4ª - A escritura em causa, o experiente e ilustre (e, infelizmente saudoso) notário que a elaborou, observou, como era seu timbre, toda a legislação aplicável, e 5ª - Procedeu como sempre o fez em centenas de partilhas notariais em que interveio: atribuindo aos bens imóveis a partilhar os respectivos valores matriciais e respeitando a vontade de todos os outorgantes, a quem sempre explicava, como nesta explicou, tal como se refere na parte final da escritura, o seu conteúdo, que todos os outorgantes, maiores e capazes, acharam conforme a sua vontade. Em suma: 6ª - Todos os contraentes, viúvo da falecida e filhos desta, quiseram que o prédio urbano pertencente à herança da...

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