Acórdão nº 04/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Março de 2004 (caso None)

Magistrado ResponsávelJ SIMÕES DE OLIVEIRA
Data da Resolução09 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal dos Conflitos- I -O INETI - INSTITUTO NACIONAL DE ENGENHARIA E TECNOLOGIA INDUSTRIAL recorre para o Tribunal de Conflitos do Acórdão da Relação de Lisboa, de fls. 163, que, nos autos de acção com processo ordinário proposta pelo recorrente contra A..., revogou a sentença condenatória da 4ª Vara Cível de Lisboa e declarou os tribunais judiciais incompetentes em razão da matéria, absolvendo a Ré da instância.

Nesta acção, o ora recorrente pedia a condenação da outra parte na quantia de Esc. 9.482.000$00 de capital e 8.176.601$00 de juros vencidos, mais os juros vincendos, com fundamento em ter celebrado com ela, em 6.2.85, um contrato de desenvolvimento industrial que envolvia um empréstimo, sem juros, para construção e teste de um protótipo de um sistema de tinturaria a frio. Esse financiamento seria realizado pelo Ministério da Indústria e Tecnologia, que então exercia a tutela sobre o Autor, estando contratualmente previsto o seu reembolso pela Ré em e anuidades iguais no terceiro ano após a conclusão do projecto, ou seja, em Fevereiro de 1990, Fevereiro de 1991 e Fevereiro de 1992. Solicitado o pagamento à Ré, esta foi pedindo a prorrogação dos prazos até que, em Fevereiro de 1996, o Autor lhe fixou por carta o prazo de 15 dias úteis a contar da data da recepção da mesma para o pagamento integral devido.

Excepcionada a incompetência material do tribunal, por a relação contratual estabelecida ser de natureza jurídico-administrativa, a sentença veio a considerar a excepção improcedente e a julgar a acção parcialmente procedente, condenando a Ré a pagar ao Autor a quantia de 9.482.000$00, acrescida de juros de mora desde 22.2.96 até integral pagamento.

O acórdão recorrido, ao invés, considerou que o pedido emerge de um contrato administrativo, pelo que é o tribunal administrativo o competente para conhecer da acção.

Contra esta decisão se insurge o recorrente, que nas suas alegações enuncia as seguintes conclusões: "1. A definição procedimental de contrato administrativo confunde-se com a noção de relação jurídica administrativa que determina a competência da jurisdição administrativa consagrada na CRP; 2. Nos termos do nº 3 do artigo 212º da CRP compete à jurisdição Administrativa o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes de relações jurídicas administrativas; 3. Relação jurídica administrativa, na esteira de Freitas do Amaral, é a que confere poderes de autoridade, ou impõe restrições de interesse público à Administração perante os particulares, ou que atribui direitos, ou impõe deveres públicos aos particulares, perante a Administração; 4. Entendendo-se como na anterior conclusão se contém, o contrato dos autos não conferiu poderes de autoridade ou impôs restrições de interesse público ao Recorrente perante a Recorrida, nem de modo algum, atribui direitos ou impôs deveres de públicos a Recorrida perante o Recorrente; 5. O douto acórdão recorrido defende que o critério estatutário é o dominante na doutrina portuguesa para se alcançar o conceito de contrato administrativo; 6. Segundo o critério estatutário o contrato é administrativo quando o seu regime jurídico e traçado pelo Direito Administrativo; 7. O regime jurídico dos contratos administrativos é constituído por normas que conferem prerrogativas especiais de autoridade à Administração Pública, e por normas que lhe impõem especiais deveres ou sujeições que não têm paralelo no regime dos contratos de direito privado; 8. Tais normas reflectem-se na formação, execução e extinção do contrato administrativo.

9. O contrato dos autos não foi precedido de concurso público, e nele o Recorrente surgiu desprovido de poderes de autoridade, nomeadamente, dos de modificação unilateral, de aplicar sanções, e de rescisão do contrato a título de sanção; 10. Entendendo-se como nas conclusões 6, 7, 8 e 9, o critério estatutário revela-se incapaz de qualificar o contrato dos autos como administrativo, qualificando-o, sim, como contrato de natureza privada, sujeito ao regime jurídico do direito privado.

11. Existem outros critérios qualificativos que por si só, e dissociados da presença de outras marcas de administratividade, devem ser afastados, por se revelarem, também eles, incapazes de distinguir contratos administrativos de contratos privados da Administração.

12. Não se pode caracterizar o contrato dos autos como administrativo à luz do critério orgânico, pois este é um critério claramente insuficiente e ultrapassado quer pela proliferação da Administração, quer pela proliferação dos seus contratos; 13. A qualificar-se o contrato dos autos como administrativo à luz deste critério, significaria qualificar todos os contratos da Administração Pública como administrativos; 14. Igualmente, não se pode qualificar o contrato em apreço como administrativo em função dos critérios do objecto e do fim de imediata utilidade pública.

15. O facto de naquele existir um fim de interesse público que se inclui nas normas estatutárias do Recorrente não significa, nem pode significar, que se está na presença de um contrato administrativo.

16. Toda a actividade do recorrente, como Administração Pública que é, é pautada pela prossecução do interesse público; 17. O contrato dos autos não encerra em si mesmo a prossecução intensa de fins concretos de interesse público nem o seu objecto consiste numa actividade de serviço público; 18. O interesse público que preside a este contrato, e o interesse público que norteia toda a actuação do Recorrente, interesse público este incapaz, de por si só, o qualificar corno administrativo; 19. De entre todos os critérios doutrinários, o da sujeição é eleito pelo recorrente como o mais capaz, entre os demais, para qualificar o contrato dos autos; 20. À luz deste critério, existe contrato administrativo quando há uma sujeição do particular a Administração Pública, manifestando-se tal sujeição através de cláusulas específicas do contrato, que conferem ao contraente pública poderes exorbitantes face ao contraente particular; 21. Tais poderes exorbitantes são os consagrados no artigo 180º do CPA (modificação unilateral das prestações, rescisão...

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