Acórdão nº 06/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Fevereiro de 2003

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal de Conflitos: 1 - A... intentou no Tribunal de Trabalho de Lisboa acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo ordinário, contra B...

O Autor alegou, em suma, o seguinte: - Foi admitido ao serviço da Ré em 5-9-83, como médico do trabalho, estando subordinado às regras aplicáveis ao contrato individual de trabalho, por força do Decreto-Lei n.º 393/82, conforme cópia do contrato e de declaração que juntou; - Ao serviço da Ré, possuía o Autor o horário de trabalho de Segunda-feira a Sexta-feira das 13h30 às 17h30 com flexibilidade de horário; - Deixou de prestar serviço à Ré em 7 de Novembro de 1998 por ter sido despedido por carta da R. datada do dia 5 anterior que acompanhava cópia da deliberação de despedimento da R. e do relatório elaborado na sequência de processo disciplinar; - Não existe, no entanto, a justa causa invocada para o seu despedimento, que é antes um despedimento ilícito dada a inexistência de justa causa; - Verificou-se caducidade do direito de a Ré instaurar procedimento disciplinar; - Ocorreu recurso ilícito a meios de prova que foram utilizados para efeitos de instauração do procedimento disciplinar; - O Autor não cometeu nenhuma infracção, designadamente não ocorreu desobediência ilegítima, nem deixou de prestar assistência a um trabalhador e, se o seu comportamento integrasse infracções, ele não serviria de fundamento à cessação da relação laboral, quer à luz do regime do contrato de trabalho, quer à face do regime aplicável ao funcionalismo público; - O Autor foi impedido de entrar nas instalações da Ré, quando já estava terminado o período de suspensão preventiva; - O Autor tem direito a uma indemnização por danos não patrimoniais, pelo transtorno sofrido na sua vida profissional e no relacionamento com os seus colegas e pelo vexame sofrido ao ser impedido por porteiros ao serviço da Ré de regressar ao seu local de trabalho; - O Autor tem direito à reintegração no seu posto de trabalho, sem prejuízo da indemnização por despedimento, a exercer no momento processual próprio, e ainda a receber as retribuições vencidas e as que se vencerem até à decisão final, além de juros.

A Ré, além de contestar por impugnação, excepcionou a incompetência absoluta, em razão da matéria, do Tribunal do Trabalho por, em suma, o Autor, embora tivesse sido admitido, na vigência do Decreto-Lei n.º 381/82, de 15 de Setembro, através de contrato individual de trabalho, com as declarações de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, daquele diploma e do Decreto-Lei n.º 33/80, de 13 de Março, constantes dos acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 31/84 e 15/88, respectivamente, passou a estar sujeito a um regime de direito público.

No despacho saneador, o Tribunal do Trabalho de Lisboa julgou-se incompetente, em razão da matéria, para conhecer da acção, absolvendo a Ré da instância.

O Autor interpôs recurso desta decisão para o tribunal de Relação de Lisboa que, por acórdão de 5-7-2002, confirmou a decisão recorrida.

Novamente inconformado, o Autor interpôs recurso deste acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1. No âmbito dos Decs. - Lei 40.391 e 40.393 não se constitui nenhum vínculo de natureza administrativa, mas um contrato de natureza duradoura que nenhuma norma prevê como possível na admissão na função publica, antes se prevendo que os contratos na função pública são por natureza transitórios - art. 15º do Dec. - Lei 427/89; 2. E o próprio recorrente foi contratado em Outubro de 1983 ao abrigo de um contrato individual de trabalho então admitido nos termos dos Decs. - Lei 33/80 e 393/82 - Docs. 1 e 2 juntos com a petição inicial; 3. Quando os Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 31/84 e 15/88 decidiram pela inconstitucionalidade com força obrigatória geral dos citados Decs. - Leis 393/82 e 33/80, a situação da relação jurídica do recorrente manteve-se uma relação de natureza civil, já que não assumiu nenhuma das formas admissíveis e transitórias de contrato que conferia a qualidade de "funcionário" ou de "agente"; 4. E, porque nesse contrato de natureza civil existia uma autêntica subordinação do recorrente às ..., o contrato mantinha-se mesmo depois de 1988 como um contrato individual de trabalho; 5. É competente pois o Tribunal do Trabalho em razão da matéria para apreciar o despedimento do A. no âmbito de um contrato de trabalho vigente com a R.; 6. O douto Acórdão recorrido, ao considerar o Tribunal do Trabalho como incompetente em razão da matéria, violou o art. 64º da LOTJ.

Termos em que, Deverá ser dado provimento ao presente recurso, declarando-se o Tribunal do Trabalho como competente para apreciar o pleito.

A Ré apresentou alegações dizendo, em suma, o seguinte: Diga-se, apenas, em jeito de conclusão que aos trabalhadores da ..., em geral, do ponto de vista jurídico-laboral são-lhe aplicáveis dois regimes: - O previsto na LCT (Lei do Contrato de Trabalho) aos trabalhadores contratados já pela B.... e aos que oriundos da ... (instituto público) tenham optado por tal regime, nos termos do disposto nos arts. 1º e 2º, nº 1 do Dec.-Lei 62/94 de 28.02; - Um regime de direito público, tendo por base o regime jurídico vigente para os funcionários públicos, com as especificidades constantes dos diplomas orgânicos da ..., aos restantes trabalhadores transitados da ....

- O Autor tendo sido admitido nas ... em 10.10.83 e não tendo optado pelo regime do contrato individual de trabalho, está sujeito a um regime de direito público.

- Donde que o Tribunal de Trabalho é incompetente em razão da matéria para dirimir a questão que lhe é colocada.

Na pendência do recurso no Supremo Tribunal de Justiça, o Autor veio invocar, como facto superveniente, o acórdão n.º 1/2001, desse Tribunal, publicado no Diário da República, I Série, de 15-5-2001, em que se decidiu que «os contratos verbais celebrados entre Arsenal do Alfeite e os médicos ao seu serviço no domínio da vigência do Decreto-Lei n.º 33/80, de 13 de Agosto, revestem a natureza de contratos de trabalho sujeitos ao Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de Novembro de 1969, e não de contratos administrativos de provimento, se estiverem verificados os requisitos do contrato de trabalho, designadamente a subordinação jurídica. A tal não faz obstáculo a declaração da inconstitucionalidade com força obrigatória geral daquele Decreto-Lei n.º 33/80, pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 15/88, de 14 de Janeiro, publicado no Diário da República, 1.ª série, de 3 de Fevereiro de 1988, uma vez que nele se faz ressalva dos efeitos jurídicos produzidos pelas normas declaradas inconstitucionais.» Sobre este Acórdão, a Ré veio dizer que ele se reporta a um caso de um trabalhador admitido em 15-6-82, na vigência do Decreto-Lei n.º 33/80, e que o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 15/88, que declarou, com força obrigatória geral, a...

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