Acórdão nº 00571/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Junho de 2005 (caso None)

Magistrado ResponsávelEugénio Sequeira
Data da Resolução07 de Junho de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

A. O Relatório.

  1. E...e mulher T..., identificados nos autos, dizendo-se inconformados com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal que julgou parcialmente improcedente uma das impugnações judiciais deduzidas e a outra totalmente improcedente, vieram da mesma recorrer para este Tribunal, formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:

  1. Ao não se pronunciar sobre a questão da legalidade da aplicação de métodos indiciários, que os impugnantes expressamente suscitaram nas petições de impugnação, a sentença recorrida sofre de omissão de pronúncia, que é causa de nulidade, nos termos do art. 125º, nº1, do C.P.P.T..

  2. Ao considerar que cabia aos impugnantes o ónus de prova da excessiva quantificação da matéria tributável fixada por métodos indirectos, sem que se verificassem os requisitos para o referido efeito impostos pelo artº 121º, nº2, do C.P.T., a sentença recorrida violou esta última norma legal.

  3. A fundamentação da decisão de aplicação de métodos indiciários violou os artºs 38º, nº2, do C.I.R.S. e 81º do C.P.T. e a sua quantificação não respeitaria os critérios estipulados no art. 52º do referido Código, aplicável por força do nº5 da referida norma do C.I.R.S. (redacções em vigor no momento dos factos).

  4. A douta sentença recorrida não valoraria o facto de o referido representante da Fazenda Pública não ter procedido à contestação especificada dos factos aduzidos pelos impugnantes, não obstante o seu eventual interesse para a prova desses factos, não tendo, assim, tido em conta o disposto no art. 110º, nº7, do C.P.P.T..

  5. A sentença recorrida violaria o princípio do inquisitório previsto no art. 99º, nº1, da Lei Geral Tributária, uma vez ter considerado globalmente provados os factos apurados pela inspecção tributária e não provados os factos não constantes do Relatório da Inspecção Tributária, não apreciando ou rejeitando liminarmente os factos aduzidos pelos impugnantes que lançaram a dúvida sobre os elementos que serviram de base à aplicação de métodos indiciários e à quantificação da matéria tributável apurada por esses métodos.

  6. A douta sentença recorrida não está igualmente fundamentada, de facto e de direito, não discriminando as razões pelos quais dados factos foram considerados provados e outros não provados e desconsiderando, através de breves afirmações desprovidas de qualquer justificação, os elementos probatórios trazidos para os autos pelos impugnantes.

  7. A sentença recorrida violou especialmente as regras de experiência aplicáveis à prova dos factos, não dando qualquer relevo à circunstância de os resultados obtidos pela farmácia da impugnante serem equivalentes aos normais das farmácias situadas em zonas rurais de desenvolvimento semelhante da Região Autónoma da Madeira e, após a aplicação de métodos indirectos e nos exercícios abrangidos, passarem a ser, em virtude da aplicação desses métodos, muito dos resultados médios obtidos por farmácias, não apenas sitas nessas zonas rurais, mas na própria cidade do Funchal, onde seria suposto serem muito superiores.

  8. Dada a fundada dúvida suscitada sobre a aplicação de métodos indirectos, no presente caso, e dado não se verificar a circunstância de inversão do ónus de prova do art. 121º, nº2, do C.P.R., devem, à luz do nº1 dessa norma legal, ser anulados os actos tributários impugnados, nos termos requeridos pelos impugnantes, ora recorrentes.

Tudo como é de Direito e de Justiça.

Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito suspensivo.

O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por os recorrentes não terem colocado em causa, nas respectivas petições iniciais de impugnação judicial, os pressupostos para a aplicação dos métodos indirectos, e não terem, por outro lado, logrado provar mostrarem-se errados os métodos utilizados pela Administração Fiscal.

Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.

B. A fundamentação.

2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se a sentença recorrida enferma dos vícios de omissão de pronúncia e de falta de fundamentação (de facto e de direito) conducentes à declaração da sua nulidade; E não enfermando, se a mesma padece de erro de julgamento quanto aos factos provados e não provados, fixados; Se se encontra errado o critério utilizado na quantificação da matéria tributável apurada por métodos indiciários/indirectos, ou essa própria quantificação em si e se cabe aos recorrentes a prova do eventual excesso dessa quantificação; E se a falta de contestação do RFP importa confissão dos factos articulados pelos impugnantes.

3. A matéria de facto.

Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal "a quo" fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz: 1. O Relatório de Inspecção Tributária, em que assentaram as liquidações ora impugnadas, é o que consta de fls. 56 ss do processo administrativo apenso a este proc. 70/02 e que aqui dou como reproduzido.

2. Do mesmo consta, nomeadamente, o seguinte: 1...

A empresa (da impugnante) desenvolve a actividade no âmbito do comércio a retalho de produtos farmacêuticos, possuindo para o efeito uma farmácia no local da sede (Sítio da Igreja, Estreito de Câmara de Lobos) e um depósito no Curral das Freiras.

Possui ...

uma directora técnica (proprietária), 4 ajudantes técnicos de farmácia, 1 praticante de farmácia e 1 escriturário.

...

vende também ...

fraldas para bebé, leite infantil, papas lácteas, produtos cosméticos e de higiene, Trata-se de um sujeito passivo (a impugnante) de IRS ...

...

obtém rendimentos da categoria C...

Trata-se de um sujeito passivo (a impugnante) de IVA ...

enquadrado no regime normal de periodicidade mensal..

.

...

é obrigado a possuir contabilidade organizada nos termos da al. b) do nº 1 do art. 109° CIRS.

2...

Dos anexos C às declarações modelo 2 de IRS foram retirados os seguintes elementos: ...

A variação das vendas é acompanhada por uma variação semelhante no CMVMC, o que denuncia um certo artificialismo na MLB s/Custo declarada.

A rentabilidade fiscal declarada afigura-se artificial uma vez que foram detectadas omissões de custos, dando-se como exemplo a remuneração do empresário.

Análise à Conta Caixa Existem entradas de caixa justificadas com base em documentos internos.

. .

docs.

5 e 6...

...

O Saldo no exercício de 1996 é muito constante, o que denota um certo artificialismo.

...

Análise às margens de comercialização Para testar a fiabilidade da MLB s/Custo declarada, expressa na linha 20 do quadro do ponto 2.1, efectuou-se uma amostragem expressa nos docs.

35 a 37 em anexo.

A amostragem foi efectuada com a presença da proprietária da farmácia, tendo-se efectuado uma subdivisão entre medicamentos éticos ou de preço fixo, medicamentos não éticos ou de preço variável, e de outros produtos.

O valor final foi obtido por ponderação, considerando-se que os medicamentos éticos representam 90% do total das vendas e os não éticos e outros produtos representam 5% das vendas cada, conforme auto de declarações, doc.

38...

...

A margem aritmética ponderada da MLB s/Custo foi calculada da seguinte maneira..

((37% x 90%) + (52% x 5%) + (45% x 55)) - 38%.

Na linha 20 do quadro expresso no ponto 2.1 obtêm-se margens declaradas que variam entre 18% e 21 %, existindo uma diferença muito significativa em relação à obtida em amostragem, sendo a menor diferença de 17%.

4.2.

Determinação do lucro tributável presumido O lucro-tributável presumido vai ser calculado com base na MLB s/Custo, conjugado com a alínea a) do art. 52° CIRC.

Efectuaram-se os seguintes cálculos para obtenção do valor presumível das vendas: (ver quadro a fl.

80 do p.a.) 4.3.

Distribuição do IVA em falta A distribuição do IVA em falta vai ser efectuada de forma equitativa, uma vez que o volume de negócios expresso nas declarações periódicas do IVA não coincide com o expresso no anexo C à modelo 2, o mesmo acontecendo em relação a alguns exercícios da contabilidade.

Considerou-se, conforme auto de declarações doc.- 2..3 em anexo, que...

3. A impugnante é proprietária de uma das duas farmácias existentes na freguesia rural do Estreito de Câmara de Lobos.

4. Esta freguesia dista cerca de 10 km da sede do Concelho, único local onde tem um centro de saúde.

5. Além da farmácia propriamente dita, a impugnante possui um posto de venda de medicamentos na freguesia do Curral das Freiras, para onde tem de se deslocar e, nos seus impedimentos, um seu empregado.

6. Em relação a alguns medicamentos, a impugnante optou por não os ter em armazém, preferindo pedi-los, no dia, ao fornecedor no Funchal.

7. A zona é fria e húmida.

8. Numa farmácia nem todos os produtos adquiridos são vendidos.

9. Ao aumento das vendas verificado entre os anos de 1992 e 1996, correspondeu um aumento do resultado fiscal, que subiu de 4 272 565$00 em 1992, para 8 875 847$00 em 1996, com uma rentabilidade fiscal da ordem dos 4% a 5%; 10. Atente-se que esses valores reflectiam uma margem de lucro bruta sobre o custo da ordem dos 20%.

11. A impugnante não põe em causa a existência à data da fiscalização, de fundamentos para aplicação de métodos indiciários; 12. O valor de 1 788 226$00 de IVA deduzido indevidamente refere-se a aquisições de álcool feitas ao Instituto do Vinho da Madeira; 13. Este Instituto, aquando da venda do álcool, apenas emitia uma guia de pagamento, para ser satisfeito na respectiva tesouraria; 14. Nessa guia era mencionado expressamente o valor do IVA, que acrescia ao valor do álcool.

15. O Instituto do Vinho da Madeira entregou nos Cofres do Estado o IVA que foi liquidado à impugnante.

16. A base de todas as presunções é constituída pelos mapas que constam dos docs. 35 a 37.

17. A amostragem foi feita a 12 produtos de entre centenas com que uma farmácia lida no seu dia-a-dia.

18. Apesar de os impugnantes terem confessado que a contabilidade não...

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