Acórdão nº 00057/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Fevereiro de 2005
Magistrado Responsável | Gomes Correia |
Data da Resolução | 15 de Fevereiro de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
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RELATÓRIO MARIA...
, residente na Rua do ...,.--- Porto, inconformada com a sentença de fls.155-166, do 1° Juízo do TT de 1a Instância do Porto, que julgou improcedente esta impugnação judicial, por si deduzida contra liquidação adicional de IVA referente ao ano de 1995, dela recorreu para o STA, rematando a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões: 1
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Em caso de apuramento da matéria colectável por métodos indiciários, é sobre o contribuinte que recai o ónus material da prova de que a avaliação não tem bases sólidas.
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A ora Rct. demonstrou, documental e testemunhalmente, que, ao contrário do vertido no relatório dos Serviços de Inspecção Tributária, o seu restaurante não funcionou 365 dias em 1995, tendo estado encerrado no dia de Natal e para obras.
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Demonstrou, documental e testemunhalmente, que, em 1995, serviu refeições económicas também ao sábado.
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Demonstrou, documental e testemunhalmente, que nas conclusões da acção de inspecção se considera que a impugnante vendeu mais frango do que aquela que comprou.
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Por fim, demonstrou, testemunhalmente, que comprou batatas e peixe, pelo que a consideração de uma margem bruta de lucro de 100% sobre o custo de tais produtos é simplesmente impossível.
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Ao não considerar como provados os factos elencados nas precedentes conclusões 2a a 5a, inc., e, em consequência, ao não anular o acto impugnado, a sentença recorrida violou o disposto nos arts. 74° da LGT e 100° do CPPT.
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A sentença recorrida não apreciou a prova documental oferecida pela Rct. e não se pronunciou sobre os factos enunciados nas precedentes conclusões 2a a 5a, inc., pelo que é nula, nos termos do art.° 668°, l, d), do CPC, pôr omissão de pronúncia.
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Ao pronunciar-se sobre uma não verificada contradição entre a 2a e 3a testemunhas, a sentença recorrida é nula pôr excesso de pronúncia ( CPC, art.° 668°, l, d)).
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O acto de liquidação de IVA impugnado está viciado por falta de fundamentação, posto que a acção de inspecção não foi rigorosa, como se demonstra pelo facto de, no projecto de conclusões notificado à impugnante nos termos do art.° 60° da LGT, se ter acusado a falta de facturas que, afinal, se encontravam escrituradas.
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Tal acto de liquidação de IVA está também viciado por falta de fundamentação, porque a AF não provou, como lhe competia nos termos do disposto no art.° 74°da LGT, os pressupostos da aplicação de métodos indiciários à matéria tributável da impugnante, limitando-se a defender vagamente a aplicação de tais métodos.
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Ao considerar o acto de liquidação de IVA como fundamentado, a sentença violou os arts. 77° da LGT e 125°, l e 2, do CPA.
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Os actos de liquidação de juros compensatórios, porque praticados sobre uma matéria colectável erroneamente quantificada, padecem de vício de forma por falta de fundamentação.
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Deve, na procedência do recurso, ser a sentença recorrida revogada pôr ofender o estatuído nos arts. 100°, l e 3, do CPPT, 77° da LGT e 125°,1 e 2, do CPA.
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Quando assim se não entenda, deve ser declarada nula, por padecer dos vícios de omissão de pronúncia, nos termos do que dispõe o art.° 668°, l, d).
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Deve, ainda, ser declarada nula por padecer do vício de excesso de pronúncia, nos termos do que dispõe o art.° 668°, l, d), do CPC, Não houve contra - alegações.
O STA declarou-se incompetente em razão da hierarquia e, remetidos os autos a este TCAS, a EPGA pronunciou-se pelo improvimento em douto parecer emitido a fls. 201/202.
Satisfeitos os vistos legais, cumpre decidir.
* 2.- FUNDAMENTAÇÃO: 2.1.- DOS FACTOS 2.1.1.- Na sentença recorrida deram-se como provados e não provados os factos seguintes: a)- Pelos Serviços de Inspecção Tributária, na sequência de exame efectuado à contabilidade da impugnante, foi elaborado o relatório de fls. 14-19, onde consta, em síntese, que: l. A contribuinte exerce a actividade de "Restaurante de Tipo Tradicional" CAE 55301 e "Churrasqueira", a título individual, desde 1993. 1.1 Com a contribuinte, trabalham o marido e o filho. No exercício em análise, também teve uma empregada durante os primeiros quatro meses do ano. 1.2 A firma vem apresentando prejuízos desde o início. (...) 2. Através da análise efectuada aos documentos e livros da sua escrita (não organizada), constatou-se:
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Que não foram escrituradas seis facturas (...) emitidas por Laurindo Alves de Sousa & Filhos, Lda - Aviários do Lanço Grande, referente à compra de frango com o peso global de 152,95 Kgs., no valor de 46 088$00; b)- Que não possui qualquer documento relativo à compra de batatas, verificando-se, igualmente, a ausência deste produto nos inventários de existências (inicial e final); c)- Que também se verifica a inexistência de documentos de aquisição de peixe, à excepção de bacalhau. 3. Estes factos, de harmonia com o disposto no art.° 38° do CIRS, levam à determinação do lucro tributável por métodos indiciários e à presunção do montante da prestação de serviços, nos termos do art.° 84° do CIVA, para a liquidação do imposto em falta. V CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDICIÁRIOS l. IRS (...) 2. IVA 2.1 O valor anual presumido da prestação de serviços é de 7 595 370$00, conforme apuramento efectuado no ponto 1.5 deste capítulo. Assim: Prestação de serviços presumidos.......................7 595 370$00 " " escriturados.....................4 950 324$00 " " omitidos............................2 645 046$00 2.2 Apuramento do imposto em falta: 2 645 046$00 x 17% = 449 658$00- Imposto em falta Este imposto é dividido pelos respectivos períodos (trimestralmente ), no mapa mod.1208, em anexo.
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A impugnante foi notificada daquele relatório, para o efeito do art.° 60° da LGT.
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Com base naquele relatório, foi fixado à impugnante o IVA em falta referente a 1995 no valor de esc. 449 658$00, tendo esta sido notificada nos termos do documento cuja cópia consta de fls. 55.
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A impugnante requereu a revisão da matéria colectável, tendo a Comissão indeferido o pedido.
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Por aviso registado expedido em 16-06-2000, a impugnante foi notificada para proceder ao pagamento do IVA no valor de esc. 449 658$00, tudo nos termos do documento de cobrança cuja cópia consta de fls. 12.
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Por aviso registado expedido em 16-06-2000, a impugnante foi notificada para proceder ao pagamento dos juros compensatórios no valor de esc. 54 964$00, 69 645$00, 73 277$00 e 74 608$00, tudo nos termos do documento de cobrança cuja cópia consta de fls. 85-88.
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Em 1995, o filho da impugnante andava a estudar, sendo que as pessoas que trabalhavam no restaurante eram a impugnante e seu marido, embora este nem sempre o fizesse, uma vez que é doente.
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Dá-se por integralmente reproduzido o acórdão do STA cuja cópia consta de fls. 132-137.
* Não se provaram outros factos para além dos supra indicados.
*O Tribunal formou a sua convicção relativamente a cada um dos factos com base nos documentos indicados os quais não foram impugnados e nos depoimentos das testemunhas dada a razão de ciência invocada.
*2.2. - DA APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS Atenta a factualidade apurada e aquelas conclusões que delimitam o objecto do recurso, são as seguintes as questões a apreciar no presente recurso: a)- Saber se ocorre a nulidade da sentença por omissão e excesso de pronúncia - conclusões 7ª, 8ª, 14ª e 15ª; b)- Saber se está fundamentada a utilização dos métodos indiciários e o critério de quantificação que suportaram a liquidação de IVA e dos juros compensatórios- conclusões 2ª, a 6ª, 9ª a 12ª; c)- Saber se opera a fundada dúvida nos termos do artº 100º do CPPT- conclusões 6ª e 13ª.
*Quanto aos vícios formais da sentença (nulidade por omissão e excesso de pronúncia - conclusões 7ª, 8ª, 14ª e 15ª), dir-se-á que esta é uma decisão dos tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativas fiscais ( artº 3º do ETAF). Ela conhece do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto, pelo que a sentença pode estar viciada de duas causas que poderão obstar à eficácia ou validade da dicção do direito:- por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação; por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e então torna-se passível de nulidade, nos termos do artº 125º do CPPT.
A matéria alegada no recurso, qualificável como omissão e excesso de pronúncia, substanciada nas sobredita conclusões, delimitadoras do objecto do recurso, integra a primeira a situação em que se imputa à sentença violação das regras da sua elaboração e estruturação ou vício que atenta contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada - cfr.
Ac. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 25/01/2005, no Recurso nº 375/03.
Todavia, vigora o principio pro actione consagrado no art° 288° n° 3 CPC, também denominado como "prevalência da decisão de mérito" em desfavor da decisão de forma, à luz do qual se permite a prolação de decisão de mérito mesmo que, por subsistir uma excepção dilatória, coubesse antes declarar a absolvição da instância ao abrigo dos art° s. 105° n° l, 288° n° l a), 493° n° 2 e 494° n° l a), CPC.
E o princípio pro actione, é aplicável ex vi art° 2° al. e) do CPPT até porque inexiste norma especial que inviabilize a sua transposição para a situação concreta, tendo hoje acolhimento expresso nos art°s. 7° e 12° n° 3 do CPTA- cfr.
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (Contencioso Administrativo) de 06/01/2005, Recurso nº 12301/03, em cuja fundamentação nos louvamos no discurso imediatamente a seguir.
Como ensina o Prof.
Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, Lex, 2a edição, 1997, págs.477/478: "(...) se estiverem simultaneamente pendentes uma apelação relativa...
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