Acórdão nº 00208/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelEugénio Martinho Sequeira
Data da Resolução16 de Novembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.

  1. O Exmo representante da Fazenda Pública (RFP), dizendo-se inconformado com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa - 2.º Juízo - que julgou procedente a oposição à execução fiscal deduzida por L. ... - Representações, Lda, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: 1) Em homenagem aos princípios da livre apreciação da prova e da descoberta da verdade material, não devem ser desentranhados os documentos ora apresentados porquanto não respeitam a factos novos mas a factos já alegados (vide a este propósito Acs. TCA nos 7471/02, de 17/12/2002 e 290/03, de 20/05/03).

    2) Apesar da devolução das cartas registadas com AR, enviadas em Agosto de 2001 para a sede da recorrida, atinentes ao iva/96 e juros compensatórios de Janeiro a Novembro do mesmo ano, a oponente tem-se por notificada porque, mantendo-se o mesmo domicílio fiscal e tratando-se de um ente colectivo, aplicam-se-lhe as regras do processo civil, conforme jurisprudência plasmada nos Acs. do STA n° 0344/03 de 02/07 e de 02/06/99, Rec.22529, que, a dado passo, refere que não alegando a sociedade qualquer motivo razoável para não ter reclamado a carta, que por isso, foi devolvida, deve o destinatário da correspondência postal ter-se por notificado, apesar da devolução dos papéis, porque é de pressupor um serviço de escritório de porta aberta e atendimento que normalmente existem e onde se exerce labor diário, o que, em princípio, garantirá a entrega postal ou, pelo menos e bem importante para o efeito, a recepção diária ou quase diária, da correspondência.

    3) Nesta esteira também se pronunciou o Tribunal Constitucional in Ac. n° 130/2002, DR nº 103 de 04/05/02 e, com as necessárias adaptações o Ac. do TCA de 10/12/03, Rec.715/03.

    4) Caso assim não entenda esse Venerando Tribunal, a citação com hora certa efectuada em 6/12/2001 ocorre nessa data e não na data da assinatura do aviso de recepção (vg. Ac. TCA de 03/03/97, Procº 64709, registo 365).

    Aliás, 5) a recorrida nem sequer litiga a validade da citação com hora certa, tendo-o feito em sede própria, admitindo ter sido notificada a 6/12/2001.

    Porém, 6) a Meritíssima Juiza "a quo" conheceu e apreciou a validade da sobredita notificação tendo assim exorbitado da matéria que lhe competia conhecer, violando o disposto no art.º 660 n° 2 do CPC.

    7) Nos termos do art° 668° n° 1 d) do citado compêndio normativo o aresto sob recurso é nulo 8) Foi decidido que a dívida exequenda estava prescrita atento a que o iva, considerado um imposto de obrigação única, está submetido à forma de contagem do prazo de caducidade do art.º 33° do CPT que revogou tácitamente o art.º 88° do Civa, pelo que "o termo inicial do prazo extintivo do direito da Fazenda à liquidação do Iva fixa-se, pois, com referência à data do surgimento do facto tributário, e não ao fim da sua ocorrência.

    9)Ao dispor nestes termos a douta sentença violou o art.º 88° n° 1 do Civa, e incorreu em erro de direito ao aplicar a norma do artº 33° CPT, atento a que aquela é norma especial em relação ao dispositivo do CPT. A confirmá-lo estão as alterações entretanto ocorridas por via do Dlei n° 139/92 de 17/07 e Dlei n° 19/95, de 19/05, que mantiveram que só poderá ser liquidado imposto nos cinco anos civis seguintes àquele em que se verificou a sua exigibilidade.

    10) Destarte, atento o ano que respeitam o imposto e os juros compensatórios, não ocorreu a caducidade do direito à liquidação, como erradamente se exara no douto aresto.

    11) Caso assim não se entenda, considerando que as notificações de Agosto/2001 se consideram efectuadas, só as liquidações atinentes aos meses de Setembro a Novembro de 1996 deverão ter-se por prescritas.

    Pelos fundamentos expostos e com o sempre mui douto suprimento de V.Exªs, deverá ser revogada a decisão recorrida, assim se fazendo a costumada Justiça! Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.

    Também a recorrida veio a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais, igualmente na íntegra se reproduzem: 1. Decidiu bem o Tribunal recorrido ao ter declarado a caducidade do direito à liquidação de IVA e juros compensatórios relativos aos períodos de Janeiro a Novembro de 1996 e julgado extinto a execução fiscal supra identificada (Processo n.º ...-.../....2), no que respeita às certidões de dívida n.ºs ... a ... e ..., esta última com exclusão do IVA de Dezembro de 1996.

  2. Os documentos juntos pela Representante da Fazenda Pública nas suas alegações de recurso devem ser desentranhados, uma vez que não se verificam as circunstâncias previstas nos artigos 524.º, n.º 1, e 706.º do Código de Processo Civil, desde logo porque, em claro desrespeito pelo que o Tribunal recorrido ordenou por diversas vezes, a Administração Fiscal, em 1.ª instância, não juntou aos autos os documentos que agora pretende juntar.

  3. A devolução de cartas registadas com aviso de recepção, expedidas pela primeira vez, não tem como efeito a presunção de notificação do seu conteúdo ao respectivo destinatário, mesmo quando este seja uma sociedade comercial, de acordo com a interpretação adequada dos artigos 35.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, 38.º, n.º 1, 39.º, n.ºs 3 e 5, e 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o que equivale a dizer que, mesmo que a Administração Fiscal tenha expedido as notificações a que se reportam os referidos documentos (no caso de serem admitidos nos autos), as mesmas não produziram quaisquer efeitos, por terem sido devolvidas.

  4. As cartas registadas com aviso de recepção a que se refere a Representante da Fazenda Pública, se devolvidas ao seu remetente (SERVIÇO DE FINANÇAS DE LISBOA - 8), não representam a notificação exigida no Código de Procedimento e de Processo Tributário, nem permitem qualquer presunção nesse sentido, pelo que deveria a Administração Fiscal, se assim o tivesse entendido, expedir novas notificações no prazo de 15 dias (com presunção de notificação no caso de voltarem a ser devolvidas, de acordo com o artigo 39.º, n.º5, do Código de Procedimento e de Processo Tributário), o que não sucedeu - sibi imputet.

  5. Para efeitos do presente processo, apenas é admissível que se considera que a oponente foi notificada das liquidações adicionais n.ºs ... e ... a ...., relativas ao IVA e juros compensatórios do ano de 1996, com excepção do período de Dezembro do mesmo ano, depois de 30 de Novembro de 2001, como, aliás, se extrai da documentação junta aos autos.

  6. As liquidações adicionais de imposto e juros compensatórios referidas na conclusão anterior, atento o disposto no artigo 33.º do Código de Processo Tributário, aplicável nesta situação concreta, deveriam ter sido notificadas à oponente nos cinco anos seguintes à formação do facto tributário, ou seja, quanto à ultima das referidas liquidações, até 30 de Novembro de 2001, o que manifestamente não sucedeu.

  7. A notificação de qualquer acto tributário depois de decorrido o prazo legal de caducidade do direito à liquidação, como é o caso das liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios relativas aos períodos de Janeiro a Novembro de 1996, se notificadas depois de 30 de Novembro de 2001, torna o mesmo ilegal e a dívida que o mesmo titula inexigível.

  8. A instauração do processo de execução fiscal, na parte em que pretende a cobrança coerciva das alegadas dívidas fiscais relacionadas com as liquidações n.ºs ... e ... a ..., é ilegal, nos termos do disposto no artigo 204.º, n.º 1, alínea e), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, uma vez que tais liquidações só foram notificadas ao contribuinte, aqui oponente, depois de decorrido o prazo legal de caducidade, previsto no artigo 33.º do Código de Processo Tributário.

    Nestes termos, deve ser mantida a douta sentença recorrida e, consequentemente, negado provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Fazenda Pública.

    O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por não ser admitida a junção aos autos dos...

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