Acórdão nº 6097/01 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Fevereiro de 2002
Magistrado Responsável | Francisco Rothes |
Data da Resolução | 26 de Fevereiro de 2002 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
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RELATÓRIO 1.1 RE.s (adiante Recorrentes ou Contribuintes) vieram recorrer para este Tribunal da sentença que julgou improcedente a impugnação por eles deduzida contra as liquidações adicionais de IRS que lhes foram efectuadas com referência aos anos de 1998 e 1999, dos montantes de esc. 919.329$00 e 982.213$00, acrescidas de juros compensatórios, dos montantes de esc. 93.268$00 e 39.370$00, tudo respectivamente, por a Administração tributária (AT) ter considerado que não estava devidamente comprovada a deficiência fiscalmente relevante invocada pelo Contribuinte marido nas declarações de rendimentos daqueles anos, uma vez que considerou que o atestado por ele apresentado para fazer prova dessa deficiência, emitido pela Administração Regional de Saúde ao abrigo do disposto no Decreto-Lei (DL) n.º 341/93, de 31 de Outubro, não era adequado para esse efeito e por o Contribuinte, apesar de notificado para provar que «continua a ser detentor de deficiência igual ou superior a 60%» As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.
, não apresentou tal prova.
1.2 Na sentença recorrida considerou-se, em síntese, o seguinte: - «O atestado médico apresentado pelos impugnantes documenta uma decisão do órgão da administração - autoridade de saúde - que ao abrigo de normas de direito público visa produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta, ou seja, documentam um acto administrativo, tal como vem definido no artº 120º do CPA; e, como tal, e visto que não é nulo nem foi revogada, produz os seus efeitos desde a data em que foi praticado - artº 127º do CPA -, impondo-se, pois, à AF, de acordo com o princípio da unicidade da administração pública»; - no entanto, « AF tem o direito nos termos do artº 14º.7 do CIRS, de controlar o grau de incapacidade alegado, relativamente a 31 de Dezembro de cada ano, ainda que a incapacidade seja classificada de permanente», sendo que «permanente é, neste contexto, apenas antinómico de temporária , significando, pois, tratar-se de deficiência sem possibilidade de cura (já vimos que esta noção está, cada vez mais, ultrapassada), o que deixa em aberto, todavia, a quantificação da incapacidade em cada momento, pois o facto de ser permanente não quer dizer que o grau de incapacidade não possa oscilar para mais ou para menos» - sendo assim, «há, na lei, uma razão válida para que a AF não tenha aceite o atestado médico apresentado pelos impugnantes».
1.3 Os Recorrentes apresentaram alegações de recurso, que terminaram com as seguintes conclusões: «1 - O Dec.-Lei nº. 202/96, se 23 de Outubro veio estabelecer um regime de avaliação de incapacidade das pessoas com deficiência, para efeitos de acesso aos benefícios fiscais legalmente fixados.
2 - Porém o respectivo regime apenas tem aplicação para o futuro, não sendo de observá-lo relativamente a situações de facto anteriormente avaliadas, à luz dos critério anteriormente aplicáveis e em vigor.
3 - A incapacidade do recorrente foi verificada e atestada pela autoridade sanitária competente, não tendo sido impugnada a validade ou autenticidade do respectivo atestado por parte da AF.
4 - Pelo que, tendo sido alterados os critérios de avaliação da incapacidade relativa a deficiências do tipo em causa pelas Circulares 22/DSO e 1/96, de 31-01-96, da DGCI, mas não existindo qualquer decisão revogatória (seja administrativa, judicial ou legal) da validade ou dos efeitos que tendem a produzir os atestados emitidos em conformidade com os critérios anteriores (que não podem deixar de ser considerados válidos), não poderia a AF, por sua iniciativa, considerar "revogada" aquela validade ou "caducados" os efeitos daqueles documentos que referem um determinado grau de incapacidade do seu titular.
Assim sendo, como na verdade o é, deverá ser a douta decisão recorrida revogada e substituída por outra que conceda provimento à impugnação, revogando-se, consequentemente, as liquidações correctivas de IRS relativas aos anos de 1998 e 1999, deste modo fazendo-se sã, serena e inteira JUSTIÇA».
1.3 O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.4 O Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da manutenção da sentença.
Para tanto, referindo as posições jurisprudenciais sobre a questão e louvando-se no acórdão de 12 de Abril de 2000 do Supremo Tribunal Administrativo Proferido no recurso com o n.º 24737 e cujo sumário doutrinal é do seguinte teor: «Com a publicação do D. Lei 202/96 foi preenchida a lacuna existente quanto aos benefícios fiscais para contribuintes com incapacidade superior a 60%. Preconizando-se aí que o atestado devia conter a indicação da capacidade residual pela aplicação de meios de correcção, era legítimo à Administração Fiscal solicitar a apresentação de novo atestado que estivesse em conformidade com a nova lei. Desinteressando-se o contribuinte da tal apresentação não poderá usufruir do benefício pretendido».
, considerou, em síntese que: «não tendo o contribuinte comprovado a sua incapacidade nos termos do D. Lei 202/96 (que começou a vigorar em 31/12/96), a impugnação deveria ter sido julgada improcedente», como foi.
1.5 Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
1.6 A questão sob recurso, delimitada pelas conclusões dos Recorrentes, é a de verificar se a sentença recorrida fez errado julgamento quando considerou que a AT pode recusar, com referência aos anos de 1998 e 1999 e para efeitos do benefício fiscal previsto nos arts. 25.º e 80.º do Código do IRS (CIRS) Todas as referências ao CIRS reportam-se à versão anterior à revisão operada pelo DL n.º 198/2001, de 3 de Julho.
e 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) Todas as referências ao EBF reportam-se à versão anterior à revisão operada pelo DL n.º 198/2001, de 3 de Julho.
, o atestado médico apresentado pelos ora recorrentes, no qual a avaliação foi efectuada ao abrigo da legislação anterior ao DL n.º 202/96, de 23 de Outubro.
* * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos, que ora se reproduzem ipsis verbis: a) Os impugnantes apresentaram tempestivamente as suas declarações de rendimentos para efeitos de liquidação do IRS de 1998 e 99, dizendo nela ser ele portador de invalidez permanente superior a 60%, conforme atestado médico conhecido da administração fiscal (AF), do teor de fls. 8, provindo aquela invalidez de hipovisão; b) A AF havia notificado o impugnante nos termos do ofício de fls. 19, e, porque ele não apresentou o documento ali referido, procedeu à correcção das declarações, e à liquidação que nos ocupa.
Ao abrigo do disposto no art. 712.º do Código de Processo Civil (CPC), fixa-se ainda a seguinte matéria de facto, que igualmente se mostra provada: c) O atestado referido em a) foi emitido em 22 de Novembro de 1995 e assinado pela Autoridade de Saúde do concelho de Esposende, que atestou, para efeitos de IRS e outros, que Jorge Manuel Saleiro Ferreira apresenta deficiência de carácter permanente que, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades (TNI), aprovada «pelo Decreto-Lei N.º 341/93, de 30/09/93», lhe confere o grau de incapacidade de 80,8% (cfr. cópia do atestado a fls. 8); d) Na sequência da apresentação das declarações ditas em a) a AT procedeu à liquidação de IRS dos anos de 1998 e 1999 a Jorge Manuel Saleiro Ferreira e mulher, Maria do Céu da Costa Oliveira Ferreira, das quais resultaram os montantes a reembolsar de esc. 509.220$00 e 511.693$00, respectivamente (cfr. linha 26 das notas demonstrativas de liquidação incluídas nos documentos de cobrança, com cópia a fls. 6 e 7); e) Por despacho de 13 de Julho de 2000, o Director de Finanças de Braga proferiu despacho do seguinte teor: «O artº 71...
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