Acórdão nº 00090/04 de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Novembro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelDr. Carlos Lu
Data da Resolução18 de Novembro de 2004
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO M…, identificado devidamente nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto – 1º Juízo, datada de 31/03/2003, que, com fundamento na irrecorribilidade do acto, rejeitou liminarmente o recurso contencioso instaurado pelo mesmo com o qual pretendia a anulação do acto administrativo que se traduziu na requisição por parte do ente recorrido “CONSELHO EXECUTIVO DA ESCOLA ABADE BAÇAL” para o ano lectivo 2002/2003 de professores sem que constasse a requisição de professor para o 7º grupo.

Formula, nas respectivas alegações, as seguintes conclusões: A) “(...) porque o acto recorrido é um acto jurídico voluntário, condição necessária para se tratar de um acto administrativo”.

B) “(...) porque é um acto unilateral, gerou-se independentemente da vontade do Agravante.” C) “(...) porque é um acto orgânico, isto é, foi praticado por um órgão administrativo”.

D) “(...) porque é materialmente administrativo, foi, com efeito, praticado no exercício do poder administrativo.” E) “(...) porque produziu efeitos jurídicos. (...) Requisitos suficientes para ser considerado acto administrativo e, como tal, com dignidade de controlo jurisdicional.” F) “(...) O acto recorrido e o despacho que indefere o recurso contencioso do mesmo, violaram, nomeadamente, os princípios da legalidade, a prossecução do interesse público, o princípio da igualdade e direitos subjectivos do agravante (...)” (violação dos arts. 266º, n.º 2 CRP, 3º do CPA, 17º, 24º, 69º, 70º e 71º todos do Estatuto da Carreira Docente, das normas de concurso de professores quanto ao regime de preferência conjugal regulado pelo D.L. n.º 18/88, de 21/01, da circular n.º 15/2002 especificadamente nos seus itens 3.1.8.3.2.2.); G) Infringe ainda o princípio da igualdade, o princípio da mobilidade, o princípio da prossecução do interesse público iniciando o ano lectivo sem docente do 7º grupo, bem como a preferência conjugal (cfr. arts. 266º, n.º 2 da CRP, 5º do CPA, 64º do Estatuto da Carreira Docente); H) Viola ainda a decisão recorrida o disposto no art. 268º da CRP, bem como nos arts. 57º § 4º do RSTA, 25º da LPTA quando considerou que o acto administrativo em crise não era lesivo e nessa medida susceptível de recurso contencioso de anulação.

O ente recorrido notificado para os termos do presente recurso jurisdicional e para os do recurso contencioso não veio a apresentar quaisquer contra-alegações (cfr. fls. 98 a 110).

Recebidos os autos neste Tribunal, em 06/05/2004, foi dada vista ao Digno Magistrado do Ministério Público junto do mesmo tendo aquele emitido parecer no sentido do improvimento do recurso (cfr. fls. 115 e 115 v.).

Colhidos os vistos legais junto dos Exmos. Juízes-Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

*2.

DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, n.ºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” art. 102º da LPTA.

A questão suscitada reconduz-se, em suma, em determinar se ocorreu ou não violação dos normativos legais invocados pelo recorrente por parte da decisão jurisdicional objecto de impugnação quando esta decidiu rejeitar liminarmente o recurso contencioso deduzido com fundamento na irrecorribilidade do acto administrativo em questão por o mesmo não ser lesivo dado se tratar de um acto preparatório.

*3.

FUNDAMENTOS 3.1.

DE FACTO Da decisão recorrida e considerando os documentos juntos aos autos têm-se como provados com interesse para a decisão os seguintes factos: I) Em 30/07/2002 o Conselho Executivo da Escola Abade Baçal, de Bragança, procedeu à elaboração de “Mapa de situação e requisição de professores” referente ao 7º grupo do ensino secundário que enviou ao Ministério da Educação - DGAE para efeitos de preenchimento vagas postas a concurso na 2ª parte do concurso para o ano escolar de 2002/2003 - vagas para lugares do corpo docente do quadro de nomeação definitiva da escola que, por destacamento ou comissão de serviço, não estivessem preenchidas (cfr. fls. 35 dos autos); (ACTO RECORRIDO); II) O recorrente é professor do quadro de nomeação definitiva (7º Grupo) na Escola Secundária de Alijó desde o ano lectivo de 1994/1995, sendo que desde o ano lectivo de 1996, através do concurso de professores no abrigo da preferência conjugal, exerce funções docentes na Escola Secundária Abade Baçal, em Bragança, cidade onde a sua esposa é professora do quadro de nomeação definitiva na Escola Augusto Moreno.

3.2.

DE DIREITO Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise das várias questões suscitadas para se concluir pela procedência ou improcedência da argumentação desenvolvida pelo recorrente no recurso jurisdicional “sub judice”.

O recorrente insurge-se contra a decisão impugnada, que rejeitou o recurso contencioso por manifestamente ilegal (irrecorribilidade do acto administrativo em questão), nos termos dos arts. 25º da LPTA, 268º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 57º, § 4º, do RSTA, invocando, no essencial, estarmos na presença dum acto administrativo lesivo dos seus direitos e interesses e, nessa medida, susceptível de impugnação contenciosa.

Analisemos.

Segundo afirma o Prof. Freitas do Amaral nas suas lições “(...) o acto administrativo é o acto jurídico unilateral praticado por um órgão da Administração no exercício do poder administrativo e que visa a produção de efeitos jurídicos sobre uma situação individual num caso concreto. (...)” (cfr. “Direito Administrativo”, vol. III, Lx 1988, pág. 66).

Do art. 25º, n.º 1, da LPTA resulta a regra de que só os actos definitivos são contenciosamente impugnáveis.

O critério da recorribilidade acolhido na CRP após a revisão de 1989 (art. 268º, n.º 4) passou a ser o da lesividade de direitos ou interesses legalmente protegidos porquanto ali se passou a utilizar a expressão “(…) que lesem os seus direitos ou interesses protegidos (…)” em contraposição com o anterior texto constitucional que referia a este propósito a recorribilidade como a qualidade dos “actos administrativos definitivos” (cfr. o teor do n.º 2 da então redacção do art. 268º).

Apesar de alguns sectores doutrinários terem visto na reforma constitucional de 1989 a supressão da definitividade como atributo do acto recorrível (cfr. Prof. Vasco Pereira da Silva in: “Em Busca do Acto Administrativo Perdido”, Coimbra, 1996, pág. 668), implicando a inconstitucionalidade do art. 25º da LPTA e, também, da exigência do recurso hierárquico necessário, temos que não foi esse o entendimento dominante ao nível da doutrina e da jurisprudência (cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade, em “Em Defesa do recurso hierárquico – Anotação ao Acórdão n.º 499/96 do Tribunal Constitucional” in: Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 0 Novembro/Dezembro, 1996, págs. 13 e segs.).

Com efeito, o entendimento claramente maioritário estribou-se na seguinte argumentação.

O actual art. 268º, n.º 4, da CRP, consagra o direito dos administrados ao recurso contencioso de todos os actos administrativos que lesem os seus direitos ou interesses legalmente protegidos.

Tal normativo constitui um corolário, no âmbito do contencioso administrativo, do princípio geral, enunciado no n.º 1 do art. 20.º da CRP, do direito dos cidadãos a aceder aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.

Este direito, pese embora não englobado no Título II da Parte I da CRP, destinado aos «direitos, liberdades e garantias» é, inquestionavelmente, um direito análogo a estes, uma vez que constitui a primacial garantia da consagração prática de todos os direitos e liberdades, pelo que, por força do disposto no art. 17.º da CRP, que prevê que ”o regime dos direitos, liberdades e garantias aplica-se aos enunciados no título II e aos direitos fundamentais de natureza análoga”, o direito de acesso aos tribunais está sujeito ao disposto no n.º 2 do art. 18º que estipula que “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.

Nos casos de impugnação administrativa necessária, o acto inicial continua a ser recorrível mediatamente, através do acto que decide a impugnação administrativa, que o incorpora se o confirma (se não o elimina ou substitui, hipóteses em que, obviamente, deixa de ter relevância o acto inicial).

Nestes termos a limitação que o art. 25º, n.º 1, da LPTA faz ao direito de acesso aos tribunais só é compaginável com estas normas constitucionais se impuser a necessidade de recurso hierárquico em casos em que ele não seja obstáculo à garantia da tutela judicial dos direitos, mas não afaste a possibilidade do recurso contencioso imediato nos casos em que o interessado necessite dele para assegurar essa tutela, ou seja, este n.º 1 do art. 25º, só é compatível com o texto constitucional se entendido como contendo um condicionamento do direito ao recurso contencioso, afastando a...

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