Acórdão nº 1750/06 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelGARCIA CALEJO
Data da Resolução20 de Junho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I- Relatório: 1-1- (…) 1-2- A...

e B..., ambos com domicílio profissional no Lugar da Chave, Gafanha da Nazaré, propõem contra a C..., com sede na Av. João XXI, 63, Lisboa, a presente acção com processo ordinário, pedindo que seja declarada a nulidade da fiança constante do “Termo de Fiança” assinado por eles, AA., em 12.8.88 e que seja declarado que não devem à R. as importâncias para cuja cobrança coerciva a R., em 26.4.93, requereu, na Repartição de Finanças de Ílhavo, que fosse instaurada execução contra eles, AA..

Fundamentam este pedido, em síntese, dizendo que a presente acção surge na sequência do acórdão proferido pelo STA, onde se remeteu os recorrentes para os tribunais judiciais, ficando suspensos os autos de oposição à execução pendentes no Tribunal Tributário de Aveiro. Tais oposições foram instauradas porque os AA. foram executados, no âmbito de uma execução instaurada na Repartição de Finanças de Ílhavo, a solicitação da CGD. A C.G.D., ora R., alegou naqueles autos executivos, deter sobre os AA. um direito de crédito no montante de Esc.: 216.944.251$00 acrescido de juros vencidos até 05.03.93 no valor de Esc.: 140.086.426$00 e de juros vincendos calculados a partir daquela data à taxa actualizada de 23%. Nesse requerimento executivo, a CGD alega que concedeu a D..., um crédito à exportação mediante desconto de remessas documentarias de exportação e um financiamento em divisas de apoio à importação. Os ora AA. foram aí executados em virtude de se terem constituídos fiadores. Sucede que o documento por si assinado e designado como “termo de fiança” é nulo, por indeterminabilidade do objecto. É que todas as dívidas daquela sociedade, anteriores à data em que o documento foi subscrito, estão extintas pelo pagamento, razão por que também se encontra extinta qualquer eventual fiança com que os AA. tivesse garantido essas obrigações. O documento em causa só se pode reportar a obrigações posteriores a 12.8.1988, mas como se trata de uma fiança genérica ou de conteúdo indeterminado, terá de ser considerada como nula. No caso verifica-se, não só uma indeterminabilidade quanto à natureza e à origem das responsabilidades e obrigações assumidas, mas também que elas são temporal e quantitativamente ilimitadas, à data em que foi constituída a fiança. Ainda que não se considere nulo o termo de fiança prestado, sempre a referida fiança teria que ser declarada nula por consubstanciar uma limitação ilícita aos direitos de personalidade e, enquanto tal, ser contrária aos princípios da ordem pública. A referida limitação, resulta do facto de os AA. não poderem controlar o grau de endividamento da sociedade “afiançada”. As responsabilidades ilimitadas que para os autores derivariam da fiança em questão consubstanciariam uma limitação aos seus direitos de personalidade, limitação essa que seria contrária aos princípios da ordem pública constitucionalmente consignados e universalmente consagrados, assim como atentatórios da moral e dos bons costumes. Por último, caso sejam julgados improcedentes os argumentos anteriormente deduzidos, sustentam os AA. que não devem à R. as quantias que por esta foram alegadas nos autos de execução cuja instauração requereu. Isto porque em 9.11.1989, “D....” apresentou à ora R. uma proposta para regularização da dívida, que também abrangia o passivo de “E...”, a R. apresentou uma contra-proposta, em 23/11/89, que foi aceite. Em cumprimento do acordado, “D...” pagou à R. o total de Esc.: 309.000.000$00. Contudo, deixou de efectuar o pagamento das prestações acordadas, porque constatou que a R., ao contrário do acordado, estava a imputar os montantes entregues nos juros e não no capital. E, apesar de várias insistências para que a R. desse uma explicação, esta nunca a deu, não agindo segundo os ditames estabelecidos no art.º 227º do Código Civil 1-3- A R. contestou, referindo, também em síntese, alegando que os AA. são sócios fundadores da sociedade “D...”, tendo sido sempre com os AA., na qualidade de sócios gerentes daquela sociedade, que foram contratadas as operações de crédito à exportação mediante desconto de remessas documentárias de exportação. Também foi nessa qualidade que foram subscritos os “termos de fiança”. Foi, também, na gerência dos AA. e com conhecimento dos mesmos, que foram libertadas as verbas em cumprimento dos contratos de financiamento celebrados, bem como discutidos os valores da dívida. Conclui que é ilegítimo o direito que o autor pretende fazer valer quanto à natureza, origem e valor do crédito. Por outro lado, considera a R. que o “termo de fiança” foi subscrito com o objectivo de garantir, em concreto, as operações de crédito identificadas nos autos, das quais os AA. tinham um especial conhecimento. Logo, a posição aqui sustentada pelos AA. revela, pelo menos, uma situação de abuso de direito, que deverá conduzir, quando muito, a uma nulidade parcial da fiança prestada. Nenhum dos contraentes deixaria de celebrar os contratos caso os mesmos não estivessem garantidos por fiança para obrigações futuras. Finalmente, a R. afirma que se encontra em dívida, em 22.4.2002, a quantia de 3.513.115,22 euros, negando que tivesse existido um acordo quanto ao perdão de juros ou que as verbas entregues pela “D...” seriam imputadas prioritariamente em capital.

Termina pedindo a improcedência das acções.

1-4- Os AA. apresentaram articulado de réplica, respondendo às excepções invocadas pela R..

1-5- O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido despacho saneador ( onde se ordenou a apensação de acções já mencionada ), após o que se fixaram os factos assentes e a base instrutória, se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu ao questionário e se proferiu a sentença.

1-6- Nesta considerou-se improcedentes por provada as acções e, em consequência, absolveu-se a R. dos pedidos.

1-7- Não se conformando com esta sentença, dela vieram recorrer os AA., recurso que foi admitido como apelação e com efeito devolutivo.

1-8- Os recorrentes alegaram, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:(…) Termos em que deve ser a sentença recorrida declarada nula, por omissão de pronúncia. Em todo caso deverá ser revoga e substituída por outra que julgue procedentes as acções intentads pelos recorrentes contra a recorrida.

1-9- A parte contrária respondeu a estas alegações sustentando o não provimento do recurso e a confirmação da decisão recorrida.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir: II- Fundamentação: 2-1- Após as respostas à matéria de facto da base instrutória, ficaram assentes os seguintes factos:(…) 2-2- Uma vez que o âmbito objectivos dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos apenas as questões que ali foram enunciadas ( arts. 690º nº1 e 684º nº 3 do C.P.Civil ).

Compulsando tais conclusões, verifica-se que foram as seguintes questões que os apelantes colocaram a este Tribunal, para apreciação: - Alteração da matéria de facto.

-Nulidade da sentença por omissão de pronúncia e falta de fundamentação.

- Nulidade das fianças por indeterminabilidade do seu objecto.

- Nulidade das fianças por consubstanciarem uma limitação ilícita aos direitos de personalidade dos AA. e serem contrárias aos princípios de ordem pública.

- Ausência de prova da dívida dos AA. à R..-------------- 2-3- No que toca à alteração da matéria de facto, os apelantes sustentam que, ao contrário do que foi decidido e quanto ao processo principal, deveriam ter sido julgado provados os pontos nºs 1, 5, 6, 7, 8, 9 e 10 da base instrutória e que deveriam ter sido julgados não provados os pontos 14 e 27 da mesma base instrutória. Já no que concerne aos autos apensos, os recorrentes consideram que, ao contrário do que foi decidido, deveriam ter sido julgado provados os pontos nºs 4 e 5 da base instrutória e que deveria ter sido julgado não provado o ponto 6 da mesma base instrutória.

No pontos 1, 5, 6, 7, 8, 9 e 10 da base instrutória do processo principal, indagava-se se “a R. nunca comunicou ao A. os factos que lhe permitiam concluir pela existência dos créditos alegados no processo de execução identificado em B)”( ponto 1), se “quando faltavam quatro prestações para o integral pagamento da dívida da “D...”, esta empresa verificou, pela análise das contas apresentadas pela R. que, contra aquilo que havia sido...

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