Acórdão nº 1345/04 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Abril de 2004
Magistrado Responsável | DR. AGOSTINHO TORRES |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO CRIMINAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA I-RELATÓRIO 1.1- Por despacho de 5.03.2004 do Ex. Juiz do TIC de Coimbra, foi solicitada a este Tribunal da Relação a dispensa de sigilo bancário, nos termos incidentais previstos no artº 135º nº 3 do CPP.
1.2- Tal pedido surge na sequência de uma investigação criminal efectuada em inquérito (nº3366/03.7PCCBR) por queixa de BB, idº nos autos, contra desconhecidos com base em factos relativos a subtracção do interior de uma carteira sua porta documentos de cartões multibanco das agências BPI e CGD e que foram usados através de efectivação de movimentos tendo o denunciante sofrido prejuízo patrimonial no valor de 2.303,50 Euros.
1.3- Na sequência dessa investigação, apurou-se que em 2.12.2003 fora indevidamente transferida da conta que o denunciante tem no BPI a quantia de 1500 euros para a conta nº KK do Banco Totta-agência do Mindelo.
1.4- Solicitada informação a esta instituição no sentido de indicar quem eram os titulares da aludida conta para a qual foi feita aquela transferência e o envio da correspondente ordem de transferência com localização da mesma, o BTA recusou fornecer os dados pedidos invocando estarem as questões suscitadas no âmbito do segredo bancário e nos termos do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.
1.5- Face a tal recusa do BTA em prestar as ditas informações e porquanto entende serem elas relevantes e imprescindíveis à investigação dos ilícitos criminais por furto e burla informática, o sr juiz de instrução entende estar justificada a quebra do sigilo bancário e abriu o presente incidente nos termos do artº 135 nº 3 do CPP, por despacho de 16.03.04 que consta dos autos a fls 16.
1.6- Nesta Relação o Sr Procurador Geral adjunto emitiu parecer no sentido da autorização pretendida.
II- ANALISANDO A QUESTÃO 2.1- De acordo com o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro Este diploma encontra-se integralmente publicado em versão consolidada , em anexo ao DL 201/02 de 26 de Setembro. Sofreu anteriormente alterações pelos Decretos Lei : 246/95 de 14 Setº; 232/96 de 1 5 de Dezº; 229/99 de 22 de Junho; 250/00 de 13 Outº; 285/01 de 3 Novº e 201/02 de 26 Setº, há pouco aludido.
: .../...
Artigo 78.º (Dever de segredo) 1 - Os membros dos órgãos de administração ou de fiscalização das instituições de crédito, os seus empregados, mandatários, comitidos e outras pessoas que lhes prestem serviços a título permanente ou ocasional não podem revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços.
2 - Estão, designadamente, sujeitos a segredo os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias.
3-O dever de segredo não cessa com o termo das funções ou serviços.
Artigo 79.º Excepções ao dever de segredo 1 - Os factos ou elementos das relações do cliente com a instituição podem ser revelados mediante autorização do cliente, transmitida à instituição.
2 - Fora do caso previsto no número anterior, os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo só podem ser revelados:
-
Ao Banco de Portugal, no âmbito das suas atribuições; b) À Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, no âmbito das suas atribuições; c) Ao Fundo de Garantia de Depósitos e ao Sistema de Indemnização aos Investidores, no âmbito das respectivas atribuições; d) Nos termos previstos na lei penal e de processo penal; e) Quando exista outra disposição legal que expressamente limite o dever de segredo.
Artigo 80.º Dever de segredo das autoridades de supervisão 1 - As pessoas que exerçam ou tenham exercido funções no Banco de Portugal, bem como as que lhe prestem ou tenham prestado serviços a título permanente ou ocasional, ficam sujeitas a dever de segredo sobre factos cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exercício dessas funções ou da prestação desses serviços e não poderão divulgar nem utilizar as informações obtidas.
2 - Os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo só podem ser revelados mediante autorização do interessado, transmitida ao Banco de Portugal, ou nos termos previstos na lei penal e de processo penal.
2.2- Os artigos 78.º e 79.º do Decreto-Lei n.º 298/92, de 31/12, regulam pois o regime substantivo do dever de segredo bancário e suas excepções.
O regime penal consta dos artigos 195.º a 198.º do Código Penal e o regime do processo penal consta dos artigos 135.º, 181.º e 182.º, do CPP.
Da conjugação destas disposições resulta que o artigo 79.º do Decreto-Lei 298/92, ao consagrar uma enumeração taxativa das excepções ao dever de segredo bancário, impõe que para além dos casos previstos na lei, apenas seja possível quebrar o segredo mediante incidente, em que se afira do interesse preponderante ou prevalecente.
O caso dos autos, dizendo respeito ao conhecimento de conteúdo de conta e movimentos bancários no BTA sendo os elementos indiciários a investigar subsumíveis a crime de furto e burla informática, não se encontra coberto por lei especial.
Não tendo havido viabilidade da obtenção do consentimento do titular do interesse protegido ( ele (a) mesmo possível arguido(a) no processo), porquanto nem sequer é conhecido por causa da ausência daquela informação, enquadra-se nesta última hipótese.
Estamos desde logo colocados formalmente perante uma interpretação dos artigos 135.º, n.ºs 2 e 182.º, n.º 1, do CPP, que se traduz em permitir ao juiz de instrução aferir do interesse preponderante na obtenção de prova, em matéria sujeita a segredo profissional, do tipo bancário, e se encontra previsto sob a forma de incidente a conhecer pelo tribunal superior, nos termos do artigo 135.º, n.º 3, do CPP, e também, quanto a documentação bancária, por remissão feita para aquele dispositivo, no artigo 182.º, n.º 2, do mesmo.
Face a estes dispositivos é pois de aceitar ser de julgar que só o tribunal superior àquele onde o incidente foi suscitado pode pronunciar-se directamente sobre a existência ou não de fundamento de quebra de sigilo.
Com efeito quando seja invocado o direito de escusa, a autoridade judiciária poderá tomar uma das seguintes atitudes: Ac do STJ- 6 de Fevereiro 2003 .
( cfr Ac do STJ- 6 de Fevereiro 2003) mutatis...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO