Acórdão nº 4134/05 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Fevereiro de 2006 (caso NULL)
Magistrado Responsável | CURA MARIANO |
Data da Resolução | 07 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Autora (apelada): A...
Ré (apelante): B...
* A Autora propôs a presente acção, com processo ordinário, peticio-nando o seguinte: - se declare a resolução do contrato de locação e compra e venda cele-brado entre a Autora e a Ré em 20 de Fevereiro de 2002, titulado por documento junto aos autos; - se declare que a Autora é a legítima dona da Estação de Tratamento de Águas Primárias que foi objecto daquele contrato; - se condene a Ré a reconhecer este direito; - se condene a Ré a restituir à Autora aquela Estação de Tratamento de Aguas Primárias, com todos os equipamentos que dela fazem parte integrante, entregando-a à Autora no estado em que a mesma se encontra e permitindo, para a concretização desta entrega, a entrada nas suas instalações de uma equipa de mecâ-nicos contratada pela Autora, para a desmontagem e retirada da mesma Estação de Tratamento de Aguas Primárias; - se condene a Ré a pagar à Autora uma indemnização de € 58.726,50, pelos prejuízos que causou à autora pelo não cumprimento do contrato celebrado, sendo € 22.726,50, a título de danos emergentes e € 36.000,00, a título de lucros cessantes, quantia aquela acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação até integral pagamento; - se condene a Ré a pagar à Autora a indemnização que se liquidar em execução de sentença, pelos danos que a Estação de Tratamento de Aguas Primá-rias apresentar no momento em que for entregue à Autora, resultantes das deterio-rações sofridas e a que a Ré deu causa; - se compense o montante de € 5.000,00, recebido pela Autora, da Ré, correspondente à primeira prestação do contrato celebrado, com a indemnização que for atribuída à Autora no âmbito deste pedido; - se condene a Ré numa sanção pecuniária compulsória, nos termos do artigo 829°-A, do Código Civil, não inferior a € 1.000,00, por cada dia de atraso na restituição à Autora da Estação de Tratamento de Águas Primárias, restituição essa que só se concretizará com a permissão de entrada nas suas instalações de uma equipa de mecânicos contratada pela Autora, para a desmontagem e retirada da mesma Estação de Tratamento de Aguas Primárias.
Para tanto, alega, em resumo, o seguinte: - acordou com a Ré, fornecer-lhe e proceder à instalação de uma Estação de tratamento de águas primárias, pelo preço de € 120.000,00, tendo acordado, posteriormente, dadas as dificuldades financeiras da Ré, na celebração de um contrato escrito, que denominaram de locação e compra e venda, titulado por 12 letras de câmbio, 11 delas no valor de € 5 000.00 e a derradeira no valor de € 65.000,00, sendo que a propriedade do equipamento seria da Autora até ao pagamento final, tendo-se, então procedido ao fornecimento da estação, montada numa estru-tura metálica, constituindo uma máquina individualizada, perfeitamente amovível e transportável, para cujo funcionamento bastaria a instalação sobre um simples maciço de betão e a realização das respectivas ligações eléctricas e hidráulicas, a cargo da Ré; - no entanto, a Ré não cumpriu o contrato, tendo as 2 primeiras letras de câmbio, sido devolvidas por falta de pagamento, o que originou despesas, suporta-das pela Autora, tendo vindo, depois, a ser paga a primeira daqueles letras, não mais tendo sido paga qualquer das restantes, o que conduziu à celebração de um novo acordo de pagamento, que igualmente, não foi cumprido pela Ré, tendo, então, a Autora comunicado àquela que lhe não restava outra alternativa senão a de retirar a estação, solicitando-lhe autorização para aceder às instalações da Ré onde estava aquela instalada, para proceder à sua desmontagem e retirada para Itália, tendo contratado pessoal para o efeito e informando a Ré da data em que pretendia fazer tal tarefa; - mas a Ré não veio a permitir a entrada da equipa contratada, nem em qualquer outra ocasião, pelo que não restou outra alternativa, que não fosse a de instaurar a presente acção a pedir a resolução do contrato e a restituição da estação, pretendendo, ainda, ser indemnizada, para alem das despesas bancárias já referidas, do valor do transporte da estação para as instalações da Ré e agora para Itália, do custo da mão de obra que suportará com a desmontagem da estação, das despesas com a presente acção judicial e, ainda do que deixou de ganhar por não ter tido acesso à estação, por ter perdido a oportunidade de a negociar, entretanto surgida, pretendendo, finalmente, se fixe uma sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso na restituição do equipamento.
A Ré apresentou contestação, alegando o seguinte: - o contrato foi celebrado por 2 administradores sem que tenha sido dis-cutido no Conselho de Administração; - o contrato celebrado é um contrato de compra e venda, com reserva de propriedade, dissimulado de locação; - a cláusula de reserva de propriedade torna-se ineficaz logo que se con-cretize a instalação da estação de tratamento, pelo que só tem a pagar o preço da estação, abatido da parcela que já pagou, acrescido de juros; - como não é este o pedido, não pode ser condenada a pagar o preten-dido pela Autora.
Na réplica a Autora propugna por que, seja qual for a qualificação jurí-dica do contrato, o certo é que, como dele resulta, as partes acordaram em que a propriedade dos equipamentos ficava a pertencer à Autora até ao pagamento da ultima prestação, o que de resto foi determinante para a contratação, por parte desta, cláusula que é válida e eficaz, o que não é sequer prejudicado pela natureza dos equipamentos, que não estão integrados no imóvel da Ré, sendo amovíveis e podendo ser facilmente levantados.
Termina por concluir pelo abuso de direito da Ré ao invocar a invalidade da dita cláusula de reserva de propriedade, devendo esta ser condenada como litigante de má fé, em multa e indemnização de valor não inferior a € 10.000,00.
A Ré, defendeu, não ter viabilidade esta última pretensão por não ter deturpado nenhum facto, não colocando em causa a verdade.
Após a realização da audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou a acção do seguinte modo: “- se declara a resolução do contrato celebrado entre a Autora e a Ré em 20 de Fevereiro de 2002; - se declara que a Autora é a legítima dona da Estação de Tratamento de Águas Primárias que foi objecto daquele contrato e de todos os elementos que fazem parte integrante da mesma; - se condena a Ré a reconhecer este direito; - se condena a Ré a restituir à Autora aquela Estação de Tratamento de Aguas Primárias, com todos os equipamentos que dela fazem parte integrante, entregando-a à Autora no estado em que a mesma se encontra e permitindo, para a concretização desta entrega, a entrada nas suas instalações de uma equipa de mecâ-nicos contratada pela Autora, para a desmontagem e retirada do equipamento; - se condena a Ré a pagar à Autora: a quantia que se vier a apurar, posteriormente, relativamente ao valor, despesas, suportado pela Autora com a devolução das letras que apresen-tou a pagamento ao Banco Comercial Português; a quantia equivalente a € 5.000,00, relativamente ao transporte da Esta-ção de Tratamento de Águas Primárias de Itália para as instalações da Ré e destas, novamente, para Itália; a quantia equivalente a € 2.500,00, relativamente aos custos da mão-de-obra para proceder à desmontagem da Estação de Tratamento de Águas Primárias, de modo a colocá-la em condições de poder ser retirada em segurança para Itália; a quantia que se vier a apurar posteriormente, que a Autora despendeu com a presente acção judicial; a quantia que se vier a apurar, posteriormente, relativa ao valor dos eventuais danos que a Estação de Tratamento de Aguas Primárias apresentar no momento em que for entregue à Autora, resultantes das deteriorações sofridas; a quantia equivalente a € 36.000,00, a título de lucros cessantes; sobre o valor da indemnização presente e liquidada, efectuada a com-pensação, pagará a Ré juros de mora à taxa legal, hoje de 12%, desde a citação, ocorrida a 27.03.2003, até integral e efectivo pagamento.
- se compensa o montante de € 5.000,00, recebido pela Autora da Ré, correspondente à primeira prestação do contrato celebrado, com a indemnização que vem de ser atribuída; - se condena a Ré na sanção pecuniária compulsória, de valor equivalente a € 250,00, por cada dia em que a Ré impeça a Autora de iniciar, da forma que lhe aprouver, a desmontagem do equipamento”.
Desta sentença interpôs recurso a Ré, alegando o seguinte: “- Uma estação de tratamento de águas e como um puzzle que só tem sentido no seu conjunto, mas que, quer as partes, quer o todo, são - ou podem ser - alienados pelo fornecedor.
- Todavia, o que dá o toque especifico ao contrato e a montagem do puzzle, é pôr o conjunto a funcionar; - A estação de tratamento de águas integrada num edifício fabril por causa deste e para complemento deste torna-se tão do proprietário do imóvel de que faz parte tal como qualquer outro elemento seja componente ou integrante do imóvel, haja a responsabilidade que houver perante o seu fornecedor .
- A cláusula de reserva de propriedade convencionada em contrato de fornecimento e a instalação de uma estação de águas primárias em prédio urbano destinado a unidade industrial torna-se ineficaz logo que se concretize a respectiva instalação.
- A douta sentença em causa viola o disposto nos 1.207°, 405° e 409º do Código Civil, bem como o disposto no Assento do Supremo Tribunal de Justiça (Tribunal Pleno), processo 87495, de 31 de Janeiro de 1996, publicado no BMJ.” A Autora apresentou contra-alegações em que pugnou pela manutenção do decidido.
* OS FACTOS Neste processo provaram-se os seguintes factos: I - A Autora é uma sociedade comercial italiana que se dedica ao pro-jecto e fornecimento de Estações e Tratamento de Águas e Efluentes, exercendo a sua actividade em Portugal através de um seu Representante, com delegação na cidade do Porto (alínea A dos factos assentes).
II - Em 19 de Abril de 2001, a Ré encomendou à Autora, através do Representante em Portugal desta...
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