Acórdão nº 2042/05 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Outubro de 2005
Magistrado Responsável | T |
Data da Resolução | 18 de Outubro de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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RELATÓRIO.
Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra.
A..., residente na Rua dos Maceiros, São João do Campo, Coimbra, veio intentar contra B...
, residente na Rua Bernardo Santareno, 201, r/ch esq., Santa Apolónia, Coimbra, a presente acção com processo ordinário, pedindo que se profira sentença destinada a substituir a declaração negocial da Ré, considerando-se transferida por esta para o Autor, o direito ao usufruto vitalício sobre o prédio urbano inscrito na respectiva matriz sob o artigo 935º da freguesia de São João do Campo, Coimbra.
Alega, em súmula, que está divorciado da Ré, por sentença de 20.9.99. Tinha celebrado com aquela um contrato-promessa de partilha, segundo o qual seria constituído a seu favor o usufruto vitalício do prédio referido.
A Ré contesta, excepcionando a nulidade do contrato-promessa de partilha e aduzindo que não assinou o contrato em causa, com ele se não obrigou e, por isso, não pode haver lugar à execução específica.
Nos demais articulados as partes mantêm as mesmas posições.
Dispensada a audiência preliminar, é proferido despacho saneador-sentença que declarou a nulidade do contrato. Interposto recurso, veio a ser revogado com a determinação do prosseguimento dos autos. Fixados os factos assentes e organizada a base instrutória, com reclamação não atendida, teve lugar a audiência de julgamento e o tribunal respondeu à matéria de facto controvertida nos moldes exarados a fls. 340 a 342, sem reclamação.
Foi proferida de novo sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré do pedido.
Daí o presente recurso de apelação interposto pelo Autor o qual no termo da sua alegação pediu que se revogue a sentença apelada, reconhecendo-se o peticionado direito do Autor declarando-o constituído.
Foram para tanto apresentadas as seguintes, Conclusões.
1) Autor e Ré, nos preliminares do seu divórcio, negociaram e acordaram quanto à partilha do seu casal, tendo sido reduzido a escrito o concernente contrato-promessa pela mandatária e irmã desta; 2) Também de comum acordo, em perfeita correspondência com o exarado neste contrato, celebraram escritura de partilha, que ambos outorgaram, da parte correspondente à meação da Ré; 3) A Ré recusou-se a celebrar a escritura destinada à constituição do usufruto, a favor do Autor, tendo por objecto a casa de S. João do Campo, o qual ficaria a preencher a sua meação nos precisos termos do estabelecido no contrato.
4) A Ré veio opor-se à execução específica deste contrato, deduzida nesta acção, tendo vindo afirmar, por um lado, que não assinou o contrato, e arguiu por isso a sua nulidade e, por outro lado, ao ser instada a apresentá-lo, para prova deste facto por ela alegado, veio dizer que não o tinha para apresentar, por lhe ter perdido o rasto o ter inutilizado.
5) A Ré concordou com o contrato, e tanto assim é que, em perfeita sintonia com o seu conteúdo, aceitou dar-lhe execução, e daí o normal seria que o tivesse efectivamente assinado e não o contrário; 6) Aliás, não logrou a Ré provar nem convencer que o não assinou, razão por que, esta pretensa omissão, impeditiva do direito do Autor, não pode relevar em seu favor, antes pelo contrário, na dúvida, deve o facto ser considerado como constitutivo do direito, - artº 342º nº 3 do Código Civil; 7) O documento (contrato-promessa), destinado a provar o direito do Autor, que confessadamente se encontrava em poder da Ré, esta, ao ser notificada nestes autos para o apresentar, veio dizer que não o tinha para apresentar e, assim, no mínimo culposamente, tornou impossível ao Autor a prova desta controvertida questão, por ela suscitada da falta da sua assinatura. (sic).
8) Nestas circunstâncias, em abono da verdade material, era imperioso que fosse a Ré a provar o que alegou, com todas as consequências, sob pena de se cometer grave como irreparável injustiça, traduzida em ter revertido a dúvida a favor da parte faltosa e, deste modo, ter sido beneficiada a infractora; 9) Impunha-se, por isso, inverter o ónus da prova, por forma a ser a Ré a ter de provar o vício que apontou ao contrato, como até apresentar o documento que o titula, mas tendo-se eximido a estes deveres que sobre ela impendiam, nada permite concluir que o elaborado contrato não esteja por ela assinado, - ex vi do disposto no Artº 530º nº 2 do C. P. Civil e 344º nº 2 do C6digo Civil; 10) Acresce que, a Ré, como se alcança da factualidade apurada, concordou com o contrato e dispôs-se a dar-lhe execução, ao ponto de, por uma das prometidas escrituras, que foi por ela outorgada e pelo Autor, logo ter recebido a sua meação composta por um bem imóvel e assumiu, além do mais, a obrigação do pagamento de um passivo à Caixa Geral de Depósitos; 11) O Autor confiou, obviamente, ao outorgar aquela escritura em proveito da Ré, que também esta, conforme o prometido, outorgaria em seu favor a escritura relativa ao usufruto da casa de S. João do Campo, para preenchimento do seu quinhão; 12) A Ré, por intermédio da sua mandatária, marcou e desmarcou esta escritura, que visava, no essencial, a constituição deste usufruto a favor do Autor, mas recusou-se depois a celebrar esta escritura e, ao arrepio de tudo o acordado e concretizado requereu um inventário; 13) Ao dar este lesto passo em frente, dando o dito por não dito, enveredou por aventureiro trajecto, ao afirmar que não concordou com o contrato e que não o assinou, culminando com a expedita afirmação de que não o tinha para apresentar, tudo isto, como se provou, em chocante contradição com o concreto comportamento que assumiu, acompanhado pela sua mandatária; 14) Esta comprovada conduta da Ré é eticamente deplorável, desde logo ao invocar a falta da sua assinatura, quando esta falta só a ela se deve; ao arguir este pretenso vício do contrato e obstar ao mesmo tempo à sua apresentação, impossibilitando esta prova; ao recusar-se a cumprir o contrato depois de ter arrecadado o direito à sua meação, sem que, então, a falta da sua assinatura tivesse sido por ela invocada; 15) É, pois, manifesto como chocante o "abuso do direito" exercido pela Ré, ao arguir, nestes termos, um tal vício formal do contrato, que mais não é do que "venire contra factum proprium", como é doutamente salientado no parecer junto e pela Jurisprudência que o abona; 16) Deste modo, deverá considerar-se como válido e eficaz o contrato, ainda que porventura, não tivesse sido assinado pela Ré, por lhe estar vedado in casu, arguir a sua nulidade, sendo a sua pretensão ilegítima, por abusiva; 17) Ao não entender assim, a sentença recorrida violou as regras dos artsº 530º nº 2 do C. P. Civil e 344º nº 2 e 334º nº 2 do Código Civil.
O Apelante juntou aos autos douto Parecer do Prof. Calvão da Silva. Contra-alegou a apelada pugnando pela confirmação da sentença.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
* 2. FUNDAMENTOS.
O Tribunal deu como provados os seguintes, 2.
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Factos.
2.1.1. O Autor e a Ré acordaram no divórcio, por mútuo consentimento, tendo o casamento sido dissolvido por decisão proferida a 20 de Setembro de 1999 pela Conservatória do Registo Civil de Coimbra, com trânsito em julgado (doc. fls. 13 a 22) (a).
2.1.
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Foi este processo de divórcio instruído com os acordos relativos ao destino da casa de morada de família e uma relação de bens comuns do casal, documentos subscritos pelo Autor e pela Ré bem como pela Drª Celeste Dias Cardoso, advogada, na qualidade de mandatária da Ré e sua irmã, que elaborou e organizou este processo (doc. fls. 13 a 22)...
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