Acórdão nº 3480/03 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Maio de 2004

Magistrado ResponsávelDR. JORGE ARCANJO
Data da Resolução25 de Maio de 2004
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

APELAÇÃO nº3480/03 ( 3ª Secção Cível ) Relator – Jorge Arcanjo Adjuntos – Isaías Pádua Cardoso Albuquerque Acordam no Tribunal da RELAÇÃO DE COIMBRAI – RELATÓRIO 1.1. - Os Autores 1) – AA e esposa BB; 2) - CC ( por intervenção principal ); – instauraram, no Tribunal Judicial da Comarca da GUARDA, a presente acção declarativa, com forma de processo sumário, - contra os Réus: 1) - DD, com sede em Lisboa; 2) - CENTRO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL DA GUARDA, com sede na Guarda; 3) - EE.

Os 1ºs Autores alegaram, em resumo: No dia 04 de Novembro de 1993, pelas 17 horas, o Autor encontrava-se no seu local de trabalho, na Estrada de Alfarazes na Cidade da Guarda, altura em que foi embatido pelo veículo de matrícula KK, conduzido pela Ré EE, por conta, no interesse e sob a direcção do seu proprietário, o Réu Centro de Assistência Social da Guarda.

O acidente ocorreu por culpa exclusiva da condutora do veículo, que circulava a grande velocidade, numa descida acentuada e por falta de destreza e perícia deixou que as rodas do veículo invadissem a berma, atrapalhando-se, pelo que acelerou ainda mais e, incapaz de dominar o veículo, guinou para a sua direita indo embater contra um monte de areia de aproximadamente 1 metro de altura, não tendo conseguido parar o veículo, atenta a velocidade que levava, indo embater numa betoneira que se encontrava à frente da areia, arrastando-a cerca de seis metros e indo embater, violentamente, com tal betoneira contra o Autor.

Em consequência do acidente, do acidente resultaram danos patrimoniais e não patrimoniais para o Autor e sua esposa.

Pediram a condenação dos Réus a pagar aos Autores a quantia global de 898.227,27 € (180.078.400$00), acrescida de juros à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento.

A 2ª Autora alegou, em síntese: No momento do acidente, o 1º Autor trabalhava para FF que celebrou com a interveniente contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho.

Na qualidade de seguradora do trabalho, para reparação dos danos que o Autor sofreu, pagou a quantia de 7 454, 43 € (1.494.479$00), de tratamentos e assistência no Hospital da requerente, 10 056,91 € (2.016.230$00) de tratamentos e assistência em Hospitais externos, 4 119, 06 € (825.795$00) em transportes, 5 318, 65 € (1.066.293$00) de indemnização por Incap. Total Absoluta de 05/11/93 a 30/01/95.

Por outro lado tendo sido atribuída ao Autor, em resultado do acidente dos autos, uma ITA para a profissão e uma ITP de 0,7084, ficou sob o encargo da mesma o pagamento de uma pensão vitalícia de 369, 64 € (74.106$00.) Com tal pagamento ficou a requerente sub-rogada nos direitos do sinistrado contra os responsáveis pelo acidente dos autos.

Pediu a condenação dos Réus a pagarem-lhe a quantia de 34.341,84 € (6.884.920$00), que posteriormente ampliou para 44.691,73 € (8.959.888$00) e, posteriormente, em audiência de julgamento de 8/03/02 para 61.368,57 € (12 303 294$00).

Contestou apenas a Ré DD, sustentando a responsabilidade pelo risco na produção do acidente e impugnou os danos reclamados.

No saneador afirmou-se a validade e regularidade da instância.

1.2. - Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, na parcial procedência da acção, decidiu: a) - Absolver os Réus Centro de Assistência social da Guarda e EE dos pedidos contra eles formulados.

  1. - Absolver a Ré DD, S.A do pedido contra ela formulado pela Autora BB.

  2. - Condenar a Ré a pagar: - Ao autor Aa a quantia de 3.903,64 €, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal que neste momento é de 7%, contados desde esta data, até efectivo e integral pagamento.

    - À interveniente CC, S.A a quantia 26.903,24 €, acrescida de juros à taxa legal de 10% desde a citação e até 17/04/99 e à taxa 7 %, desde essa data e até efectivo e integral pagamento.

  3. - Absolver a Ré dos restantes pedidos contra ela formulados.

  4. - Custas pelos Autores, interveniente e Ré na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que os Autores beneficiam.

    1.3. - Os Autores JOAQUIM QUELHAS e esposa, e a Ré DD interpuseram recurso de apelação.

    1.3.1. - Recurso dos AUTORES – conclusões: 1º) - De acordo com a prova produzida em juízo e a experiência e o senso comum, conforme acima exposto, deve ser alterada a resposta aos quesitos 60, 61 e 62°, dando--se os mesmos como não provados.

    1. ) - Do mesmo modo, deve ser alterada a resposta dada aos quesitos 5°, 60, 27°, 28°, 30° e 40° (este último provado documentalmente, sem oposição a esses documentos) dando-se os mesmos por provados.

    2. ) - Sempre com o mesmo fundamento deve ser alterada a resposta aos quesitos 31° a 39°, à excepção dos montantes neles referidos, que deverão ser calculados segundo um prudente juízo de equidade.

    3. ) - Assim sendo, não há dúvidas que a culpa do acidente coube inteiramente à sua condutora que se despistou e em consequência foi atingir o recorrente que se encontrava no passeio.

    4. ) - A admitir-se que os Réus conseguiram provar que o acidente se ficou a dever à falta de travões sempre será de considerar que a condutora do veículo foi a única culpada do acidente.

    5. ) - Desde logo não há qualquer prova (nem se encontra alegado) que a co-Ré Armandina tenha primeiro tentado, como lhe impunham as regras, travar com o travão de estacionamento, que, nos termos da lei (e dos depoimentos prestados, mesmo pelas testemunhas arroladas pela Ré), deveria estar em bom estado.

    6. ) - Do mesmo modo os Réus não alegaram (e consequentemente também não provaram) que alguma vez a condutora tenha tomado precauções para a descida, designadamente travando com o motor, ou seja através das mudanças.

    7. ) - E isto não obstante, como se disse na al. B) da especificação, a estrada ter uma descida muito acentuada e o veículo em causa ser um veículo ligeiro com quase 20 anos e ir em claro excesso de lotação, violando todas as regras de prudência.

    8. ) – Com efeito, era da mais elementar prudência que, perante as circunstâncias, a condutora do veículo tivesse reduzido a velocidade com o auxílio do motor, engrenando uma mudança mais baixa, para, assim, ter a certeza de mais facilmente controlar o veículo.

    9. ) - Isto é, estamos, claramente, perante a falta de um cuidado, de uma precaução, que o dever geral de previdência aconselha e que, sem dúvida, a condutora do veículo poderia e deveria ter.

    10. ) - Acresce que, havendo, como há, no caso em apreço um presunção de culpa, o simples facto de se provar (o que se admite sem conceder) que os travões (e logo os dois?) deixaram de funcionar, não é suficiente para excluir a presunção de culpa.

    11. ) - Não foi alegado, nem demonstrado, que, como estipulava expressamente a lei na altura do acidente, o veículo em causa circulava com os sistemas de travagem (que deviam ser dois) em perfeito estado de conservação.

    12. ) - Aliás os Réus, embora pedido expressamente, foram incapazes de juntar aos autos a documentação referente à inspecção obrigatória a que estava sujeito o veículo.

    13. ) - A presunção contida no art° 503° n° 3 do C. Civil, para além das regras atinentes à condução de veículo, visa ainda e fundamentalmente, assegurar que estes circulem em condições de segurança e funcionamento.

    14. ) - Ora, não há dúvidas que os réus não conseguiram, quanto às condições de segurança e funcionamento do veículo, designadamente no respeitante aos seus órgãos de travagem, fazer qualquer prova de que este se encontrava nas devidas condições, não tendo, deste modo, afastado a presunção de culpa que sobre eles pendia.

    15. ) - A simples existência de “força maior”, não é suficiente para afastar a presunção de culpa vertida no art° 503°, n° 3 do Cód. Civil, é necessário que essa “força maior” se mostre estranha ao funcionamento do veículo.

    16. ) - Sendo que, a manutenção do veículo em condições de segurança para poder circular na via pública é da responsabilidade quer do comissário, quer do comitente.

    17. ) -- A falta de travões, por razão que se desconhece em absoluto, nunca poderá ser entendida como estranha ao funcionamento do veículo.

    18. ) - Existe uma contradição entre o art° 6° do DL 522/85 (no caso em apreço com a redacção do DL 18/93) e o art° 508 nº1 do Código Civil.

    19. ) - Salvo o devido respeito, perante a contradição existente entre aquele preceito e o art° 508°, do Código Civil, é de considerar, segundo a melhor interpretação, de com recurso ao próprio texto da Directiva 84/05/CEE do Conselho, de 30/12/83, que aquele Diploma visa aplicar, que o art° 508°, n° 1 do Código Civil, se encontra revogado.

    20. ) - O valor dessa indemnização deve ser estabelecido próximo do montante peticionado de Esc,: 109.564.000$00 (actualmente 546.502,93 €).

    21. ) - Os danos morais sofridos pelo Autor marido, sujeito a um estado de facto de tretaperésia, com incapacidade quase total, são elevadíssimos, devendo ser computados, segundo um prudente juízo de equidade, perto do montante peticionado de 60.000 000$00 (actualmente 299.278,73 €).

    22. ) - Salvo melhor opinião, é claro que, no caso em apreço, que a apelante mulher, em consequência do acidente, sofreu evidentes danos de natureza patrimonial e danos resultantes da violação de direitos próprios, e não meramente reflexos dos danos e lesões sofridas pelo autor marido, que, portanto, são indemnizáveis, nos termos do art° 483° do Código Civil.

    23. ) - Desde logo como se deu por provado como acompanhante (“em permanência a enfermeira do seu marido”), para o resto da sua vida.

    24. ) - Deixou de exercer uma vida sexual normal, “condenada a um estado de viuvez sem ser viúva “, e impediu-a de “constituir família mediante uma plena comunhão de vida “.

    25. ) - Pelo que, por todo o exposto, sempre com o devido e merecido respeito, é de entender que a indemnização pedida de Esc.: 10 000 000$00 (actualmente 49 879,79 €), para a apelante mulher, considerando os danos patrimoniais e não patrimoniais directamente sofridos, presentes e futuros, é inteiramente devida.

    26. ) - Valor esse a que deverá acrescer o montante de Esc.: 4.900$00 (actualmente 24,44 €), conforme resulta da...

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