Acórdão nº 2/05-1 de Tribunal da Relação de Évora, 01 de Março de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelF. RIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução01 de Março de 2005
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, precedendo conferência, na Relação de Évora:I1. E.V. apresentou queixa-crime contra S.G. e P.B. imputando-lhes a prática de factos que na sua perspectiva integravam um crime de ameaças, um crime de injúrias, um crime de ofensa à integridade física qualificada e um crime de abuso de poder, p. e p, respectivamente, pelos art. 153 n.º2, 181 n.º1 e 184, 146 e 382, todos do Código Penal.

  1. Posteriormente veio a constituir-se assistente.

  2. Findo o inquérito, o Digno Magistrado do M.º P.º, por entender que não existiam indícios nos autos que permitissem afirmar com um grau de certeza razoável que os denunciados praticaram os factos constantes da queixa apresentada, determinou o arquivamento dos autos, ao abrigo do disposto no art. 277 n.º2 do CPP.

  3. O assistente veio, então, requerer a abertura da instrução imputando desta feita aos arguidos, a prática, em co-autoria material, de um crime de ofensas à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 143 n.º1, com referência aos art. 146 e 132 n.º2, alin. l) do C.Penal, um crime de ameaças, p. e p. pelo art. 153.º do C. Penal, um crime de coacção grave, p. e p. pelos art. 154 n.º1 e 155 n.º1, alin. d) do C. Penal, e de um crime de abuso de poder, p. e p. pelo art. 382 do C. Penal, referindo que os autos indiciavam com suficiência os seguintes factos: " No dia 15 de Março de 2003, por volta das 15,10 horas o assistente dirigia-se para um local chamado " …" que dista aproximadamente …Km do ….

    Nesse local encontrava-se um grupo de amigos seus ali reunidos para um lanche, planeado havia já algumas semanas.

    Utilizava, como meio de transporte, um ciclomotor de matrícula … Ao chegar próximo do local e junto à vedação que delimita o "…" e o "…", a cerca de 500 metros do "…" o assistente apercebeu-se de um ruído que lhe pareceu ser o de uma sirene.

    Estranhando o facto, por se encontrar em pleno campo, o assistente estacionou o veículo para se inteirar do que estava a acontecer.

    Nessa altura avistou um jipe da G. N. R.., que se aproximou do local onde se encontrava parado e ali estacionou.

    Dele saíram os arguidos e sem qualquer explicação empurraram-no, fazendo-o cair no chão.

    De seguida, os arguidos agrediram voluntariamente o assistente com vários pontapés nas costas e nas pernas.

    0s arguidos, muito exaltados e aos gritos, perguntavam ao assistente porque tinha fugido.

    Ainda durante a agressão o arguido S. disse-lhe também: "Ah!... Tu não me conheces!.. Só me conheces sem farda!" Depois de o terem agredido repetidas vezes, os arguidos levantaram-no do solo e colocaram-lhe as algemas.

    Só então o informaram que iria ser multado por não ter capacete, e por ter desobedecido a uma ordem de parar.

    O assistente respondeu-lhes que, muito embora fosse verdade o facto de não trazer capacete de segurança, era falso que tivesse recebido uma ordem de parar.

    Exaltados com a resposta, os arguidos ameaçaram-no com a frase seguinte: "Não digas mais nada, senão, no Posto da G.N.R vai ser muito pior, vais apanhar mais tareia!".

    De seguida, os dois arguidos conduziram-no para o jipe e colocaram-no no banco de trás.

    Muito assustado, o assistente perguntou aos soldados que crime tinha cometido para ser algemado e tratado dessa forma ao que estes responderam:"No posto já vais ver".

    Encetaram, então uma viagem a alta velocidade, supostamente a caminho de …, conduzidos pelo soldado S., que lhe dizia: " Com a mesma velocidade a que viemos atrás de ti assim vais para lá ".

    Durante a viagem, o soldado P., disse ao soldado S.: "Vá a ver se ele bate com os cornos no vidro", ao que este respondeu: "Nos … têm muita mania mas nós vamos tirar-lha!".

    E dirigindo-se ao denunciante ainda lhe disse: "Sabes? Eu conheço este sítio como a palma da minha mão! Não te safas, nem tu nem os outros!" Durante o trajecto, o banco do jipe, desencaixou-se do lugar, porque não se encontrava fixo, tendo o assistente batido com a cabeça no vidro.

    O assistente ainda tentou colocar o cinto de segurança, mas não encontrou nenhum no local onde estava sentado, tendo sido projectado sucessivas vezes contra as paredes e vidros do jipe.

    Durante o trajecto, o assistente disse aos soldados que não trazia consigo os seus documentos de identificação e pediu para fazer um telefonema para casa.

    Os arguidos mudaram, então, de ideias e conduziram o assistente a sua casa, no "…" De seguida e obtidos os documentos os arguidos, notificaram o assistente das infracções alegadamente cometidas e foram-se embora.

    Como consequência das agressões e da queda o assistente sofreu várias lesões várias, que lhe provocaram fortes dores e grande perturbação psicológica, tendo recebido tratamento médico no Centro de Saúde de ….

    Os arguidos agiram livre, deliberada e conscientemente.

    Sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal".

  4. Realizada a instrução e efectuado o debate instrutório, a Senhora Juiz de Instrução lavrou despacho de não pronúncia, com os seguintes fundamentos: "Iniciaram-se os presentes autos de instrução a requerimento do assistente, inconformado com o despacho de arquivamento deduzido contra os arguidos P.B. e S.G., alegando, em síntese que: 1. O MP fez uma errada apreciação dos factos e desconsiderou meios de prova apresentados no inquérito; 2. A testemunha L.I. não foi inquirida, por o MP ter considerado desnecessário, atendendo a que a mesma não presenciou os factos descritos na queixa-crime apresentada.

    Requereu a inquirição da médica que o observou no Centro de Saúde, de D.S., que lhe tratou das dores e de L.I..

    Foi inquirida a médica, conforme se apura de fls. 194 -195, o assistente acabou por prescindir da inquirição do mencionado J.S., na sequência de atestado em que se declarava que o mesmo não estava em condições físicas para se deslocar ao Tribunal e, atendendo a que a testemunha L.I. se encontra na …, não se prevendo quando volta, por motivos de saúde mental (fls. 187 a 189), bem como ao facto do mesmo não ter presenciado as alegadas agressões (fls. 203, 33 e 159), foi indeferido o requerimento para a sua inquirição a fls. 211 a 213.

    Foi realizado o debate instrutório, com observância do formalismo legal.

    Há que ter presente que o JIC estará limitado, à partida, pela factualidade relativamente à qual se pediu a instrução (cfr. art. 287, n.º l e 2 e 288, n.º4 do CPP), sendo orientado no seu procedimento e decisão pelas razões de facto e de direito invocadas.

    Por outro lado, dispõe o art. 283°, n.º2, aplicável à fase de instrução ex vi do n.º 2 do art. 308°, ambos do CPP, que se consideram suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, uma pena ou uma medida de segurança.

    Preceitua, por sua banda, o art. 308°, n.º1 do CPP que se até ao encerramento da instrução tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário, profere despacho de não pronúncia.

    Fundando-se o conceito de indícios suficientes na possibilidade razoável de condenação ou de aplicação de uma pena ou medida de segurança, deve considerar-se existirem indícios suficientes para efeitos de prolação do despacho de pronúncia (tal qual para a acusação), quando: - os elementos de prova, relacionados e conjugados entre si, fizerem pressentir da culpabilidade do agente e produzirem a convicção pessoal de condenação posterior, e - se conclua, com probabilidade razoável, que esses elementos se manterão em julgamento; ou - quando se pressinta que da ampla discussão em plena audiência de julgamento, para além dos elementos disponíveis, outros advirão no sentido da condenação futura.

    O assistente imputa aos arguidos factos que integrariam a prática, em concurso efectivo de um crime de ofensas à integridade física qualificada p. e p. pelo art. 143, n.º1, 146° e 132°, n.º2, aI. l) do CP, de um crime de ameaças p.e p. pelo art. 153° do CP, de um crime de coacção grave p.e p. pelos art. 154°, n.º l e 155°, n.º1, aI. d) do CP e de um crime de abuso de poder p. e p. 382° do CP.

    Com efeito, o assistente veio dizer que no dia 15 de Março de 2003, cerca das 15 h e 10 m, conduzia o seu ciclomotor junto do …, quando estacionou por se aperceber de um ruído atrás de si que parecia ser o de uma sirene. De dentro de um jipe saíram os arguidos que o empurraram para o chão, atingiram com pontapés nas costas e nas pernas, o algemaram e o informaram que iria ser multado por não ter capacete e por ter desobedecido a uma ordem de parar. Foi então ameaçado e levado para o posto da GNR.

    Cotejada a prova produzida em sede de inquérito com a realizada em instrução, apura-se que: - a médica que se encontrava de serviço no Centro de Saúde depôs no sentido de confirmar que elaborou o relatório de fls. 48, confirmando tudo o que dele consta por ter resultado da sua observação directa da pessoa do assistente. Mais disse que a lesão que se observa na fotografia de fls. 40, a existir, não é indiciária de qualquer lesão traumática de relevo e que não se afigura verosímil, na sequência do que na altura constatou, a possibilidade de qualquer lesão traumática que se relacione com as alegadas agressões consubstanciadas em pontapés nas costas e nas pernas.

    - a testemunha H.J. (fls. 54) apenas viu...

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