Acórdão nº 9018/2003-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Fevereiro de 2005
Magistrado Responsável | DURO MATEUS CARDOSO |
Data da Resolução | 02 de Fevereiro de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa I- (A), intentou no 4º Juízo - 1ª Secção do Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato de individual de trabalho, CONTRA, ANA-AEROPORTOS DE PORTUGAL, SA.
II- PEDIU que a acção seja julgada procedente e provada e a ré condenada a pagar ao autor a quantia de 3.054.488$00 (sendo 1.480.888$00 devidos a título de diminuição arbitrária de subsídio de assistência no período de 1 de Agosto de 1994 a 31 de Março de 1998 e 1.573.600$00 correspondentes a verbas não pagas por diminuição arbitrária de remuneração base desde 31 de Março de 1998), sendo tal quantia acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos até integral pagamento.
Mais pediu a condenação da ré a pagar ao autor uma indemnização não inferior a 3.000.001$00 a título de danos morais, a liquidar em execução de sentença.
III- ALEGOU, em síntese, que: - Em 7 de Setembro de 1987, outorgou um contrato de trabalho com a Ré; - É Oficial de Operações Aeroportuárias (OPA); - Os OPA's têm um Regulamento Autónomo; - A Ré por razões que a ela dizem respeito determinou a existência de uma figura equívoca a que chamou " coordenador de terminal de bagagens"; - Tal figura coincidia nas suas atribuições com as funções de OPA; - A Ré veio a proceder ao provimento de coordenadores de terminais de bagagem invocando uma "comissão de serviço"; - Permaneceu sob a designação de coordenador de terminal de bagagem de 1 de Agosto de 1994 até 31 de Março de 1998 recebendo pelo nível 20; - Quando cessou a sua designação como coordenador de terminal de bagagens passou a auferir pelo nível 16 e posteriormente pelo 18; - Tratou-se de uma inadmissível quebra de retribuição, tanto mais que a Administração da Ré havia deliberado que quando cessassem as comissões de serviço os trabalhadores manteriam os níveis remuneratórios; - Tem direito a receber a retribuição base correspondente ao nível 20 desde 31 de Março de 1998 bem como à sua manutenção; - A Ré deve ser condenada a pagar-lhe 1.573.600$00 de diferenças remuneratórias; - Entre 1 de Agosto de 1994 e 31 de Março de 1998, não lhe foram pagos subsídios de assistência e pelo trabalho suplementar a que tinha direito nos termos do contrato colectivo aplicável; - A tal título a ré ANA deve-lhe o montante de 1.408.888$00; - A Ré tem o dever de preservar o bom ambiente de trabalho; - Todavia não o tem feito, pois no âmbito dos processos laborais que contra ela são instaurados usa reunir com as suas testemunhas nas instalações da empresa às horas de serviço; - Corre na Ré a notícia de que sobre os trabalhadores que testemunhem arrolados por colegas podem recair retaliações sobre a forma de quebra de prémios; - O SINDOPA já formulou uma queixa à Comissão Parlamentar de Direitos, Liberdades e Garantias; - Os trabalhadores da Ré não ousam aproximar-se dos dirigentes do SINDOPA; - O Autor hesitou longo tempo antes de intentar a presente acção por ter receio das consequências perversas da respectiva interposição; - Estamos perante ausência de condições morais do trabalho que são imputáveis à Ré; - A Ré deve ser condenada a pagar-lhe um montante a título de danos morais em quantia a liquidar em execução de sentença.
IV- A ré foi citada e realizou-se Audiência de Partes em que teve lugar infrutífera tentativa de conciliação.
Nesta Audiência de Partes o autor requereu que a ré fosse tratada como faltosa à diligência, com as legais consequências nos termos e na letra da Lei, uma vez que a ré esteve apenas representada pelo respectivo Mandatário Judicial e por procurador da ré com poderes para representar a sociedade ré, sendo que a Audição de partes exige a presença de quem, nos termos do Pacto Social, for susceptível, em razão da qualidade, de vincular a pessoa colectiva em causa.
Sobre este requerimento recaiu o seguinte despacho: "O n° 3 do art° 540 do C.P.T. estatui que o Autor é notificado para Audiência de Partes e a Ré é citada, ambos para comparecerem pessoalmente ou, em caso de justificada impossibilidade de comparência, se fazerem representar por mandatário judicial com poderes especiais para confessar, desistir ou transigir.
Afigura-se-nos que o Autor, no seu douto requerimento, quando se refere a Depoimento de Parte, pretende fazer alusão às declarações previstas no art° 55° do aludido diploma.
Daí que extraia as conclusões e inerentes consequências referidas no douto requerimento.
Todavia, salvo o devido respeito por entendimento diverso, afigura-se-nos que, se a Lei permite que, em certos casos, tais declarações sejam inclusivamente prestadas por mandatário judicial munido dos poderes referidos no n° 3, do art° 54º do C.P.T., por maioria da razão, também permite aos legais representantes da Ré constituírem um Procurador para o efeito.
In casu, a Procuração do Sr. Dr. (NP) atribui-lhe expressamente poderes para comparecer à Audiência de Partes e emitir as declarações negociais que entender convenientes.
Igualmente lhe confere poderes para confessar, desistir ou transigir em qualquer estado do Processo, podendo, para o efeito, servir-se do Advogado que for, pela empresa, nomeado para a patrocinar no Processo, bem como, e ainda, praticar qualquer outro acto que entenda conveniente para o efeito da formação e declaração da vontade negocia) que à empresa venha a ser solicitado em Juízo.
Por outro lado, o Exmo Mandatário da Ré também detém poderes para confessar, desistir ou transigir.
Entendemos, pois, salvo o devido respeito por entendimento diverso, que a Ré se encontra devidamente representada na presente Audiência de Partes, pelo que não há lugar à aplicação da sanção prevista no C.P.C. para a litigáncia de má fé (vide art° 102° do C.C.J.)".
Desse despacho o autor recorreu (fls.) 59 a 65) interpondo recurso de agravo que foi recebido com subida diferida: (...) IV- A ré contestou concluindo pela improcedência da acção, (...) VI- O processo seguiu os seus termos, com elaboração de Factos Assentes e Base Instrutória, vindo, a final, a ser proferida sentença em que se julgou: "a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência decido condenar a Ré pagar ao Autor o montante que se liquidar em execução de sentença respeitante aos subsídios de assistência devidos desde 1 de Maio de 1995 e 31 de Março de 1998, montante do qual se deve descontar as quantias que o Autor recebeu nesse lapso de tempo a título de subsídio de turno.
Os montantes em dívida a tal título deverão ser acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde a data do respectivo vencimento até integral pagamento - vide art 2º do DL nº 69/85, de 18 de Março." O autor voltou a interpor novo recurso, agora desta sentença (fls. 496 a 498, 541 e 585 a 586), apresentando as seguintes conclusões: Quanto à matéria de facto e em relação ao constrangimento dos trabalhadores relativamente ao exercício de direitos fundamentais.
1. O Mmº Juiz do Tribunal a que não pode exigir a geométrica clareza quanto à demonstração e enquadramento das causas do medo, se o medo existir entre trabalhadores - e aqui tudo indica, infelizmente, que sim - quanto ao exercício de Direitos Fundamentais, ou até quanto ao exercício de deveres de cidadania, como sejam os de depor em juízo de trabalho e em processo de camarada de trabalho; nesta matéria, com efeito, demonstrando-se que a "hierarquia" (expressão infeliz por excessiva, pese embora o "non est enfim potestas nisi a Deo") provoca, voluntária ou involuntariamente, ignora ou utiliza a dissuasão, ou que contemporiza com factos aptos a gerá-la não é necessário, nem pode ser necessário, exigir a demonstração da coacção onde tem de bastar a razoabilidade do efeito dissuasor dos factos apurados; 2. A relevância de tais factos não é tanto dada pela previsão penal da coacção, mas pela realidade da tela de embaraços onde se sustentam ansiedades difíceis de definir sem o auxílio da psicologia das organização fenómeno que, não estando embora criminalizado entre nós, está todavia genericamente proibido quando se consagrou o dever de respeito pelas boas condições morais de trabalho que o empregador deve proporcionar" (na fórmula do futuro 120° do Código de Trabalho) à luz do princípio geral da "promoção humana" e do dever concreto de respeito pela pessoa do trabalhador... dever de respeito que à luz do Direito aplicável, é o devido a um colaborador (expressão que, por si só, explica a ausência radical da palavra "subordinação" em toda a LCT detalhe em cujo sublinhado nos temos sentido um tanto sós); 3. O empregador não pode pois ignorar o medo dos trabalhadores quanto ao exercício de direitos fundamentais ou quanto ao cumprimento dos deveres de cidadania, nem alhear-se dele, porque nem pode tolerar situações cuja equivocidade seja - à luz da experiência comum - apta a gerar a dissuasão quanto ao exercício de tais direitos ou ao cumprimento de tais deveres e esta seria talvez a via da reconciliação da razoabilidade em Direito de Trabalho com as exigências de clareza geométrica do criminalista, na Justiça do caso; 4. Em função desta perspectiva da relevância dos factos, há erro de julgamento na desvalorização - feita à luz da disciplina intelectual do penalista, como nos parece - dos depoimentos de (AP), de (CS) e de (B) quanto à matéria da dissuasão ou constrangimento moral relativamente ao exercício de direitos fundamentais (qual seja o de se apresentar em juízo pedindo o exame e decisão de causa) ou ao cumprimento de deveres de cidadania (qual seja o de comparecer em juízo depondo com verdade), desvalorização que tem de corrigir-se pela adopção da perspectiva ajustada e jus laboral que é a do dever de propiciar as boas condições morais de trabalho, perspectiva à luz da qual e salvo melhor opinião, devem voltar a ouvir-se e a reponderar-se tais...
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