Acórdão nº 9282/2003-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Maio de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSARMENTO BOTELHO
Data da Resolução12 de Maio de 2004
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO (A), intentou, em 6 de Setembro de 2002 contra Espaço Dois Gráfico-Artes Gráficas L.da com sede na Praça Artur Portela n.º 2-A 1500-061 Lisboa, a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, tendo em vista impugnar o despedimento de que foi alvo na sequência de processo disciplinar alegando para tal que o processo disciplinar enferma de nulidade e que as razões invocadas para o seu despedimento não o justificam. Pediu, por isso, que seja reconhecido e declarado como nulo e ilícito o despedimento, quer por ausência de justa causa bastante, quer por nulidade do processo disciplinar em consequência da não realização pela ré das diligências probatórias requeridas pelo autor na sua defesa, devendo a ré ser condenada a pagar-lhe a quantia de 712,28 Euros, bem como os salários, complementos mensais deste, subsídios de refeição, férias e subsídios de férias e Natal que se vencerem desde 30 dias antes sobre a data de entrada em juízo da presente acção e até à data da sentença, pedindo, ainda, que a ré seja condenada a reintegrá-lo ao serviço e no seu posto de trabalho, com a categoria, vencimento e antiguidade que lhe competirem, excepto se em alternativa a esta reintegração o autor vier a optar, na audiência de julgamento ou até lá, pelo recebimento da indemnização de antiguidade, no montante então a determinar.

*Realizada audiência das partes e, não tendo havido conciliação, foi ordenada a notificação da ré para contestar a acção, o que a ré fez, defendendo a regularidade do processo disciplinar e mantendo as razões invocadas para o despedimento no processo disciplinar, deduzindo, ainda, incidente de verificação do valor da causa. Concluiu pela a sua absolvição, com a rectificação do valor da causa para 3.740,98 Euros. *O incidente de verificação do valor da causa foi julgado improcedente.

*Fixada a base instrutória, e decididas as reclamações - a apresentada pelo autor não foi atendida e a apresentada pela ré apenas foi atendida em parte -, o processo prosseguiu para julgamento ao qual se veio a proceder com observância do legal formalismo, conforme consta da respectiva acta. * O Tribunal respondeu à matéria da Base Instrutória, nos termos constantes de fls. 176 e 177, sem qualquer reclamação das partes.

* Foi oportunamente proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, com a consequente absolvição da Ré do pedido.

* O Autor não se conformou com tal decisão e dela interpôs recurso e apelação, tendo arguido, no requerimento de interposição do recurso, a nulidade da sentença (cfr. fls. 200).

(...)*B) SUBSUNÇÃO JURÍDICA DOS FACTOS: Questões a decidir no recurso: 1.ª Da nulidade da sentença recorrida.

  1. Da alteração da matéria de facto que vem fixada da 1.ª instância.

    face aos depoimentos das testemunhas gravados na audiência.

  2. Da caducidade do procedimento disciplinar; 4.º Da procedência (ou improcedência) da acção, tendo em vista a apreciação da "justa causa" do despedimento do Autor.

    *1.ª QUESTÃO: - Da nulidade da sentença recorrida: Veio a recorrente arguir a nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia, com fundamento no disposto na al. d), 1.ª parte, do n.º 1 do art.º 668.º do Código de Processo Civil.

    A M.ma Juiz do tribunal recorrido, por despacho de fls. 230 e v.º, considerou improcedente tal arguição.

    Cumpre, pois, conhecer desta questão.

    Alega a recorrente, neste particular que: - a sentença proferida nos presentes Autos enferma de tal nulidade, por virtude de a Meritíssima Juiz do Tribunal recorrido não se ter pronunciado sobre uma questão que deveria apreciar com indiscutível relevância para a boa decisão da causa.

    - O Autor A. solicitara ao Tribunal de Julgamento para se pronunciar sobre a violação por parte da Ré das garantias de defesa conferidas pela lei ao trabalhador, no quadro do processo disciplinar contra si promovido, tendo invocado na acção que tinha requerido, na sua Resposta à Nota de culpa, a junção dos cartões de ponto do A. e dos demais trabalhadores ao serviço da R. correspondentes aos últimos 5 anos e até ao mês de Outubro de 2001 inclusivé, bem como o livro de registo de horas suplementares, realizadas pelos trabalhadores ao serviço da R. nos anos de 1998, 1999, 2000 e 2001 até Outubro (inclusivé); - O Tribunal a quo, na douta sentença que proferiu, apenas se pronunciou sobre a não junção do Livro de Registo de Trabalho Suplementar, concluindo pela improcedência da nulidade arguida e, quanto à não junção pela Ré dos cartões de ponto do A. e dos demais trabalhadores, referentes aos anos de 1998, 1999, 2000, o Tribunal nada referiu ou concluiu sobre tal facto; - Tal omissão, pela sua gravidade, reflectiu uma decisão que não tutelou os reais interesses do Autor, ora Apelante.

    - Neste sentido, a sentença recorrida enferma de omissão de pronúncia, uma vez que não se pronunciou sobre uma questão essencial que deveria apreciar, com claro prejuízo para a boa resolução da causa, pelo que deve ser considerada nula nos termos do disposto no artigo 668.º, n.º 1, alínea d), 1.ª parte, do Código de Processo Civil.

    Vejamos, então, se a sentença a nula, por omissão de pronúncia, como pretende o recorrente e, em caso afirmativo, quais as consequências daí derivadas: Na sentença em apreciação escreveu-se, neste particular o seguinte: « A) Nulidade do processo disciplinar A este respeito o autor vem alegar que não foram realizadas pela ré as diligências probatórias requeridas pelo autor na sua defesa. A temática das nulidades do processo disciplinar tem de ser ponderada à luz dos fundamentos e natureza jurídica do poder disciplinar, com incidência especial na sua vertente de poder vinculado. Como sublinha Menezes Cordeiro ("Manual de Direito do Trabalho", 1991, pág. 754), há princípios cogentes que devem ser respeitados na articulação entre os factos que merecem a censura da entidade patronal e a aplicação da sanção. São eles: o princípio da defesa, que impõe a audição prévia do trabalhador, a qual não pressupõe apenas que o trabalhador tenha direito a apresentar a defesa à nota de culpa, mas igualmente a possibilidade de requerer diligências e de as mesmas serem realizadas pela entidade patronal - art. 10º, nº 4 do RJCCIT, o princípio da boa-fé, o princípio da celeridade e o princípio da igualdade. De referir que basta a violação dum deles para, em regra, surgirem violações dos demais, dado que a repartição é meramente conceitual. O art. 12º, n.º 3, do RJCCIT contém uma enumeração taxativa das causas de nulidade do processo disciplinar. Aí se dispõe que o processo só pode ser declarado nulo se: a) Faltar a comunicação referida no n.º 1 do artigo 10º; b) Não tiverem sido respeitados os direitos que ao trabalhador são reconhecidos nos n.ºs 4 e 5 do mesmo artigo e no n.º 2 do artigo 15º; c) A decisão de despedimento e os seus fundamentos não constarem de documento escrito, nos termos dos n.ºs 8 a 10 do artigo 10º ou do n.º 3 do artigo 15º.

    Como bem sintetiza Lobo Xavier ("Curso de Direito de Trabalho", 1992, pág. 508 e segs.) os casos de nulidade do processo disciplinar são os seguintes: falta de comunicação de intenção de proceder ao despedimento e, por maioria de razão falta de entrega da nota de culpa, falta de audiência do trabalhador dando-lhe oportunidade de responder à nota de culpa e de se levarem a efeito diligências probatórias que interessem ao apuramento dos factos e falta de decisão e seus fundamentos em documento escrito. As outras violações às normas de processo que revistam menor gravidade são consideradas irregularidades eventualmente puníveis com multa. Por aqui se vê, pois, que a lei só comina com a sanção da nulidade a falta de actos que afectam gravemente a defesa do arguido. Na verdade, não sendo o processo disciplinar um processo judicial a que sejam aplicáveis as regras processuais comuns, a prática dos actos que correspondem à tramitação do mesmo não obedece àquelas regras. Desse modo, a omissão de certas regras que num processo judicial correspondem a violações do princípio do contraditório e, consequentemente, do princípio da defesa, não se aplica em sede de processo disciplinar laboral. O que acaba de ser dito serve para demonstrar que a nulidade que o autor invoca não pode conduzir à nulidade do processo disciplinar. É verdade que o autor no final da resposta à Nota de Culpa, requereu a junção aos autos dos cartões de ponto do autor e dos demais trabalhadores ao serviço da ré correspondentes aos últimos 5 anos e até ao mês de Outubro inclusive bem como do livro de registo de horas suplementares, realizadas pelos trabalhadores ao serviço da ré nos anos de 1998, 1999, 2000 e 2001 até Outubro...

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