Acórdão nº 8409/2005-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Novembro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelJOÃO CARROLA
Data da Resolução10 de Novembro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, em audiência, na 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa: I.

No processo comum n.º 3828/01.0 P8LSB da 1.ª Secção da 6-ª Vara Criminal de Lisboa, o arguido (A) foi submetido a julgamento, após ter sido acusado da prática de um crime de roubo p. e p. pelo art.º 210.°, n.°s 1 e 2, alínea b), do Código Penal, com referência ao art.º 204.°, n.º 2, alínea f), do Código Penal.

Realizada a audiência, sem documentação da prova produzida, foi o arguido condenado, como autor material de um crime de roubo p. e p. no art.º 210.º n.º 1 Código Penal na pena de 2 anos e 6 meses de prisão.

Inconformado com a decisão, veio o arguido interpor recurso da mesma, com os fundamentos constantes da respectiva motivação que aqui se dá por reproduzida e as seguintes conclusões: "1 - O arguido, ora recorrente foi condenado pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, previsto e punível, pelo artigo 210.°, n.º 1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, 2 - O Tribunal a quo fundamentou a sua condenação apenas no depoimento de (F), agente da PSP; 3 - Depoimento esse que se baseia quase na integra no que ouviu dizer ao queixoso, quando recebeu a queixa 4 - A testemunha apenas presenciou os factos ocorridos na casa de câmbio, os restantes factos foram-lhe transmitidos pelo queixoso, como aliás consta de fls. 5 do acórdão ora recorrido, 5 - O Tribunal a quo ao valorar o depoimento da testemunha, na parte em que reproduz as declarações prestadas pelo queixoso no momento da apresentação da queixa esta como que a deixar para seja o agente fazer a valoração do depoimento do queixoso e não permite que seja feito um contra interrogatório a quem efectivamente presenciou os factos 6 - Ao condenar-se o recorrente apenas com base no depoimento de um agente da PSP que recebeu a queixa, no qual este relata a queixa apresentada pelo queixoso, estamos a violar os mais elementares princípios constitucionais 7 - Nestes termos deve considerar-se que o Tribunal a quo valorou uma prova que não poderia valorar, por esta ter sido prestada em violação do disposto no artigo 129.° do CPP, 8 - Na medida em que é proibido o depoimento do que se ouviu dizer a pessoa determinada, salvo se a inquirição da pessoa não for possível por morte, anomalia psíquica superveniente ou impossibilidade de serem encontradas, 9 - Nos presentes autos não ficou provado que existisse impossibilidade de o queixoso ser encontrado, nem o Tribunal a quo, suspendeu a audiência de julgamento para tentar encontrar a testemunha, 10 - Parece-nos, salvo o devido respeito, que o Tribunal a quo cedeu a uma culpabilidade presumida, pois se o recorrente já havia praticado o mesmo tipo de ilícito, nada o impediria de voltar a praticar.

11 - A realidade é que não poderemos confirmar se o queixoso se enganou quando fez o reconhecimento do recorrente, ou quando relatou os factos, 12 - Não pode assim o Tribunal a quo não pode desfazer as dúvidas levantadas em audiência de julgamento, ou seja, o arguido nega a prática dos factos e quem diz que este os praticou é o agente da PSP que recebeu a queixa.

13 - Não deveria de ter sido valorado este depoimento, por ser indirecto, ainda mais quando é basicamente a única prova produzida em sede de audiência de julgamento, como resulta de fls. 5 do acórdão ora recorrido.

14 - "Se o depoimento produzido resultar do que a testemunha ouviu dizer a pessoa determinada, e esta não tiver sido chamada a depor pelo juiz apesar de não se mostrar provada a impossibilidade de ser inquirida, não pode o depoimento nessa parte servir de prova por, em regra, ser proibido o depoimento indirecto." Acórdão da Relação do Porto de 1995.05.03, Boletim do Ministério da Justiça, 447, pág. 574.

15 - Sendo este o único meio de prova indicado na fundamentação da decisão da matéria de facto, que contribuiu para a convicção do juiz deve o acórdão ora recorrido ser declarado nulo e em consequência ser o recorrente absolvido do crime de que vem acusado.

16 - O acórdão ora recorrido, ao valorar o referido depoimento indirecto e com ele fundamentar a condenação do recorrente, nos termos em que foi valorado é inconstitucional, na medida em que viola o artigo 32.°, n.°s 1 e 5 da Constituição da República Portuguesa, 17 - Como já foi referido, o art. 129.° n.° 1 do CPP possibilita que, em caso de morte, anomalia psíquica superveniente, impossibilidade de ser encontrada a «pessoa determinada» seja considerado válido o depoimento de testemunha de "ouvir dizer", podendo tal testemunho servir como meio de prova.

18 - Entende o recorrente que a utilização e valoração de uma depoimento de «ouvir dizer» é incompatível com um processo de estrutura acusatória devendo considerar-se incompatível com a constituição tal depoimento de «ouvir dizer», por força do disposto no art. 32° n° 5 da Constituição da República Portuguesa, 19 - Este tipo de depoimento de «ouvir dizer», mesmo de pessoa determinada que não foi encontrada e não pôde ser inquirida pelo Tribunal, carece de razão de ciência, e não tem qualquer valor, nem há que levá-lo em consideração.

20 - Ao admitir a possibilidade desse testemunho, e ao considerá-lo como meio de prova, o art. 129.° n.º 1 colide com o princípio de contraditório, e com as garantias de defesa do arguido previstas no art. 32.° n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e é incompatível com um processo de estrutura acusatória por violar o princípio do contraditório consignado na CRP no art. 32.° n.º 5.

21 - O artigo 129.° n.º 1 do CPP, ao atribuir ao Tribunal a possibilidade de valorar e considerar como meio de prova legal, mesmo que apenas em certas circunstâncias, o testemunho de «ouvir dizer», contradiz a doutrina e os princípios constitucionais de garantia de defesa do arguido, havendo nítida oposição entre esta norma legal e as normas constitucionais consagradas no art. 3.2° n.°s 1 e 5 da Constituição da República Portuguesa.

23 - Deve assim considerar-se a aplicação do art. n.º 129.° n.º 1 do CPP, nos presentes autos ferido do vício da inconstitucionalidade material, por violação dos apontados preceitos, não poderia o douto Tribunal de primeira instância ter feito aplicação do mesmo, por violar o princípio de que o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa e é contrária à estrutura acusatória prevista pelo texto constitucional para o processo criminal e à subordinação da audiência de julgamento ao princípio do contraditório.

24 - Mesmo que assim não se entende deve concluir que este crime terá necessariamente que assumir um grau de gravidade menor e em consequência uma pena menor.

25 - Considera o ora recorrente que a pena que lhe foi aplicada é excessiva e que o Mmo. Juiz a quo também não ponderou de forma criteriosa, quer a culpa, quer as exigências de reprovação e de prevenção (prevenção geral ligada à defesa da sociedade e à contenção da criminalidade e prevenção especial positiva ligada à reintegração social do agente) - cfr. Artigo 40.° n.°s 1 e 2 do Código Penal - bem como as demais exigências do artigo 71.° n.º 2 do Código Penal, na determinação concreta das penas fixadas ao recorrente.

26 - Terá sobrevalorizado a necessidade de prevenção geral das penas e não teve a percepção que com a aplicação de pena mais baixas, estavam asseguradas as expectativas da sociedade e consequentemente realizadas as finalidades de punição de forma adequada e suficiente.

Deve assim ser considerado que o grau de ilicitude dos factos terá de ser é baixo, pelo que o douto acórdão deveria ter ponderado favoravelmente e não o fez, o modo de vida do recorrente e a sua desintegração familiar.

27 - O douto acórdão ao condenar o recorrente numa pena tão acima do limite mínimo, violou o artigo 210.° n.º 1 do Código Penal - o artigo 71° do Código Penal, dado...

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