Acórdão nº 01A1638 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Outubro de 2002

Magistrado ResponsávelGARCIA MARQUES
Data da Resolução02 de Outubro de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:I"A" veio, ao abrigo do artigo 129º do CPEREF, deduzir embargos à sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa, de 20 de Outubro de 2000, que declarou a sua falência no processo nº. 139/98, em que foram requerentes "Banco B, S.A."; "Banco C, S.A." e "D, S.A." tendo o embargante sustentado, em síntese, o seguinte: (a) necessidade de suspender a presente instância em virtude da pendência dos processos de falência instaurados contra as empresas "E, S.A." e "F, S.A.", cujos débitos foram garantidos pelo requerido e que servem de causa de pedir à presente acção; (b) omissão de pronúncia pela sentença que decretou a falência a respeito da questão da ilegitimidade activa suscitada em requerimento apresentados nos autos em 28-07-2000; (c) a circunstância de a referida sentença ter declarado a falência do embargante prescindindo da audiência de julgamento prevista no artigo 123º do CPEREF; (d) omissão de pronúncia pela sentença embargada quanto à invocada falta de interesse em agir e contradição insanável no tratamento ali dado à questão do alegado abuso de direito por parte dos requerentes da falência; (e) não conhecimento da questão da invocada nulidade das garantias prestadas por indeterminabilidade do objecto das fianças. As questões enunciadas foram objecto de apreciação no saneador/sentença de 24 de Janeiro de 2001, que julgou improcedentes os embargos deduzidos à falência- cfr. fls. 78-80. Inconformado, veio o requerido/embargante interpor recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente e em separado, com efeito meramente devolutivo mas suspendendo a liquidação do activo (fls. 83). Entretanto, por se considerar verificarem-se os respectivos pressupostos, foi determinado o recurso per saltum para este Supremo Tribunal de Justiça (artigo 228º, nº 3, do CPEREF), tendo o recurso passado à espécie de "revista" - cfr. fls. 156 e 471. Ao alegar, ofereceu o recorrente as seguintes conclusões: 1. A sentença recorrida entendeu não suspender a instância no presente processo devido à pendência de causa prejudicial, porque entendeu que a suspensão da instância não é compatível com a natureza urgente dos processos de recuperação e falência. 2. Ora, é entendimento jurisprudencial unânime que os processos de recuperação e falência podem ser suspensos, podendo sê-lo na pendência de causa prejudicial. 3. A sentença entendeu ainda, embora não justificasse esse seu entendimento, que o recorrente deveria ter agravado da decisão proferida quanto à suspensão da instância, em lugar de a ter atacado por via de embargos. 4. A sentença proferida violou, assim, por erro de interpretação, o artº. 279º do CPC e o artº. 10º do CPEREF, na medida em que estes permitem a suspensão da instância em processo falimentar e ainda o artº. 129º do CPEREF, na medida em que este impõe que toda a oposição à sentença declaratória de falência seja formulada por via de embargos e não por via de recurso. 5. Indeferindo a arguição de ilegitimidade dos recorridos, suscitada pelo recorrente nos seus embargos, a sentença recorrida decidiu que os mesmos eram partes legítimas, fundamentando esta sua decisão que terá sido proferida em 29 de Setembro de 1999 mas que ainda não se mostra notificada ao recorrente. 6. A sentença é como tal nula, nos termos do artº. 668º, nº 1, alíneas b) e d), do CPC, por não conter os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão tomada (sendo certo que a remissão para uma decisão que o recorrente desconhece não pode obviamente ser levada em consideração), nulidade que se invoca para todos os devidos efeitos legais. 7. Sem prejuízo da nulidade invocada, refira-se que ao decidir em matéria de legitimidade, a sentença recorrida violou o artº. 30º, nº. 4, do CPC, em vigor à data da interposição do requerimento de falência e aplicável aos autos, porquanto os recorridos não fizeram prova de se encontrarem numa situação de legitimidade activa ao abrigo de tal artigo. 8. E violou ainda o artº. 1º, nº 3, do CPEREF, porquanto, ainda que este artigo fosse aplicável (o que não se concede), ainda assim a sentença não conheceu de factos que era mister que conhecesse e que levavam a concluir pela ilegitimidade dos recorridos ao abrigo deste mesmo artigo. 9. Por outro lado, a sentença recorrida dispensou a audiência de julgamento da oposição deduzida pelo recorrente por considerar que o processo já continha todos os elementos de facto necessários à decisão da causa. 10. No entanto, a própria sentença recorrida veio a proferir as suas decisões com base em juízos fácticos contrários aos factos invocados pelo recorrente, quer na sua oposição quer posteriormente nos embargos. 11. Ao que acresce que mesmo que as questões a resolver fossem apenas de direito, sempre teria que ser facultada às partes a possibilidade de previamente as discutirem em audiência de julgamento da oposição, desenvolvendo e aprofundando o exposto nos seus articulados, mediante alegações. 12. A sentença em causa violou, pois, o disposto no artº. 123º, nºs 1 e 2 do CPEREF, conjugado com o seu artº. 124º, bem como o princípio fundamental do contraditório, consagrado no artº. 3º do CPC, ao impedir a apresentação das provas prevista no nº 2 do citado artº. 123º e ao não permitir a observância deste princípio em audiência de julgamento. 13. A sentença recorrida não se pronunciou quanto à falta de interesse em agir invocada pelo recorrente nos seus embargos, o que consubstancia nulidade por omissão de pronúncia, que expressamente se invoca (artº. 668º, alínea d), do CPC). 14. A sentença recorrida entendeu não existir abuso de direito dos recorridos, ao virem requerer a falência exclusivamente com base em actos impugnáveis e que se presumem celebrados de má fé pelos próprios recorridos. 15. Com o entendimento expresso na precedente conclusão, a sentença recorrida violou o artº. 156º, alínea e), do CPEREF, e o artº 334º do Código Civil. 16. Ao contrário do invocado pelo recorrente, a sentença ora recorrida considerou que as fianças prestadas pelo mesmo não eram nulas, porque, nas mesmas, o recorrente apenas tinha garantido as obrigações derivadas dos acordos de consolidação e reestruturação do passivo em que interveio e não quaisquer outras. 17. Na sua fundamentação a sentença invoca uma conclusão de facto oposta aos factos invocados pelo recorrente nos seus embargos, quando, simultaneamente, vedou o julgamento dos próprios embargos por considerar que as questões a resolver nos mesmos se restringiam a meras questões de direito, assim violando o artº. 280º do Código Civil. 18. Como se referiu na conclusão precedente, a sentença ora recorrida não procedeu à audiência de julgamento de embargos prevista no artº. 130º, nº 4, do CPEREF, alegadamente porque as questões a resolver se restringiam a meras questões de direito. 19. Paradoxalmente, a mesma sentença decidiu determinadas matérias dos embargos interpostos pelo recorrente exclusivamente com base na apreciação de matéria factual, cujo julgamento contraditório previsto na lei coarctou. 20. Razão pela qual a sentença recorrida violou o artº. 130º, nº 4, do CPEREF, conjugado com o seu artº. 124º, bem como o princípio fundamental do contraditório consagrado no artº. 3º do CPC, ao impedir a apresentação das provas prevista no nº 3 do citado artº. 130º e ao não permitir a observância deste princípio em audiência de julgamento de embargos. 21. Por força do referido na precedente conclusão, a sentença é além disso nula, o que expressamente se invoca, na medida em que consubstancia a omissão de um acto previsto na lei e passível de influenciar a decisão da causa (cfr. artº. 201º, nº 1, do CPC). Termos em que o recorrente pede a anulação da decisão recorrida, em substituição da qual deverá ser proferida sentença que o absolva do pedido. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. IINa sentença que decretou a falência foi, "atenta a prova documental e testemunhal produzida, bem como a confissão quase integral dos factos alegados na petição inicial", considerada assente a seguinte factualidade com interesse para a decisão final, a qual, todavia, não viria a ser reproduzida na sentença que conheceu dos embargos: a) em Maio de 1997, a requerente "Banco B, S.A." acordou com o requerido A na consolidação e reestruturação do passivo deste então existente e que ficou fixado na quantia global de 52.590.958$00, a pagar à requerente em 10 prestações mensais acrescidas de juros remuneratórios diários até integral pagamento, sob pena de resolução do acordo e de exigência imediata de todas as prestações em dívida; b) ficou igualmente acordado que seria considerado como incumprimento o não pagamento de qualquer das obrigações assumidas perante a requerente pelas empresas "G, Lda.", "F, S.A.", "H, Lda." e "E, S.A."; c) o requerido e as aludidas empresas não cumpriram pontualmente as suas obrigações de pagar; d) o requerido ficou então a "dever" à requerente, por conta do acordo referido em a), a quantia global de 27.721.434$00, a título de capital e de juros vencidos; e) igualmente no mês de Maio de 1997, a requerente também celebrou acordos de consolidação e reestruturação do passivo com as aludidas empresas; f) naqueles acordos, o requerido constituiu-se solidariamente fiador, com renúncia ao benefício da prévia excussão, do...

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