Acórdão nº 02B2045 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Junho de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SANTOS BERNARDINO |
Data da Resolução | 26 de Junho de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. "A" intentou contra B, Companhia de Seguros C e D a presente acção com processo ordinário, pedindo que a primeira e a segunda rés fossem condenadas a pagar-lhe a quantia de 749.569$00, correspondente ao valor das rendas vencidas e não pagas até à resolução do contrato pela autora, e de uma renda vincenda, e dos respectivos juros de mora, calculados até 02.11.95, a que acrescerão os que se vencerem desde essa data até integral pagamento, e que a primeira e a terceira rés fossem condenadas a restituir-lhe o veículo locado; ou, caso assim se não entenda, serem a primeira e a segunda rés condenadas a pagar-lhe a quantia de 628.438$00, respeitante ao valor das rendas vencidas e não pagas até à resolução do contrato pela autora, da indemnização correspondente a 20% da soma das rendas vincendas e do valor residual do veículo locado, e dos respectivos juros de mora, calculados até à data acima referida, e a primeira e a terceira rés condenadas a restituir-lhe o veículo locado. Alegou, para tanto, em síntese, ter dado em locação financeira à ré B, o veículo automóvel de marca Honda, modelo CBR, com a matrícula LX-..., e que esta não cumpriu as obrigações decorrentes desse contrato, não lhe tendo pago as rendas vencidas em 10.09.94 e 10.12.94, no valor de 172.684$00 cada, e em 10.03.95, no valor de 155.416$00, o que forçou a autora - goradas as tentativas para cobrar da ré os referidos créditos - a resolver o contrato. A responsabilidade da ré C decorreria do facto de, através de contrato de seguro-caução que celebrou com a B, e no qual a autora figura como beneficiária, ter segurado o risco de incumprimento das obrigações desta ré para com a autora, emergentes do dito contrato de locação financeira, sendo acordado entre ambas as rés que tal garantia seria paga à primeira solicitação da autora, no prazo de 45 dias após a interpelação. Mas o certo é que, interpelada pela autora, para pagar a indemnização devida em consequência da resolução do contrato, a ré não o fez. Na carta de resolução do contrato, a autora exigiu também à ré B a restituição do veículo locado, tendo requerido, por força da recusa desta, contra ela e contra a 3ª ré, que detinha a posse do veículo, providência cautelar de entrega judicial e cancelamento do registo da locação financeira - providência que veio a ser decretada. A ré B deduziu contestação/reconvenção, alegando, em súmula, que a autora exigiu, para a celebração do contrato, a apresentação de uma garantia idónea, que assegurasse o cumprimento da obrigação de pagamento da totalidade das rendas contratuais, equivalente ao preço do veículo - e que ela, ré prestou, sob a forma de seguro-caução, no qual a autora figura como beneficiária - comprometendo-se a autora, perante ela, a não promover a resolução do contrato em caso de incumprimento, mas antes a accionar o seguro, pelo que, contrariando as legítimas expectativas que nela criou, agiu com abuso de direito; pretendendo ainda a autora, com o seu pedido, tal como vem formulado, obter, à revelia do contrato, enriquecimento sem causa, pois que assumiu perante a ré que, em caso de incumprimento contratual, obteria apenas o pagamento das rendas vencidas e vincendas, e não também a entrega do veículo. Em reconvenção, pediu a condenação da autora a accionar o seguro-caução emitido pela C, e rematou com o pedido de condenação da autora em multa (de 1.000.000$00), como litigante de má fé. Também a ré C apresentou contestação/reconvenção, alegando, com interesse, que o contrato de seguro-caução que celebrou com a B se destinou a garantir, como a autora bem sabia, não as obrigações desta ré para com a autora, mas antes o pagamento das rendas a pagar à B pelos locatários dos contratos de aluguer de longa duração (ALD) celebrados entre esta empresa e os seus clientes, ficando até estabelecido que, em caso de sinistro coberto pela apólice (não pagamento por parte desses mesmos locatários), a B transferiria a propriedade do veículo locado para a seguradora, sem qualquer contrapartida. Ora, nem sequer foi alegada a falta de pagamento por parte do locatário de ALD, pelo que está excluída a responsabilidade da ré. Sustentou ainda que, mesmo que assim não fosse, sempre seria de considerar nulo o contrato de locação financeira celebrado entre a autora e a B, por ofensa à lei imperativa (arts. 280º e 281º do CC). Por outro lado, o contrato de seguro foi resolvido pela contestante, e a respectiva apólice cancelada, em 11.08.94, pelo que o máximo que poderia pedir-se-lhe seria a renda vencida em 10.09.94. Em reconvenção - e para o caso de vir a entender-se que o seguro-caução abrange as obrigações assumidas pela B para com a autora - pede a ré que a autora seja condenada a pagar-lhe a indemnização que vier a liquidar-se em execução de sentença, equivalente, no mínimo, ao montante pelo qual viesse a responder por força da apólice, fundando tal pretensão na circunstância de a autora não ter agido com presteza, pois não promoveu a resolução do contrato a seguir ao não pagamento da primeira renda, nem reclamou de imediato a devolução do veículo, permitindo à B continuar a receber as rendas pagas pelo locatário do ALD, e possibilitando a utilização e consequente deterioração do veículo, desprotegendo o direito de regresso da reconvinte e o direito desta a receber o veículo. Finalmente, a ré D também apresentou contestação, na qual sustenta a sua ilegitimidade ad causam, e impugna os factos alegados pela autora. Replicou a autora, refutando a tese das rés e sustentando a improcedência das excepções por elas arguidas, e a improcedência do pedido reconvencional formulado por cada uma das rés B e C. Elaborados o despacho saneador - no qual foi, além do mais, julgada improcedente a excepção de ilegitimidade arguida pela 3ª ré - e a especificação e questionário, e decididas as reclamações apresentadas, veio, oportunamente, a ser realizado o julgamento, com sequente prolação da sentença, na qual foi a acção julgada procedente, sendo as rés condenadas, solidariamente, a pagar à autora a quantia de 500.784$00, acrescida do IVA respectivo e dos juros de mora, à taxa de desconto do Banco de Portugal, os vencidos até 02.11.95, no montante de 82.256$00, e os vincendos, à mesma taxa, até integral pagamento, e a quantia de 42.313$00, correspondente a 20% da soma das rendas vencidas e do valor residual do veículo locado, acrescido de juros de mora, vencidos até 02.11.95, no valor de 3.130$00 e os vincendos até integral pagamento. As rés B e D foram também condenadas a restituir à autora o veículo locado. A sentença declarou ainda improcedente o pedido reconvencional formulado pela ré C. Da sentença apelaram as três rés. A Relação de Lisboa, por acórdão de 29.11.01, julgou "parcialmente procedentes os fundamentos da apelação", e revogou parcialmente a decisão recorrida, absolvendo a ré D do pagamento da quantia em que havia sido condenada, mantendo-se, no mais, o decidido na sentença. Recorrem agora de revista, as rés C e B. A primeira remata a sua alegação de recurso com a enunciação de um alargado leque de conclusões, com as quais pretende demonstrar, em síntese, que - a intenção das partes (i. e., da C e da B) ao contratarem a emissão do seguro-caução aludido nos autos consistiu - como o demonstram os protocolos firmados entre ambas - na prestação de garantia ao pagamento das rendas por parte dos clientes da B, locatários nos contratos de aluguer de longa duração; - o acórdão recorrido, apesar de reconhecer a nulidade da sentença da 1ª instância por omissão de pronúncia sobre a questão da anulação, pela recorrente, com efeitos a partir de 11.08.94, da apólice de seguro por falta de pagamento do sobre-prémio reclamado, não deu resposta a essa questão, não suprindo o invocado e reconhecido vício, sendo totalmente omisso sobre a questão da improcedência das alíneas c) e d) do pedido subsidiário quanto à mesma recorrente; - a considerar-se que a garantia do seguro-caução incide sobre o contrato de locação financeira, deve a condenação da recorrente ser limitada às alíneas a) e b) do pedido subsidiário, pois a tanto se resumirá a sua responsabilidade; - accionando a autora a garantia prestada pela apólice do seguro-caução, fica necessariamente vinculada ao cumprimento dos termos e condições em que tal garantia é prestada, designadamente às condições dos arts. 10º, 11º e 14º das condições gerais da apólice; todavia, - não foram ponderados os factos em que assenta o pedido reconvencional formulado pela recorrente, impondo-se, pois, a reformulação da especificação e do questionário nos termos oportunamente requeridos, seguindo-se então os demais termos até final; - o acórdão recorrido viola os arts. 236º e 238º do CC e o art. 659º do CPC. Deve, assim, - finaliza a recorrente - ser revogado o acórdão recorrido e ser a recorrente absolvida do pedido; ou, em alternativa, ser limitada a sua condenação ao pagamento das quantias referidas nas alíneas a) e b) do pedido subsidiário, caso em que deverá conhecer-se do mérito do pedido reconvencional. Por sua vez a B fez terminar a sua alegação enunciando um ainda mais alargado quadro conclusivo, que pode assim sintetizar-se: a) O seguro de caução directa é uma garantia autónoma, automática, à 1ª interpelação, completamente independente do contrato base - não é uma fiança. Não há, portanto, devedores solidários, mas apenas a seguradora, pois a recorrente, através desse seguro, transferiu a sua responsabilidade civil contratual, salvaguardando-se, assim, das consequências do incumprimento; b) Na verdade, o garante está obrigado a satisfazer a garantia de imediato, bastando que para tal o beneficiário o tenha solicitado, pelo que nunca poderia a recorrente ser condenada, mas apenas a seguradora, que assumiu a totalidade da responsabilidade da dívida, ou seja, o pagamento de todas as rendas vencidas e não pagas, bem como das vincendas, do contrato de locação financeira; c) A A, aquando da...
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