Acórdão nº 02P3185 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Novembro de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução21 de Novembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I1.1. O Tribunal Colectivo de Ourém, na sequência de audiência de julgamento, em processo comum, decidiu. a) - absolver o arguido JASM, da prática de 1 crime furto do art. 203.º, n.º 1 do C. Penal e de 1 crime de homicídio, na forma tentada, dos art.ºs 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, al. j), 22.º e 23.º do C. Penal; b) - condenar o mesmo arguido, pela prática de: - 1 crime de homicídio, na forma tentada dos art.ºs 131.º, 22.º, 23.º e 73.º, n.º 1, a) e b) do C. Penal na pena de 7 anos de prisão; - 1 crime de homicídio, na forma tentada, dos art.ºs 131.º, 22.º, 23.º e 73.º, n.º l, a) e b) do C. Penal na pena de 3 anos de prisão; - 1 crime de homicídio, na forma tentada dos art.ºs 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, j), 22.º, 23.º e 73.º, n.º 1, a) e b) do C. Penal, na pena de 4 anos de prisão; - 1 crime de furto do art. 203º, n.º 1 do C. Penal, na pena de 4 meses de prisão; - 1 crime de furto do art. 203.º, n.º 1 do C. Penal, na pena de 2 meses de prisão; - 1 crime de dano qualificado, dos art.ºs 213.º, n.º 1, c), 206.º, n.º l e 73.º, n.º l, a) e b) do C. Penal, na pena de 6 meses de prisão; - em cúmulo, nos termos do art. 77.º do C. Penal, na pena unitária de 11 anos de prisão. Condenou ainda o arguido JASM a pagar ao Hospital de São José a quantia de 62.950$00, acrescida de juros, à taxa legal, desde a notificação para contestar o pedido cível até pagamento; c) - absolver o arguido RMFC da prática de 1 crime de receptação do art. 231º, n.º 1 do C. Penal; d) - condenar o arguido RMFC, pela prática de 1 crime de receptação do art. 231.º, n.º 2 do C. Penal, 206.º, n.º 1 e 73.º, n.º 1, c) do C. Penal, na pena de 70 dias de multa, à taxa de 1.000$00 diários, a que corresponde, nos termos do art. 49.º, n.º 1 do C. Penal, prisão subsidiária por 46 dias; e) - Decretar, nos termos do art. 109.º, n.º 1 do C. Penal, a perda da arma, documentação a ela atinente e munições apreendidas. f) - Ordenar a entrega da cerca eléctrica identificada a fls. 79 e respectivos acessórios (fls. 80), bem como a rede de arame identificada a fls. 81 ao ofendido JA e do mais que se apreendeu a quem provar pertencer-lhe; g) - ordenar a entrega ao ofendido JA da quantia de 35.000300 (relativa ao valor da rede de arame zincado), a retirar do montante titulado pelo cheque entregue pelo arguido RMFC, devolvendo-se o restante a este arguido. 1.2. Inconformado, o arguido JASM recorreu para a Relação de Évora (proc. n.º 972/02), concluindo na sua motivação: 1ª - O Tribunal Colectivo deu como provado, além do mais, que o arguido, quando efectuou os disparos, sabia que dentro do Jeep se encontravam o Soldado S e a filha do ofendido JA. 2ª - E que, POR ISSO, previu como possível que, com a sua conduta pudesse tirar a vida a alguma dessas pessoas. 3ª - Deste facto, como se vê da motivação, ficou o Colectivo convencido a partir de depoimentos e declarações exteriores ao arguido. 4ª - Na verdade, tais elementos subjectivos, e intrínsecos ao arguido, não foram perscrutados através do próprio arguido. 5ª - Foi por circunstancialismos exteriores a ele que o Colectivo formou a sua convicção. 6ª - Entendemos nós, contudo, que o Colectivo não tem, na factualidade assente base para se catapultar a tal conclusão.: 7ª - Não entrou, o Tribunal Colectivo, em linha de conta com todos os factos do conhecimento comum, ou de conhecimento objectivo possível, com influência na apreciação. 8ª - É que uma caçadeira - como o Tribunal classificou a arma utilizada pelo arguido - pode usar vários tipos de projecteis. 9ª - Desde os cartuchos carregados com chumbo tão miúdo que quase parece poalha, como carregados com um único projéctil, a que vulgarmente se chama bala. 10ª - É completamente diferente a perigosidade de uns e de outros. 11ª - À medida que o número classificativo do chumbo aumenta, diminui o seu diâmetro. 12ª - Assim, o chumbo mais miúdo tem os nºs 9, 8, e o de maior diâmetro números mais pequenos - o n.º 1 é muito maior que o 9 - existindo, além do nº 1 ainda uma outra classificação de chumbo maior - os denominados zagalotes (de 6 ou 9 bagos), hoje proibidos. 13ª - O chumbo mais miúdo, por ser assim mesmo, quase não é utilizado, por ser pouco eficaz mesmo com pequenas aves (tordos, por exemplo). 14ª - Não ficamos a saber qual o chumbo utilizado pelo arguido ficando, assim, sem saber se utilizou o n.º.9, o n.º5, o n.º 1, ou bala. 15ª - A importância de se conhecer desta questão, assenta mesmo, em nosso entender, na probabilidade da tentativa de homicídio - a existir tal dolo quanto aos soldado S e à filha do ofendido JA - se tornar impossível. 16ª - Ficou, assim e antes de mais, por apurar se o meio utilizado pelo arguido era, ou não, adequado a causar a morte a todas aquelas pessoas. 17ª - Porque o leque de hipóteses é grande: se o chumbo é muito miúdo, não é mortal; se por uma bala, é um único projéctil e, por isso, só segue uma direcção. 18ª - E, neste caso, só estaria em risco de perder a vida o ofendido JA, a quem os tiros foram dirigidos. 19ª - Por outro lado, aquela conclusão - a da previsibilidade do arguido de poder causar a morte do Soldado S e da SC - tem pouco cabimento tendo em conta o seu posicionamento no interior do Jeep, a própria estrutura e configuração deste. 20ª - Como sabemos - e além disso, era fácil apurar - o jeep tem a separar o banco da frente - onde também se senta o condutor - do resto da parte do veículo que lhe fica à retaguarda, uma divisória em chapa. 21ª - E existia ainda, nas costas do Soldado S, o próprio espaldar do banco em que se sentava. 22ª - A divisória e o espaldar são suficientes para deter qualquer projéctil disparado nas circunstâncias em que o foram os dos autos. 23ª - Mesmo que o arguido tivesse utilizado balas e não houve mais nada entre a arma e o condutor, a chapa divisória e o espaldar do banco chegariam para, depois da própria porta do jeep, amortecer o impacto da bala que, se por acaso perfurasse tais obstáculos não teria força para, em circunstâncias normais, causar a morte. 24ª - Isto porque a alma lisa dos canos da caçadeira retira aos respectivos projécteis capacidade perfurante. 25ª - Na verdade, são as estrias dos canos das espingardas que as possuem que conferem aos projecteis por ela disparados um movimento de rotação e, por isso, um efeito de broca. 26ª - Também estava ao alcance do Tribunal Colectivo apurar se era, ou não, possível - além das questões atrás referidas - a filha do ofendido ser atingida por algum daqueles disparos. 27ª - O banco onde se sentava era lateral, isto é, tinha o espaldar encostado à parte esquerda do jeep, dando para a rua. 28ª - A SC estava entre o ofendido JA - seu pai - e o Soldado S - o condutor. 29ª - Tinha, assim, entre ela e o arguido, seu pai. 30ª - Este é um homem corpulento que pesa, pelo menos, 100 Kg. 31ª - Cobria, com o seu corpo, completamente o corpo da filha, sendo, por isso, impossível que algum projéctil que lhe fosse dirigido atingisse a filha. 32ª - Tendo ficado tudo isto por apurar, não pode o arguido ser prejudicado, tanto mais que tudo esteve ao alcance do conhecimento do Tribunal Colectivo. 33ª - O simples facto de o arguido saber - se é que sabia - que no interior do veículo se encontravam também aquelas duas pessoas, não chega para configurar o dolo, seja ele qual for. 34ª - Como já se referiu, se o disparo foi de bala, ela apenas toma uma direcção e, se foi de chumbo múltiplo, embora os bagos possam vir a tomar várias direcções, é preciso saber se são, ou não, adequados a causar a morte. 35ª - Aliás, podemos mesmo dizer, sendo do conhecimento comum que uma caçadeira, preparada para, quando usando cartucho de chumbo, o fazer abrir em cone, a curta distância não provoca este efeito. 1.3. Por acórdão de 18.6.02, a Relação de Évora, decidiu: - revogar o acórdão recorrido no concernente à subsunção jurídico-penal da conduta do arguido/recorrente de que resultaram danos na viatura (jeep) da GNR, enquadrando-se tal conduta na figura do crime de dano dos artºs. 212.º, n.º 1, 206.º, n.º 1 e 73.º, n.º l, als. a) e b) do C. Penal; - julgar parcial procedente o recurso, por razões diferentes das aduzidas pelo recorrente, revogando-se nessa parte, o acórdão recorrido e condenando-se o recorrente nas seguintes penas: - 6 anos de prisão, pelo crime de homicídio, na forma tentada, dos artºs. 131º, 22º, 23º e 73º, n.º l, als, a) e b) do C. Penal, cometido na pessoa de JA; - 2 anos e 6 meses de prisão pelo crime de homicídio, na forma tentada, das mesmas disposições legais, de que foi vítima SC; - 3 anos e 6 meses de prisão pelo crime de homicídio qualificado, na forma tentada, dos art.ºs 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, al. j), 22.º, 23.º e 73.º, n.º 1, als. a) e b) do C. Penal; - 3 meses de prisão pelo crime de furto (da cerca eléctrica) do art....

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