Acórdão nº 02S1193 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Dezembro de 2002

Magistrado ResponsávelEMÉRICO SOARES
Data da Resolução11 de Dezembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: "A" intentou a presente acção, com processo ordinário, contra "B", pedindo a condenação desta a: - Reconhecer a ilicitude do seu despedimento; - Reintegrá-lo ao serviço com todos os direitos de antiguidade e da sua categoria; - Pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas desde que comunicou ao A. a sua decisão de considerar rescindido o contrato de trabalho até à sentença; - Pagar-lhe 1.600.500$00, de retribuições salariais relativas aos meses de Julho a Novembro de 1996; - Pagar-lhe 320.100$00, de subsídio de férias vencidas em 01/01/96; - Pagar-lhe 62.700$00, de subsídio de alimentação dos meses de Julho a Novembro de 1996; - Apenas, no caso de não ser reconhecida a ilicitude do despedimento, pagar-lhe 880.275$00, de férias e subsídios de férias e de Natal proporcionais ao tempo de duração do contrato de trabalho no ano de 1996; - Reembolsar-lhe a totalidade das importâncias que este pagou ou venha a pagar para amortização dos pagamentos feitos pelo A. de dívidas contraídas para investimentos no Externato da Ré, no valor que vier a ser liquidado em execução de sentença; - Pagar-lhe os juros de mora das prestações pecuniárias calculadas desde o respectivo vencimento.

Para tanto, alegou, em síntese: tendo sido admitido ao serviço da Ré, em Outubro de 1976, ministrando aulas de educação física, no Instituto ..., pertencente à Ré, em Outubro de 1977 foi integrado nos quadros de pessoal do Externato ..., também pertencente à Ré, e ali trabalhou, sob as suas ordens e direcção até 22/11/96, data em que a Ré, por carta, considerou cessado o contrato de trabalho por abandono do trabalho. O A. tinha a categoria profissional de professor e, em Agosto de 1992, a Ré colocou-o a exercer as funções de director executivo do Externato. No exercício dessas funções de director executivo, e devido às dificuldades financeiras que o Externato atravessava, houve necessidade de contrair empréstimos junto de particulares e de uma instituição bancária, tendo o A. pago do seu bolso alguns dos empréstimos contraídos e continuou a pagá-los mesmo após o afastamento do cargo de director e da cessação do contrato de trabalho, quantias de que a Ré nunca o reembolsou. Na data em que a Ré considerou rescindido o contrato de trabalho, auferia a retribuição mensal de 320.100$00, não tendo recebido as retribuições salariais relativas aos meses de Julho a Novembro de 1996, nem o subsídio de férias relativo às férias vencidas em 01/01/96, nem o subsídio de alimentação dos meses de Julho a Novembro de 1996, como tão pouco pagou as férias e subsídios de férias e de Natal proporcionais ao tempo de duração do contrato de trabalho no ano de 1996.

Contestou a Ré, fazendo-o por excepção e por impugnação. Por excepção, arguiu a nulidade da citação, a incompetência do tribunal em razão da matéria, o caso julgado, a incompetência do tribunal em razão do território e, finalmente, o abandono do trabalho, tendo também impugnado os factos articulados pelo A.. E, deduzindo reconvenção, pediu o pagamento da quantia de 435.600$00, correspondente a 2 meses de aviso prévio que o A. não lhe facultou antes de abandonar o trabalho.

Findos os articulados, e após decisão dos incidentes de incompetência territorial e do apoio judiciário, foi, a fls. 340, corrigida a forma do processo que passou a seguir a forma sumária.

Após realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, julgando a acção parcialmente procedente, condenando a Ré a pagar ao A. a quantia de 2.258.576$00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação, e, bem assim, a pagar ao A. a quantia que vier a ser liquidada em execução de sentença, relativa ao reembolso da totalidade das quantias que o A. pagou ou venha a pagar para amortização dos pagamentos que fez ou venha a fazer das dívidas contraídas para investimentos no Externato da Ré.

Mais se julgou procedente a reconvenção, tendo o respectivo crédito da Ré, de 435.600$00, sido deduzido ao montante global dos créditos liquidados do A., de valor de 2.694.176$00, resultando o crédito do A. de 2.258.576$00, supra referido.

Inconformados, levaram a Ré e o Autor recursos dessa sentença para o Tribunal da Relação do Porto que, pelo douto acórdão de fls. 732 a 758, verso, negou provimento ao recurso da Ré e, concedendo provimento ao recurso do Autor, decidiu: A) Revogar a sentença na parte em que em que se julgou procedente a reconvenção, absolvendo o Autor desse pedido: B) Julgar a acção parcialmente procedente e, declarando a ilicitude do despedimento do Autor, condenar a Ré a pagar ao A. a quantia global de 26.296.240$00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação da Ré.

Irresignada com o assim decidido traz agora a Ré recurso desse acórdão para este Supremo Tribunal, recorrendo o Autor subordinadamente. Apresentando, oportunamente, a respectiva alegação, rematam-na os Recorrentes com as seguintes conclusões: A Ré (recorrente principal), "B": 1. A eventual existência de um contrato de trabalho entre as partes não coíbe as mesmas partes de firmarem entre si contratos de outra natureza, sem que estes fiquem sujeitos ao regime e disciplina daquele; 2. O Tribunal de Trabalho do Porto é incompetente em razão da matéria para julgar a presente acção no que respeita à relação existente entre Rte e Rdo no período que vai de Agosto de 1992 até 24 de Outubro de 1996; 3. O Mmo. Juiz da 1ª instância, e o venerando Tribunal da Relação ao aceitar as conclusões daquele, ao tomar conhecimento do já decidido no Tribunal Cível através das certidões juntas aos autos deveria desde logo conhecer da incompetência em razão da matéria do Tribunal de Trabalho para conhecer da questão relacionada com a qualificação da relação existente entre Rte e Rdo e absolver a Rte da instância; 4. Não o fazendo violou a norma contida no art. 14º da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, sendo que a incompetência absoluta do Tribunal constitui excepção dilatória, que implica a absolvição da instância da Rte (Arts. 494 a), 493, n.º 2 e 105, n.º1, do C.P.C.); 5. Ficou também inequivocamente provado que os empréstimos que o Rdo alega ter contraído em proveito do Externato, foram contraídos no período em que o Rdo foi Director do Externato, e como tal abrangido por um outro regime que não o laboral, mas sim o de uma mera prestação de serviços, o que significa que tal matéria não advém de qualquer relação laboral pelo que, só o Tribunal Cível se poderia pronunciar acerca de tais factos 6. Se o Tribunal de Trabalho é incompetente para conhecer da questão relacionada com o período em que o Rdo foi Director do Externato da Rte, então também terá de ser Incompetente para conhecer desta questão das dívidas, pelo que, também aqui o Mmo. Juiz da 1ª instância e o venerando Tribunal da Relação, ao não conhecerem da incompetência em razão da matéria alegada pelo Rte, violou a norma contida no artº 14º da LOTJ, e também por isso, a incompetência absoluta do Tribunal constituí, também quanto a esta questão das dívidas, excepção dilatória, que implica a absolvição da instância da Rte (Artº 494º -a), 493º, n.º 2 e 105º n.º 1 do C.P.C.); 7. Nos termos do n.º 3 do artº 510º do C.P.C., o despacho saneador que conheça o caso previsto na alínea a) do n.º 1 desse mesmo artigo, constitui caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas, logo que transite; 8. A matéria respeitante à competência do Tribunal em razão da matéria para julgar o período em que o Rdo foi Director do Externato está definitivamente decidida e confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto, e o Mmo. Juiz da 1ª instância, e a Relação, ao aceder às conclusões daquele, ao decidir incluir o período em que o Rdo foi Director do Externato como fazendo parte do Contrato Individual de Trabalho, aceitando assim a sua competência para julgar a presente acção, ofendeu o Caso Julgado.

9. Nos termos da alínea i) do artº 494º do C.P.C., o caso julgado constitui excepção dilatória que obsta a que o Tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar á absolvição da instância (Artº 493 n. 2 e 497 a 499 do C.P.C.); 10. Com a procedência do presente recurso quanto à questão da incompetência do Tribunal de Trabalho em razão da matéria para julgar os pedidos do Rdo, bem como da existência de caso julgado e da sua consequente ofensa, quer a condenação da Rte a pagar os meses não pagos de Julho a Outubro + 22 dias do mês de Novembro de 1996, quer a condenação da Rte a pagar os proporcionais, quer ainda a condenação da Rte a reembolsar as quantias que o Rdo pagou ou venha a pagar respeitante às dívidas contraídas para proveito do Externato, deverão ser declaradas NULAS e de nenhum efeito nos termos do artº 669º n.º 2 - b) do C.P.C., e substituídas por uma única decisão que reconheça a incompetência do Tribunal de Trabalho do Porto para julgar os pedidos formulados pelo Rdo e absolver a Rte da instância, bem como reconhecer a existência de Caso Julgado e a sua consequente ofensa, absolvendo-se a Rte nos mesmo termos; 11.Para o caso de não se considerarem as conclusões supra apontadas, deverão contudo as contas finais serem rectificadas, uma vez que, considerada provada a tese do abandono de Trabalho em 24 de Outubro de 1996, não pode considerar-se os últimos 22 dias úteis desde 24 de Outubro até 22 de Novembro de 1996, uma vez que nesse período o Rdo não trabalhou; 12. E se não trabalhou, não pode receber qualquer remuneração por trabalho não prestado. (Cfr. art.os 1º, alínea b) do artº 19º e artº 82º do DL 49408 de 24/11/ 69); 13. O venerando Tribunal da Relação não tomou em devida conta a impugnação especificada que a aqui Rte. fez, no artº 79º da Contestação, das matérias constantes dos artigos 156º a 163º da Petição Inicial, pelo que não poderia nem deveria aditar à matéria de facto os artigos 88º a 90º da mesma; 14. Tendo-o feito caiu no âmbito da alínea b) do n.º 2 do artº 669º do CPC, pelo que deve o acórdão da Relação ser reformado quanto...

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