Acórdão nº 02S3742 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Outubro de 2003
Magistrado Responsável | VÍTOR MESQUITA |
Data da Resolução | 01 de Outubro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:1. Relatório "A", viúva, residente na R. ..., Matosinhos, intentou a presente a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma comum, contra "B - Centro de Formação ...", peticionando se condene a R. a reconhecer a categoria de contabilista e a atribuir à A. as funções contratadas e executadas de contabilista e a pagar-lhe as diferenças salariais pedidas e vincendas com base na retribuição que devia ter sido actualizada em 1998 e em 1999 e o prémio de responsabilidade, com juros legais desde o vencimento de cada obrigação e até integral pagamento, e a ser fixada uma sanção pecuniária compulsória eficaz por cada dia de atraso no cumprimento da sentença. Em fundamento da sua pretensão alegou, em síntese: que foi admitida ao serviço do R. em 1990 para exercer funções de contabilista, categoria profissional que lhe foi atribuída, sendo que a partir de Outubro de 1995 a R. lhe atribuiu unilateralmente a categoria de técnico especialista; que adoeceu em 10/03/97 e esteve de baixa até 17/09/98 e, na sequência da alta, foi mandada ficar em casa sob a fórmula "dispensada de comparecer ao serviço, por motivo de reestruturação"; que foi mandada retomar o serviço em 17/1/2000 e, a partir desta data, foi posta inactiva num gabinete; que com a colocação na inactividade, o réu iniciou um processo de desgaste da autora; que na altura do regresso ao serviço, o Director lhe atribuiu a gestão do arquivo e do imobilizado e deu-lhe uma informação escrita para formação, mas não lhe atribuiu qualquer tarefa para executar; que o réu pagava à autora um prémio de responsabilidade em 14 meses e deixou de processar-lhe esse prémio a partir do mês de Abril de 1997; que quanto aos seus colegas que o auferiam, o integrou no vencimento a partir de 1998; que a retribuição fixada com efeitos a Janeiro de 1997 não foi alterada nos anos de 1998 e 1999, ao contrário dos seus colegas e que a conduta do réu lhe causou danos morais, com repercussões na sua saúde e no seu agregado familiar, que lhe causaram síndroma depressivo grave, com perigo para o seu equilíbrio físico e psíquico, os quais são indemnizáveis nos termos dos artºs. 483º e 496º, nº. 1 do C. Civil. O R. contestou a acção impugnando o alegado pela A. e invocando no seu articulado, em síntese, que pelo menos desde Março de 1997, a autora passou a ser responsável pela cabimentação, pela imputação de custos e pela informação periódica a remeter ao IEFP e à contabilidade pública; que em 1995 ocorreu no réu uma ampla reestruturação dos seus serviços, que determinou alteração nas categorias profissionais; que no caso da autora, verificou-se a sua reclassificação como técnica especialista; que nunca a autora reagiu perante o réu contra essa categoria e que o prémio de responsabilidade tinha como pressuposto o exercício efectivo de determinadas funções. Questionou ainda o fundamento da peticionada indemnização por danos não patrimoniais e concluiu pela improcedência da acção e absolvição do pedido. A A. veio a fls. 63 a 65 apresentar resposta e aditar factos novos, alegando, em suma, que o réu se lembrou de criar nova aparência de exercício de funções, obrigando a autora a fazer deslocações a Barcelos sob o pretexto de aprender a gestão do imobilizado, que a autora não carecia de qualquer ensinamento da pretensa gestão do imobilizado e perdia grande parte do tempo na viagem e depois passava o resto do tempo útil sentada, inactiva, a ver os outros trabalhar com o computador, o que tudo lhe causa uma depressão ansiosa e reactiva, provoca o recurso a calmantes e lhe cria uma situação de instabilidade emocional, factos que em seu entender são geradores de danos não patrimoniais que completam o valor indemnizável do item 33º da petição, a arbitrar nos termos do artº. 28º do Código de Processo do Trabalho. O R. contestou este aditamento, alegando essencialmente que as deslocações a Barcelos cabiam no âmbito da gestão do imobilizado e concluindo como na contestação. Foi proferido despacho saneador e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e controvertida, objecto de reclamação, oportunamente decidida. Em fase posterior a este despacho, veio a autora a fls. 83 a 84, aditar factos novos integrantes de nova causa de pedir, alegando, em síntese, que: no dia 9 de Janeiro de 2001, o réu encarregou a Dra. C de invectivar a autora sobre o que tinha feito; que se travou uma discussão entre ambas, pela qual a autora lhe fez ver que o jogo que estava a adoptar era incorrecto; que tal foi a pressão desse dia, acumulada com toda uma situação, que no dia 10 de Janeiro de 2001 a autora sofreu um enfarte agudo do miocárdio e teve de ser conduzida ao Hospital, onde ficou internada, e que não reúne condições para receber subsídio de doença em virtude de ter estado de baixa médica de 8 de Junho a 11 de Novembro de 2000, pelo que pede seja o réu condenado a pagar-lhe a retribuição integral dos meses de Janeiro de 2001 em diante até plena recuperação, com juros legais não o fazendo no fim de cada mês, e em melhor cálculo de indemnização por danos não patrimoniais. O réu apresentou também contestação a este aditamento e concluiu pela improcedência do pedido nele formulado. Ambos os aditamentos foram admitidos por despacho. Foram determinados aditamentos à matéria de facto provada e à base instrutória, em consequência do aditamento de fls. 83-84. Designado dia para o julgamento, a este veio a proceder-se com observância das formalidades legais, após o que foi decidida a matéria de facto em litígio e proferida sentença que julgou inepta a petição inicial no que concerne aos danos não patrimoniais invocados na petição inicial e nulo todo o processo quanto a eles, absolvendo o réu nesta parte da instância. Decidiu ainda a mesma sentença condenar o réu: - a atribuir à autora a execução efectiva de funções inerentes à sua categoria; - no pagamento da quantia de Esc. 10.000$00 (dez mil escudos) por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação em que foi condenado, a título de sanção pecuniária compulsória; - a pagar à autora a quantia de Esc. 300.000$00 (trezentos mil escudos) a título de indemnização por danos de natureza não patrimonial; - a pagar a autora o denominado "prémio de responsabilidade" actualmente no valor de Esc. 22.700$00 (vinte e dois mil e setecentos escudos) mensais; - a pagar à autora o montante global de Esc. 610.946$00 (seiscentos e dez mil novecentos e quarenta e seis escudos) a título de "prémios de responsabilidade" em dívida desde Abril de 1997 a Maio de 2000, inclusive, acrescida de juros sobre cada uma das prestações devidas, desde as datas dos respectivos vencimentos, à razão de Esc. 22.700$00 (vinte e dois mil e setecentos escudos) mensais, calculados à taxa de 10% até 17/04/99 inclusive e de 7% a partir desta data, até integral pagamento. Inconformada a A. recorreu de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, por douto acórdão de 8 de Abril de 2002, negou provimento ao recurso e confirmou a sentença da 1ª instância, fazendo uso da faculdade prevista no artº. 713, nº. 5 do CPC. De novo inconformada a A., veio recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando nas alegações as seguintes conclusões: 1 - O R. é um centro de formação profissional da indústria têxtil, de seu nome, pelo que o seu objecto social ou actividade e a sua natureza estão inscritos no nome ou firma e ressaltam das actas juntas e dos articulados. 2 - A Relação deveria ter preenchido a lacuna factual aparente, firmando a actividade do R. 3 - De todo o modo, o juiz tem obrigação de conhecer o direito e, como tal, de saber que é aplicável ao R. a PRT para os trabalhadores administrativos, como a A. lhe adiantou, até por falta de indicação de uma regulamentação colectiva de trabalho específica, que deveria ter sido alegada como excepção (artº. 1, nº. 3 da PRT do BTE nº. 9/96, pgs. 135). 4 - Nos termos do artº. 2º da PRT do BTE nº. 9/96, pgs. 135, o R. tinha de classificar a A. de acordo com as funções efectivamente desempenhadas (norma geral de toda a regulamentação colectiva de trabalho), pelo que a categoria profissional que lhe atribuiu de técnica especialista é nula e deve a sentença condenar expressamente o R. na atribuição à A. da categoria de contabilista com as respectivas funções. 5 - O pedido de danos não patrimoniais foi feito na petição inicial, levado ao valor da acção, reconhecido como tendo sido feito na contestação, reforçado na resposta e nem careceu de esclarecimento nos termos do artº. 193º, nº. 3 do CPC, pelo que, pelo mero sentido da acção e confronto com os demais articulados (Ac. do STJ de 26.4.95, in CJ, 1995, tomo 1, p. 155), não é inepto e se descobre imediatamente que se trata de um lapso manifesto (artº. 249º do C.Civil - Acórdão da Relação de Lisboa de 23.4.98, in C.J. 1998, tomo 2, pgs. 130. 6 - Em 1998 e 1999 o R. procedeu a aumentos gerais e uniformes para todos os seus trabalhadores, independentemente do mérito relativo e esclareceu que não aumentou a A. nesses anos por ter estado doente parte de cada ano. 7 - Não precisava a A. de invocar porque é que não foi aumentada em contraposição aos seus colegas por ter sido um aumento geral e incondicionado, mas dúvidas não existem de que o R. a quis discriminar por virtude da doença, como ele próprio alegou, em violação da doutrina do Acórdão nº. 16/96 do STJ (in DR 1ª série I-A, nº.º 280, de 4.12.96) e do princípio da igualdade de tratamento (artº. 59º, nº. 1, al. a) da C R P). 8 - Os prémios seguem o mesmo regime da retribuição base como seguiram em relação aos seus colegas, pelo que deve o R. ser condenado a pagar as diferenças salariais pedidas e no valor actualizado da retribuição de base e dos prémios. 8 - O acórdão recorrido violou os artºs. 1º, nº. 3 e 2º da PRT do BTE nº. 9/96, pgs. 135, o artº. 249º do C.Civil e o artº. 59º, nº. 1, al. a) da CRP. A recorrida não contra alegou. O Exmo. Procurador Geral Adjunto emitiu...
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