Acórdão nº 03B3515 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Março de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução25 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Plenário das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça: "A" intentou, no Tribunal Judicial de Vila Verde, acção declarativa sob a forma sumária contra a "Companhia de Seguros B" (actualmente "... - Companhia de Seguros, SA") pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a indemnização de 13.868.767$00 (69.177,12 Euros) acrescida de juros legais desde a citação

Alegou, para tanto, ter sido o condutor do veículo segurado na demandada que deu causa ao embate gerador dos danos patrimoniais e morais cuja compensação reclama

Citada, contestou a ré, por excepção e impugnação, concluindo por que se julgue a acção improcedente

No mesmo articulado a ré requereu e foi-lhe deferida a intervenção de terceiro, C, condutor do automóvel de matrícula RN, com o fundamento de que este omitiu assistência ao autor, de que resulta o direito de regresso previsto no art. 19º, al. c), parte final, do Dec.lei nº 522/85

Este condutor, simultaneamente segurado, apresentou contestação própria em que nega ter abandonado o sinistrado mas aceita a versão do acidente adiantada pelo autor

A final foi proferida sentença que: a) condenou a demandada no pagamento ao autor de indemnização por danos patrimoniais (emergentes) no valor de 63.47 Euros e por danos morais, no montante de 2.253,61 Euros, o que perfaz um crédito indemnizatório global de 630,55 Euros (?), acrescido de juros às taxas legais previstas pelo art. 559º do Código Civil (ou outras entretanto vigentes), desde 12/01/99 e até efectivo e integral pagamento; b) condenou a mesma demandada no pagamento ao autor de indemnização por danos materiais - perda de salários e de capacidade de ganho decorrente da incapacidade absoluta temporária e parcial permanente que foi apurada - a liquidar em execução de sentença; c) absolveu a ré do restante peticionado

Inconformada com essa decisão, dela o autor apelou, vindo, no respectivo conhecimento, o Tribunal da Relação de Guimarães, em acórdão de 30 de Abril de 2003, a julgar parcialmente procedente a apelação, condenando a ré a pagar ao autor a indemnização global de 35.706,75 euros, correspondente a 75% (percentagem de responsabilidade do condutor do RN) dos montantes parciais de 7.500 Euros (danos morais), 29.927,87 Euros (lucros cessantes), 10.055 Euros (salários perdidos) e 126,94 Euros (despesas efectuadas), e juros acrescidos da forma fixada na sentença recorrida. Interpôs, agora a ré recurso de revista, pugnando pelo provimento do recurso com a alteração do acórdão recorrido e a sua absolvição do pagamento de importância que ultrapasse 4.000.000$00 (19.951,92 Euros)

Em contra-alegações defendeu o recorrido a manutenção do julgado. Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir. A recorrente findou as respectivas alegações formulando as conclusões seguintes (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. A indemnização global dos danos sofridos pelo autor eleva-se ao montante de 41.784,62 Euros, sendo 7.500 Euros (danos morais), 24.939,89 Euros (lucros cessantes), 9.217,79 Euros (salários perdidos) e 126,94 Euros (despesas efectuadas). 2. A responsabilidade pelo risco em acidente de viação deve ser apreciada em concreto e não em abstracto. 3. Na dúvida gerada pela insuficiência da matéria de facto apurada, deve ser fixado o grau de responsabilidade de cada um dos veículos na proporção de metade, atenta a regra do art. 506°, n° 2, do C.Civil

  1. Com efeito, desconhece-se qual dos veículos contribuiu em maior grau para os danos

  2. Não estando provado que foi o veículo ligeiro que embateu no ciclomotor, nem sendo relevante

  3. Da factualidade alegada sob os n°s 11, 12 e 13 da petição ficou apenas provado que o RN embateu no ciclomotor tripulado pelo autor (n° 3 dos factos apurados no acórdão recorrido). Dizer isto ou que o ciclomotor embateu no RN, sem se saber, num e noutro caso, o ponto da estrada (caminho) em que tal aconteceu, é exactamente a mesma coisa

  4. A indemnização fundada no risco tem como limite máximo o montante correspondente ao dobro da alçada da relação

  5. Na data do acidente dos presentes autos (07/11/96) a alçada da relação era de 2.000.000$00 - art. 20°, n° 1, da Lei nº 38/87, de 23 de Dezembro

  6. Por conseguinte, a indemnização a atribuir ao autor não deve ultrapassar o dobro de tal importância, 4.000.000$00 (19.951,92 euros), a que há-de deduzir-se a já paga pela ré àquele durante o período em que não pôde retomar o trabalho, 300.000$00 (1.496,39 euros) - n° 17 dos factos apurados no acórdão recorrido

  7. O acórdão recorrido violou lei substantiva, vigente, por não revogada, expressa ou tacitamente, no caso, o disposto nos arts. 506°, n° 2, 508°, n°1, 564° e 566° do C.Civil e a norma do art. 20º, nº 1, da Lei nº 38/87

    Os factos apurados, em definitivo, pela Relação, são os seguintes: i) - cerca das 19,45 horas do dia 7 de Novembro de 1996, ocorreu um embate no lugar do Outeiro, freguesia de S. Miguel do concelho de Vila Verde, em que intervieram o ciclomotor 1 VVD, propriedade de De conduzido pelo autor e o veículo ligeiro de passageiros RN, conduzido pelo respectivo proprietário, C; ii) - o demandante circulava pela Estrada Municipal que liga a EN 201 ao lugar da Torre e nesse sentido de marcha; iii) - por seu lado o veículo ligeiro de passageiros RN circulava em sentido contrário; iv) - o caminho por onde circulava o RN tinha 4,5 metros de largura e o piso era em pedra (calçada)

    v) - o RN embateu no ciclomotor tripulado pelo autor; vi) - em consequência do embate o demandante sofreu fractura exposta segmentar da tíbia esquerda e fractura do prato tibial esquerdo; vii) - do local do embate foi imediatamente transportado para o Hospital Distrital de S. Marcos, em Braga, onde foi submetido a uma intervenção cirúrgica; viii) - tendo tido alta hospitalar no dia 7 de Janeiro de 1997, recolheu ao seu domicílio; ix) - depois disso, em Agosto de 1997, foi novamente internado no Hospital Santa Maria, no Porto, durante três dias, para extracção do material de osteossíntese; x) - apesar dos tratamentos a que se submeteu, ficou a padecer de ligeira atrofia da coxa esquerda, genum valgum, fractura viciosamente consolidada e desvio axial; xi) - essas sequelas provocam-lhe uma incapacidade parcial permanente para o trabalho de 15%; xii) - as lesões sofridas provocaram-lhe dores físicas tanto no momento do acidente como no decurso do demorado tratamento; xiii) - o autor nasceu em 04/11/62; xiv) - o autor era saudável e fisicamente bem constituído; xv) - o autor trabalhava à data do embate e exerce actualmente a actividade de trolha; xvi) - ganhava 7.000$00 diários; xvii) - por causa dos ferimentos e dos tratamentos sofridos o autor só pôde retomar o trabalho cerca de 1 ano após aquele embate; xviii) - a demandada pagou ao autor durante o período em que este não pôde retomar o trabalho a quantia de 300.000$00 (1.496,39 Euros); xix) - em consequência do embate e das lesões sofridas o autor pagou 39,90 Euros de honorários médicos; 54,87 Euros em meios de diagnósticos; 10,97 Euros em medicamentos e pelo menos 21,20 Euros em transportes; xx) - a demandada, através de contrato de seguro titulado pela apólice nº 50.5441640, assumiu a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo RN; xxi) - o condutor do RN, ocorrido o embate, abandonou o local e não prestou assistência ao autor, tendo em seguida chegado ao local várias pessoas que o fizeram

    Como acima vimos, o acórdão recorrido, para atingir a indemnização global de 35.706,75 Euros que atribuiu ao autor, calculou parcelarmente a quantia correspondente a cada um dos diversos danos por ele sofridos. Assim, fixou o montante total dos danos não patrimoniais em 7.500 Euros, dos lucros cessantes em 29.927,87 Euros, dos salários perdidos em 10.055 Euros e das despesas efectuadas em 126,94 Euros, tudo na quantia global de 47.609,81 Euros, após o que deduziu ao montante fixado a percentagem de 25% em que quantificou a responsabilidade deste no acidente. Ora, quanto aos valores dos mencionados danos parcelares, a recorrente apenas discorda dos respeitantes aos salários perdidos, cujo montante sustenta ser de 1.848.000$00 (9.217,79 Euros) e dos que concernem aos lucros cessantes, que pretende deverem ser de 5.000.000$00 (24.939,89 Euros), conformando-se com os demais valores. Temos, portanto, perante o exposto e face ao que resulta das conclusões das alegações, que abordar, na apreciação do recurso, as questões seguintes: I. O valor total que deve ser atribuído pelos danos referentes aos salários perdidos em consequência das lesões que o autor sofreu no acidente. II. O valor correspondente aos lucros cessantes (perda futura da capacidade de ganho por virtude da IPP com que o autor ficou). III. Determinar a percentagem de responsabilidade no acidente que, a título de responsabilidade pelo risco, deve ser atribuída a cada um dos condutores (veículos). IV. Averiguar se deve aplicar-se ao caso o limite indemnizatório fixado, quanto à responsabilidade objectiva, pelo art. 508º, nº 1, do C.Civil. I. A primeira questão resulta de mero preciosismo da recorrente que, aceitando (porque teve que aceitar) ser o apuro diário do autor de 7.000$00, vem apenas interrogar se este seria remunerado ao mês ou ao dia e, neste caso, sustentar que ele apenas trabalharia nos dias úteis, ou seja, 22 dias em cada mês. Considerou o acórdão, e nesta parte não pode ser impugnado, que o vencimento diário do autor era de 7.000$00, isto é, que o autor ganhava aquele montante por dia (e ainda bem para a recorrente porquanto se o vencimento fosse mensal ainda teria que pagar a parte devida do subsídio de férias e 13º mês). Doutro passo, entendeu a decisão em crise que o mesmo trabalhava 24 dias por mês. E também neste aspecto bem decidiu. É facto notório que os trolhas, como todos os trabalhadores da arte, trabalham por norma aos sábados e, por...

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