Acórdão nº 03B4109 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Março de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução09 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" deduziu, por apenso à execução que lhe move B, embargos de executado, arguindo a incompetência territorial e invocando a prescrição da acção cambiária e a nulidade do contrato de mútuo subjacente à emissão dos cheques dados à execução. Concluiu pela procedência das excepções e absolvição da instância executiva e pela declaração da nulidade do contrato de mútuo celebrado. Contestou o embargado pugnando pela improcedência das excepções invocadas. Remetido o processo ao tribunal declarado competente, foi exarado despacho saneador no qual o M.mo Juiz, sentindo-se a tal habilitado, conheceu directamente do mérito da causa e julgou os embargos procedentes, absolvendo em consequência o embargante do pedido executivo, declarando extinta a execução. Inconformado apelou o embargado, sem êxito embora, uma vez que o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 15 de Maio de 2003, julgou improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida. Interpôs, agora o mesmo embargado recurso de revista, pretendendo a revogação do acórdão recorrido e sua substituição por outra decisão que julgue os embargos improcedentes. Não houve contra-alegações. Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir. O recorrente findou as respectivas alegações formulando as conclusões seguintes (e é, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. O exequente alegou no artigo 1º da petição executiva que mutuou ao executado 3.000.000$00 e que este emitiu os cheques dos autos para titular tal capital e os juros. 2. Ora, o M.mo Juiz da 1ª instância deu como assente - sem que a Relação corrija tal entendimento - que o exequente mutuou 3.709.194$00. Trata-se de um erro de facto com profundas consequências na decisão de direito. 3. Com efeito, ao tempo em que foi emprestado o dinheiro só o mútuo de valor superior a 3.000.000$00 (art. 1143º do CC na redacção que lhe deu o DL 163/95, de 13/7) é que estava sujeito a escritura pública. 4. Logo, nem a quantia mutuada foi de valor superior a 3.000.000$00, nem estava um tal mútuo obrigado a escritura pública. 5. As exigências de forma estão, no caso dos autos, respeitadas. 6. Com efeito, o facto de o executado ter subscrito e entregue ao exequente os cheques em causa permite concluir que o mútuo está titulado por escritos suficientes. 7. O cheque embora constitua uma ordem de pagamento dirigida a um depositário de valores do sacador, também, por outro lado, corporiza e contém o reconhecimento implícito de uma dívida e uma promessa de pagamento de um crédito de que é titular o beneficiário do cheque. 8. A nulidade por falta de forma de um contrato de mútuo não afecta a relação cambiária que se mantém incólume, por ter natureza abstracta. 9. A execução instaurada com base nos cheques não pode ser afectada pela falta de forma do mútuo subjacente mesmo quando este devesse ser celebrado por escritura pública. No caso dos autos não só o mútuo não estava sujeito a tal forma como até está titulado por escritos particulares bastantes. 10. Quanto aos cheques de fls. 4, 5 e 6 o M.mo Juiz da 1ª instância, secundado pela Relação, entendeu que não têm força executiva porque não foram apresentados a pagamento dentro dos 8 dias do artigo 29º da LUC e que, consequentemente, não terá quanto a eles o exequente título executivo. 11. Ora, mesmo quando a letra ou o cheque não valham como título executivo cartular - por exemplo por prescrição - valem, contudo, como títulos executivos nos termos da alínea c) do artigo 46º do CPC na redacção dada pelo DL 329-A/95, de 12/12, desde que o exequente tenha invocado o negócio subjacente ou causal, como o exequente fez nestes autos. 12. A falta de apresentação do cheque a pagamento no prazo de 8 dias contados do saque inutiliza-o como título executivo, mas apenas no que respeita à acção cartular. 13. Por outro lado, a ultrapassagem do prazo de 8 dias para apresentação a pagamento dos cheques e sua ineptidão para servirem de títulos executivos em acções cíveis, nomeadamente por não terem sido apresentados a pagamento no prazo, são questões marcadamente peremptórias, de caducidade, e não de exequibilidade ou de existência/suficiência de título como afirmado no acórdão recorrido. 14. Ora, as excepções peremptórias - incluída a caducidade quando relativas a direitos disponíveis - não são de conhecimento oficioso: é o devedor, o réu ou o executado quem tem de a invocar. 15. E jamais o executado alegou algo sobre a inexequibilidade dos cheques de fls. 4 a 6 nem sobre a questão de terem ou não sido apresentados a pagamento fora do prazo, tendo sido o M.mo Juiz da 1ª instância - e só ele - quem suscitou esta questão, pelo que não obstante o que se afirma no acórdão, conheceu-se de questão de que não podia conhecer-se o que acarreta a nulidade da sentença da 1ª instância por excesso de pronúncia, nulidade não atendida no acórdão e que deve ser aqui e agora reconhecida e declarada. 16. Se em processo penal é dever oficioso do Juiz certificar-se de que a apresentação a pagamento do cheque foi feita no prazo de 8 dias do artigo 29º da LUC como condição ou requisito de punibilidade da infracção de cheque sem provisão, já em direito civil é ao executado - e só ao executado - que cabe, como questão impeditiva do direito de crédito do portador do cheque, invocar e esgrimir a questão da extemporaneidade da apresentação do cheque a pagamento. 17. A sentença e o acórdão recorridos incorrem em nulidade e interpretaram ou aplicaram incorrectamente as normas dos artigos 1.143º do CC e 46º c) e 496º do CPC. Encontra-se fixada pelas instâncias a seguinte matéria fáctica: i) - o embargado é portador dos "cheques" que fazem fls. 4 a 11 dos autos principais, todos sacados pelo executado sobre o "Banco C: - nº 01858195, emitido em 20/04/97, do montante de 339.194$00; - nº 01858189, emitido em 03/05/97, do montante de 300.000$00; - nº 01858190, emitido em 03/06/97, do montante de 300.000$00; - nº 01858191, emitido em 03/07/97, do montante de 300.000$00; - nº 01858196, emitido em 03/07/97, do montante de 1.570.000$00; - nº 01585192, emitido em 03/08/97, do montante de 300.000$00; - nº 01585193, emitido em 03/09/97, do montante de 300.000$00; - nº 01585194, emitido em 03/10/97, do montante de 300.000$00; ii) - os referidos cheques foram apresentados a pagamento e foram todos devolvidos com a indicação de falta de provisão; iii) - os cheques de fls. 4, 5 e 6, datados de 20/04/97, 03/05/97 e 03/06/97, foram apresentados a pagamento em 01/07/97; iv) - com fundamento nos factos referidos em i) e ii) o embargado apresentou queixa crime contra o embargante; v) - por despacho de 14/04/98, por se ter entendido que os cheques eram pós datados, foi declarado extinto o procedimento criminal e arquivado o...

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