Acórdão nº 03P2851 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Outubro de 2003

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução09 de Outubro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Supremo Tribunal de Justiça I 1. O Tribunal Colectivo da 4.ª Vara Criminal de Lisboa (proc. comum n.º 27/2002) condenou MS e JMMS, respectivamente nas penas de 7 anos e 6 anos de prisão pelo crime simples de tráfico de estupefacientes do art. 21.º n.º 1 do DL n.º 15/93 de 22/01 e absolveu do mesmo crimes BMGR, NMMF, HV, DHLV, MBL e LAMT

2. Recorreram para a Relação de Lisboa o arguido JMMS, interlocutoriamente e da decisão final, e o Ministério Público do despacho que lhe indeferiu a audição em audiência de prova arrolada e da parte do acórdão que absolveu os arguidos BMGR, NMMF, HV e LAMT

2.1. O arguido JMMS concluiu então quanto ao recurso interlocutório: 1 - Nas escutas telefónicas atribuídas ao recorrente ou em que ele seria interveniente, cujas transcrições constam dos apensos D, DI, E, EI, E2, E3, F e G, ocorreu uma falta de suficiente controlo jurisdicional das escutas, caracterizada na ausência de qualquer auto ou sequer escrito onde se revele terem sido as gravações ouvidas e seleccionadas e mandados transcrever por um Magistrado Judicial

2 - Debalde se procurará nos autos qualquer referência sequer à apresentação em juízo das fitas magnéticas recolhidas pelo OPC, mas tão-somente das suas transcrições

3 - Os despachos judiciais sobre as transcrições limitam-se a mandar juntar aos autos, nunca ali aparecendo sequer qualquer menção ao facto de o Juiz ter ouvido as fitas magnéticas

4 - O art. 188° n° 3 conjugado com o n° 1 determina que o Juiz deve OUVIR as fitas magnéticas pois só assim as poderá seleccionar e mandar transcrever. 5 - A consequência de tal omissão só poderá fazer concluir pela inexistência de controlo jurisdicional das escutas

6 - O que acarreta a NULIDADE ABSOLUTA por constituir método proibido de prova em flagrante violação do art. 32° n° 6 da C.R.P

7 - Tendo sido tudo praticamente efectuado pelo OPC. e não pelo Juiz, houve violação das regras de competência do Tribunal - art. 269° n° 1 aI. e) e d), 187°, 1900, 17°, 188° n° 3 e 101° n° 2 e 3 - o que só por si, na medida em que invadem competências estritamente judiciais, constitui NULIDADE INSANA VEL - art. 119° al. e) do C.P.P

VIOLARAM-SE OS ART°s: - 188° n° 1 do C.P.P. porque o Juiz não ouviu as gravações, nem as seleccionou, antes se limitou a ordenar a junção das transcrições que lhe foram trazidas pelo OPC

- 269° n° i ai. c) e d), 187°, 190°, 17°, 188° n° 3 e 101° n° 2 e 3 porque o OPC. invade competências estritamente judiciais

- art. 99° do C.P.P. porque uma diligência de AUDIÇÃO e SELECÇÃO de escutas telefónicas efectuadas por um Juiz devem ser reduzidas a AUTO

-18°, 32° n° 6,34° e 37° da CRP

2.2. Quanto ao acórdão condenatório: 1 - O recurso intercalar apresentado tempestivamente e ao qual foi dado subida diferida deve obter provimento, anulando-se o resultado das escutas telefónicas, por falta de controlo jurisdicional adequado, sendo inconstitucional qualquer interpretação dos art°s 187° e violação do disposto no art° 32° n° 5 da C.R.P

2 - No Acórdão recorrido afirma-se que se chegou à conclusão de que os arguidos MS e JMMS se iriam encontrar naquele local e hora para proceder a uma transacção de estupefacientes, sem fazer recurso como meio de prova ao resultado das escutas telefónicas

3 - Salvo o devido respeito, que até é IMENSO, o Tribunal recorrido nunca aí poderia ter chegado convincentemente sem tal recurso

4 - Na verdade, foram as próprias testemunhas invocadas na MOTIVAÇÃO - ponto 2. do Acórdão que alto e bom som, segura e firmemente, afirmaram unanimemente que só procederam à operação de intersecção por virtude da gravação das escutas telefónicas

5 - A nulidade das escutas telefónicas terá, como efeito à distância a nulidade de todas as provas obtidas como consequência da respectiva utilização

6 - De qualquer forma, o que resta e foi observado pelas testemunhas /inspectores da PJ é muito pouco; resulta insuficiente para as conclusões tomadas

7 - A PJ actuou CEDO DEMAIS; ANTES QUE PUDESSE OBSERVAR O QUE OS DOIS ARGUIDOS IRIAM FAZER; se se iriam encontrar, se os dois iriam encontrar terceiros na loja de conveniência aberta e com muitas pessoas sita a alguns passos do local onde o arguido MS foi abordado, se iriam trocar a droga por dinheiro ou se cada um permaneceria na posse do que tinha sem haver permuta

8 - O art° 21.º do Dec. Lei 15/93 não é um crime exaurido e os actos atribuídos nem sequer podem consubstanciar actos preparatórios quanto mais tentativa. 9 - O veículo que o recorrente conduzia não transportou droga nem sequer lhe pertencia mas sim à sua namorada pelo que não pode ser perdido a favor do Estado

Violaram-se os art°s: 187° e 188° do C.P.P. porque se não cumpriu o que ali está determinado sendo competência exclusiva do Juiz a selecção das gravações das escutas telefónicas a ser transcritas ou destruídas

- art° 127° do C.P.P. porquanto a convicção ali referida deve assentar em premissas onde o vulgar raciocínio lógico tenha que conduzir transparentemente, sendo que, no caso vertente faltaram as tais premissas

- art° 350 n° 1 e 2 do Dec. Lei 15/93 porquanto o veículo apreendido não pertence ao recorrente nem foi utilizado no transporte de qualquer substância ilícita - art° 210 do Dec. Lei 15/93 porquanto não consubstancia um crime exaurido e o acto apurado quanto ao recorrente (deslocar-se ao local onde estava o arguido MS) não constitui acto preparatório quanto mais tentativa

O recorrente pretende que o Venerando Tribunal da Relação aprecie a matéria de facto, ouvindo-se as gravações e lendo-se as respectivas transcrições de toda a prova pessoal, por forma a apurar-se de qualquer forma é que os elementos da P J. se convenceram da iminência do encontro entre os dois arguidos MS e JMMS e qual o motivo desse encontro. Só assim nos poderemos aperceber do eventual motivo do eventual encontro na perspectiva acusatória, separado os meios de prova a utilizar e avaliando da sua suficiência para suportar as conclusões tomadas

Protesta juntar as transcrições de toda a prova pessoal, nomeadamente da arrolada no ponto 2.2 do Acórdão recorrido, só não o fazendo agora devido ao período de férias em que não foi possível obter o concurso de agencias especializadas nestas transcrições

Nestes termos, deve o recurso intercalar obter provimento, anulando-se todo o processado imediatamente anterior à Acusação

Se assim se não entender deverá reenviar-se o processo para novo Julgamento, anulando-se o Acórdão recorrido. Ou pura e simplesmente absolver-se o recorrente do crime imputado por insuficiência de provas

2.3. No que respeita aos recursos do arguido JMMS, apreciou a Relação as questões de saber: - se são nulas as escutas telefónicas, no que a este arguido respeita; - se, face à matéria de facto provada se se está perante o crime pelo qual o arguido foi condenado; - se foi violado o disposto no art. 127° C.P.P.; - se havia lugar à perda do veículo apreendido -art. 35.° n.º 1 do DL n° 15/93

2.4. Nessa análise, partiu a Relação da seguinte matéria de facto estabelecida pela 1.ª Instância e que não alterou: Factos Provados: 2.1 Na sequência de uma denúncia anónima efectuada para a Polícia Judiciária, em dia incerto do mês de Junho de 2000, dando conta de que um indivíduo de sexo masculino, não identificado naquela denúncia, estaria a ultimar contactos tendo em vista a conclusão de uma aquisição de elevada quantidade de produto estupefaciente, elementos da DCJTE daquela Polícia, deram início a uma série de diligências investigatórias tendentes à descoberta e eventual detenção daquele indivíduo e de outros que, como ele, alegadamente estivessem envolvidos na actividade do tráfico de droga

Tais diligências, que genericamente consistiram na recolha de informações, vigilâncias de locais e de pessoas, buscas e intercepção de conversações telefónicas, prolongaram-se por vários meses

2.2. No seguimento das informações obtidas, mediante as quais elementos daquela Polícia concluíram que o arguido MS iria proceder, na noite de 23 para 24 de Fevereiro de 2001, a uma entrega de produto estupefaciente ao arguido JMMS, a ocorrer na zona da Alameda das Linhas de Torres, nesta cidade, as testemunhas JV, LA, CB, MC, MC2, FS, TA e FC, inspectores da falada entidade policial, montaram um dispositivo de vigilância com vista à eventual captura daqueles dois arguidos

Pelas 0 horas e 10 minutos daquele dia 24, o arguido MS chegou à Alameda das Linhas de Torres, conduzindo o veículo automóvel Opel, modelo Astra, de matrícula espanhola M-8 que estacionou nesta artéria, saindo da viatura, mas a ela regressando instantes após

Saindo novamente do veículo, o MS caminhou alguns metros, dirigindo-se a uma cabina telefónica, onde entrou, situada naquela via

Entretanto, decorridos escassos minutos sobre a chegada daquele arguido, aproxima-se das imediações daquele local, conduzindo o veículo automóvel Ronda, modelo Civic 1600, de matrícula UF, o arguido JMMS, que o estacionou também na Alameda das Linhas de Torres, na esquina com a Rua Particular

Quando ambos se encontravam a uma distância, um do outro, compreendida entre 7 metros e meio a 15 metros, e no momento em que o MS abandonava a cabina telefónica onde instantes antes entrara, foi este abordado por alguns daqueles elementos policiais, enquanto os restantes, quase em simultâneo, procediam à abordagem do JMMS, que estava sentado ao volante do veículo, em que para ali se transportara

Numa altura em que o MS estava a ser algemado pelos elementos que efectuaram a referida abordagem, e sendo-lhe efectuada logo no local uma revista sumária, foi encontrado na sua posse, dentro de um dos bolsos exteriores do casaco que vestia, um pacote envolto numa fita castanha

Efectuada também no local, pelos elementos que abordaram o JMMS, uma revista sumária ao veículo em que este se fazia transportar foi encontrado debaixo do respectivo banco da frente, lado direito, vulgarmente chamado o do pendura, um saco em plástico no interior do qual se encontravam acondicionadas várias notas do Banco de Portugal...

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