Acórdão nº 03S118 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Novembro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelEMÉRICO SOARES
Data da Resolução05 de Novembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça. No Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira, A, com a identificação nos autos, instaurou acção declarativa de condenação, emergente de contrato de trabalho, contra "B - Cooperativa de Habitação e Construção de Ovar C.R.L" com sede na Rua ...., Ovar, pedindo que, na procedência da acção seja a Ré condenada: a)a pagar ao A. a importância de 4.400.000$00 a título de compensação pela cessação do contrato. b)A pagar ao A. a importância de 1.080.138$00 a título de prestações retributivas em dívida

Para tanto, alega, em síntese, que tendo sido admitido ao serviço da Ré em 1 de Março de 1981, por contrato de trabalho por seis meses, para desempenhar, como engenheiro civil, as funções de fiscalização das obras, manteve-se a trabalhar para a Ré sob a subordinação desta, até que, devido a comportamentos negativos desta que descreve, despediu-se em 11 de Setembro de 1996, com invocação de justa causa, tendo, por isso o A. a haver da Ré as quantias que peticiona

Contestou a Ré, suscitando a questão prévia relacionada com o cumprimento do disposto no art.280º do Cód. Proc. Civ.. Seguidamente excepcionou a incompetência material do Tribunal do Trabalho para esta acção com a alegação de que o que entre o A. e a Ré existia era um contrato de prestação de serviços. E impugnando, depois, muitos dos factos alegados pelo A. e aceitando outros, conclui que o contrato celebrado ente o A. e a R., tipifica um contrato de prestação de serviços; que há um manifesto abuso de direito por parte do autor em todo o processo e que o mesmo A. litiga com manifesta e desusada má fé. E deduzindo reconvenção, para a eventualidade de se julgar competente o tribunal de trabalho, opõe ao credito de 1.080.138$00 do Autor, que reconhece, a compensação do seu crédito sobre o A., de 641.666$00, por rescisão do contrato sem aviso prévio

Conclui nos termos seguintes: "Termos em que, julgada procedente por provada a invocada excepção dilatória de incompetência material, que é absoluta, do Tribunal de Trabalho para a presente acção, se requer a consequente absolvição da Ré da instância. Assim não se entendendo: deve o pedido formulado pelo Autor contra a Ré, ser julgado totalmente improcedente por não provado, com a consequente absolvição da Ré do mesmo. Ainda assim não se entendendo: deve o pedido formulado pelo Autor, ser julgado apenas parcialmente procedente, tendo aqui em conta o alegado pela Ré sob o artigo 216.º deste articulado, em tudo o mais sendo, do mesmo, a Ré absolvida". Mais se requer que, julgado competente para a presente acção este Tribunal, deve ser julgado procedente por provado o pedido reconvencional deduzido pela Ré contra o Autor e, em consequência, deve este ser condenado a pagar à Ré a quantia de Esc. 641.666$ 00 (seiscentos e quarenta e um mil seiscentos e sessenta e seis escudos), mais se peticionando seja a mesma declarada compensada na quantia referida supra sob o artigo 216.º. Termos em que, deve o Autor, na pessoa do seu Ilustre Mandatário, ser notificado da presente reconvenção para, querendo, contestar, no prazo e sob a legal cominação"

Respondeu o A. à contestação e contestou a reconvenção, concluindo pela improcedência das excepções deduzidas e pela sua absolvição do pedido reconvencional

A fls. 79 foi proferido o despacho saneador, no qual relegou-se para final a questão de incompetência do tribunal do trabalho, em razão da matéria e afirmou-se, em termos genéricos, verificarem-se os pressupostos da regularidade da instância

Organizaram-se, de seguida, a especificação e o questionário que foram objecto de uma reclamação por parte da R., a qual, porém, veio a ser desatendida

Realizado o julgamento, o questionário mereceu as respostas constantes do despacho de fls. 277 a 284, que passou sem reclamações

Seguiu-se a prolação da sentença (fls. 287 a 294, verso) que, considerando o tribunal do trabalho materialmente competente, julgou a acção e a reconvenção apenas parcialmente procedentes e, compensando os respectivos créditos, condenou a R. a pagar ao A. 1.080.138$00 (ilíquidos, fazendo depois a R. os descontos legais), menos o valor líquido (de IRS e contribuições para a segurança social) de dois vencimentos mensais de 275.000$00, nos termos antes exemplificados

Inconformado, levou o Autor recurso dessa sentença para o Tribunal da Relação do Porto que, pelo acórdão de fls. 346 a 349, deixando dito que "a decisão recorrida apreciou correctamente todas as questões suscitadas, fundamentando-as devidamente e encontrando a solução juridicamente justa e adequada, com a qual se concorda inteiramente", confirmou a decisão recorrida nos termos do n.º 5 do art. 713º do Cód. Proc. Civ

Novamente inconformado, traz o Autor recurso de revista desse acórdão para este Supremo Tribunal, apresentando, oportunamente a sua alegação que finaliza com as seguintes conclusões: 1 - A entidade empregadora não pode exigir de um seu trabalhador subordinado a passagem de recibo verde" apanágio dos rendimentos de trabalho independente, nem tão pouco exigir a liquidação de IVA sobre a importância em pagamento

2 - A entidade empregadora deve sim entregar ao trabalhador documento de onde conste o seu nome completo, o número de inscrição na instituição de segurança social respectiva, a categoria profissional, o período a que respeita a retribuição, discriminando a retribuição base e demais remunerações, os descontos e deduções efectuados e o montante líquido a receber (v. Artº 94.º do D.L. 49.408 e n.º 1 do art.º 11º do D. L. 491/85

3 - Como igualmente deve fazer a dedução relativa a imposto de selo, inscrever o trabalhador como beneficiário e inscrever-se como contribuinte da Segurança Social, concorrer com as contribuições legalmente estabelecidas, sendo as do trabalhador descontadas pela entidade empregadora e por esta entregues

4 - O facto de o trabalhador e a entidade empregadora terem, em dado momento da vigência do contrato de trabalho, acordado na prática referida (passagem de "recibo verde") não veda a qualquer deles o direito de, em qualquer momento, impor ou exigir o cumprimento das regras enunciadas em -2- e -3- destas conclusões

5 - A entidade patronal estando obrigada a cumprir todas as obrigações decorrentes do contrato de trabalho e das normas que o regem (v. alínea g) do art.º 19.º do D.L. 49.408) não podia recusar-se ao cumprimento das citadas regras

6 - Tendo o recorrente/trabalhador reclamado da recorrida/entidade empregadora pelo cumprimento de tais obrigações tendo até concedido um prazo de 30 dias para tal agiu claramente dentro dos limites que a boa fé lhe impunha (v. Artºs 334.º e 762.º do C. Civil)

7 - A recorrida/entidade empregadora ao manter a recusa de cumprir com as obrigações referidas em -2- e -3- destas conclusões e ao prosseguir com a prática referida em -1- não está a exercer um direito/dever de regularização da remuneração do seu trabalhador antes está a recusar cumprir as suas obrigações legais e contratuais ao impor a passagem de recibo verde" e a liquidação de IVA para pagar ao mesmo as suas retribuições

8 - A sentença proferida em 1.ª instância assim o acaba por reconhecer ao decidir que as retribuições a pagar ao recorrente devem ser sujeitas aos descontos legais (IRS e contribuições para a Segurança Social)

9 - Constitui justa causa de despedimento por parte do trabalhador a recusa pela sua entidade empregadora em cumprir, após aquele o ter reclamado e concedido prazo para tal, as obrigações referidas em -2- e -3- destas conclusões e a imposição pela mesma de passagem de "recibo verde", com liquidação de IVA, para o pagamento das retribuições

10 - Estando provado que a recorrida só pagaria as retribuições do recorrente se este lhe passasse "recibos verdes" e liquidasse IVA, não pode tal questão ser considerada acessória, como o foi

11 - É que está demonstrado que, abstraindo do valor concreto em causa, a recorrida só aceitaria pagar contra tal comprovação de pagamento por considerar o contrato como de prestação de serviços, mas não está demonstrado qual o procedimento do recorrente se aquela, ainda abstraindo do valor concreto, cumprisse com as obrigações referidas em -2- e -3- 12 - A decisão sob recurso ao decidir de modo diverso e ao considerar que a apelada exerceu um direito/dever de regularização da remuneração do seu trabalhador com a exigência contida em -1- destas conclusões violou o disposto no art.º 94.º do D.L. 49.408, no n.º 1 do art.º 11.º do D.L. 491/85, no n.º 1 do art.º 2º , art.º 3.º e al. c) do n.º 1 do art.º 107.º do C.l.R.S., art.º 141.º da Tabela Geral do Imposto de Selo, art.ºs 1.º, 4.º e 5.º do D.L. 103/80 e al. b) do n.º 1 do art.º 35.º do D.L. 64-A/89

13 - O disposto no n.º 1 do art,º 1.º do D.L. n.º 824/76 não é impeditivo que entidades empregadoras e trabalhadores ajustem entre si retribuições líquidas, apenas vedando que os segundos transfiram para as primeiras a responsabilidade pelo pagamento dos seus impostos

14 - O ajustamento de remunerações líquidas supõe conexamente o cálculo das respectivas remunerações ilíquidas que produzam as primeiras, cálculo esse a realizar pela entidade empregadora por mais habilitada a tal

15 - Se o recorrente e a recorrida ajustaram entre si uma retribuição líquida não pode a segunda proceder à sua redução sob pena de violar o disposto na al. c) do n.º 1 do art.º 21.º do D.L. 49.408, o que constitui justa causa de despedimento nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 35.º do D.L. 64-A/89

16 - A decisão recorrida ao considerar como válida tal redução violou as disposições acabadas de citar, pelo que sempre se verificaria justa causa para o despedimento por parte do recorrente pelo que deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogado o douto acórdão proferido, bem como a douta sentença da 1ª instância e julgada integralmente procedente a acção, designadamente quanto à justa causa para despedimento do recorrente e quanto ao pagamento a este da respectiva indemnização de...

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