Acórdão nº 03S2652 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelVÍTOR MESQUITA
Data da Resolução14 de Janeiro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório "A", residente na Rua Aquilino Ribeiro, nº. ..., Carnaxide, 2795 Linda-a-Velha intentou no Tribunal do Trabalho de Lisboa contra a "Cooperativa B (B)" e "Universidade C (C)", ambas com sede na Rua de Santa Marta, nº. ..., em Lisboa a presente acção com processo ordinário, peticionando a condenação das RR.: a) a reconhecerem que o contrato existente entre elas e o Autor era um contrato de trabalho sem prazo desde Outubro de 1987. b) a reconhecerem que a cessação do mesmo contrato, operado pelas Rés a partir de 30-9-94 consubstancia um despedimento sem justa causa, sem processo disciplinar e logo ilícito. c) a pagarem ao Autor o total das remunerações que este deveria ter normalmente auferido entre a data do despedimento e a data da sentença, ascendendo à data da propositura da acção a Esc. 3.026.400$00. d) a reconhecerem ao Autor o direito de optar entre a reintegração e a indemnização de antiguidade. e) a pagarem ao Autor as diferenças de retribuição para a remuneração correspondente à categoria de professor auxiliar desde Outubro de 1993. f) a pagarem ao Autor as quantias correspondentes aos subsídios de férias e de Natal desde Outubro de 1993. g) a pagarem ao Autor todos os montantes que se mostrarem devidos a titulo de deslocações, quilómetros, capitações e exames. Para tanto alegou, em síntese: que a Ré "Cooperativa B" foi a entidade instituidora da Ré "Universidade C"; que foi admitido como membro do corpo docente da "Universidade C" em Outubro de 1987, com a categoria de assistente, revestindo o contrato celebrado a natureza de contrato de trabalho; que em Outubro de 1991 passou a ter a categoria de Professor Auxiliar; que em 1990 a Ré "Cooperativa B" determinou que a partir daquela data a relação contratual estabelecida com o Autor passava a reger-se por um contrato de prestação de serviços, deixando de ser pago a este os subsídios de férias e de Natal; que em 1992 o Autor foi despromovido à categoria de assistente; que desde Outubro de 1987 e após 1990 a actividade prestada pelo Autor foi sempre a mesma, sujeito às orientações e directrizes das Rés e integrado na estrutura e organização destas; que as duas Rés figuram cessar o contrato com efeitos reportados a 30-9-94, o que consubstancia um despedimento ilícito; que as Rés reduziram a retribuição do Autor referente a Outubro de 1993 em pelo menos 50%, retribuindo-o de acordo com a categoria de assistente, quando detinha a categoria de Professor Auxiliar, que não lhe podia ser retirada e que não foram igualmente satisfeitas as importâncias devidas por deslocações, quilómetros e viagem à delegação da "Universidade C" nas Caldas da Rainha, capitações e exames. As Rés apresentaram contestação, por excepção, invocando a incompetência material do Tribunal do Trabalho, por entenderem que está em causa um contrato de prestação de serviços. Alegam ainda factos dos quais concluem que o alegado pelo A. não consubstancia um contrato de trabalho, que o serviço de docência prestado visa o resultado do ensino da matéria em questão, subscrevendo o A. com a R. "Cooperativa B" um contrato de prestação de serviços que o vinculou nos seus termos, não efectuando as RR. descontos para a Segurança Social, não recebendo o A. subsídios de férias e de Natal, sendo o horário das aulas fixado de harmonia com as conveniências do A., entregando o A. recibos relativos a trabalho independente que como tal são declarados às Finanças e auferindo o A. uma remuneração por hora de leccionação superior à que auferiria se exercesse docência em regime de contrato de trabalho. Invocam também que as relações contratuais entre as instituições particulares universitárias e os seus docentes não podem obedecer a um puro contrato de trabalho, que a "Cooperativa B" é uma cooperativa de prestação de serviços e os professores são havidos como prestadores de serviços pela própria lei (artºs. 10º e 11º do D.L. nº. 441-A/82 de 6 de Novembro que estabelece as disposições relativas às cooperativas de ensino) e que a autonomia e independência do A. na sua docência flui do princípio da autonomia universitária consagrado na Constituição da República Portuguesa e na lei ordinária. Finalmente defendem-se por impugnação e concluem que não podia a "Cooperativa B" contratar o A. para o ano de 1994/1995 pois a "Universidade C" não distribuiu ao A. nenhum serviço para esse ano. Respondeu o autor concluindo como na petição inicial e pugnando pelo indeferimento da defesa por excepção, nos termos de fls. 244 e ss. Foi proferido o despacho saneador, no qual se relegou o conhecimento da excepção invocada pelas Rés para a decisão final, e organizados especificação e questionário. Procedeu-se à instrução e julgamento da causa, tendo sido proferida a sentença de fls. 446 e ss., que julgou o Tribunal do Trabalho competente em razão da matéria e parcialmente procedente a acção. Inconformadas com a decisão, interpuseram as Rés recurso de apelação, vindo a ser proferido o acórdão de fls. 526 e ss., que confirmou a sentença da primeira instância. Do referido acórdão recorreram as partes de revista para o STJ que no douto acórdão de fls. 606 e ss., após ter apreciado o recurso interposto, anulou a decisão da Relação, ordenando a ampliação da matéria de facto. Baixaram os autos ao Tribunal da Relação e depois à 1ª instância, tendo sido aditados os quesitos 23º a 27º (fls. 621) e realizado novo julgamento, após o que foi proferida a sentença de fls. 709-728 que julgou parcialmente procedente a acção e consequentemente: a) declarou, como sendo contrato de trabalho por tempo indeterminado, o celebrado entre o Autor e as Rés desde Outubro de 1987; b) declarou a cessação do contrato de trabalho operada pelas Rés como constituindo um despedimento ilícito e condenou as Rés a reintegrar o Autor e a pagarem ao Autor as prestações que este deixou de auferir desde o despedimento até à sentença, a liquidar em execução desta e c) condenou as Rés a pagarem ao Autor as quantias devidas a titulo de subsídio de férias e de Natal, a liquidar em execução de sentença. Novamente inconformadas, as Rés interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa que novamente julgou improcedente o recurso e confirmou a decisão da 1ª instância. Mais uma vez irresignadas com a decisão do Tribunal da Relação, vieram as RR. recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando nas alegações as seguintes conclusões: 1ª - O factualismo realmente provado não suporta - e muito menos impõe - a conclusão que o Acórdão dele extrai: que, no caso sub-judice a relação jurídica em causa configura uma relação de trabalho subordinado; 2ª - Razões fortes apontam antes no sentido de se tratar de uma mera relação de prestação de serviços, e sujeito ao respectivo regime, tal como foi entendido nas hipóteses análogas das várias decisões juntas aos autos por fotocópia (Cfr. supra V); 3ª - Com efeito, ficou considerado provado nos autos - fls. 448 e segs. - que: - "o A. não estava inscrito na Segurança Social", como é próprio dos trabalhadores por conta própria, mas não dos prestadores de serviços; - "a Ré retinha IRS, à taxa de 15%, e o A. passava recibo à "Cooperativa B", pelas quantias recebidas, pelo modelo nº. 6 (artigo 107º do CIRS)", o que apenas se harmoniza com a existência de um contrato de prestação de serviços; - "o A. tinha de cumprir horários que lhe eram fixados para as aulas", mas não se provou que tivesse quaisquer outros horários a cumprir e aqueles afiguram-se de todo irrelevantes do ponto de vista da qualificação jurídica do contrato sub judice; - irrelevante era também a assinatura do livro de ponto/sumários, por ser ela indispensável para controlar a assiduidade e os correspectivos pagamentos da R. "Cooperativa B" ao A., atento a que este auferia remuneração unicamente pelo número de horas efectivamente leccionadas (cf. v.g. resposta ao quesito 17º); - "a calendarização para os pontos de exame, sua correcção e publicação, nem sempre era cumprida e tal não acarretava quaisquer sanções ao A., o que patenteia a autonomia com que ele prestava a docência; - "a iniciativa da marcação do dia e hora para a realização dos exames orais dependia da iniciativa do A." - "a remuneração do A., como a da generalidade dos docentes da "Universidade C", foi sempre variável em função do número de horas que leccionava na Universidade, e estas eram fixadas, por norma, no inicio de cada ano lectivo", o que pressupõe a sempre possível variação desse número de horas; - o docente em regime de prestador de serviços (como era, indiscutivelmente no plano formal, o do A.) tinha uma remuneração horária maior que a do contrato em regime de contrato de trabalho; - a "Cooperativa B", pelo menos nos anos lectivos de 1992/1993 e 1993/1994 distinguia quanto ao valor remuneração da hora de aula o trabalho dependente e independente, pagando a do primeiro a 3.450$00 e 3.900$00 e a do segundo a 4.020$00 e 4.500$00, respectivamente. 4ª - Depois, as funções de docente para que o A. foi - sucessivamente - contratado exerciam-se na "Universidade C" e no nosso direito positivo rege o princípio da autonomia universitária, consagrado até constitucionalmente, segundo o qual as universidades gozam, nos termos da lei, de autonomia científica, pedagógica, administrativa e financeira (artº. 76º - 2 da Constituição da República); 5ª - Tal autonomia, constitucional briga com a aplicação - irrestrita - do regime do contrato de trabalho consagrado na lei geral do trabalho, relativamente à R. "Cooperativa B". 6ª - Assim, repetidamente chamados a pronunciar-se sobre casos análogos - vertidos nas sentenças (e Acórdão) juntas aos autos - que ligavam a "Cooperativa B", a outros docentes da "Universidade C", sempre foi decidido pelos Tribunais estar-se em presença de contratos de prestação de serviços, conforme já se referiu; 7ª - Essa doutrina veio a ser consagrada por este Supremo nos seus cinco Acórdãos...

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