Acórdão nº 01357/07.8BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução22 de Outubro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO F…, A… e ESTADO PORTUGUÊS, respectivamente AA. e R. na presente acção administrativa comum, sob forma sumária, para efectivação de responsabilidade civil extracontratual deste último, inconformados vieram, de per si, interpor recursos jurisdicionais da decisão do TAF de Viseu, datada de 30.12.2009, que havia julgado parcialmente procedente a pretensão, condenando o R. no pagamento aos AA. da quantia total de 5.000,00 € a título de indemnização, quantia essa acrescida de juros legais desde a citação e até integral pagamento.

Formulam os AA., aqui recorrentes, nas respectivas alegações (cfr. fls. 160 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. O Estado deve ser condenado nos precisos termos do pedido.

  2. Incluindo na indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a 14.900,00 €, sendo 7450,00 euros para cada autor.

  3. Atenta a duração do processo e a matéria provada. Pois os Autores sofreram de ansiedade, depressão, angústia, incerteza, preocupações, aborrecimentos e insónias; tinham a expectativa de receber o dinheiro rapidamente e aplicá-lo; o dinheiro em causa na referida acção e execução era para investir.

  4. Com efeito, o processo começou em 1996 e findou em 2007, durando mais de onze anos. Assim, 2.500 Euros por pessoa a dividir por 11 dá cerca de 227 Euros por ano, o que é uma indemnização irrisória! 5. Atendendo ao que atrás consta e das alegações foram violadas por errada interpretação e aplicação as disposições dos arts. 18.º, n.º 1, 20.º, n.º 4 e 22.º da CRP, bem como o art. 6.º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o art. 1.º do Protocolo n.º 1 anexo à Convenção.

  5. Que deveriam ter sido interpretados e aplicados no sentido das conclusões anteriores; 7. Deve dar-se provimento ao recurso, condenando-se o Estado Português nos precisos termos constantes do pedido na P.I. ...

    ”.

    Por sua vez o R., aqui também recorrente, formulou conclusões (cfr. fls. 176 e segs.

    ) com o teor seguinte: “...

    1. O que seja um prazo razoável não se obtém por uma definição em abstracto, a partir dos prazos fixados na lei, mas de uma análise do caso concreto.

    2. A jurisprudência do STA (ver entre outros o acórdão de 15/10/1998, recurso n.º 036811) e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (decisão de 8/7/1987, caso BARAONA v. PORTUGAL) serve-se dos seguintes critérios: 1- a complexidade do processo; 2- o comportamento das partes; 3- a actuação das autoridades competentes no processo.

    3. Mais recentemente a Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem acrescentou um outro critério: 4- a importância do objecto do litígio para o interessado.

    4. Se quanto à complexidade da causa se verifica que a mesma não teve qualquer incidência no âmbito do processo.

    5. Quanto ao comportamento das partes a Mm.ª Juíza na douta sentença não valorou a matéria constante dos factos provados.

    6. Com efeito, ao contrário do que refere a fls. 12 da douta sentença (onde se diz nem se verificou qualquer recurso), foi interposto pelas partes um recurso de agravo conforme se pode ver pelo número 12 dos factos provados.

    7. Por outro lado, o processo teve atrasos provocados pelas partes, designadamente, os referidos nos números 9 (diligências e solicitações que demoraram o processo desde 29/11/1999 até 24/1/2001), 15 (suspensão da instância desde 29/4/2002 até 9/10/2002) e 23 (suspensão da instância por 30 dias desde 21/11/2005 a 11/5/2006) também dos factos dados como provados, além de outros.

    8. Já quanto ao comportamento das autoridades competentes - por parte do tribunal Judicial de Ovar, verificou-se um comportamento adequado e exemplar às exigências do serviço, os adiamentos de diligências encontram-se devidamente justificados face ao modo de organização e funcionamento do tribunal de Circulo, com uma única sala de audiência equipada para a gravação de prova além da pendência global (cível e crime) ser no 1.º Juízo da ordem dos 2100 processos excluindo deprecadas.

    9. E também quanto à importância do processo para os Autores: - não ficou provado, nem sequer foi alegado que o recebimento da quantia indemnizatória era imprescindível à sua vida pessoal por serem pessoas de fracos recursos económicos ou por dependerem em exclusivo desse valor.

    10. Neste contexto, conjugando todos estes pressupostos, entendemos que, atenta a toda a matéria dada como provada, o período de tempo que demorou o processo abstractamente, não excedeu o que no caso concreto se deva considerar um prazo razoável.

    11. Não havendo pois qualquer falha ao nível de meios técnicos, materiais ou humanos ao serviço da justiça, que permitam concluir que o Estado Português actuou com culpa no deficiente ou no ineficiente funcionamento do aparelho judiciário.

    12. Por outro lado, nos termos do artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil os danos morais só são indemnizáveis se atingirem uma gravidade tal que mereça a tutela do direito.

    13. Ora, a ansiedade, a depressão, a angústia, a incerteza, as preocupações e aborrecimentos e as insónias, não se encontram abrangidos pela previsão do referido artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil, pois não passam dos naturais aborrecimentos que a entrada e pendência duma acção em tribunal provoca, não merecendo, uma especial tutela do direito.

    14. Tudo valendo por dizer que os simples incómodos e contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais.

    15. Por outro lado, a Justiça do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem dado relevância sim a interesses como o emprego, questões familiares (divórcio e regulação do poder paternal), pedidos indemnizatórios de reparação de danos, etc.,.

    16. Não sendo razões económicas de pequena monta e aborrecimentos pessoais que devem justificar que o atraso na realização da justiça possa sem mais, sem que se provem danos concretos provocados por tal atraso, originar a obrigação de indemnizar por parte do Estado.

    17. Pode-se assim, concluir e face à interpretação que se faz do disposto no artigo 6.º, n.º1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e respectiva Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que aos Autores não assiste o direito a qualquer indemnização, uma vez que a sua pretensão não é enquadrável no disposto naquela norma, nem no disposto no artigo 20.º, n.º 4 da CRP, pelas mesmas razões.

    18. Por conseguinte ao condenar o Réu Estado Português não fez a Mm.ª Juíza uma correcta aplicação dos factos ao direito, porquanto o Estado Português não violou a sua obrigação de proferir uma decisão jurisdicional em prazo razoável, tal como estipula o artigo 20.º, n.º 4 da CRP, artigo1.º, 2.º, 6.º e 7.º do D. Lei n.º 48051 de 21/11/1967 e artigo 6.º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

    19. Termos em que deve ser revogada a decisão sob recurso e substituída por outra na qual se proceda à absolvição do Réu ESTADO PORTUGUÊS ...

    ”.

    Apenas os AA. apresentaram contra-alegações (cfr. fls. 186 e segs.

    ), nas quais conclui nos seguintes termos: “… 1. Houve violação do direito à justiça em prazo razoável.

  6. O Estado deve ser condenado nos precisos termos do pedido, incluindo nos juros desde a citação… 3. …Incluindo nos honorários devidos, a apresentar pelo mandatário ou no que se liquidar, bem como na totalidade das despesas… 4. Que são totalmente indemnizáveis nos termos da jurisprudência do Tribunal Europeu; 5. Para efeito do ressarcimento dos danos morais, nada mais tinham os autores que alegar; 6. Segundo o TEDH, a matéria alegada, quanto a danos morais constitui um facto notório e resulta das regras da experiência, obrigando o Estado a indemnizar a vítima de violação do art. 6.º da Convenção; 7. Os danos alegados são inerentes a todos aqueles que litigam em juízo. De resto, só uma pessoa excepcionalmente insensível ou desprendida dos bens materiais é que não passaria pelas mesmas angústias e aborrecimentos que os recorrentes.

  7. O artigo 22.º da Constituição não exige a existência de dano e é directamente aplicável por força do artigo 18.º da CRP; 9. Violado que foi o artigo 20.º da CRP, no seu segmento direito à justiça em prazo razoável, automaticamente têm os autores direito a uma indemnização.

  8. Quando houver violação de um direito fundamental está constitucionalmente garantida indemnização, independentemente da existência de prejuízo, isto é de dano patrimonial. Ou dito de outro modo, está constitucionalmente garantido que os danos morais causados por ofensa de um direito fundamental têm sempre dignidade indemnizatória; 11. O artigo 20.º, n.º 4, da CRP garante que as decisões judiciais sejam tomadas em prazo razoável; 12. O artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil está de acordo com tais disposições constitucionais e, quando não estivesse, tinha de ser interpretado em consonância com as mesmas; 13. O Tribunal interpretou tal artigo no sentido de não serem indemnizáveis os danos morais causados pela violação dum direito ou garantia constitucional quando deveria sê-lo em sentido contrário; 14. Por força do artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil, sob a epígrafe danos não patrimoniais, «na fixação de indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua natureza mereçam a tutela do direito». Este artigo deve ser interpretado no sentido de serem graves e merecerem a tutela do direito os danos morais causados com a violação de direitos constitucionais, sob pena de violação dos artigos 18.º, n.º 1, 20.º, n.º 4, 22.º da CRP.

  9. Não sendo assim entendido, é inconstitucional o artigo 496.º, n.º 1 do CC, por violação das disposições precedentes; 16. É a lei ordinária que deve ser interpretada de acordo com a Constituição e com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e seus Protocolos e não o contrário.

  10. Por outro lado, se a Constituição e/ou a Convenção garantem o direito a uma indemnização, não se pode...

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