Acórdão nº 04S4336 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Fevereiro de 2006

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Em 31 de Julho de 2000, no Tribunal do Trabalho de Cascais, AA intentou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa-A, pedindo que, declarada a ilicitude do seu despedimento, seja a ré condenada: (a) a reintegrá-la no seu posto de trabalho, como directora financeira, e na sanção pecuniária compulsória diária de 100.000$00, caso a ré não cumpra essa prestação, no prazo de dez dias, a contar da data da notificação da sentença; (b) a pagar-lhe todas as prestações salariais que deveria auferir, no valor mensal de 932.162$00, desde Agosto de 2000 até à data da sentença, acrescidas de juros de mora a contar da citação; (c) a pagar-lhe a quantia de 8.952.173$00, sem prejuízo da correcção do valor da indemnização prevista no n.º 2 do artigo 33.º da LCT, em função da data em que vier a ser proferida a decisão, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação; (d) a pagar-lhe a quantia de 10.000.000$00, a título de compensação por danos físicos e morais; (e) e ainda a pagar-lhe, 2.321.620$00, prestação atinente à atribuição de veículo automóvel (artigo 13.º da petição inicial), 750.000$00, a título de prémio anual relativo ao ano de 1999 (artigo 20.º da petição inicial), 768.829$00, remuneração que deveria ter auferido, «desde a data do despedimento até à data da propositura da presente acção», no mês de Julho de 2000 (artigo 61.º da petição inicial), 800.713$00, diferença da remuneração de férias vencidas em 1 de Janeiro de 2000 e do respectivo subsídio de férias (artigo 62.º da petição inicial) e 111.011$00, correspondente à diferença dos proporcionais de férias e subsídios de férias e de Natal do ano de 2000 (artigo 64.º da petição inicial).

A ré contestou, impugnando a factualidade vertida na petição inicial e sustentando a improcedência da acção.

Tempestivamente, a autora declarou optar, em caso de procedência da acção, pela indemnização de antiguidade (fls. 448).

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo a ré de todos os pedidos.

  1. Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou improcedente, confirmando a sentença recorrida, sendo contra esta decisão que agora a autora se insurge, mediante recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das seguintes conclusões: «1.ª Após ter retomado a respectiva actividade, em 12-04-2000, a Ré nunca atribuiu à A. funções compatíveis com a sua categoria profissional de directora financeira, com a inerente responsabilidade pelo sector financeiro e desempenho da função de direcção e chefia ao mais alto nível hierárquico, 2.ª E apenas lhe cometeu as 3 (três) tarefas referidas em B') e I'), conforme resulta da resposta ao quesito 9.º, cujo conteúdo funcional não corresponde ao exercício da categoria de directora financeira e violam, por isso, essa mesma categoria; 3.ªTendo sujeitado a A. às condições de trabalho indicadas nas alíneas N) a S) e nas respostas aos quesitos 9.° a 14.° que fizeram sentir a A. humilhada e vexada perante os respectivos colegas de trabalho; 4.ª E que a A. tivesse vivido debaixo de forte tensão emocional e sofrimento psicológico, sabendo os gerentes da Ré que a A. sofre de doença de esclerose múltipla; 5.ª Não constituindo justificação, minimamente, bastante e razoável para a falta de condições de trabalho a que a A. foi sujeita, após 12-04-200[0], os factos que a Ré alegou e que resultam das respostas aos quesitos 41.º a 57.º; 6.ª Por isso, a Ré deve ser condenada em indemnização a fixar, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 496.º do Código Civil, que compense a gravidade dos danos morais que causou à Autora e em cuja fixação deverá ser tido em conta, quer o carácter, manifestamente, intencional das várias actuações da Ré, quer a respectiva situação económica, quer ainda o facto de ter actuado, como, de facto, actuou em relação à Autora, apesar de saber que a mesma sofria de esclerose múltipla; 7.ª O acórdão recorrido, ao ter concluído que a A. "não logrou provar os factos constitutivos" do direito a ser indemnizada pelos danos que a Ré lhe causou, em virtude de não lhe ter atribuído funções compatíveis com a respectiva categoria profissional de directora financeira e através dos factos referidos nas alíneas N) a S) e nas respostas dadas aos quesitos 9) a 14), violou as normas do n.º 1 do artigo 342.º, do n.º 1 do art. 483.º e dos n.os 1 e 3 do artigo 496.º, todos do Código Civil; 8.ª A ordem que a Ré deu à A., para se deslocar a 28 hospitais do Norte e Centro do País, a fim de recolher o pagamento imediato de dívidas desses hospitais ou de propostas que as respectivas administrações pretendessem apresentar, com vista ao pagamento de tais dívidas, não se enquadra no desempenho da função de direcção e chefia ao mais alto nível que caracterizava a essência e a substância da categoria profissional da A.; 9.ª Não sendo também razoável e justificado que a execução material das mencionadas tarefas de recolha de pagamentos e de propostas tenha sido ordenada à A., que era a directora financeira, e não a qualquer dos outros trabalhadores subalternos da área financeira, como sejam o Dr. BB e os que a este passaram a reportar (CC, DD, EE e FF) - cfr. respostas aos quesitos 13.º e 14.º; 10.ª Sendo, por isso, legítima a recusa da A. e ilícito o despedimento que a Ré fez à A., por não ter cumprido tal ordem; 11.ª Mas mesmo que as tarefas de recolha do pagamento imediato de dívidas ou de propostas que as administrações hospitalares quisessem apresentar se enquadrassem, na categoria profissional da A., o que não se admite, ainda assim as circunstâncias referidas no n.º 5 do artigo 12.º [por lapso, escreveu-se 13.º] da LCCT e a que o tribunal deve atender, para a apreciação da justa causa, sempre excluiriam a licitude do despedimento da A.; 12.ª Dado que: (i) do hipotético acto [de] desobediência da A. não resultou qualquer prejuízo para a Ré, a qual, de resto, também nem sequer alegou que o tivesse tido; (ii) a A., ao ter recusado o cumprimento da ordem da Ré, fê-lo na convicção de que não devia obediência a essa mesma ordem, pois, ao ter pedido a "aclaração" da primeira ordem, demonstrou que pretendia cumpri-la, pretendendo apenas que lhe fossem indicados os termos em que poderia estabelecer a calendarização das dívidas, ao que a Ré veio a responder, dizendo que a A. não poderia estabelecer qualquer calendarização das dívidas com as administrações dos hospitais; (iii) na altura em que as referidas ordens foram dadas à A., a Ré mantinha esta última, desde 12-04-2000, numa ostensiva situação de desvalorização e rebaixamento profissional, seja por não lhe proporcionar as devidas e necessárias condições de trabalho, seja por a manter afastada do exercício da respectiva categoria profissional de directora financeira, condições essas cuja reposição a A. solicitou à Ré, através de 3 cartas, datadas, respectivamente, de 17-04-2000, de 12-05-2000 e de 15-05-2000 - cfr. al. T); (iv) à data das referidas ordens, a A. tinha regressado, há cerca de um mês, de um período de cerca de 10 meses de baixa por doença, em que não podia ter acompanhado elementos relevantes do evoluir e acumular da dívida dos hospitais; (v) a A. sofria de esclerose múltipla, o que a Ré bem sabia e tomava mais penoso o ter que se deslocar, em duas semanas seguidas, a 28 hospitais; (vi) as duas outras tarefas anteriores que a Ré havia cometido à A., após 12 de Abril de 2000, nada tinham a ver com a dívida atrasada dos hospitais, contribuindo assim a Ré para que a A. não se encontrasse a par da situação dessa dívida, durante os 10 meses em que esteve de baixa; 13.ª Ao ter considerado a ordem legítima, o acórdão recorrido violou as normas da alínea c) do n.º 1 do artigo 20.° da LCT e dos n.os 1, 2 e 3 do artigo 22.°, também da LCT, e, ao ter julgado o despedimento lícito, violou as normas do n.º 1 do artigo 9.° e do n.º 5 do artigo 12.° [por lapso, escreveu-se 13.º], ambos do Regime Jurídico de Cessação do Contrato de Trabalho; 14.ª E, ao não ter julgado abusivo o despedimento que a Ré efectuou menos de 6 meses depois de a Autora ter solicitado que lhe fossem repostas as condições de trabalho inerentes à respectiva categoria profissional de directora financeira - cfr. al. T) -, o acórdão recorrido violou as normas da alínea a) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 32.° e as normas dos n.os 1 e 2 do artigo 33.°, todos da LCT; 15.ª Por outra parte, ao ter julgado também improcedente o pedido de pagamento de diferenças relativas aos créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho da A., o acórdão recorrido violou as normas do n.º 1 do artigo 6.°, as normas dos n.os 1 e 2 do artigo 10.º, ambos do DL 874/76, de 28 de Dezembro, e ainda a norma da alínea b) do n.º 2 do artigo 2.° do DL 88/96, de 3 de Julho; 16.ª O prémio referido na alínea J) era devido à A., por força do contrato de trabalho que tinha com a Ré, e desde que as disponibilidades líquidas a curto prazo atingissem um dado valor em cada ano, não dependendo, portanto, do desempenho concreto da Autora; 17.ª E, dado que a A. trabalhou em metade do ano de 1999, isto é de 1 de Janeiro de 1999 até 28 de Junho de 1999 - cfr. al. I) -, é-lhe devido metade do valor do prémio em questão, no montante de Esc. 750.000$00; 18.ª Por ter absolvido a Ré do pagamento de metade do valor deste prémio, o acórdão recorrido violou as normas dos n.os 1, 2 e 3 do artigo 82.° e do n.º 2 do artigo 88.°, ambos da LCT; 19.ª Resulta da matéria de facto provada que à A. foi atribuído um automóvel, para uso, sem quaisquer restrições, tanto na vida privada, como na profissional; 20.ª Tal direito da A. não se suspendeu, durante o período em que a mesma esteve de baixa por doença, pois, ao poder usar o automóvel, sem quaisquer restrições, na respectiva vida privada, o exercício desse direito não pressupunha a efectiva prestação de trabalho...

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