Acórdão nº 05B1067 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Abril de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução27 de Abril de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I "A" intentou, no dia 20 de Junho de 2003, contra B, acção declarativa de revisão de sentença homologatória da delegação do exercício do poder paternal relativamente a C e D proferida, no dia 14 de Dezembro de 2000, pelo tribunal da comarca de Santa Catarina, República de Cabo Verde.

Foi-lhe concedido o apoio judiciário nas modalidades de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento de honorários de patrono - a advogada E.

O réu não contestou a acção, a autora alegou no sentido de a sentença dever ser confirmada, e o Ministério Público alegou que a lei não permite a sua confirmação, sob o fundamento de que o poder paternal é irrenunciável no direito português, não haver notícia de as menores residirem ou terem autorização de residência em Portugal, e não poderem as sentenças proferidas por tribunais estrangeiros condicionar a política portuguesa de emigração.

A autora e o Ministério Público, na sequência de junção ao processo de documento comprovativo do pertinente direito de família caboverdeano, produziram novas alegações, reiterando as suas anteriores posições.

O relator, no dia 15 de Julho de 2004, proferiu sentença pela qual julgou a acção procedente, o Ministério Público reclamou para a conferência, e a Relação, por acórdão proferido no dia 16 de Novembro de 2004, manteve aquela sentença, indeferindo a reclamação.

Interpôs o Ministério recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - as normas relativas ao poder paternal são de interesse e ordem pública; - a delegação do poder paternal traduz-se, no caso, na renúncia pelo progenitor paterno do poder-dever por natureza irrenunciável e intransmissível; - a confirmação da sentença revidenda para produzir efeitos em Portugal significaria a admissão na ordem jurídica portuguesa, de forma indirecta, de uma adopção fora do respectivo processo; - o acórdão recorrido desrespeitou os artigos 8º e 31º do Acordo Judiciário entre Portugal e Cabo Verde, aprovado pelo Decreto nº 524-O/76, de 5 de Julho, 1882º e 1973º, nº 2, do Código Civil e 1096º, alínea f), do Código de Processo Civil; - deve ser substituído por outro que declare a incompetência do tribunal recorrido para conhecer da acção ou negue a revisão.

Respondeu a autora, em síntese de conclusão de alegação: - o tribunal recorrido é competente para apreciar o pedido de confirmação da sentença, e o Acordo Judiciário entre Portugal e Cabo Verde não é aplicável no caso; - o pedido de revisão visa informar os estabelecimentos escolares e demais entidades públicas da titularidade do poder paternal das menores, que residem em Portugal; - a referida regulação do exercício do poder paternal não colide com os princípios do ordenamento jurídico português ou da ordem pública internacional do Estado Português; - relevam para a decisão de confirmar ou não confirmar a sentença em causa os seus efeitos práticos, que não são incompatíveis com os princípios acima enunciados em segundo lugar, pelo que está preenchido o requisito da alínea f) do artigo 1096º do Código de Processo Civil.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. Nos dias 5 de Dezembro de 1989 e 4 de Setembro de 1990 nasceram nas freguesias de Santa Catarina e de São Miguel, concelho de Santa Catarina, República de Cabo Verde, C e D, filhas de B e de F, solteiros, a última falecida no dia 30 de Setembro de 1998.

  1. B requereu no tribunal da comarca de Santa Catarina, República de Cabo Verde, a delegação do exercício do poder paternal relativamente a C e D na pessoa de A, casada, nascida no dia 28 de Março de 1955, filha de G e de H, irmã de F.

  2. Alegou, para o efeito, terem as menores nascido do seu relacionamento marital com E durante 11 anos, terem aquelas ficado ao seu cuidado, viver da agricultura, sem rendimento certo, ter enfrentado dificuldades na educação e sustento delas, conferir voluntariamente à delegada as faculdades integrantes do poder paternal estatuído no artigo 1815º do Código Civil, designadamente a guarda e a regência das menores, a garantia do seu sustento e zelo pela sua saúde e normal desenvolvimento, o dirigir e assegurar a sua educação, formação intelectual e cultural, inculcando-lhe o amor pelo estudo e trabalho, o velar pela sua correcta formação moral e social no respeito de si, dos outros e da comunidade, determinar o seu domicílio enquanto estiverem na sua dependência, representá-las nos actos e negócios jurídicos necessários não vedados por lei, administrar diligentemente os bens que elas adquirirem, autorizá-las a praticarem os actos que, por determinação da lei, dependam do seu consentimento, acordar com a delegada perdurar a delegação até atingirem a maioridade e que a última já tinha dado o consentimento em as educar como se fossem suas filhas.

  3. O requerente tem nove filhos - C de 12 anos, I de 12 anos, D de 10 anos, Y de 10 anos, X de oito anos, Z de 6 anos, não tem trabalho, passa grandes dificuldades e A - a delegada - é tia materna delas 5. A decisão judicial é do seguinte teor: Face aos factos dados como provados no requerimento apresentado pelo progenitor das menores e à não oposição do Ministério Público, na qualidade de curador de menores, por estarem verificados os pressupostos da delegação voluntária do exercício do poder paternal, nos termos dos artigos 1861º, 1862º, 1863º e 1864º, nº 2, do Código Civil em vigor, homologa-se por sentença o requerimento transcrito para todos os efeitos legais, conferindo a A todas as faculdades que integram o exercício do poder paternal em relação às menores C e D Teresa da Veiga Batista até à sua maioridade.

  4. A secretaria do Tribunal da Comarca de Santa Catarina, República de Cabo Verde, certificou, no dia 14 de Dezembro de 2000, ter a sentença mencionada sob 5 transitado em julgado.

    III A questão essencial decidenda é a de saber se ocorrem ou não no caso espécie os pressupostos de confirmação da sentença mencionada sob II 5.

    Tendo em conta o conteúdo do acórdão recorrido e das conclusões de alegação formuladas pelo recorrente e pela recorrida, a resposta à referida questão pressupõe a análise da seguinte problemática: - requisitos de revisão de sentenças estrangeiras e pressupostos da sua impugnação à luz do direito português de origem interna; - regime legal de revisão em Portugal de sentenças proferidas da República de Cabo Verde; - regime legal aplicável de entre os regimes de origem interna e externa acima referidos; - tal regime implica ou não a incompetência do tribunal recorrido para a revisão e confirmação da sentença em análise? - regime jurídico substantivo estrangeiro em que assentou a sentença revidenda no...

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