Acórdão nº 05B3578 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Fevereiro de 2006
Magistrado Responsável | ARAÚJO BARROS |
Data da Resolução | 02 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A, L.da" intentou, no Tribunal Judicial de Valongo, acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra B, pedindo que seja declarado resolvido o contrato-promessa identificado na petição inicial, por incumprimento definitivo e culposo da ré, bem como a condenação desta a pagar-lhe, a título de restituição de sinal, em dobro, a quantia de 2.465.083,81 Euros, acrescida de juros, à taxa legal de 12% ao ano, sobre 2.429.145,76 Euros e até efectivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese, que: - por contrato de 31/12/98, a ré prometeu vender à autora uma parcela de terreno, pelo preço de 500.000.000$00; - a ré recebeu logo 100.000.000$00, em dinheiro, a título de sinal e princípio de pagamento; - a quantia de 200.000.000$00 seria paga por dação em pagamento de 11 fracções autónomas - sete das quais, no valor de 143.500.000$00, já se encontravam construídas, prontas a habitar, ficaram adstritas a tal pagamento, na inteira disponibilidade da ré, podendo esta fazer as escrituras quando e para quem pretendesse; - a ré prometeu atribuir eficácia real à promessa de venda do terreno e obrigou-se a outorgar a respectiva escritura logo que a autora para tal a convocasse; - ficou acordado que ambas as partes deveriam proceder à demarcação do terreno até 31/01/99; - o prazo de realização da escritura, cuja marcação ficou a cargo da ré, era de 120 dias a contar da data em que esta obtivesse a cessação do arrendamento que onerava o subsolo do dito, mas sem prejuízo da data limite de 01/06/2000; - apesar de convocada pela autora, por carta de 12/03/99, para outorgar a escritura de atribuição de eficácia real ao contrato-promessa, a ré não compareceu, situação que se repetiu na sequência de carta de 07/04/99; - a autora tentou obter a execução específica da promessa de atribuição de eficácia real, mas a respectiva acção foi julgada improcedente; - esgotado o prazo de 01/06/2000, a ré não marcou a escritura, e nada comunicou, pelo que a autora, ela própria, procedeu a tal marcação para 28/06/2000; - mas, apesar de convocada, a ré não compareceu no local para se efectuar a demarcação do prédio, nem à escritura, nem deu qualquer justificação; - tendo a autora feito nova marcação e convocatória da ré para 29/09/2000, esta contactou-a a pedir-lhe o adiamento e comprometendo-se a outorgar a escritura durante o mês de Outubro seguinte ou, se a autora assim o preferisse, até final de Janeiro de 2001, o que a autora aceitou, ambas tendo vertido num documento esse acordo; - a autora comunicou à ré que diferia o prazo para 31/01/2001; - por carta de 15/01/2001, a autora convocou a ré para a escritura marcada para 31 seguinte e para comparecer no terreno a fim de o mesmo ser demarcado; - ela compareceu à demarcação e esta fez-se; - porém, não compareceu à escritura; - depois disso, reafirmou que era sua intenção cumprir o contrato-promessa, mas, com diversas desculpas e evasivas, sempre se foi esquivando a celebrar a escritura; - mais uma vez a autora marcou e notificou a ré para a escritura em 12/04/2002; porém, de novo, a ré faltou, sem mais, pelo que a autora, por carta de 07/08/2002, lhe comunicou que considerava resolvido o contrato-promessa por incumprimento definitivo e culposo da ré; - além dos 100.000 contos, a autora entregou à ré as 7 fracções autónomas, no valor de 143.500 contos, também estas com o carácter de sinal.
Na contestação a ré impugnou parte da matéria fáctica alegada na petição, maxime: - a concernente à entrega e disponibilidade das sete fracções referidas; - à falta de justificação ou explicação para a não comparência à escritura; - que se tivesse esquivado à celebração da escritura; - que se verifiquem os motivos para resolução por culpa sua; - que tenha havido entrega das fracções equivalente a sinal e, portanto, que o valor destas deva ser computado para o efeito; - sempre se dispôs e dispõe a cumprir o contrato, o qual só o não foi porquanto a autora ainda não iniciou a construção das fracções (quatro) a que se alude a dado passo do respectivo documento (alínea b) da cláusula 5ª) pois que sempre afirmou que queria que estas fossem a contrapartida do negócio e não a alternativa monetária, pela qual só ela (ré) poderia optar.
Em reconvenção, alegando a confissão pela autora do seu desinteresse e que o negócio só não se efectuou devido a falta de condições da sua parte, pediu que a autora seja condenada a ver declarado perdido, a seu favor, o dinheiro entregue a título de sinal.
Na réplica a autora lembrou que a não construção das ditas quatro fracções está prevista no contrato, até em condições mais favoráveis para a ré, já que lhe permitiam receber o preço (alínea b), do nº 2, da cláusula 5ª).
Exarado despacho saneador, condensados e instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, com decisão acerca da matéria de facto controvertida, sendo, depois, proferida sentença que julgou em parte procedente, por provada, a acção, e, em consequência, declarou resolvido o contrato-promessa, por incumprimento definitivo e culposo da ré, condenando-a a pagar à autora, a título de restituição de sinal em dobro, a quantia de 997.595,79 Euros (equivalente a 200.000.000$00) e, bem assim, os juros de mora, sobre essa quantia, à taxa legal, anual, civil, que vigorar em cada momento, desde 9 de Agosto de 2002 (data da resolução do contrato) até efectivo e integral pagamento, absolvendo-a do mais.
Inconformada, apelou a ré, sem êxito embora, já que o Tribunal da Relação do Porto, em acórdão de 16 de Maio de 2005, decidiu negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Recorreu, agora, a mesma ré de revista, pretendendo a revogação do acórdão impugnado e que, em sua substituição, seja proferida decisão que decrete que o negócio em causa (o contrato promessa) não produziu quaisquer efeitos desde a sua realização, por impossibilidade objectiva, não imputável à recorrente já que, sujeito à verificação de uma condição suspensiva, esta não chegou a verificar-se, declarando-se extinta a obrigação, com o direito da autora ver-lhe restituído pela ré a importância que lhe entregou a título de sinal.
Em contra-alegações pugnou a recorrida pela improcedência do recurso e pela confirmação do acórdão recorrido.
Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.
Nas alegações do recurso formulou a recorrente as conclusões seguintes (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. Constitui causa de pedir na presente acção um contrato-promessa de compra e venda de imóvel em que é promitente vendedora a recorrente e promitente compradora a recorrida celebrado em 31 de Dezembro de 1998 - Facto levado à Especificação - factos provados.
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Conforme cláusula 4ª deste Contrato "para possibilitar a concretização da venda ora prometida", a promitente vendedora comprometeu-se a liberar o prédio do arrendamento que o onerava para exploração de massas minerais no seu subsolo e celebrado em 28 de Novembro de 1928, efectivando a cessação daquele contrato, pela forma que entender, o mais tardar até 1 de Junho de 2000 - Provado na Especificação.
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Com objectivo referido no corpo desta Cláusula ("possibilitar a concretização da venda ora prometida") a recorrente já havia enviado à arrendatária, carta registada com aviso de recepção, em 19 de Junho de 1998, a denunciar o contrato para 1 de Junho de 2000 (Provado na Especificação).
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E para o mesmo fim, a recorrente já havia instaurado pelo 1° Juízo do Tribunal Judicial de Valongo uma acção de despejo contra a mesma arrendatária visando a cessação/extinção do arrendamento e que tomou o nº 167/97 - facto levado à Especificação.
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Mais se obrigou a recorrente a fazer cessar as situações de facto criadas por pessoas que cultivavam certas partes do prédio prometido vender, gratuitamente e por mero favor, sem qualquer título que legitimasse a sua ocupação, no prazo máximo de sessenta dias - Provado na Especificação.
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A escritura definitiva de compra e venda do contrato prometido seria outorgada no prazo máximo de 120 dias, a contar da data em que a recorrente obtivesse a cessação do arrendamento do subsolo que onera o prédio - Provado na Especificação.
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Competindo-lhe comprovar tal facto perante a recorrida e proceder à marcação da escritura notarial, convocando a recorrida por meio de carta registada com aviso de recepção - Provado na Especificação.
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Todos estes factos se encontram provados por acordo das partes - Especificação - alínea A), fls. 10 da decisão proferida na 1ª instância e confirmada pelo tribunal a quo.
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As promitentes, compradora e vendedora, quiseram, assim, fazer depender a assinatura da escritura definitiva do contrato prometido, e consequentemente, o cumprimento do contrato, da verificação de um facto futuro e incerto - o de "liberar o prédio do arrendamento que o onera".
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A promitente compradora tinha perfeito conhecimento de todos estes factos antes da feitura e celebração e assinatura do contrato promessa, em 31 de Dezembro de 1998 - Provado na Especificação.
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São claras e inequívocas as declarações de vontade expressas no contrato: "para possibilitar a concretização da venda ora prometida, a 1ª Outorgante comprometeu-se a liberar o prédio do arrendamento que o onera".
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A promitente vendedora cumpriu todos os compromissos a que estava obrigada contratualmente.
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A cessação do contrato de arrendamento que onerava o prédio prometido vender foi registada no contrato-promessa como condição suspensiva para assinatura da escritura definitiva e cumprimento do contrato, como de resto se vê do art. 17º da petição inicial, entrada em juízo em 24 de Setembro de 2002.
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A data limite de 1 de Junho de 2000 para outorga da escritura definitiva consta do contrato-promessa como um objectivo temporal dos interessados, aliás coincidente com o prazo que a promitente vendedora...
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