Acórdão nº 05P4737 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Maio de 2005

Magistrado ResponsávelHENRIQUES GASPAR
Data da Resolução04 de Maio de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Na 2ª Vara da Competência Mista de Sintra, sob acusação do Ministério Público foi, entre outros arguidos (A; B; C; D; E; F e G), condenado H, identificado no processo, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes e p°. e p° pelo art° 21°, nº l e art° 24° alínea c), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de sete anos de prisão, e como autor material de um crime de receptação, p°. e p° pelo art°. 231°, nº l do Código Penal na pena de dois anos de prisão; em cúmulo jurídico foi condenado na pena de e sete anos e seis meses de prisão.

  1. Não se conformando com a decisão, o arguido recorre para o Supremo Tribunal, fundamentando o recurso nos termos da motivação que apresenta e que faz terminar com a formulação das seguintes conclusões: 1ª Na concretização dos factos dados como provados, apenas se faz menção ao haxixe apreendido, cerca de 150 kg.

    1. Este facto não é susceptível de convocar a aplicação da agravante cominada na alínea c), do D.L. 15/93.

    2. O acórdão apenas se faz alusão ao lucro que o recorrente pretendia obter com o haxixe apreendido.

    3. Na matéria de facto não se deu como provado qual o lucro que o recorrente pretendia obter, ainda que aproximadamente.

    4. Tão pouco se deu como provado factos, que segundo as regras da experiência, levem a concluir, com elevado grau de certeza, que o recorrente iria obter enormes proveitos.

    5. Designadamente, importava saber por que preço o arguido adquiriu a droga, por que preço pretendia vendê-la, se era o dono do negócio.

    6. Sendo a matéria de facto apurada omissa quanto a estes pontos impunha-se a aplicação do principio in dubio pro reo, tal como acontece ao nível da determinação do valor da coisa furtada.

    7. A condenação pelo crime de tráfico simples impunha, desde logo, a diminuição da pena.

    8. Todavia, outros motivos se juntam no sentido de almejar esse objectivo.

    9. O recorrente sente-se injustiçado pelo facto de a sua pena não ser semelhante à do seu co-arguido C.

    10. Por outro lado o douto tribunal não atendeu a todas os elementos que devem intervir na determinação da medida da pena.

    11. Com efeito, a única droga de que há noticia, quanto ao ora recorrente. foi apreendida, tendo como resultado a ausência de consequências ao nível da saúde pública.

    12. A droga apreendida é das menos perniciosas à saúde dos cidadãos, sendo considerada uma droga leve.

    13. Não ficou provado que lucros o recorrente obteve ou procurava obter com o transporte desta droga.

    14. A primariedade do recorrente não foi valorada, deduzindo-se daqui a desnecessidade da acção, por via da pena, de socialização.

    15. Todos estes elementos nos levam a concluir que a pena a aplicar não deve ser superior a 4 anos e 6 meses de prisão.

    Refere como violadas as disposições dos artigos 21 ° e 24°, alínea c), do D.L. 15/93,e 40° e 71° do C.P.

    Pede o provimento do recurso, e em consequência; a revogação do acórdão, aplicando ao recorrente uma pena não superior a 4 anos e 6 meses de prisão.

    O magistrado do Ministério Público, respondendo à motivação, considera que o recurso não merece provimento.

  2. Neste Supremo Tribunal, o Exmº Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que se refere o artigo 416º do Código de Processo Penal, considera que nada obsta ao conhecimento do recurso.

    Colhidos os vistos, teve lugar a audiência, com a produção de alegações, cumprindo apreciar e decidir.

    O tribunal colectivo considerou provados os seguintes factos: Desde data indeterminada, mas anterior a 23 de Outubro de 2001, que o arguido A se vinha dedicando à pratica reiterada e continuada da compra e venda de produtos estupefacientes, nomeadamente heroína, cocaína, haxixe e ecstasy.

    O arguido A tinha contactos e fornecedores, com ligações à Holanda, actuando em conjugação de esforços com indivíduos de outras nacionalidades e radicados na Holanda, alguns de origem Cabo-Verdiana e Marroquina.

    Nesta actividade o A actuou juntamente com vários elementos com tarefas especificas, contando-se entre eles, os que são utilizados como "correios", os que procedem ao armazenamento dos produtos estupefacientes e à sua distribuição no mercado nacional, essencialmente a pessoas nos concelhos de Sintra, Amadora e Oeiras, e ainda os que procedem à recolha dos proventos monetários relacionados com a venda da droga, guardam os lucros e se encarregam de os colocar no circuito bancário, como seguidamente melhor se explanará.

    O arguido A encetou contactos com o I, de alcunha, o "Petcha", indivíduo de nacionalidade Cabo-Verdeana, residente na Holanda. Mercê dos conhecimentos que tinha do mercado de estupefacientes naquele País (Holanda), era o "Petcha" quem fornecia tais produtos ao arguido A.

    Para o efeito, o A deslocava-se à Holanda onde acertava com o "Petcha" os pormenores relativos ao transporte de estupefaciente para Portugal e efectuava o respectivo pagamento.

    Para a introdução do produto estupefaciente em Portugal, o A utilizava "correios" em quem depositava a sua confiança, como é o caso da arguida D, a "...". Estes "correios" em primeira linha, viajavam com o A até à Holanda onde eram apresentados ao fornecedor e se inteiravam dos trâmites do transporte. Posteriormente, deslocavam-se eles próprios sozinhos à Holanda, via aérea, e após lhes serem entregues os produtos estupefacientes, regressavam a Portugal, fazendo o percurso de regresso por outro itinerário, via terrestre - Holanda - Luxemburgo - Portugal.

    Com o A actuava juntamente o seu irmão e também arguido B, de alcunha, o "Chica", o suspeito J, de alcunha, o "...", o C, de alcunha, o "...", além de outros indivíduos não identificados..

    O arguido C "....", canalizava o estupefaciente para outros indivíduos, tais como o arguido E, o "....", e o suspeito K, o "...".

    Por sua vez, o arguido E, o "..." adquiriu por várias vezes 1 kg. a 1,5 Kg. de haxixe, pela quantia de 180 000$00 a 190 000$00, directamente ou através do "..." , ao "....", procedendo à venda dos mesmos na zona de Oeiras, o que ocorreu pelo menos nos dias 11/04/02, 26/04/02, 13/05/02, 14/05/02, 17/05/02, 25/11/02 em horas e circunstâncias não concretamente apuradas.

    Como forma de preservar os elevados lucros obtidos com a actividade ilícita de tráfico de estupefacientes, o arguido A fez-se ainda rodear de indivíduos, que guardavam os lucros e colocavam parte deles no circuito bancário, entre eles o seu próprio irmão, o também arguido B , o "Chica".

    O arguido F, o "Cola", guardava os proventos obtidos na actividade ilícita de tráfico, fazendo a gestão dessas quantias através de aplicações financeiras em instituições bancárias.

    Relativamente ao arguido F, o "COLA", amigo de infância do arguido "....", este ultimo começou por lhe entregar quantias em dinheiro que rondavam os 50 contos por semana, e que vieram a aumentar progressivamente para os 150 a 200 contos por semana.

    Ao arguido "COLA" incumbia como se referiu, depositar parte das mesmas nomeadamente numa conta bancária por si titulada na Agência da CGD do Cacém, sendo que a outra parte guardava na sua residência.

    Parte das quantias depositadas ( cerca de 4 000 000$00) veio a ser empregue pelo arguido "...." na aquisição de um apartamento sito na Avenida do Brasil, n° 82 - 2° C, S. Marcos, Cacém, e que adquiriu pelo valor de 21 500 000$00.

    Todavia, a actuação deste arguido "COLA" encontrava-se restrita ao que lhe era ordenado pelo arguido "....".

    Como seguidamente se vai explanar, o arguido A na sequência de operação policial, veio a ser detido em 26 de Maio de 2002, na companhia de um dos seus "correios", a arguida D. No acto de detenção foram apreendidos na posse destes arguidos, 16,2 Kg de comprimidos que se veio a concluir tratar-se de ecstasy, comprimidos que a D acabara de transportar da Holanda e que lhe haviam sido entregues pelo "PETCHA".

    Com a detenção e prisão preventiva do arguido A, surge no seio desta grupo, o arguido H, de alcunha o "ESPERTO, tomou o lugar daquele, tornando-se o responsável pela "importação" de elevada quantidade de estupefaciente (haxixe) proveniente de Espanha.

    Para o efeito, foi o arguido L quem se deslocou a Espanha, após ter contactado previamente o seu abastecedor, indivíduo que até à data não foi possível identificar.

    O transporte para Portugal foi controlado directamente pelo L.

    Nessa viagem o arguido "ESPERTO" utilizou "batedores de estrada" que se deslocavam alguns quilómetros à frente da sua viatura que transportava o estupefaciente, com vista a assegurar que não existia presença policial; Utilizava ainda, outros veículos de "segurança" à viatura , para evitar assaltos de grupos rivais.

    Era sob as suas ordens que o estupefaciente era distribuído na Amadora, Damaia e Cacém.

    Nesta ultima localidade - Cacém - residia um dos seus principais clientes, o já referido C, o "...".

    Em 26 de Março de 2003, ocorreu a detenção dos arguidos B, C, E, M e F.

    Até esta data, os arguidos B, C, E e F mantinham um nível sem terem rendimentos compatíveis com a situação económica que ostentavam, acumulando bens de elevado valor nomeadamente carros de alta cilindrada, telemóveis, e sendo titulares de contas bancárias em que eram patentes valores monetários elevados.

    Exemplificativo desta vida é o facto do arguido C ter instalado na sua viatura Fiat Punto Punto Turbo i.e. matrícula VL, um sistema de som avaliado em 7 500 Euros.

    Entre os dias 25/26 de Dezembro de 2001 e 5 de Janeiro de 2002, o arguido A deslocou-se à Holanda, tendo regressado no voo TP 5657, proveniente de Amesterdão; Em Janeiro de 2002, designadamente nos dias 18 de Janeiro e 21 de Janeiro, o arguido A contactou telefonicamente a arguida D, para que esta efectuasse um transporte de produto estupefaciente da Holanda para Portugal, a troco de 1500 contos.

    Nesse dia, 18 de Janeiro de 2002, o arguido A procedeu ao levantamento numa agência bancária do Cacem de cerca de 15.000 Euros, em notas de elevado valor facial; No dia 22 de Janeiro de 2002, cerca das 16,00 horas, o arguido A desloca-se à Agência de...

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