Acórdão nº 05S1919 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Dezembro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelMARIA LAURA LEONARDO
Data da Resolução07 de Dezembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça: I - "AA", residente na Damaia, Amadora, intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra Empresa - A, com sede na Avª Dr ...., ..., em Lisboa, em que pede que o despedimento efectuado pela ré seja declarado ilícito e esta condenada a reintegrar a autora e a pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas até decisão final e, ainda, uma indemnização por danos morais de montante não inferior a 5.000.000$00.

Alegou, em síntese: - em 2 de Março de 1981, entrou ao serviço da Sociedade Empresa - B; - em 1 de Fevereiro de 1995, foi transferida para a Sociedade Empresa - C; - em 1 de Junho de 1999, foi transferida para a sociedade Empresa - D, posteriormente transformada em Empresa - A ; - desde Março de 1981 até 27 de Novembro de 2000, sempre exerceu as funções de Secretária de Administração, apesar de só em Janeiro de 1990 lhe ter sido atribuída tal categoria profissional; - com data de 13 Novembro de 2000, a ré instaurou-lhe um processo disciplinar que culminou com o seu despedimento, em 27 de Novembro de 2000; - acontece que os factos que lhe são imputados não ocorreram nos 60 dias anteriores à apresentação da nota de culpa, o que determina a caducidade do procedimento disciplinar; - de qualquer forma, inexiste justa causa de despedimento, dado que os factos imputados na nota de culpa foram empolados pela ré com o objectivo de lhe retirar, como retirou, o desempenho das funções de secretária de administração que vinha exercendo há anos; - com o despedimento, a sua saúde ficou muito afectada, vendo-se na necessidade de recorrer a tranquilizantes e a consulta de psiquiatria.

A ré contestou, alegando, que a autora foi admitida para exercer as funções de secretária e que praticou actos violadores dos deveres de respeito, urbanidade, lealdade, obediência, zelo e diligência que, pela sua gravidade, inviabilizam a continuação da relação laboral.

Conclui pela improcedência da acção.

Instruída e discutida a causa, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré do pedido.

Apelando a autora da sentença, o Tribunal da Relação revogou a sentença recorrida. Consequentemente declarou ilícito o despedimento da autora e condenou a ré a reintegrar a autora ao seu serviço e a pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas até decisão final.

Inconformada, a ré vem pedir revista, formulando na sua alegação as conclusões que, de forma mais sintética, se indicam: 1ª) - O acórdão em recurso não fez uma acertada interpretação e aplicação da lei - artºs 18, 20 n. 1 a) b) c) da LCT e artºs 9º n. 1 e 2 a) d) e 12º-5 da LCCT; 2ª) - O acórdão sub judice entendeu que a ordem dada pela ré à autora em 21 de Setembro de 2000 era ilegítima; 3ª) - A ilegitimidade decorria do facto das novas funções atribuídas à autora serem funções qualitativamente inferiores às que a autora vinha desempenhando, pelo menos, desde Janeiro de 1990, o que, na prática, se traduzia numa situação de baixa de categoria, violadora do disposto nos artºs 22º-1 e 23º da LCT; 4ª) - Situação que se consubstanciava numa mudança de sector - sem consentimento da autora - para o exercício de funções qualitativamente inferiores às que vinha exercendo há, pelo menos, 10 anos, mudança que, por si, implicava condições de trabalho mais desfavoráveis, as quais também resultavam da mudança de gabinete imposta à autora...., o que tudo constituía uma violação ao disposto na alínea i) do nº 1 da Cláusula 39ª do CCT Automóvel; 5ª) - E ao exigir que a autora trabalhasse em benefício de outra empresa (a Entreposto Lisboa), ficando sujeita ao poder de direcção e autoridade de trabalhadores desta, a ré tinha violado o princípio geral de direito consagrado no artº 1º da LCT, bem como o disposto no regime de cedência de trabalhadores previsto nos artºs 26º e segs do DL nº 358/89; 6ª) - Por outro lado, o facto de o administrador BB manter a confiança na autora, obstava a que in casu se verificasse uma situação de impossibilidade de subsistência da relação de trabalho; 7ª) - Discorda-se do acórdão recorrido: as novas funções atribuídas à autora não eram funções qualitativamente inferiores às que esta vinha desempenhando; além disso, a autora nunca chegou a exercer uma única dessas novas tarefas (cf. ac. STJ de 12.05.99, in CJ II, 275); 8ª) - Como se refere no acórdão recorrido: «A autora não aceitou os trabalhos que lhe foram solicitados no âmbito das novas funções (factos constantes dos nºs 46, 48, 51 e 52) e solicitou que as ordens para os fazer lhe fossem dadas por escrito»; 9ª) - A autora, antes de começar a exercer as novas funções que lhe foram comunicadas pelo seu superior hierárquico, o Dr. CC (um dos 3 vogais do Conselho de Administração, que acumulava as funções de director financeiro), não poderia saber se essas novas funções correspondiam ou não às de secretária tal como esta função vem definida a fls. 164 dos autos no Anexo III do CCT para o Sector Automóvel, aplicável à relação das partes; 10ª) - A ré na carta que lhe dirigiu em 11 de Outubro de 2000 (facto nº 42) informou-a nestes termos: «as funções que lhe foram distribuídas inserem-se no elenco de tarefas que caracterizam a categoria profissional de Secretária... O exercício dessas tarefas não é ilegal nem há qualquer desvalorização profissional ou baixa do seu escalão profissional, esperando esta Administração que V. Exa. as exerça ainda com mais zelo e competência do que as que diz ter exercido nas suas funções anteriores»; 11ª) - Perante as cinco ordens do Dr. CC, recusadas pela autora, esta poderia executá-las, sob protesto, se viesse a verificar na prática que essas funções não correspondiam às da sua categoria de secretária; 12ª) - Ou poderia, considerando que as funções não eram as suas, recorrer aos tribunais, para estes decidirem se aquelas funções correspondiam ou não à sua categoria; 13º) - No dizer da douta sentença revogada, a autora «revelou má compreensão do dever de obediência a que estava adstrita»: «Ao condicionar o cumprimento do dever de obediência à exigência das ordens lhe serem transmitidas por escrito, que no caso carece de justificação, a situação acaba por se reconduzir à recusa de cumprimento de ordens (...), factos (...) que, no que concerne à desobediência, revelam uma atitude persistente de desafio às ordens da entidade patronal ... que comprometem definitivamente a continuação da relação laboral»; 14ª) - A recusa da autora, além de sistemática (repetiu-se 4 vezes), foi ostensiva perante a colega DD e sempre com diferentes explicações: não, porque ainda me estou a instalar (nº 46); não, porque ainda não estou em condições de aceitar trabalho; não, porque estou muito ocupada (nº 48); - quando puder, telefono-lhe (n.º49); não, porque quero a ordem por escrito (nº 51 e 52); 15ª) - A autora com a sua obstinada recusa não permitiu sequer à ré demonstrar, na prática, que não iria alterar a categoria-função e a categoria-estatuto da mesma; 16ª) - A este propósito, veja-se o que escreve Bernardo da Gama Lobo Xavier, em "A mobilidade funcional e a nova redacção do artº 22º da LCT", in RDES, Ano XXXIX - 1997 (XII da 2ª série), 1, 2, 3, pgs. 51 e sgs; 17ª) - A ré colocou a autora a exercer funções para as quais a sabia qualificada e com capacidade para as desenvolver com diligência e zelo, sem beliscar a sua categoria-função e a sua categoria-estatuto, garantindo que lhe seria prestada formação específica nos sistemas de gestão Autosoft e SGCV, únicas funções para as quais seria necessário dar-lhe formação; 18ª) - Não se verificou a condição imposta na parte final da alínea i) da Cláusula 39ª do CCT, ou seja, que essa mudança implicasse para a autora «condições de trabalho mais desfavoráveis»; 19ª) - A autora desempenharia funções que lhe foram anunciadas na reunião de 21 de Setembro de 2000 com muito maior "à vontade" porque teoricamente menos exigentes do que as que vinha exercendo quando secretariou o presidente do Conselho de Administração, responsável máximo pela gestão da entidade empregadora; 20ª) - A circunstância perfeitamente transitória de a autora poder mexer nalguns "dossiers" de clientes do Empresa-C não significava que passasse a trabalhar para essa sociedade. Isto foi explicado pelo presidente do conselho de administração, Eng.º EE, no seu depoimento (lado A da cassete nº 4) e a autora tinha a obrigação de já ter percebido isso; 21ª) - A partir de 28 de Junho de 1995, o Regulamento (CE) n.º 1475/95 impôs aos concessionários de marcas automóveis «locais de vendas e oficinas separadas mas podiam ter uma contabilidade comum a fim de construir sinergias»; 22ª) - O Entreposto Lisboa e o Empresa-D (denominação anterior da ré) comercializavam, simultaneamente, as marcas NISSAN e HYUNDAI. Por imposição dos Regulamentos Comunitários e das respectivas fábricas, a partir de 1999, o Empresa-C reservou para si a representação NISSAN e o Entreposto Cascais (transformado em sociedade anónima com a denominação Entreposto L. H. - iniciais que significam Lisboa-Hyundai) ficou com a representação HYUNDAI; 23ª) - Numa fase inicial e transitória, a ré teve de tratar ainda dos "dossiers" NISSAN que pertenciam aos clientes da marca NISSAN do Entreposto L.H. assim como o Entreposto Lisboa teve de lidar com os "dossiers" HYUNDAI dos seus anteriores clientes da marca coreana e, só, a pouco e pouco, é que esta destrinça seria completada; 24ª) - Por esta razão é que a autora iria eventual e transitoriamente mexer com "dossiers" de clientes NISSAN já pertencentes ao Empresa-C; 25ª) - Não foi esse, todavia, o caso aquando da recusa frontal da autora em aceitar os "processos de viaturas contendo documentos que deviam ser enviados a clientes" e cujo trabalho lhe foi mandado executar pelo administrador, Dr. CC, nos dias 4, 6, 11, 18 e 30 de Outubro de 2000 (factos provados sob os nºs 45, 46, 43, 47, 48, 51 e 52 da sentença); 26ª) - A ré não violou o disposto no regime da cedência de trabalhadores constante dos...

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