Acórdão nº 97A928 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Julho de 1998 (caso None)
Magistrado Responsável | GARCIA MARQUES |
Data da Resolução | 09 de Julho de 1998 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I O Banco A. instaurou execução ordinária, para pagamento de quantia certa contra B e mulher C, todos com os sinais dos autos, alegando ser legítimo portador de três livranças, no valor de 10000000 escudos, cada uma, subscritas a favor do exequente pela sociedade D, com o aval dos executados a favor da subscritora e que nenhum dos firmantes pagou quer no vencimento quer posteriormente. O executado veio deduzir embargos, alegando, em síntese: a) o facto de não constar das livranças dadas à execução, por ele avalizadas, a menção da qualidade de gerente de quem as assinou, como é exigido pelo artigo 260º, nº 4, do CSC; b) visarem tais livranças, subscritas e entregues em branco, assegurar responsabilidade futura, não sendo possível, quando prestado o aval, determinar o âmbito e os limites dessa garantia. Particularmente relevante a primeira referida irregularidade formal da subscrição dos títulos. Provindo a nulidade da obrigação avalizada de vício de forma, atinge, assim de igual forma a obrigação do avalista, inexistindo causa de pedir. Após contestação do exequente/embargado, no sentido da improcedência total dos embargos, foi proferida decisão no saneador, a julgar os embargos procedentes, com todas as consequências legais, e, nomeadamente, a da execução não poder prosseguir contra o embargante. Inconformado, o embargado deduziu apelação para a Relação do Porto, que, por acórdão de 19 de Junho de 1997, negou provimento ao recurso, confirmando a decisão da 1ª instância. É desse acórdão que o embargado traz a presente revista, oferecendo, ao alegar, as seguintes conclusões: 1. Desde a sua constituição, em 1964, a subscritora das livranças ajuizadas manteve com o Banco recorrente relações comerciais, intensas e regulares. 2. No âmbito dessas relações, a sociedade sempre se obrigou validamente, quer antes quer depois da entrada em vigor do CSC, exclusivamente com a assinatura da sua firma social, assinada pelo recorrido ou pela mulher, como gerentes da sociedade. 3. Já depois da entrada em vigor do CSC, a sociedade efectuou com o recorrente diversas operações bancárias, para a realização das quais assinou correspondência, contratos, propostas de desconto, cheques e livranças, designadamente as ora ajuizadas, sempre com a assinatura da sua firma social, assinada pelo gerente recorrido, conforme os autos sobejamente documentam. 4. Este procedimento, habitual e único, nas relações entre as partes, criou objectivamente no Banco recorrente a convicção, séria e fundada, de que poderia confiar, como de facto confiou, que o recorrido, ao avalizar pessoalmente as livranças ajuizadas, como gerente da sociedade, da forma como sempre fez, ao longo de tantos anos, com a assinatura da firma social da subscritora, o fazia com a intenção, firme e clara, de assumir validamente a obrigação do seu pagamento no vencimento e, consequentemente, de se considerar vinculado a não vir excepcionar e fazer valer, no futuro, a nulidade formal da subscrição, que ele próprio culposamente provocou. 5. As disposições legais sobre os requisitos da forma só serão de interesse e ordem pública quando aquela for exigida por razões de certeza e segurança do comércio jurídico. 6. Como as livranças ajuizadas não entraram em circulação, posto que não saíram e se mantiveram sempre no domínio restrito das relações imediatas entre as partes, não concorre, no caso, aquela exigência de certeza e segurança jurídicas. 7. E daí que haja de atender-se, acima de tudo, aos ditames da boa fé e do não abuso do direito, nas relações entre as partes. 8. O dever de proceder de boa fé, imposto pelos artºs 227º e 762º do CC, tanto na formação e conclusão do contrato, como no cumprimento da obrigação, tem de sobrepor-se correctivamente e não pode ser preterido, no domínio restrito das relações imediatas entre as partes, pela inobservância culposa pelo recorrido da nova forma legal de vinculação da sociedade, que o artº 260º do CSC veio estabelecer. 9. Ao estatuir uma nova forma legal das sociedades por quotas se vincularem, seguramente que o legislador não quis abranger e exonerar os devedores das obrigações contraídas da forma legal anterior, como sempre se vincularam, quer antes quer depois da entrada em vigor do CSC, perante o recorrente de boa fé. 10. Tanto mais que a nulidade formal da assinatura da sociedade nas livranças ajuizadas, por inobservância da forma legal daquela se obrigar, foi provocada, intencional e culposamente, pelo próprio recorrido, que a veio invocar depois. 11. De modo que a arguição daquela nulidade formal pelo recorrido constitui, nas circunstâncias concretas das relações entre as partes, um caso típico de "venire contra...
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