Acórdão nº 98P1003 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Janeiro de 1999

Magistrado ResponsávelFLORES RIBEIRO
Data da Resolução19 de Janeiro de 1999
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1. Subsecção Criminal: No 2. Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém responderam, em processo comum e perante o Tribunal Colectivo, os arguidos A, e B, ambos com os sinais dos autos a quem o Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público imputa a prática, na sua acusação, quanto ao arguido A, de um crime de homicídio, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 131 e 22 do Código Penal de 82 e no tocante ao arguido B, de um crime de ofensas corporais, previsto e punido pelo artigo 142 n. 1, do mesmo diploma. O arguido A constituiu-se assistente nos autos e, contra o arguido B, deduziu acusação particular imputando a este a prática de um crime de injúrias, previsto e punido pelo artigo 165 do referido Código, formulando contra o mesmo pedido de indemnização civil, reclamando a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 75000 escudos por danos não patrimoniais que alega ter sofrido. Por sua vez, o arguido B, enquanto lesado, deduziu pedido cível contra o arguido A, solicitando a condenação deste a pagar-lhe a verba de 1335120 escudos, por danos patrimoniais e não patrimoniais, que diz ter sofrido, acrescidos de juros moratórios a partir da data da ocorrência dos factos. Apenas o arguido B contestou oferecendo o merecimento dos autos. Realizada a audiência de discussão e julgamento veio o Tribunal Colectivo, em face da matéria de facto dada como provada a condenar o arguido A, como autor material de um crime de homicídio, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 131, 22, 23 n. 2 e 73 do Código Penal de 95 na pena de 3 anos de prisão. E a condenar o arguido B como autor de um crime de injúrias, previsto e punido pelo artigo 181, do Código Penal de 95, na pena de 50 dias de multa a 500 escudos diários e como autor de um crime de ofensas corporais previsto e punido pelo artigo 142 do Código Penal de 82, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de 500 escudos; em cúmulo condenou-se este arguido na pena única de 120 dias de multa a 500 escudos por dia, ou seja, na multa de 60000 escudos, com 80 dias de prisão em alternativa. Quanto aos pedidos de indemnização civil formulados e tendo já em conta o acórdão de folha 218 que rectificou o acórdão de folhas 175 e seguintes, foram os mesmos julgados parcialmente procedentes e assim condenou-se o arguido B a pagar ao ofendido A a quantia de 50000 escudos; e condenou-se o arguido A a pagar ao ofendido B a verba total de 1135120 escudos, acrescida de juros legais, desde 22 de Outubro de 1994 até efectivo pagamento. Com o assim decidido não se conformou o arguido A e daí o ter interposto o presente recurso. Da motivação apresentada extraiu o recorrente as seguintes conclusões: 1. O ora recorrente foi condenado como autor material de um crime de homicídio na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 131, 22, 23 n. 2 e 73 do Código Penal de 1995, na pena de 3 anos de prisão. 2. Discorda o recorrente da sentença de que se recorre por considerar que, face aos factos dados como provados não se pode atribuir ao recorrente a autoria da prática de um crime de homicídio na forma tentada. 3. O recorrente exerceu o seu direito de legítima defesa e é à luz desta que a sua conduta deve ser apreciada. 4. E dos factos dados como provados o que se conclui é que o recorrente agiu em legítima defesa - vg. artigo 32 do Código Penal. 5. Nos termos do artigo 32 do Código Penal de 1995, "Constitui legítima defesa o facto praticado como meio necessário para repelir a agressão actual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiros". 6. São requisitos de legítima defesa a existência de uma agressão, a qual deverá ser actual e ilícita e a intenção de defesa por parte do arguido. 7. No caso dos autos estão reunidos os requisitos de legítima defesa. 8. Ficou provado nos autos que o ora recorrente se encontrava, no dia dos factos, entretido a jogar matraquilhos e que a dada altura foi apalpado nas nádegas pelo ofendido. 9. Ficou também provado que já cá fora do café, o recorrente foi agredido a soco e depois com um cinto na cara. 10. Tais factos consubstanciam uma agressão, a qual é ilícita e actual (acrescente-se que o ofendido/arguido foi condenado pela prática destes crimes). 11. Foi dado ainda como provado que "ao desferir a navalha no abdómen do B, agiu o arguido A com o propósito de o afastar de si, em reacção à ofensa que este lhe acabara de cometer". 12. Este facto dado como provado é significativo e não deixa dúvidas quanto à intenção com que o recorrente agiu: "... com o propósito de o afastar de si...". 13. Este facto demonstra inequivocamente que o recorrente agiu com "animus defendendi", não tendo tido outra intenção que não a de repelir uma agressão de que estava a ser vítima. 14. O recorrente não teve intenção de matar. Aliás, é o próprio tribunal "a quo" que dá como assente que o recorrente agiu com o propósito de afastar o agressor. 15. De todos estes factos, ter-se-á que concluir que o recorrente apenas se defendeu de uma agressão, a qual não foi provocada por si, nem para ela contribuiu, como reconhece o acórdão recorrido ao concluir que "o arguido foi arrastado para o sucedido pela própria vítima". 16. Face aos factos dados como provados o tribunal "a quo" deveria ter concluído que o recorrente agiu em legítima defesa - artigo 32 do Código Penal de 95. 17. A legítima defesa é uma causa de exclusão de ilicitude - artigo 31 do Código Penal de 95 - pelo que a douta sentença recorrida deveria ter concluído pela absolvição do recorrente, nos termos dos artigos 31 e 32, ambos do Código Penal de 95. 18. Ao assim não fazer, o douto acórdão recorrido, fez erróneo enquadramento jurídico da matéria de facto dada como provada. 19. Os factos dados como provados não integram o crime previsto e punido pelos artigos 131, 22, 23 n. 2 e 73 do Código Penal, pelo que estes preceitos não são aplicáveis ao caso concreto. 20. O acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 31 e 32 do Código Penal de 95. 21. Mas...

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