Acórdão nº 0111138 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Abril de 2002

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MARCOLINO
Data da Resolução10 de Abril de 2002
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto Nos autos de processo comum singular n.º ../.., do -º Juízo, -ª Secção, do Tribunal Judicial de....., mediante acusação do M.º P.º, foi o arguido Manuel....., nascido a 25.03.1951, na freguesia de....., ....., filho de José..... e de Glória....., casado, residente na Rua....., ....., julgado pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência grosseira previsto e punido pelo artº 137º n.º 1 e 2 do Código Penal, em concurso efectivo com um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, previsto e punido pelo artº 291º nº 1 a) e b) e de uma contra-ordenação prevista e punida, à data da prática dos factos, pelos artº 38º e 148º alínea j) do CE, e actualmente pelos artº 38º e 146º alínea j) do Código da Estrada e 69º do CP.

A final foi proferida sentença, que assim decidiu: 1. Condenou o arguido, pela prática de um crime condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo artº 291 nº 2 do C.P., na pena de dois meses de prisão; 2. Condenou-o, pela prática de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo artº 137 nº 2 do C.P. na pena de onze meses de prisão.

  1. Em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de 1 ano de prisão.

  2. A execução da pena de prisão foi-lhe declarada pelo período de dois anos.

  3. Foi ainda o arguido condenado na sanção acessória de inibição de conduzir por seis meses.

  4. Conquanto não conste da parte decisória da sentença, a Sra. Juiz considerou amnistiada a contra ordenação, face ao disposto na Lei 29/99, de 12 de Maio.

    *Inconformado com o assim decidido, o M.º P.º interpôs recurso, tendo extraído da sua motivação as seguintes conclusões: 1. Ao arguido foi nestes autos aplicada a pena unitária de 1 ano de prisão, cuja execução logo se declarou suspensa pelo período de 2 anos, pela prática, em concurso efectivo, de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário tipificado no art.º 291º, n.º 2 do C. Penal e de um crime de homicídio por negligência grosseira tipificado no art.º 137º, n.º 1 e 2 do mesmo diploma legal (ilícitos a que corresponderam, respectivamente, as penas parcelares de 2 meses e 11 meses de prisão); 2. Sucede que verificando-se, no caso, uma relação de subsidiariedade entre as normas punitivas em questão (sendo, portanto, o concurso entre ambos os crimes meramente aparente), a punição do arguido deveria ter sido feita apenas com recurso à que prevê o crime de homicídio por negligência, cuja prevalência radica na circunstância de a especificação dominante ser aqui a negligência grosseira; 3. Diversamente do que sucederia se se estivesse perante a prática de factos subsumíveis também seja ao crime de homicídio por negligência simples, seja ao de ofensa à integridade física por negligência, em que prevaleceria então o crime de condução perigosa de veículo rodoviário, por via da maior especificidade da respectiva previsão típica, com a agravação da respectiva moldura penal abstracta, decorrente da remissão operada pelo art.º 294º para o art.º 285º do C. Penal; 4. Na douta sentença recorrida consta, por outra parte, como matéria fáctica provada, para além do nexo causal entre a conduta do arguido e a morte do ofendido, que o acidente em questão ficou a dever-se à circunstância daquele (arguido) ter efectuado uma manobra de ultrapassagem a uma viatura pesada em local sem qualquer visibilidade relativamente ao trânsito que circulava em sentido contrário; que estava ali marcada na via uma linha longitudinal contínua proibindo a realização de tal tipo de manobra e, bem assim, existia sinalização vertical com o mesmo significado; que sabia ser proibida tal manobra; que para a efectuar violou aquela linha longitudinal contínua, passando a ocupar a via de trânsito contrária; que foi nela que embateu frontalmente no ciclomotor do ofendido, que por ali transitava regularmente; e que (o arguido) conduzia embriagado, apresentando uma TAS (taxa de álcool no sangue) de 1,76 g/l, resultante de bebidas alcoólicas que voluntariamente havia ingerido antes de iniciar a condução; 5. Tendo ficado assente também que agiu de forma voluntária, livre e consciente, podendo e devendo ter actuado de outra forma, não ultrapassando no local onde o fez; 6. Não foram, por outro lado, apuradas quaisquer circunstâncias anteriores ou posteriores ao facto, passíveis de favorecer o arguido, seja em sede de ilicitude do facto, seja em sede de culpa; 7. Atendendo ao limite máximo da moldura penal abstracta cominada no tipo de crime de homicídio por negligência grosseira que a apurada conduta do arguido efectivamente integra - pena de prisão até 5 anos -, ao grau da ilicitude do facto, à manifestada culpa daquele e às muitíssimo prementes exigências de prevenção sentidas no caso, a pena adequada a aplicar àquele, em função e em observância dos critérios estabelecidos no art.º 70º e 71º, n.º 1 do C. Penal, deve ser a de prisão efectiva em medida não inferior a 2 anos; 8. Não se justificando o recurso à suspensão da execução de tal pena, dado não se verificar o pressuposto material da sua aplicação, a saber, o poder concluir-se, atenta a personalidade e as circunstâncias do facto, por um prognóstico favorável relativamente ao arguido, no sentido de que a simples censura do facto e a ameaça da pena realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. art.º 50º, n.º 1 do C. Penal); 9. Por outro lado, integrando a matéria de facto apurada a prática pelo arguido das contra ordenações estradais por que vinha acusado, tipificadas, à data, nos art.ºs 38º, n.º 1, 2, alínea a) e 4 do Código da Estrada e 6º, n.ºs 3, alínea a) e 17º do Regulamento do Código da Estrada aprovado pelo Decreto n.º 39987, de 22/12/54, deveria ter sido aquele correspondentemente punido por tais infracções, dado encontrarem-se as mesmas em situação de concurso efectivo com o praticado crime de homicídio por negligência e não se verificar relativamente a tal matéria nenhuma causa extintiva da responsabilidade do respectivo agente; 10. Assim, ao considerar existir "in casu" um concurso efectivo ou verdadeiro dos crimes tipificados nos arts 137º, n.º 2 e 291º, n.º 2 do C. Penal e imputados ao arguido na acusação (em vez de concluir pela existência de simples concurso de normas), efectuou a M.ª Juíza recorrida errónea interpretação das respectivas previsões normativas; 11. Ao determinar, a final, ao arguido uma pena de 1 ano de prisão cuja execução se suspendeu por 2 anos, violou o disposto nos art.ºs 50º, n.º 1, 70º e 71º, n.ºs 1 e 2 do C. Penal; 12. E ao não sancionar o arguido pela prática das contra ordenações estradais por que vinha acusado e que os factos dados como assentes também integram, violou os preceitos legais que, respectivamente, as prevêem e mandam punir, ou seja, os supra referidos arts 38º, n.ºs 1, 2, alínea a) e 4 do Código da Estrada e 6º, n.ºs 3, alínea a) e 17º do respectivo Regulamento; 13. Neste entendimento, deverá a douta sentença recorrida ser revogada, na parte ora posta em crise, e substituída por outra que condene o arguido apenas pela prática de um crime de homicídio por negligência grosseira em pena de prisão efectiva não inferior a 2 anos e, bem assim, o sancione pelas também cometidas infracções estradais, aplicando-lhe as coimas correspondentes.

    *Respondeu o arguido, com as seguintes conclusões: 1. Salvo o mais elevado respeito, pensamos que a M.ª Juiz a quo fez uma correcta e sábia apreciação e ponderação dos factos sub judice, 2. E decidiu pela aplicação de uma pena ao arguido que se revela justa e adequada aos fins que lhe são subjacentes, 3. Nunca postergando, em momento algum o Homem, a pessoa do arguido, tal como é, a sua personalidade, a sua postura, o seu juízo de auto - censura, o erro grave e a tragédia que lhe é consequente, 4. Tanto na escolha da punição, a pena de prisão, como na medida da pena, em função da culpa e das exigências de prevenção.

  5. Com a sua conduta, postura e desabafos sentidos, o arguido revelou auto censura, juízo crítico de si mesmo, reconhecimento e consciência do erro que...

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