Acórdão nº 0322444 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Junho de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAMÕES
Data da Resolução17 de Junho de 2003
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B....., L.da, com sede na Rua....., ....., instaurou, no Tribunal Judicial da Comarca do....., depois distribuída à -ª Vara Cível, acção com processo sumário contra Maria...., com última residência conhecida no Bairro....., ..... e Manuel....., residente na Estrada....., ....., pedindo que os réus sejam, solidariamente, condenados a pagar-lhe: a) a quantia de 660.000$00 relativa às rendas vencidas e não pagas, referentes aos meses de Dezembro de 1998 a Julho de 1999; b) a quantia de 330.000$00 relativa à indemnização prevista no art.º 1041º do Código Civil; c) a quantia de 26.000$00 relativa a despesas, nos termos do contrato firmado; d) e as rendas que se vencerem na pendência da acção.

Para tanto, alegou, em resumo, que: Deu de subarrendamento à ré, para habitação desta, um T2 duplex do prédio urbano sito na Rua....., ....., inscrito na respectiva matriz sob o artigo 962, por contrato entre eles celebrado para vigorar após o dia 1 de Setembro de 1998, pelo prazo de um ano, renovável por iguais períodos, mediante a renda anual de 990.000$00, paga em duodécimos de 82.500$00, tendo o réu ficado de fiador daquela.

Acordaram, ainda, que a ré pagaria as despesas de condomínio e saneamento, bem como a luz, água e gás que consumisse.

Os réus não pagaram as rendas e as despesas supra referidas.

Apenas contestou o réu dizendo, em síntese, que não foi estipulado que a ré pagaria as despesas de condomínio; em Novembro de 1998, a ré entregou o arrendado à autora, que o aceitou, exonerando-a do pagamento das rendas e das despesas; não existe licença de utilização por causa imputável à autora, pelo que pretende resolver tal contrato; a pretensão da autora é ilícita por não existir aquela licença e o prédio não ter condições de habitabilidade, o que também permite recusar o pagamento das rendas; a autora, ao não resolver o contrato, abusa do seu direito e age de má fé. Concluiu pela improcedência da acção.

Citada editalmente, a ré não contestou, assim como também não apresentou qualquer contestação o Digno Magistrado do Ministério Público, apesar de citado para tanto, enquanto representante daquela ausente.

Na resposta, a autora impugnou a matéria das excepções concluindo pela sua improcedência.

Foi proferido despacho saneador, sem condensação dos factos.

Prosseguiram os autos para julgamento, ao qual se procedeu com gravação da prova produzida em audiência, a requerimento do réu, tendo a matéria de facto sido decidida pela forma constante do despacho de fls. 130 e 131, que não mereceu reparo das partes.

Seguiu-se douta sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu condenar, solidariamente, os réus a pagarem à autora a quantia de 660.000$00 ou € 3292,07, relativa às rendas vencidas e não pagas referentes aos meses de Dezembro de 1998 a Julho de 1999, bem como a quantia de 330.000$00 ou € 1646,03 relativa à indemnização prevista no art.º 1041º do C. Civil e as rendas que se venceram na pendência da acção, absolvendo-os do resto do pedido.

Inconformado com o assim decidido, o réu interpôs recurso para este Tribunal, o qual foi admitido como de apelação e com efeito meramente devolutivo.

E alegou, oportunamente, finalizando com as seguintes conclusões: 1. A autora, ora apelada, no tocante ao contrato de arrendamento sub judice, violou o disposto na alínea c) do n.º 2 do art.º 8º e n.ºs 1 e 2 do art.º 9º do RAU.

  1. Pelo que a arrendatária (1ª ré) pode exercer o direito à resolução do contrato - n.º 6 do art.º 9º do RAU.

  2. Na sua contestação, o réu/fiador, ora apelante, exerceu o direito à resolução de tal contrato, ao abrigo do art.º 637º do C. Civil, declarando-o resolvido com base no art.º 9º, n.º 6 do RAU, do que resulta que a autora não tem direito a haver rendas, indemnizações, despesas e tudo o mais que peticiona.

  3. Ao assim não entender, e ao não declarar resolvido tal contrato de arrendamento com todas as legais consequências (designadamente, a de a autora não ter direito a haver o que peticiona), a douta sentença recorrida fez errada interpretação e violou o disposto no art.º 637º, n.º 1 do C. Civil e art.ºs 8º, n.º 2, al. c) e 9º, n.ºs 1, 2 e 6 do RAU.

  4. Sem conceder, verificou-se a ilicitude do contrato de arrendamento por violação do disposto nos n.ºs 1 a 3 do art.º 9º do RAU, pelo que é ilícito tal contrato e ilícita a pretensão que a autora nele funda de obter o pagamento das rendas, indemnização, despesas e do mais que peticiona e ao assim não decidir a douta sentença violou o disposto nos n.ºs 1 a 3 do art.º 9º do RAU e no art.º 280ºdo C. Civil.

  5. A douta sentença, ao não julgar procedente - como se impunha - a invocada excepção de não cumprimento do contrato para efeitos de a 1ª ré recusar o pagamento das rendas, indemnização, despesas e do mais peticionado enquanto a autora não efectuar a prestação que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo (pois que a autora não cumpriu relativamente ao arrendado as obrigações enunciadas nos n.ºs 1 a 3 do art.º 9º do RAU) violou o disposto no art.º 9º, n.ºs 1 a 3 do RAU e nos art.ºs 428º e segs. e 637º, n.º 1 do C. Civil.

  6. Ao não considerar que a autora incorreu no invocado abuso de direito, a douta sentença recorrida violou o disposto nos art.ºs 334º, 227º, n.º 1 e 762º, n.º 2 do C. Civil.

  7. Os réus não podiam ter sido - como foram - condenados no pagamento das rendas vencidas na pendência da acção, porquanto a presente acção não é de despejo, não lhe sendo aplicável o disposto nos art.ºs 58º, n.º 1 do RAU e 472º do CPC.

  8. Acresce que não vindo dado como provado o não pagamento das rendas vencidas na pendência da acção, a condenação no pagamento dessas rendas acarreta a nulidade prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 668º do CPC, que aqui se argui e deve ser julgada verificada com todas as demais legais consequências.

    Contra alegou a apelada pugnando pela manutenção da sentença impugnada.

    Sabido que o objecto do presente recurso está delimitado pelas conclusões do apelante, conforme resulta do disposto nos art.ºs 684º, n.º 3 e 690º, n.º 1, ambos do CPC, as questões a decidir consiste em saber: - se a sentença é nula por oposição entre os fundamentos e a decisão; - se o réu/apelante, enquanto fiador, pode resolver o contrato celebrado entre a ré e a autora, com fundamento na falta de licença de utilização do locado; - se o mesmo contrato é nulo por faltar a referida licença; - se pode ser recusado o pagamento das rendas e da indemnização com base na excepção de não cumprimento do contrato pela autora, devido à falta da aludida licença; - se existe abuso de direito por parte da autora ao exigir o pagamento das rendas e da indemnização e não resolver o respectivo contrato; - e se os réus não podiam ter sido condenados no pagamento das rendas vencidas na pendência da acção.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir: II. Fundamentação 1. De facto.

    Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos:

    1. Por contrato celebrado entre a autora e os réus e para vigorar após 1 de Setembro de 1998 pelo período de um ano, renovável, a autora deu de subarrendamento à 1ª ré um T2 duplex com diverso mobiliário, devidamente individualizado com o n.º 9, no prédio urbano sito na Rua....., da cidade do....., descrito na CRP sob o n.º 1046 e inscrito na matriz sob o art.º 962.

    2. Acordaram ainda que a renda anual seria de 990.000$00, pagável em duodécimos de 82.500$00, cada um, vencíveis no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que respeitasse.

    3. Mais acordaram que a ré pagaria as despesas de saneamento, luz, água e gás que consumisse.

    4. O local arrendado destinava-se à habitação da 1ª ré.

    5. O 2º réu obrigou-se para com a autora na qualidade de fiador.

    6. A ré, que logo passou a ocupar o prédio, mesmo depois de notificada por carta pela autora para o efeito, ainda não liquidou as rendas referentes aos meses de Dezembro de 1998 a Julho de 1999 na quantia de 660.000$00, nem as despesas relativas ao mesmo período.

    7. A autora enviou ao 2º réu uma carta comunicando a falta de pagamento das rendas de Dezembro e Janeiro pela 1ª ré e solicitando-lhe tal pagamento.

    8. O aludido contrato não menciona a existência de licença de utilização, as partes não alegaram urgência na sua celebração e não houve substituição de tal licença por documento comprovativo da mesma ter sido requerida.

    9. O referido prédio não tem licença de utilização.

    10. O prédio foi inscrito na respectiva matriz sob o art.º 962, antes de 1951.

      Atento o teor do documento de fls. 7 e 8 que titula o aludido contrato e que não foi impugnado, consideram-se provados mais os seguintes factos: K) O contrato referenciado em A) foi celebrado no dia 31 de Agosto de 1998.

    11. O mesmo é renovável por períodos de um ano enquanto não for denunciado pela ré com a antecedência...

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