Acórdão nº 0354886 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelMARQUES PEREIRA
Data da Resolução15 de Março de 2004
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: No Tribunal de Comércio de ..............., B............. intentou acção declarativa, com processo ordinário, contra C................, D................ e E..............., pedindo que: a)Seja declarada nula a deliberação do Conselho de Administração da 1.ª Ré, de 11 de Junho de 2001, b)Seja declarada nula a deliberação da Comissão de Vencimentos da 1.º Ré, de 26 e Junho 2001; c)Sejam os 2.º e 3.º Réus condenados a pagar, solidariamente, ao Autor, a quantia de 10.000.000$00, de indemnização por danos morais, bem como a importância em dinheiro correspondente a 535.000$00 por mês até que, no âmbito da providência cautelar de suspensão da deliberação da Comissão de Vencimentos, venha esta, efectivamente, a ser suspensa, ou se não o vier a ser, até ao trânsito em julgado da decisão desta acção que declare nulas as deliberações em causa, a título de danos patrimoniais.

Contestaram os Réus, concluindo pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

Replicou o Autor, concluindo como na petição inicial.

Frustrada a tentativa de conciliação e dispensada a audiência preliminar, o Senhor Juiz proferiu, imediatamente, decisão sobre o mérito da causa, concluindo assim: "Nos termos vistos e face ao exposto, julgo procedente a excepção invocada e, em consequência, absolvo os RR da instância no que tange às deliberações tomadas pelo Conselho de Administração da 1.ª Ré de 11 de Junho de 2001 e à deliberação da Comissão de Vencimentos da 1.ª Ré de 26 de Junho de 2001, ficando prejudicada a apreciação dos restantes pedidos, atenta a relação de dependência existente entre os pedidos, nos termos do disposto nos arts. 493, n.º 2 e 494, al. a) do CPC.

Custas a cargo do A (art. 446, n.º 1 do CPC)".

Inconformado, o Autor interpôs recurso de agravo para esta Relação, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1.É admissível a impugnação judicial directa das deliberações do conselho de administração nulas ou anuláveis.

  1. Sindicabilidade judicial que não é vedada pelo art. 412 do CSC.

  2. O art. 411 do CSC é aplicável, por manifesta analogia, às deliberações dos demais órgãos sociais que não a assembleia geral e, por isso, à concreta deliberação da Comissão de Vencimentos de 26 de Junho de 2001.

  3. Deliberação de que se pode recorrer, também, directamente, para os tribunais apesar da letra do art. 412 do CSC.

  4. É inconstitucional a interpretação ou dimensão da norma do art. 412 do CSC, perfilhada pelo Senhor Juiz, no sentido de que está vedada a impugnação judicial directa das deliberações do conselho de administração nulas ou anuláveis, por violar o direito de acesso aos tribunais garantido no art. 20, n.º 1 da CRP.

  5. Juízo de inconstitucionalidade extensível à interpretação perfilhada pelo Senhor Juiz da insindicabilidade directa da deliberação da Comissão de Vencimentos, dada a aplicação analógica dos arts. 411 e 412 do CSC a essa deliberações sociais.

  6. A decisão recorrida violou os arts. 411 e 412 do CSC e o art. 20, n.º 1 da CRP.

    Pediu que, revogando-se a decisão recorrida, seja seleccionada a matéria de facto com vista à decisão, a final, do mérito da causa.

    Os Réus contra-alegaram, rebatendo os fundamentos do recurso, concluindo pela sua improcedência. Subsidiariamente, ao abrigo do disposto no art. 684-A, n.º 1 do CPC, pediram que, procedendo os argumentos apresentados na contestação nos arts. 40 a 70 (a irrelevância jurídica da deliberação de "distribuição de pelouros"), arts. 80 a 92 (falta de interesse em agir), 93 a 99 (inviabilidade manifesta do pedido) e arts. 10 a 146 (plena legalidade da deliberação de fixação de vencimentos), sejam absolvidos os RR dos pedidos formulados na petição inicial.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    Estão dados como assentes os seguintes factos: 1.A 1.ª Ré, C..............., é uma sociedade comercial anónima, constituída por escritura de 12 de Abril de 1968, matriculada na Conservatória do Registo Predial do ............ sob o n.º ....., com capital social de 1.000.000.000$00, tendo por objecto a promoção de empreendimentos industriais ou comerciais, o estudo e a execução dos respectivos projectos, a eventual participação nas sociedades que se proponham realizá-los e ainda a prestação de serviços de assistência técnica, administrativa e financeira a empresas industriais e comerciais e que se encontra subordinada às demais cláusulas do seu contrato social.

  7. O A é accionista da identificada sociedade, desde 21 de Setembro de 1988, sendo o único titular de acções de categoria C.

  8. No dia 24 de Maio de 2001, realizou-se a assembleia geral anual da 1.ª Ré que, além da ordem de trabalhos obrigatória, incluía a eleição dos órgãos sociais para o quadriénio de 2001-2004, entre os quais, o Conselho de Administração e a Comissão de Vencimentos, constituída pelas mesmas pessoas, a saber, o Sr. Dr. D.............., o requerente, e o Sr. Dr. E...............

  9. No dia 11 de Junho de 2001, teve lugar a primeira reunião do Conselho de Administração.

    Neste foi deliberada a distribuição de pelouros pelos membros do Conselho de Administração, mediante proposta do Sr. Presidente, Dr. D.............., a este sendo atribuídos os das áreas administrativa e financeira e de recursos humanos e jurídica, e ao Sr. Dr. E................. o a da área comercial.

    Ao requerente foi distribuído o da área de manutenção da sede social.

  10. A Comissão de Vencimentos reuniu em 26 de Junho de 2001, revogando pela primeira vez, em trinta anos de existência, anterior e vigente deliberação do mesmo órgão social e fixando os vencimentos de todos os membros na quantia de 120.000$00.

    O Direito: Delimitado o recurso pelas conclusões extraídas pelo recorrente das respectivas alegações (arts. 684, n.º 3 e 690, n.º 1 do CPC), a questão fundamental que nele se coloca _ a que, na sentença recorrida, se respondeu pela negativa _ é a da impugnabilidade judicial das deliberações do Conselho de Administração e da Comissão de Vencimentos da sociedade anónima.

    De fora, ficou o problema _ cuja apreciação, na decisão recorrida, se considerou prejudicada _ da responsabilidade dos 2.º e 3.º Réus para com o Autor pelos danos que directamente teriam causado a este, no exercício das suas funções de administradores (cfr. Art. 79 do CSC) _ não considerado entre os fundamentos do recurso indicados nas alegações do recorrente.

    Centremo-nos, separadamente, sobre cada uma das deliberações em causa.

    I _ Deliberação do Conselho de Administração da sociedade Ré, de 11 de Junho de 2001, pela qual foi feita a distribuição de tarefas entre os seus membros, tendo sido encarregado especialmente o Autor da "área de manutenção da sede social": Vemos que se trata de uma deliberação tomada pelo conselho de administração, ao abrigo do art. 407, n.º 1 do CSC, nos termos do qual, "A não ser que o contrato de sociedade o proíba, pode o conselho encarregar especialmente algum ou alguns administradores de se ocuparem de certas matérias de administração".

    Especificando o n.º 2 do mesmo artigo que "O encargo especial referido no número anterior não pode abranger as matérias previstas nas alíneas a) a m) do artigo 406 e não exclui a...

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