Acórdão nº 0433052 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Junho de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução17 de Junho de 2004
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto I . RELATÓRIO No .....º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Oliveira de Azeméis, A............................. instaurou acção declarativa de condenação sob a forma de processo sumário contra B...................... & Filhos, Ldª e C................, Ldª .

Pede: a declaração de ineficácia das alienações pela 1ª Ré à 2ª Ré do veículo automóvel de mercadorias «Mitsubishi» matrícula VB - ... - ... e do estabelecimento comercial da 1ª Ré sito na Rua do U............, nº ...., Oliveira de Azeméis, e seja ordenada a restituição, material e jurídica, dos bens alienados ao património da alienante, a 1ª Ré.

Alega, em síntese: Que é credora da 1ª Ré da importância de esc. 2.000.000$00 .

Uma vez que a aludida quantia não foi paga à Autora, esta moveu a competente execução para pagamento da quantia em causa.

Na dita execução, a 1ª Ré nomeou habilidosamente à penhora o «Estabelecimento Comercial» sito na Rua S............, sendo que, esse estabelecimento não era mais do que um pequeno local destinado a armazenamento de mercadorias e integrante do verdadeiro estabelecimento comercial que possuía na Rua do U.......

A Autora opôs-se a essa nomeação e nomeou, por sua vez, o veículo e o estabelecimento acima identificados e quaisquer contas bancárias ou créditos.

Nesse seguimento, veio a apurar-se que existia apenas uma conta bancária no montante de esc. 29.451$00 e que o veículo e o estabelecimento comercial haviam sido transferidos, em 27/08/1999 e 08/11/1999, para a 2ª Ré.

Acresce, ainda, o facto dos sócios-gerentes de ambas as Rés serem os mesmos.

Nesta medida, a 1ª Ré, salvo o depósito bancário, desfez-se de todo o seu património, sendo do seu conhecimento que impossibilitava o pagamento da dívida à Autora, e bem assim, era do conhecimento da 2ª Ré qual era o montante em dívida à Autora e que as alienações da 1ª Ré à 2ª Ré causavam prejuízo à Autora em virtude da inexistência de património da 1ª Ré, após as alienações.

Citadas as Rés, deduziram contestação a fls. 32 e ss., defendendo-se por excepção peremptória impeditiva e por mera impugnação directa.

Seguidamente, procedeu-se à elaboração de despacho saneador e à selecção da matéria de facto.

Teve lugar a audiência final, com observância do formalismo legal, tendo, de seguida, o tribunal respondido à matéria de facto da base instrutória.

Por fim, foi proferida seguinte sentença: "Pelo exposto, julgo a presente acção procedente por provada, e consequentemente, decido: - declarar a ineficácia das alienações do veículo automóvel de mercadorias «Mitsubishi» matrícula VB-...-... e do estabelecimento comercial da 1ª Ré sito na Rua do U........, nº ..., Oliveira de Azeméis realizadas pela 1ª Ré á 2ª Ré, e - ordenar a restituição, material e jurídica do veículo automóvel de mercadorias «Mitsubishi» matrícula VB-...-... e do estabelecimento comercial da 1ª Ré sito na Rua do ......., nº ...., Oliveira de Azeméis ao património da 1ª Ré." Inconformadas com esta sentença, as rés interpuseram recurso de apelação, apresentando alegações que terminam com as seguintes "CONCLUSÕES: I. Na decisão recorrida existe, quanto à matéria de facto, erro notório na apreciação da prova, designadamente da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, assentando ainda a resposta positiva aos quesitos essenciais em meras presunções.

  1. Quanto à matéria de direito, foi incorrectamente julgada a excepção peremptória invocada pelas rés determinante da absolvição do pedido (quanto ao valor, à data da execução (1999) do trespasse do imóvel em causa, atenta a sua dimensão e localização) e foi feita uma incorrecta interpretação dos normativos constantes dos artigos 610º e ss. do Código Civil, atinentes à figura jurídica da impugnação pauliana, nomeadamente quanto à sua natureza e fundamentalmente quanto aos seus efeitos - artº 616º CC.

  2. Nos actos onerosos é requisito especial da impugnação pauliana a existência de má fé psicológica por parte do devedor e por parte do terceiro, a favor de quem foi praticado o acto impugnado (artº 612.CC), ou seja exige-se que "os intervenientes no acto impugnado estejam moralmente convencidos de que esse acto vai causar prejuízo ao credor" IV. Não foi feita prova que criasse uma situação de mínimo de certeza tal que, mesmo em termos de extracção da correspondente presunção judiciária, permitisse dar resposta afirmativa aos quesitos 5, 7 e 8, atinentes ao predito requisito indispensável da "má fé", revelando-se ainda a incapacidade probatória, só por si, dos elementos disponíveis nos autos.

  3. Nenhum elemento positivo e concreto decorrente dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, nem qualquer outro meio probatório aponta para a "consciência por parte das rés do prejuízo que o acto causa ao credor", faltando, por conseguinte essa prova da ideia de "fraude", da "convicção de a conduta não ser recta,"associada à má-fé (612º do CC) - veja-se os depoimentos das testemunhas D.............. e E................., que nada disseram quanto à alegada consciência por parte das rés do prejuízo que o acto causa ao credor", não obstante estarem indicados aos quesitos que continham tal alegação - 4º e 8º VI. A acta da audiência de julgamento de fls. 201 e 202 dos autos contém dois manifestos erros no que concerte à indicação dos quesitos a que responderam as testemunhas D...................... e E.................., porquanto a primeira testemunha não respondeu a toda a matéria, mas apenas aos quesitos 1º a 5º, 9º e 10º e o segundo foi indicado aos quesitos 6º, 7º, 8º e 11º e não a toda a matéria, o que pode aferir-se da gravação.

  4. A resposta dada à matéria constante do quesito 3, não encontra também qualquer suporte nos depoimentos prestados em audiência, sendo ademais óbvia a contradição entre o que se perguntava no quesito - "o legal representante da Ré afirmava para quem o quisesse ouvir que a Autora jamais recebera" um tostão que fosse" e a fundamentação dada pelo MM. Juiz - a testemunha D......... é "vizinha da Autora, há largos anos, a qual ouviu o sócio gerente de ambas as rés avisar a Autora de que ela Não receberia nada", pelo que o depoimento da referida testemunha não poderia sequer ser valorado no sentido que resulta da transcrita fundamentação.

  5. A impugnação pauliana é uma acção pessoal, porque os seus efeitos se medem pelo interesse do credor e só a este aproveitam; julgada procedente, o acto impugnado mantém-se válido, sendo sacrificado apenas na medida do interesse do credor impugnante, ou seja, até à satisfação total do seu crédito.

  6. O credor impugnante (autora) não pode pedir a restituição material e jurídica dos bens alienados para o património do devedor (1ª ré), pois tal pedido implicaria a nulidade ou a anulação das alienações (cfr. artº 289º CC), e a satisfação de tal pedido, decorrente da sentença recorrida, implicaria condenação em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, violando o princípio do dispositivo por condenação ultra petitum ou extra petitum.

  7. Assim não se entendendo, na douta decisão de facto e na douta decisão de direito, violou-se o estabelecido nas citadas disposições legais.

    Termos em que e melhores de direito pedem seja dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida".

    A apelada contra-alegou, concluindo pela manutenção da sentença recorrida, com a consequente improcedência da apelação.

    Foram colhidos os vistos legais.

    Cumpre apreciar e decidir.

  8. FUNDAMENTAÇÃO: II.1. AS QUESTÕES: Tendo presente que: --O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil); -- Nos recursos se apreciam questões e não razões; -- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões propostas para resolução são as seguintes: 1ª- Impugnação da matéria de facto: erro na apreciação da prova, em especial no que concerne aos quesitos 3º, 5º, 7º e 8; 2ª- Erro no julgamento da excepção peremptória suscitada na matéria contida no quesito 11, atento o errado julgamento de tal matéria; 3ª- Incorrecta interpretação dos arts. 610º e segs., atinentes à impugnação pauliana, nomeadamente quanto à sua natureza e aos seus efeitos, pois o credor (autora) não pode pedir a restituição material e jurídica dos bens alienados para o património do devedor, já que tal pedido implicaria a nulidade ou anulação das alienações e a sua satisfação acarretava a condenação em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

  9. 2. OS FACTOS: 1 - Em 2/11/1998, a Autora intentou contra a 1ª Ré acção com processo ordinário nº 538/98 com fundamento em despedimento ilegítimo no Tribunal de Trabalho de Oliveira de Azeméis...

    2 - ... peticionando a Autora a quantia de esc. 3.344.207$00.

    3 - No aludido processo, teve lugar, em 19/05/1999 uma tentativa de conciliação onde as partes acordaram que a Autora reduziria o seu pedido para a quantia de esc. 2.000.000$00, que a 1Ç Ré aceitava pagar a mesma em 11 prestações, vencendo - se a primeira, no valor de esc. 500.000$00, em 31/07/1999 e as demais no montante de esc. 150.000$00 cada uma, no último dia de cada um dos meses subsequente ...

    4 - ... tendo o acordo sido homologado pelo Meritíssimo Juiz.

    5 - No termo da diligência a 1ª Ré através do seu legal representante emitiu com data de 31/07/1999 e duma conta a ela pertencente o cheque nº 1226544305, sacado sobre o Banco Portugal do Atlântico, no montante de esc. 500.000$00 á ordem da Autora ... 6 - ... destinado ao pagamento da primeira das prestações acordadas ...

    7 - ... tendo dele constituído depositário o seu ilustre mandatário...

    8 - ... que em tempo útil o faria chegar à Autora através do ilustre mandatário desta.

    9 - Face ao não pagamento da 1ª prestação a Autora considerou vencidas...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT