Acórdão nº 0452848 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 31 de Maio de 2004
Magistrado Responsável | CAIMOTO JÁCOME |
Data da Resolução | 31 de Maio de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO RELATÓRIO B...................
, com os sinais dos autos, intentou a presente acção declarativa de condenação, na forma ordinária, contra C................., S.A.
, com sede no ..............., pedindo: A) se declare a anulação do contrato de compra e venda celebrado com a R. e relativo ao veículo de matricula ..-..-ER; B) a condenação da Ré a restituir-lhe a quantia de Esc. 2.600.000$00, que dele recebeu ; C) a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de Esc. 1.000.000$00 a título de danos não patrimoniais.
Alegou, em síntese, que comprou à ré um veículo Renault ............., de matrícula ..-..-ER, do ano de 1994, aí se deslocou e verificou o veículo, cujo conta-quilómetros marcava cerca de 43.000 Kms, pelo que o adquiriu pelo preço de Esc. 2.600.000$00, que pagou, sendo Esc. 900.000$00 através da entrega do seu anterior veículo. Na posse do veículo só mais tarde - em 30MAI98 - lhe foram entregues os documentos e bem assim o "livro de assistência", pôde constatar que, aquando da última revisão, que tinha tido lugar em Dezembro do ano anterior, o veículo tinha registado como percorridos cerca de 80.000 Kms. De imediato contactou a ré, a quem propôs a anulação do negócio, o que ela rejeitou, tendo um seu vendedor e um elemento da administração passado às ameaças e humilhação, pelo que apresentou queixa criminal, na sequência da qual foi proferida sentença que absolveu os aí arguidos. A alteração da quilometragem do veículo que adquiriu à R. foi efectuada nas instalações desta, quando o vendedor lhe garantiu que o veículo tinha percorrido os 43.434 quilómetros que o conta-quilómetros apresentava, o que foi decisivo para o ter adquirido até porque o seu anterior veículo tinha também cerca de 80.000 Kms e, por esse facto, decidira adquirir outro com menos quilometragem. Se soubesse da quilometragem real do veículo que veio a adquirir, que lhe foi ocultada, não o teria adquirido para além de que, tendo tomado todas as cautelas para negociar com uma firma credenciada e séria, e tendo sido por ela enganado de forma grosseira e dolosa, sentiu-se enganado e frustrado, o que o fez sofrer, tendo-se visto forçado a andar com um veículo que não queria, o que o traz permanentemente em sobressalto.
Citada, a ré contestou impugnando, em parte, o alegado pelo demandante. Referiu que o veículo que vendeu ao autor já acusava cerca de 85.000 Kms quando deu entrada nas suas instalações tendo sido com essa quilometragem que foi exposto para venda. O autor tem detido e utilizado o veículo percorrendo mais de 40.000 Kms. A existir nulidade do negócio, havia que reconstituir a situação inicial, a qual não é possível atenta a utilização do veículo efectuada pelo A., que sem causa enriqueceria à sua custa, sendo o valor actual do veículo de Esc. 930.000$00. Invocou, ainda, o abuso do direito e má fé processual na conduta do autor.
Houve réplica do demandante.
*** Saneado, condensado e instruído o processo, após julgamento, foi proferida sentença na qual se decidiu: "Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência, declarando a anulabilidade do contrato de compra e venda do veículo em causa nos autos, condeno a R. a restituir ao A. a quantia de 8.479,56 Euros (Esc. 1.700.000$00) bem como o veículo de matrícula AX-..-.. ou, caso a mesma não seja possível, o montante de 4.489,18 Euros (Esc. 900.000$00 que lhe foi atribuído), e a pagar-lhe a quantia de 498,80 Euros a título de danos não patrimoniais, devendo o A. restituir à R. o veículo Renault .............. de matrícula ..-..-ER.
Custas por A. e R. na proporção de (Um quarto) para o A. e de (Três quartos) para a R.".
*** Inconformada, a ré apelou, tendo, nas alegações, concluído: a) - O princípio da "reconstituição in natura" consagrado no artigo 562° do C.C., subjaz à ideia de "repristinação da situação" que decorre do artigo 289° do C.C., tanto que aqui, no n.° 2. se faz ressalva, num aspecto especial.
Outro entendimento feriria aquele normativo e o princípio da "comutatividade" dos negócios - um dos prevalentes na hierarquia axicológica, tal como definido pelo Prof. Varela, op. cit. acima - tal como se salientou no Ac. S.T.J. de 20.03.03 (Cons. Araújo de Barros), in C.J. tomo I, pág. 133.
a.l) - Provado que, reportado ao momento da celebração do negócio em causa, o veículo ..-..-ER valia 2.600.000$00, ou seja, cerca de 12.968,75 Euros, sendo que, no presente, depois de, ao longo de mais de 5 anos ter o A. com ele percorrido mais de 40.000 Kms, o mesmo vale 6.649 Euros - al. c) e quesitos 25° e 26, mesmo que fazendo apelo ao regime do artigo 566°, n.º 3 do C.C., e a juízo equitativo, teria a Ré direito a compensar o crédito do A. com o seu contra-crédito, em montante não inferior a 3.500 Euros, se tivesse que receber o veículo vendido (o que não ocorre no caso presente!!) e devolver a prestação pecuniária recebida e a viatura retomada.
Nesse sentido, "A obrigação de restituir, devida à anulação do negócio, funda-se nos princípios do enriquecimento sem causa e não na própria nulidade do contrato, sendo determinada de acordo com as regras fixadas nos artigos 479 e 480 do Código Civil." in Ac. STJ de 28/03/1995, relator PAIS DE SOUSA, ou ainda, "Quanto a deslocação patrimonial assenta sobre um negócio jurídico e este é nulo ou anulável, a própria declaração de nulidade ou anulação devolve ao património de cada uma das partes os bens com que a outra parte se poderia enriquecer", in Ac. STJ 25/02/1986, relator SENRA MALGUEIRO.
a.2) - É que, repristinada a situação é como se "destinação jurídica" do bem se mantivesse na esfera do transmitente, razão para que esse "aproveitamento" deva ser tutelado, quer para o adquirente - artigo 479°, n.º 1 -, quer para o alienante - cfr. 289, n.º 2 e 3, 1273° e 1274° do C.C.
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- Atenta a resposta negativa ou limitativa aos quesitos 16, 17, 18 e 19, nada mais tendo provado que o "desagrado ", que não persistiu, nem teve efeitos psico-somáticos experimentado pelo A., não se verificam quaisquer "circunstâncias de tal gravidade, que a própria personalidade moral seja atingida, está preenchida a condição exigida pelo código e existe, portanto, dano...
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