Acórdão nº 0515178 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Fevereiro de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelINÁCIO MONTEIRO
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo comum com intervenção do tribunal singular n.º ..../98.9TAVFR, do ...º Juízo Criminal, do Tribunal Judicial da Comarca de Santa Maria da Feira***Acordam, em audiência, os juízes da 1.ª Secção Criminal, do Tribunal da Relação do Porto* No processo supra identificado, foram pronunciados B..... e C....., pela prática, como autores materiais, na forma consumada, cada um deles, de um crime de poluição, p. e p. pelo art. 280.º, n.º 1, al. a), conjugado com o art. 279.º, n.º 1, al. c), ambos do Código Penal.

O tribunal decidiu julgar o despacho de pronuncia improcedente e, em consequência absolveu os arguidos, com o fundamento de não constando dos autos qualquer cominação da administração pública quanto à prática dos crimes previstos nos artigos 279.º e 280.º do CP, ao arguido não pode ser imputado o ilícito penal típico pelo qual vem pronunciado, por falta de preenchimento daquele elemento objectivo típico de provocar ruído em medida inadmissível.

*Da sentença interpuseram recurso o Ministério Público e os assistentes D..... e esposa, na parte que absolveu o arguido B...... circunscrito à matéria de direito, sustentando que este arguido deve ser condenado como autor material do crime pelo qual vem pronunciado.

Conclusões da motivação do Ministério Público: 1- No crime de poluição com perigo comum, previsto e punido no art. 280.º do Código Penal, os bens jurídicos directamente tutelados com a incriminação são a vida, a integridade física de outrem ou bens patrimoniais alheios de valor elevado.

2- Assim, só de forma indirecta é protegido o bem jurídico ambiente, pelo que neste caso a tutela penal já não pode estar sujeita aqui ao princípio da oportunidade administrativa, ou seja, condicionada à ausência ou não de eventuais desobediências a normas ou ordens da administração.

3- Estamos, por isso, no caso do art. 280.º do Código Penal, perante um crime autónomo e não perante um crime qualificado relativamente ao crime de poluição, p. e p. no art. 279º do mesmo diploma.

4- Dessa forma, a remissão efectuada pelo art. 280.º para as condutas descritas no n.º 1 do art. 279.º do Código Penal é apenas para as alíneas aí previstas e não também para a exigência típica do elemento " medida inadmissível".

5- Encontra-se, pois, excluída da previsão típica do crime previsto no art. 280º do Código Penal o elemento da desobediência a normas ou ordens da administração.

6- O legislador ao efectuar a remissão no art. 280º do Código Penal para as condutas descritas no n.º l do art. 279.º do mesmo diploma e ao querer incluir, nessa remissão a exigência do elemento "medida inadmissível", então, deveria ter feito menção expressa ao n.º 3 do art. 279.º, o que claramente não aconteceu.

7 - Por outro lado e sendo o crime previsto no art. 280.º do Código Penal um crime de perigo comum, não é configurável com a sua natureza a componente de desobediência.

8- Pelo exposto, considerando que o crime previsto no art. 280.º do Código Penal é um crime autónomo e que, por isso, não faz parte da sua previsão normativa o elemento poluição em "medida inadmissível", deveria a M.ª Juíz a quo ter enquadrado jurídico- penalmente os factos dados como provados naquele crime e ter condenado o arguido B..... como seu autor.

9- Violou, por isso, a M.ª Juíz a quo, na D. sentença recorrida o disposto nos arts. 280.º e 279.º, n.º l, al. c), ambos do Código Penal.

Pelo exposto, deverá a D. sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que condene o arguido B..... pela prática do crime de poluição com perigo comum, previsto e punido no art. 280.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, com remissão para o art. 279.º, n.º 1, al c) do mesmo diploma.

*Conclusões da motivação dos assistentes: Primeira: Os factos provados são suficientes para condenar o arguido B..... .

Segunda: O arguido vinha pronunciado pela prática do crime de poluição com perigo comum, p. p. pelo art. 280º. CP., que tutela os bens jurídicos ligados à vida, à integridade física e os bens patrimoniais alheios de valor elevado. Trata-se de um crime autónomo e não um crime qualificado relativamente ao crime de poluição p. p. no art. 279.º CP, conforme foi entendido na sentença proferida.

Terceira: No art. 280.º apenas existe remissão para as condutas do n.º 1 do art. 279.º e não há existe a menor referência ao que dispõe o n.º 3, o que quer dizer que neste tipo de crime se encontra excluído o elemento da cominação prevista no n.º 3 do art. 279.º .

Quarta: O n.º 1 do art. 279.º CP estrutura o crime de poluição, sem haver o recurso ao n.º 3 para que tal crime exista.

Quinta: O n.º 3 do art. 279.º CP limita-se a esclarecer que sempre que se verifiquem as condições que ali se prevê se está perante «poluição em medida inadmissível».

Sexta: Além dos casos previstos no n.º 3 do art. 279.º CP, haverá poluição «em medida inadmissível» (conceito indeterminado) quando a situação de poluição é «grave».

Sétima: Tendo-se provado que o ruído propagado pela actividade da fábrica E...... atingiu os assistentes e sua família, por forma a afectar a sua saúde, e que tal ruído excedia largamente o máximo legalmente permitido, com conhecimento do arguido, estamos perante um caso de poluição grave em medida inadmissível, não sendo por isso de exigir qualquer advertência da autoridade administrativa.

Oitava: A decisão recorrida violou o disposto nos art. 279.º, n.º 1, al. c) e 280.º do Código Penal e Dec.-Lei 251/87, de 24 de Junho.

*O arguido B......, notificado da interposição do recurso, para os efeitos do art. 413.º, do Cód. Proc. Penal, na resposta defende a tese sustentada pela sentença recorrida de que a remição do art. 280.º, do CP para o n.º 1 do art. 279.º do CP contempla a poluição em medida inadmissível.

*Nesta Relação o Ex.mo Procurador-geral Adjunto subscreve integralmente a tese expandida na motivação de recurso do Ministério Público, não havendo deste modo lugar à notificação a que alude o art. 417, n.º 2, do CPP.

Colhidos os vistos legais e realizada a audiência, cumpre-nos decidir.

Vejamos pois a factualidade dos autos.

Factos provados 1. O arguido B...... é sócio-gerente e legal representante da empresa "F......, Lda." e da empresa "E....., Lda.", enquanto o arguido C..... é apenas sócio-gerente e legal representante da primeira.

  1. Estas empresas encontram-se sediadas no Lugar de ....., ...., Santa Maria da Feira, laborando há mais de 20 anos em espaços diferenciados, com instalações fabris próprias, embora num prédio - parque industrial - comum, servindo-se ambas, e pelo menos, da mesma entrada e de parte do logradouro.

  2. Contiguamente ao referido prédio vivem os ofendidos D......, G......, H....., I...... e o menor J...... .

  3. A empresa "E...

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