Acórdão nº 0524564 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Outubro de 2005

Magistrado ResponsávelALBERTO SOBRINHO
Data da Resolução25 de Outubro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B........., residente na Rua ...., nº ..., ..º ...º, ...., Matosinhos, intentou a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra C.........., residente na Praça ....., nº ...., ...º ....º ..., Matosinhos, pedindo que: a- seja declarada, por simulação, a nulidade da separação de pessoas e bens judicialmente decretada entre autor e ré e, consequentemente, declarados nulos todos os negócios ou actos jurídicos posteriores a essa separação; subsidiariamente b- seja declarada, por negócio em fraude à lei, a nulidade do contrato de compra e venda de determinadas fracções e, consequentemente, declarados nulos todos os negócios ou actos jurídicos posteriores relativos a essas fracções e a ré condenada a reconhecê-lo; cumulativamente com este pedido subsidiário c- seja a ré condenada a reconhecer o autor como dono e legítimo proprietário dos bens móveis e imóveis que identifica e condenada a entregar-lhos livres de quaisquer ónus e em bom estado de conservação ou, na sua falta, os respectivos valores, a serem liquidados em execução de sentença.

Em fundamento desta sua pretensão alega, sinteticamente, que nunca foi sua intenção e da ré separarem-se judicialmente de pessoas e bens e que apenas visavam, com esta medida, acautelar o seu património próprio e o comum do casal que ambos constituíam de eventuais credores. Tendo-se a ré posteriormente aproveitado desta situação para se arvorar em dona dos bens que também ficticiamente partilharam.

Contestou a ré para, no essencial, alegar que nunca teve vontade diferente daquela que manifestou ao longo de todo o percurso que culminou na separação judicial de pessoas e bens e em todos os actos posteriores. Além de que esta separação não pode ser atacada com base em simulação.

Termina pedindo a improcedência da acção e a condenação do autor como litigante de má fé.

Replicou o autor para tomar posição sobre os documentos juntos pela ré e pugnar, por sua vez, pela condenação da ré como litigante de má fé.

Saneado o processo e fixados os factos que se consideraram assentes e os controvertidos, teve lugar, por fim, a audiência de discussão e julgamento.

No decurso da audiência de julgamento, manifestou a ré a sua oposição à produção de prova testemunhal sobre os pontos controvertidos da base instrutória que versavam matéria atinente à simulação, por legalmente inadmissível.

Tendo visto esta sua pretensão indeferida, dela agravou a ré, recurso admitido com subida diferida, mas julgado deserto, já neste Tribunal da Relação, por falta de alegações.

Na sentença, subsequentemente proferida, foi a acção julgada parcialmente procedente e declarada a nulidade por simulação, das partilhas notarial e particular efectuadas, com as consequências legais ressalvando-se, no entanto, a ineficácia da nulidade em relação à transmissão a terceiros.

Inconformado com o assim decidido, recorreram ré e autor, defendendo aquela que não devem ser consideradas as respostas aos pontos controvertidos nºs 28 e 41 e, consequentemente, considerar-se não ter havido simulação; e defendendo este a procedência da acção.

Contra-alegaram os apelados em defesa da sentença na parte posta em crise pelos apelantes.

*** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

  1. Âmbito do recurso A- De acordo com as conclusões, a rematar as respectivas alegações, o inconformismo dos recorrentes radica no seguinte: Apelação da ré 1- O presente recurso refere-se apenas quanto à matéria dos nºs 28 e 41 aos factos considerados pelo Mmº Juiz a quo e à audição de testemunhas; 2- E quanto ao primeiro, sempre com toda a vénia, lembrar-se-á que, conforme ao artigo 369º do Código Civil, os documentos autênticos (trata-se de uma escritura) fazem prova plena dos factos que neles são atestados; 3- Perante o Notário, Apelante e Apelado disseram como queriam que fossem as coisas no futuro, estando desde logo, assim, afastada a ideia de simulação ou falsidade; 4- E salvaguardado sempre o devido respeito que é todo nenhuma prova se fez em tal sentido; 5- O que já faz algum é que, tendo-se Apelante e Apelado separado judicialmente de pessoas e bens em 19 de Outubro de 1995 e transformado em divórcio tal separação nos idos de 7 de Setembro de 1997, a presente acção tenha surgido em Juízo em 31 de Outubro de 2002; 6- Quando a Apelante, à custa de muito trabalho e força de vontade, estava a sair do atoleiro onde a fizeram cair as atitudes de Apelado; 7- Presentemente em más condições de ordem financeira, como ele próprio declara nos autos; 8- O documento da partilha dos bens móveis identificado no nº 41 dos factos provados refere-se a comuns do casal; 9- Fez parte da relação de bens que acompanhou o requerimento de Apelante e Apelado pedindo a decretação da separação judicial de pessoas e bens; 10- Tendo sido tudo controlado e decidido pelo Mmº Juiz a quo; 11- Foram tais bens que Apelante e Apelado partilharam, tendo por tal, como no documento se refere aquela pago a este 13.285.000$00; 12- Através de compensação pois, titulares conjuntamente de contas bancárias, o Apelado havia feito movimentos através dos quais se tornara devedor; 13- Não fora assim e a Apelante teria um prejuízo total, não obstante e, como é óbvio, com todo este tempo decorrido, muitos dos bens referidos se terem partido ou danificado; 14- O nº 2 do artigo 3:94º do Código Civil proíbe aos simuladores, quando sejam eles a invocar a simulação, a prova por testemunhas; 15- Ao contrário do que sucede com o "common law" que espera o litígio, resolve-o e espera o próximo litígio, o nosso sistema, codificado, prossegue como objectivo principal a certeza e a segurança do direito; 16- Tudo aponta, portanto, para que seja respeitado o texto do artigo 394º do Código Civil, já que, ladeando-o e não atendendo ao nele disposto, estar-se-á, em suma, a adulterar o seu comando jurídico; 17- Tal disposição legal com a mesma redacção constava da versão inicial do diploma, publicada no Decreto-Lei nº 47344, em 25 de Novembro de 1966; 18- Ao longo dos 38 anos que decorreram desde então até à presente data o referido artigo 394º tem-se mantido inalterável; 19- Por isso que deva ser aplicado já que no caso subjudice, o ora Apelado e Autor da acção se assume como simulador; 20- A não sê-lo, poderá dar-se azo à existência de um abuso de direito, consequente a um venire contra factum proprium; 21- A nota típica do abuso do direito reside na utilização do poder contido na estrutura do direito para a prossecução de um interesse ilegítimo; 22- Sendo "Velha" a questão de determinar se podem ou não ser arroladas testemunhas pêlos próprios simuladores, a maioria da Jurisprudência através dos seus doutos arestos afina pela negativa; 23- Que o objectivo da lei (artigo 394º do C.C.) é o de evitar que prevaleça a prova testemunhal ou por presunção judicial (artigo 351º do C.C.), meios probatórios de reconhecida falibilidade, sobre a prova documental; 24- Os documentos autênticos dos e nos autos provam exactamente que não houve simulação, sendo a declaração (Doc. nº 53 junto com a petição, assinada pelo filho de Apelante e Apelado), como ele próprio referiu, obtida sob coacção moral; 25- Devem, pois, cora todo o respeito, não serem consideradas as respostas dadas aos quesitos, à excepção das que resultaram de confissão.

    Apelação do autor 1- Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente improcedente o pedido principal e o pedido subsidiário referido em B-1 da petição inicial e prejudicado os pedidos subsidiários B2 e o pedido cumulativo C; 2- Ficou assente e é expressamente referido pelo M.º Juiz "a quo" que é por evidente que a separação de pessoas e bens, e posterior conversão em divórcio, partilha judicial e extrajudicial, bem como outros negócios celebrados no decurso temporal até à separação efectiva das partes, mais não foi que uma fórmula expedita de frustrar credores e, assim, salvaguardarem o património das partes; 3- A separação de pessoas e bens e posterior divórcio realizados pelos recorrente e recorrida são, respectivamente, causa modificativa e causa extintiva do contrato casamento e são, ambos, actos jurídicos, "quase-negócios jurídicos"; 4- O facto de tais actos jurídicos, modificativo e extintivo do contrato casamento terem sido decretados por sentença não altera o direito de qualquer interessado, inclusive os próprios simuladores, requererem a respectiva nulidade; 5- Não se trata de um problema de má-fé processual, podendo havê-la, mas de uso anormal do processo (artº 665º do CPC), de tal sorte que o que emerge é uma aparência de decisão; 6- Não se está, igualmente, em presença da revisão de sentença ou da oposição de terceiros: com efeito, não é requerida a nulidade por terceiro, nem se pretende rever uma sentença válida; 7- Nem está em causa, no caso em apreço, o caso julgado, tendo a força obrigatória da decisão dentro e fora do processo os limites fixados pelos artigos 497º e seguintes do CPC; 8- O que se pretende com a presente acção é que o tribunal declare a nulidade da separação de pessoas e bens judicialmente decretada entre autor e ré e posterior conversão em divórcio, como nulos todos os actos posteriores a um daqueles, sem prejuízo do estabelecido no artigo 343º do CC, conforme se refere na petição, em virtude da causa sofrer, toda ela, de uma invalidade absoluta, pelo motivo exposto, de tal forma que poderá ser atacada pela nulidade e ter os efeitos que a esta se prevê; 9- Se o M. Juiz "a quo" tivesse razão quanto à impossibilidade de se requer a nulidade de um acto decretado por sentença, por esta ser inatacável pelo instituto da nulidade, então razão teria o M.º Juiz "a quo" em declarar inatacável a partilha judicial; 10- Declarada a nulidade da partilha extrajudicial referida em 28) dos factos descritos na sentença como provados e declarado quanto aos seu efeitos o cumprimento do previsto nos artigos 243º e 291º do CPC (pese embora haja registo da acção, o problema no caso não se...

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